25 outubro 2018

A mudança

Na sequência da Prancha apresentada por um  I:. intitulada “Sobre a Impermanência”, pareceu-me ser consistente escrever sobre a mudança e os processos que lhe estão associados, já que está subjacente à impermanência.

Deixem-me começar por transcrever algumas frases soltas que creio poderem servir para enquadrar o tema:
  • "Quando sentimos a necessidade de uma mudança profunda, normalmente vemo-la como algo que deve ocorrer, mas não em nós. Nas funções em que exercemos autoridade, sejamos pais, professores, chefes, ou outra coisa qualquer, somos particularmente atentos à necessidade de mudar dos outros. Esses esforços falham frequentemente e é comum que respondamos aumentando a pressão. Esta luta raramente traz consigo mudança ou excelência." - Robert E. Quinn
  • "Se nos conseguíssemos mudar a nós próprios, então as tendências do mundo também mudariam. Conforme a nossa mudança, assim muda também a atitude do mundo perante nós… não precisamos de esperar que os outros mudem." - Mahatma Gandhi
  • "A mudança não é algo opcional… é inevitável." - Barbara Sher
  • "A mudança pode ser um desafio, mas pode também ser uma ameaça. Aquilo em que acreditamos pavimenta o nosso caminho para o sucesso ou insucesso." - Marsha Sinetar
  • "A espécie que sobrevive não é a mais forte, nem sequer a mais inteligente; é sim a que se adapta mais facilmente à mudança." - Charles Darwin
  • "Todos já aceitámos que a mudança é inevitável. Mas todos ainda a encaramos como a morte ou pagar impostos – deve ser adiada o mais possível e se for possível, fiquemos na mesma. Contudo, no período em que vivemos o normal é a mudança e não a permanência." - Peter F. Drucker
  • "Mudemos antes que tenhamos de mudar." - Jack Welch
  • "A mudança é difícil porque tendemos a sobrevalorizar o que temos e a desvalorizar o que poderíamos ter se mudássemos." - James Belasco e Ralph Stayer
  • "Não há nada mais difícil de assumir, mais arriscado de dirigir, ou com maior incerteza no resultado, do que a liderança na mudança." - Niccolo Machiavelli
  • "Choque com o futuro é o resultado do stress e desorientação que induzimos nos indivíduos, quando os submetemos a demasiadas mudanças num curto espaço de tempo." - Alvin Toffler
  • A vida é constituída por uma série de mudanças naturais e espontâneas. Resistir-lhes só serve para trazer frustração e tristeza. Deixemos que a realidade seja a realidade. Deixemos as coisas fluírem naturalmente na direcção que tiverem de tomar.” - Lao Tzu
  • Quando a taxa de mudança nos mercados for maior que a da organização, o fim está à vista.” - Jack Welch

Entremos em matéria…

A vida vai acontecendo e o que acontece é muitas vezes denominado de mudança. Algumas são resultado da evolução biológica e da passagem do tempo, no que é o ciclo natural do nascimento, crescimento, decrescimento e morte. Outras resultam de factos sob o nosso controlo e esforço ou da interacção com familiares, amigos, etc. Finalmente, há um terceiro grupo que resulta de factos totalmente fora do nosso controlo.

As nossas experiencias resultam de factos externos ou internos que seguem um caminho linear, regulado pelo tempo, pelo espaço, ou pelas estruturas sociais. Podem também resultar de aspectos emocionais, psicológicos ou até das nossas lutas internas e externas. Podem ser subtis ou graduais, fáceis e bem-vindas ou difíceis e exigentes. Podemos encará-las e à mudança que implicam, com aceitação e adesão ou com protesto e resistência.

O significado pessoal de cada mudança ocorre quando decidimos mudar, já que isto significa passar do estado mais contemplativo em que as coisas acontecem porque sempre aconteceram, para um estado mais activo em que mudamos para obter um resultado por nós escolhido. Mudar o nosso foco do que acontece para o que fazemos com o que acontece é outra forma de descrever a mudança. Não nos esqueçamos que a forma como interagimos com a mudança é uma escolha pessoal.

O perigo de mudar sem verdadeiramente experimentarmos a mudança é o de essa mudança não chegar a ocorrer. Se estivermos focados na mudança em si mesmo e/ou demasiado ansiosos por resolver um problema, podemos perder a mensagem que o processo contém, bem como o seu aspecto transformativo. Daqui resulta que é importante não só a mudança, mas também a forma como mudamos. Mudanças radicais sem um processo evolutivo resultam frequentemente em cenários “déjà-vu” e no reforço de comportamentos que pretendíamos mudar. Para que a mudança seja real e tenha um efeito efectivo, é necessário que aprendamos a trabalhar realmente com ela e não a evitá-la sempre que possível. Já agora, contemplá-la também não costuma dar resultado.

Os antigos filósofos diziam que tudo muda permanentemente (impermanência). O I Ching, o Livro da Mudança, é um texto Chinês que tem servido como ferramenta para tomada de decisões e para tentar prever o futuro, por mais de cinco mil anos. Apesar de tudo ser transitório e estar em constante mudança, o conceito e o seu processo evolutivo respeitam as leis naturais, que pelas suas propriedades cíclicas e repetitivas, fazem da mudança um processo que não muda (impermanência).

O I Ching contem uma simbologia cujo objectivo é ajudar-nos a encontrar ordem dentro dos acontecimentos quase aleatórios da vida. Basicamente, todas as situações na vida ocorrem segundo seis estadios, que embora sejam mutáveis, são previsíveis: começar a ser, início, expansão, evolução para atingir o potencial mais alto, potencial mais alto, regressão. Podemos estabelecer um paralelismo com os seres: concepção, nascimento, crescimento, evolução para a maturidade, maturidade, envelhecimento e morte. Estes estadios são também aplicáveis ás organizações, aos produtos e a muitas outras coisas que nos rodeiam. Tudo parece ter um inicio e um fim e nesse intervalo está em constante mudança.

