MAÇONARIA E AMBIENTE - Demografia: Infecção ou nem por isso?
Existe um sítio na Rede, em inglês, que mostra, de maneira particularmente impressiva, o ritmo de crescimento da população humana no Mundo e todo um conjunto de dados, quer inerentes à população (número de infectados por HIV, número de doentes com cancro, quantidade de pessoas que passam fome), quer inerentes ao estado do planeta, poluição e exploração dos seus recursos (temperatura média global, emissão de CO2, espécies extintas, área de floresta perdida e área de floresta replantada, área desertificada, petróleo extraído, petróleo derramado nos oceanos, reservas de petróleo, sua duração, resíduos nucleares). É o Relógio da Terra.
A consulta dos dados deste sítio é elucidativa. No que a este texto respeita, fiquemo-nos pelos dados demográficos: existem presentemente mais de seis mil, seiscentos e trinta milhões de seres humanos à face da Terra, dos quais mais de quarenta e cinco milhões infectados com o vírus HIV e mais de sete milhões sofrendo de cancro. Só desde o princípio do corrente ano de 2007, a população mundial foi aumentada em mais de sessenta e cinco milhões de indivíduos.
A questão demográfica pode ser vista por dois modos, o catastrofista e o optimista.
Quem segue a via de análise catastrofista, antevê para depois de amanhã o caos, o apocalipse. Para esses, a espécie humana está para o planeta como a bactéria para o corpo humano: prolifera tão desregradamente que acabará por o destruir e, com ele, destruir-se-á a si própria.
Para os optimistas não há crise: naturalmente tudo se comporá, o planeta tem capacidade para albergar mais gente do que se julga e a Natureza é mais perfeita do que a julgamos e saberá desencadear o mecanismo de contenção do crescimento da espécie quando a capacidade do planeta estiver a ser atingida.
Para os catastrofistas, a Humanidade é uma infecção que só não destruirá o planeta se este não a destruir primeiro, com um qualquer equivalente cósmico do antibiótico.
Para os optimistas, a Natureza é mãe que acomodará seus filhos até ao limite do possível e, entretanto, providenciará a estes os meios de se auto-regularem e não ultrapassarem o limite da capacidade do planeta.
Para os catastrofistas, a infecção está já actuando e o aquecimento global é o planeta em febre, primeiro sintoma de doença que, se não for rapidamente debelada, levará à morte da doença (a Humanidade) ou do doente (o planeta), com a consequente destruição também daquela.
Para os optimistas, a responsabilidade humana no aquecimento global é uma treta (conferir a posição, aliás com fundamentação que impressiona, que Rui G. Moura apresenta no seu interessante blogue Mitos Climáticos).
Que o crescimento demográfico é um problema, parece que ninguém põe isso em causa. Que não pode ou não deve ser atalhado com medidas de força ou restritivas dos direitos e da dignidade humanas é um princípio que a Maçonaria não pode deixar de proclamar. Como não deve ceder à tentação de se deixar instrumentalizar por uma das teses.
É evidente que o acelerado crescimento da Humanidade coloca problemas cada vez mais urgentes e ingentes. Mas não se deve cair nas tentações dos presságios de catástrofe mais ou menos iminente, caucionando pretensas medidas correctivas que não respeitem a dignidade da pessoa humana.
Por outro lado, não devem também os maçons enfiar a cabeça na areia e pensar e agir como se nenhum problema houvesse, infantilmente confiantes que a Mamã-Natureza resolverá por nós o problema. Porque assim proceder pode levar a que a Mãe-Natureza efectivamente resolva o problema, quiçá por modo menos agradável...
A sobrepopulação deve ser por nós entendida como um problema sério, com que se deve lidar com seriedade, mas também ponderação.
Duas pistas penso que, para já, podemos apontar.
Verifica-se que, nos países economicamente mais desenvolvidos, a taxa de natalidade decresce. Dir-se-ia que o desenvolvimento económico é um bom meio de controlo populacional. Onde não há já grande taxa de mortalidade infantil, as pessoas não sentem a necessidade de ter mais filhos, para garantir que não fiquem sem nenhum. Onde as necessidades básicas são consideradas como asseguradas, as pessoas não sentem a necessidade de ter filhos para auxiliar na obtenção do sustento da família. Devemos, creio, defender o desenvolvimento económico EQUILIBRADO E AMBIENTALMENTE SUSTENTÁVEL também como meio de controlo do excesso de população.
