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27 outubro 2014

Reflexão sobre o " Livre Associativismo" e a sua relação com a Maçonaria…

(imagem proveniente de Google Images)
De tempos a tempos e em vários países do mundo, é posta em questão a obrigação da assumpção da pertença dos cidadãos em alguns tipos de associações, sejam de carácter privativo ou não. E por estes dias o assunto veio novamente a debate a nível parlamentar.

Naturalmente que apenas irei dar a minha opinião sobre o que à Maçonaria concerne, pois é geralmente em relação à Maçonaria que  este tipo de situações se torna mais evidente.

A Lei Portuguesa na sua Constituição da República,  afirma nos seguintes Artigos:
  •  Artigo 41º, sobre a "Liberdade de Consciência, Religião e de Culto":
    1. A liberdade de consciência, religião e de culto é inviolável.
   3. Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder. 
  •  Artigo 45º, sobre o "Direito de Reunião e Manifestação":
 1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
  •  Artigo 46º, sobre a  “Liberdade de Associação”:
  1. Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.
2. As associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial.
3. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela.
4. Não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.
E como a Instituição Maçónica não promove a violência, não tem qualquer desígnio contrário à lei do país (aliás um maçom no seu juramento assume a concordância e o dever de respeitar as leis do país onde se encontra!), não faz proselitismo nem obriga ninguém a aderir à mesma (quem a ela adere, fá-lo de livre consciência e vontade), não é uma Ordem militar nem a tal se propõe, objeta contra o racismo e a xenofobia em todas as suas formas e é acima de tudo uma Ordem de caractér iniciático e filantrópico, que defende os valores da Liberdade, Igualdade e da Fraternidade e que promove a evolução da sociedade e do seu progresso através do auto-aperfeiçoamento dos seus membros e da sua ação no mundo profano.
Logo, a Maçonaria e os seus membros podem e devem ser encarados como englobados nestes artigos da nossa legislação.
Desta forma, é uma “falsa questão” se tentar obrigar os maçons a assumirem ou não a sua condição maçónica, uma vez que a mesma não decorre de nada que seja considerado ilegal pelas leis portuguesas.
Não obstante, o que me parece que é o real problema de quem tenta obrigar os maçons, membros de alguma Obediência Maçónica a declarar a sua pertença a esta Augusta Ordem não seja apenas por desejar conhecer o nome dos seus membros, até porque a maioria é gente anónima do conhecimento público, não ocupam cargos importantes nas empresas onde trabalham ou nas associações e agremiações profanas a que pertencem.
Quem quer legislar contra a Maçonaria no que toca a cercear o direito ao livre associativismo e  à privacidade dos seus membros, quer saber acima de tudo, se os  membros de alguma Loja Maçónica nas suas profissões e nas suas relações profanas poderão cometer alguma ilegalidade em virtude dos seus juramentos e/ou relações fraternais.
Quero acreditar que tal não acontece e se tal efetivamente acontecer, a pessoa ou pessoas em questão não podem ser consideradas realmente como sendo maçons, uma vez que agem contráriamente àquilo a que a Maçonaria se propõe fazer e atentam contra os valores morais da própria Ordem e contra aquilo que juraram cumprir.
Mas, quem deseja criar leis e condições que permitam a obrigatoriedade de ser assumida a filiação maçónica para justificar também a sua ignorância e a sua curiosidade sobre o que se passa no seio de uma Loja Maçónica, será também para se informar sobre quem  esteve presente e o que se debateu nessas reuniões maçónicas.  Pois em relação ao povo em geral, estes o que querem conhecer é saber se o fulano” X” ou “Y” é reconhecido como maçon e com isso justificar a opinião que poderão ter sobre essa(s) pessoa(s). Tanto que comparo isso com a mesma avidez com que a generalidade da população lê  revistas “cor-de-rosa” para saberem o que se passa na vida de fulano “A” ou “B”. No fundo meros fait-divers, porque na prática o conhecimento de tais informações não lhes trarão qualquer mais valia e apenas servirá para “matar” a sua curiosidade sobre a vida dessas pessoas, pois essas informações serão irrelevantes para a sua vida em particular.
Mas o que é para mim o mais relevante a reter, é o ataque que se faz aos direitos e garantias dos cidadãos, uma vez que o livre associativismo e a liberdade de um cidadão pertencer a qualquer tipo de agremiação ou associação num futuro quiçá talvez não tão longínquo assim, irá ser posta também em causa.
Para já, o assunto apenas aborda quem pertencer a associações secretas ou de carácter discreto, mas basta se aceitar que tal possa ser exequível, também qualquer outro direito de pertença e militância poderá também ser posto em questão e com toda a legitimidade por quem o fizer.
Para quê e para quem importará saber quem pertence a uma Obediência Maçónica se também não nos é possível saber o que se passa no interior de outras  associações e conhecer a identificação dos seus membros?
Não terão essas mesmas associações o mesmo direito que a Maçonaria se arroga a ter?!  
O direito dos seus membros poderem reunir em privacidade, sem ter de assumir a sua filiação publicamente e com isso não serem incomodados por tal?

