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02 fevereiro 2008

Virtual... Mas Dolorosamente Real!

Já tive este texto há algum tempo comigo, entretanto perdi-o e hoje entrou-me, de novo, caixa do correio dentro.
É Sábado de Carnaval e o assunto é muito pouco adequado à quadra.

Será ?

Como durante o fim de semana o Rui faz merecida gazeta, resolvi publicar, mesmo correndo o risco de nada haver de novidade.
Não sei quem é o autor

Entrei apressado e com muita fome num restaurante. Escolhi uma mesa bem afastada do movimento, porque queria aproveitar os poucos minutos de que dispunha naquele dia, para comer e acertar alguns bugs de programação num sistema que estava a desenvolver. E também planear a minha viagem de férias, coisa que já há muito tempo não sei o que é.Pedi um filete de salmão com alcaparras em manteiga, uma salada e um sumo de laranja. Abri o meu portátil e apanhei um pequeno susto com aquela voz baixinha atrás de mim:— Senhor, não tem umas moedinhas?— Não, não tenho, menino.— Só uma moedinha para comprar um pão.— Está bem, eu compro um.Para variar, a minha caixa de entrada está cheia de e-mails. Fico distraído a ver poesias, as formatações lindas, rindo com as piadas malucas. Ah!... Esta música leva-me até Londres e às boas lembranças de tempos áureos. — Senhor, peça para colocar fiambre e queijo.Percebo, nesse momento, que o menino tinha ficado ali.— OK. Vou pedir, mas depois deixas-me trabalhar, estou muito ocupado, está bem?Chega a minha refeição e, com ela, o meu mal-estar. Faço o pedido do menino, e o empregado pergunta-me se quero que mande o menino ir embora. O peso na consciência, impede-me de lhe dizer que sim. Digo que está tudo bem. Deixe-o ficar. Que traga o pão e, mais uma refeição decente para ele. Então sentou-se à minha frente e perguntou:— Senhor o que está fazer?— Estou a ler uns e-mails.— O que são e-mails?— São mensagens electrónicas mandadas por pessoas via Internet — sabia que ele não ia entender nada, mas, a título de livrar-me de questionários desses… — É como se fosse uma carta, só que via Internet. — Senhor você tem Internet?— Tenho sim, é essencial no mundo de hoje.— O que é Internet?— É um local no computador, onde podemos ver e ouvir muitas coisas, notícias, músicas, conhecer pessoas, ler, escrever, sonhar, trabalhar, aprender. Tem de tudo no mundo virtual. — E o que é virtual?Resolvo dar uma explicação simplificada, sabendo com certeza que ele pouco vai entender e deixar-me-ia almoçar, sem culpas.— Virtual é um local que imaginamos, algo que não podemos tocar, apanhar, pegar... É lá que criamos um monte de coisas que gostaríamos de fazer. Criamos as nossas fantasias, transformamos o mundo em quase como queríamos que fosse. — Que bom, isso. Gostei!— Menino, entendeste o significado da palavra virtual ?— Sim, também vivo neste mundo virtual.— Tens computador?! — Exclamei.— Não, mas o meu mundo também é vivido dessa maneira... Virtual. A minha mãe fica todo dia fora, chega muito tarde e quase não a vejo. Eu fico a cuidar do meu irmão pequeno que vive a chorar de fome e dou-lhe água para ele pensar que é sopa. A minha irmã mais velha sai todo dia também, diz que vai vender o corpo; mas não entendo, porque ela volta sempre com o corpo. O meu pai está na cadeia há muito tempo, mas imagino sempre a nossa família toda junta em casa, com muita comida e muitos brinquedos de Natal e eu a estudar na escola para vir a ser um médico um dia. Isto é virtual não é senhor?! Fechei o portátil, não conseguindo impedir que as lágrimas caíssem sobre o teclado.Esperei que o menino acabasse de literalmente "devorar" o prato dele, paguei, e dei-lhe o troco. Retribuiu-me com um dos mais belos e sinceros sorrisos que já recebi na vida e com um "Brigado senhor, você é muito simpático!". Ali, naquele instante, tive a maior prova da virtualidade insensata em que vivemos todos os dias, enquanto a realidade cruel nos rodeia de verdade e fazemos de conta que não percebemos !
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JPSetúbal
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PS (de "post scriptum") - O nosso incansável e atentíssimo visitante "Simple" deixou-me um comentário com o "chá"...
Meu Caro, agradeço vivamente a ajuda porque obviamente este texto merece um autor. E neste caso uma autora, ROSA PENA. Ainda bem. Obrigado. Um abraço.