Por outro lado, não devemos deixar passar em claro os receios contrários: a quebra da natalidade, dizem alguns, deve ser atalhada, porque causa envelhecimento da população, sobrecarrega os sistemas de protecção social, faz definhar as sociedades. Devemos ajudar a manter os nossos concidadãos e os nossos decisores com a cabeça fria. Primeiro, apontando que o envelhecimento da população nos países mais desenvolvidos não resulta só da quebra de natalidade, resulta também do facto de os frutos da explosão de nascimentos que ocorreu após o fim da II Guerra Mundial estarem agora no declinar da vida, conjugado com o sucesso das técnicas da medicina moderna no prolongar do tempo médio de vida. Mais vivem mais tempo e portanto daí resulta a alteração da relação entre o número de idosos e o de jovens. Aqui, estamos a ser aparentemente vítimas do nosso sucesso... Mas este é, creio, um problema que naturalmente se resolverá com o tempo: o tempo de vida, mesmo aumentado, dos frutos da explosão de nascimentos chegará ao fim e, tão naturalmente como a relação idosos-jovens se alterou, paulatinamente retomará o sentido da normalidade.
Acresce que o problema conjuntural da alteração do envelhecimento da população nos países economicamente mais desenvolvidos se resolve facilmente com uma medida que, simultaneamente, ajudará a debelar alguns dos problemas resultantes do excesso de natalidade dos países mais pobres: regular os fluxos migratórios, não "fechando portas", mas permitindo um adequado fluxo migratório, que permita manter a quantidade de força de trabalho adequada para o normal funcionamento de cada sociedade, melhorar a relação idosos-jovens e aliviar a pressão sobre os sistemas de segurança social.
É também devido ao facto de ser, ao longo do tempo, um país de imigração que os Estados Unidos são uma potência económica...
Simplesmente, tolerar o Outro, o Diferente, o Imigrante, é, por vezes, difícil. Conviver com culturas diferentes, costumes diversos, não é fácil.
É aqui que a Maçonaria deve intervir: Tolerância é algo de que sabemos muito bem o significado!
Rui Bandeira
4 comentários:
BoAS...
Já conhecia este relógio.
É de facto assustador ver "aqueles" números todos e para mais sempre a aumentarem...
Se ninguém meter a mão à consciência e pensar no que quer para o seu futuro, a Terra como a conhecemos hoje se transformará num local inóspito e de impossivel de ser habitado; pelo menos por aqueles que tanto mal lhe fazem, e que somos Nós...
abr...prof...
"É também devido ao facto de ser, ao longo do tempo, um país de imigração que os Estados Unidos são uma potência económica..."
Parece-me que os EUA o fazem por interesse próprio, e não por magnanimidade. A verdade é que têm atraído os melhores cérebros do mundo, mas fechado firmemente as portas ao resto. Entendo a estratégia - pois abrir as portas de par em par seria catastrófico para todos - mas não a tomemos pelo que não é.
Em vez de fomentar a imigração dos melhores, parece-me mais equilibrado - e mais justo - ajudar os países menos desenvolvidos a atingir o tal patamar de conforto que lhes permita ser auto-suficientes. Ora, retirar-lhes os cidadãos mais promissores dificilmente pode ser considerado uma ajuda.
A imigração é tema igualmente meritório - que seria interessante até debater-se aqui - mas para já foquemo-nos no ambiente e na sustentabilidade.
Quanto aos défices da Segurança Social, parece consensual que o modelo de aumento constante da população como meio de financiamento é insustentável.
Apertemos antes o cinto, e procuremos sobreviver pesando tão pouco quanto possível nos ombros das gerações que nos seguem. Elas agradecer-nos-ão.
Um abraço,
Simple Aureole
@ NuNo_R:
É por isso que convém ir pensando enquanto é tempo... Mas sem radicalismos, de um ou outro sentido, que só servem para fazer ruído e dificultar a análise séria do problema e a busca de remédios eficazes e possíveis.