Obviamente que sim, a vida interna de uma associação apenas deve interessar aos seus membros ou a quem vive dessas e para essas associações. É uma questão de justiça social!
E numa época em que os cidadãos têm visto os seus direitos e garantias serem limitados, independentemente de quem os governa (pois acontece assim no mundo inteiro em virtude das crises financeiras e guerras que vão se sucedendo) , abrir-se mão de um direito tão básico e ao mesmo tempo tão importante como este, será o abrir de uma “Caixa de Pandora” que depois dificilmente será fechada. Porque neste momento a preocupação infundada que existe sobre a Maçonaria facilmente se poderá alargar a outra associação qualquer, independentemente do seu tipo ou classificação profana.
E uma vez que é natural ao ser humano se associar a algo ou a outrém - isso está na nossa natureza e no nosso ADN, pois o Homem é um animal gregário -,  ao criarem-se condições para que tal suceda, parece-me a mim que, para além de ser anti-natura, é regressar-se a tempos em que mal se podia abrir a boca ou simplesmente olhar outrém nos olhos sem que se tivesse o receio de o fazer... Tempos esses que não deixaram grande saudade nos portugueses.
Seria isso quanto a mim, um retrocesso civilizacional impensável para os dias de hoje!
Aliás, já no tempo do Estado Novo, o deputado à Assembleia Nacional, José Cabral (16/09/1885 – 10/06/1950) apresentou em 19 de janeiro de 1935 e posteriormente aprovado cerca de quatro meses depois, a 12 de maio, um projeto-lei para extinguir as “Sociedades Secretas” – este projeto-lei  foi até hoje um dos mais vis ataques que a Maçonaria sofreu no nosso país – que teve como réplica por parte do poeta e jornalista do Diário de Lisboa,  Fernando Pessoa (13/06/1888 – 30/11/1935), um artigo bastante conhecido ainda hoje, denominado por “"As Associações Secretas: Análise Serena e Minuciosa a um Projecto de Lei apresentado ao Parlamento”, no qual Fernando Pessoa faz uma certa apologia da Augusta Ordem Maçónica e em que confronta a Assembleia Nacional, na pessoa do deputado José Cabral, em que o exorta a deixar cair este projeto-lei atroz para a liberdade dos portugueses. Liberdade esta, que mais tarde veio a ser limitada quase na íntegra como todos nós o bem sabemos…
Por tudo isto, não quero acreditar que os  direitos e garantias que atualmente existem e que promovem a Liberdade dos cidadãos e que foram conquistados com lutas e algum sangue derramado, sejam perdidos assim tão irresponsavelmente e de uma forma tão irrefletida como o aparenta ser .
Seria muito triste para mim, que defendo os valores da Liberdade e da Igualdade, assistir às consequências desse hipotético cenário que alguns se propõem a criar.
É que não basta se pensar que este é um problema exclusivo dos maçons, este é um problema que afetará a todos nós como cidadãos livres que somos. Pois se “agora toca-me a mim, amanhã te tocará a ti”…

O que me leva a recordar o poema "A Indiferença" de Bertold Brecht (10/02/1898 - 14/08/1956), que foi baseado num sermão proferido pelo pastor luterano Martin Niemöller (14/01/1892 - 06/03/1984), que irei aqui partilhar convosco dada a contemporaneadade que o mesmo tem para este assunto em particular:
"Primeiro levaram os comunistas,
Mas eu não me importei
Porque não era nada comigo.
Em seguida levaram alguns operários,
Mas a mim não me afectou
Porque não sou operário.
Depois prenderam os sindicalistas,
Mas não me incomodei
Porque nunca fui sindicalista.
Logo a seguir chegou a vez
de alguns padres, mas como não sou religioso, também não liguei.
Agora levaram-me a mim
E quando percebi,
Já era tarde."
Concluindo, esta visão que tenho sobre este assunto pode parecer demasiado pessimista, mas basta se analisar o que se fez noutros tempos e noutros lugares e se depreenderá com alguma facilidade que tal não será tão irrealista assim…
Urge cada vez mais acabar com “falsos moralismos” e com os preconceitos ignobeis  de quem atenta indisplicentemente contra a Maçonaria.
Tudo o que há para ver, à vista está! Tudo é que é passível de ser conhecido, poderá ser conhecido.
Se dá trabalho obter tal conhecimento? Sim, dá trabalho! Mas nada nesta vida é obtido sem trabalho.
Por isso deixem lá os maçons com as suas lojas e as suas reuniões, que também eles não se importarão com os outros que também têm o direito de se reunir em privado nas suas associações…
Em democracia, o direito de uns é o direito dos outros!
É o direito de Todos Nós!