@ simple:
Não duvido que os EUA têm uma política de atracção de cérebros. Outros países também a têm, talvez com menos sucesso porque as condições estruturais que são oferecidas são diferentes.
Mas seria injusto esquecer que os EUA, ao longo da sua breve história (são só 200 e poucos anitos...), têm sido um país de acolhimento de imigrantes qualquer que seja a capacidade e a preparação destes. Só três exemplos: a migração de irlandeses na época da Grande Fome na Irlanda, a vaga migratória italiana (que resultou na introdução da Cosa Nostra nos EUA, isto para não especular sobre as origens da pizza à americana...) e a migração portuguesa, constituída maioritariamente por açorianos. São movimentos que duraram décadas, talvez hoje com menor expresão (mas hoje há vagas migratórias de outras paragens...), que originaram a integração desses imigrantes e seus descendentes no Povo americano e que obviamente não têm nada a ver com a caça aos cérebros.
Por outro lado, quanto à sugestão de o melhor caminho ser a ajuda aos países menos desenvolvidos, é indiscutível a sua sensatez. Mas, a meu ver, não deve ser utilizada como forma de impedir a migração, ao jeito de "a gente ajuda-os a desenvolverem-se; fiquem lá quietinhos nas vossas terras e não venham para cá misturar-se connosco; afinal de contas, os vossos bisnetos já vão poder ter uma boa vidinha e, perante isso, o que são os sacrifícios, a fome e a miséria de três gerações?".
É que de boas intenções está o Inferno cheio e de boas palavras está a hipocrisia política plena...
Portanto, meu caro, insisto na minha: é útil que a Maçonaria insista na Tolerância, no caso na Tolerância perante a Diferença e o Diferente. Até porque, queiramos ou não, goste ou deteste quem gostar ou detestar, os movimentos migratórios são como a maré: quando sobe, nada a pára. E nem os diques da Holanda devem iludir-nos. Vão sendo a excepção que vai confirmando a regra e, se se confirmar a subida do nível do mar, daqui a umas dezenas de anos se calhar mem isso...
@ Rui
De facto, não se pode falar de ambiente sem se cair na demografia e na economia; é como tentar falar de gastronomia sem falar de agricultura.
O problema de fundo é simples: afinal, chega ou não para todos, e em que termos? É inegável que, descontadas as incontornáveis assimetrias locais a cada país, chega para todos (e até sobra) nos países desenvolvidos, e falta o mais essencial nos países menos desenvolvidos.
Mas será que o excedente dos países "mais ricos" pode, deve ou basta para ajudar os países "mais pobres"?
Não tenho a pretensão de responder a questões deste calibre. Contudo, foquemo-nos no que se fazia, anos atrás, quando uma colheita de cereais era má: passava-se fome, mas guardava-se semente para o ano seguinte. No limite, sacrificava-se o curto prazo para não comprometer o ano seguinte. A Economia ensina isso: que o investimento é alternativo à fruição dos bens, mas que o crescimento económico só se consegue à custa do investimento.
Por outro lado, os excedentes europeus vendidos a baixo custo em África têm destruído a economia local, por serem vendidos a preços abaixo do custo de produção local. Linda ajuda; antes os deitassem ao mar. Vi um programa na TV que mostrava um tipo que construiu 12 aviários com subsídios ao desenvolvimento - uma coisa bem feita - mas, quando apareceu frango congelado europeu a 2/3 do preço de custo dele, ficou com tudo ao abandono, excepto um bocadinho de um aviário apenas para subsistência... Se deixasse de haver subsídios à produção, quer na Europa quer nos EUA, o problema ficava resolvido por si, pois os produtos são baratos por serem subsidiados...
As minhas objecções são desta natureza, não doutra. Em resumo: parem de lhes mandar peixe, e ensinem-nos antes a pescar!!! Afinal, eles até têm, em muitos casos, melhores recursos naturais do que nós... Desde que não lhes façam o que tem feito o Mugabe...
Um abraço,
Simple Aureole
Enviar um comentário