Apesar da mudança poder interromper o decurso normal das nossas vidas (e fá-lo), constitui também uma oportunidade e um desafio para analisar o que fazemos e o que poderemos fazer e para alterar esse estado, se assim o entendermos. Pode até servir para nos mantermos como estamos e assim permitir-nos melhores escolhas e decisões.

Afastar ou negar a mudança e o que nos pode oferecer, pode ser uma oportunidade perdida de aprendizagem ou de descoberta. A chave está em entender e aceitar que a mudança é a regra e não a excepção e que mesmo que não aceitemos mudar, estaremos ainda assim a fazê-lo. Quando aceitamos esta realidade e aprendemos a lidar com ela, torna-se muito mais fácil ajustar-nos, já que o fazemos com a consciência de que estamos a mudar de forma controlada, num processo que não muda.

Colocando a mudança de lado, vejamos a outra parte da equação – a complexidade do desenvolvimento da personalidade individual. O desenvolvimento da personalidade é função de três variáveis ou sistemas: O corpo (soma), A psique (psyche), e o comunitário ou social (ethos).

Existem diversas teorias sobre o desenvolvimento da personalidade, mas as do psicanalista Erik Erickson são consideradas das que melhor nos podem ajudar a compreender a mudança no contexto do ciclo da vida. A sua teoria ajuda a clarificar como é que um individuo adere e processa a sua mudança intrínseca o que permite perceber se a pessoa está à altura para fazer mudanças em si próprio.

Esta teoria identifica oito estadios pelo qual o individuo passa, desde o nascimento até à velhice. Todos estão presentes à nascença, mas desenvolvem-se em função de uma dicotomia entre o pessoal e o social.

Cada estadio é marcado por uma crise psicossocial entre uma vertente positiva e uma vertente negativa. As duas vertentes são necessárias, mas é essencial que se sobreponha a positiva à negativa. A forma como cada crise é ultrapassada ao longo de todos os estadios influenciará a capacidade para se resolverem conflitos inerentes à vida, bem como a atitude perante a evolução (mudança). Para Erickson, o conflito e a crise psicossocial são positivas, já que são fontes de crescimento, força e compromisso.

A forma como cada individuo evolui ao longo deste trajecto de oito estadios, pode determinar que seja mais ou menos confiante e que tenha uma maior ou menor aversão ao risco. Confiança e atitude perante o risco são dois factores fundamentais que balizam a forma como lidamos com a mudança.

Para além desta perspectiva mais teórica, há diversos factores de ordem pratica que influenciam se e como lidamos com a mudança.

O temperamento, ou seja, a nossa atitude perante a vida, que faz de nós maleáveis e adaptáveis, envergonhados e medrosos, ou difíceis e inflexíveis, influencia de forma decisiva a forma como vemos o mundo e os outros e consequentemente a nossa capacidade de nos adaptarmos. Os pensamentos, atitudes e comportamentos de todos aqueles que nos rodeiam, podem influenciar a nossa forma de pensar e de agir. Por exemplo, amor, aceitação ou optimismo induzem confiança e esperança, ao contrário de críticas, pessimismo e outras atitudes negativas. O mesmo papel podem desempenhar experiências passadas: uma mudança com sucesso gera optimismo, abertura e confiança.

Os valores familiares e sociais são sempre herdados pelo individuo, desde o princípio da sua vida. O medo da mudança e de assumir riscos são contagiosos e interferem na forma como o individuo encara a mudança e limitam o que é capaz de fazer. Para muitos a simples ideia de mudar é esmagadora e geradora de ansiedade, constituindo algo a evitar a todo o custo.

Mas quais são realmente as implicações da mudança quer no plano individual, quer no grupo ou organização. O que é que devemos e/ou pudemos tentar gerir?

Edgar Henry Schein (Ph.D., Psicologia Social, Harvard University) propõe-nos um modelo conceptual para a mudança e suas implicações. Segundo ele, a mudança gera normalmente dois tipos de ansiedade:

A ansiedade associada ao ter de mudar (também chamada “Ansiedade de Aprendizagem”, já que isso implica ter de aprender e deixar o que sabemos por o que não sabemos. Esta ansiedade pode ser gerada e alimentada por diversas razões, toda elas válidas:
  • Receio de perder poder e/ou posição.
  • Receio de sermos temporariamente incompetentes
  • Receio de não sermos capazes de mudar (Princípio de Peter), ou seja, o receio de já termos atingido o nosso limiar de competências que evoluir implique passarmos a ser incompetentes.
  • Finalmente, o receio de perca de identidade e de pertença ao grupo.
Como parece ser claro, quanto maior for esta ansiedade, maior será também a nossa Resistência à Mudança. Adiante veremos formas de tentar minimizar estes efeitos.

Mas a mudança também pode induzir a chamada “Ansiedade de Sobrevivência”, ou seja, o medo sobre o que pode acontecer se não mudarmos.

Como é evidente, estamos perante duas ansiedades que jogam em sinal contrário – “eu estou bem como estou, mas o que é que acontecerá se eu não mudar”. Parece também ser evidente que a mudança fica claramente dificultada enquanto a Ansiedade de Aprender for superior à de Sobrevivência e a forma de conseguirmos que o processo evolua é precisamente “jogar” com estas duas variáveis.

Como???

Para baixar a Ansiedade de Aprendizagem, há algumas alternativas.
  • Desdramatizar o processo, envolvendo os implicados e criando condições para que possam participar.
  • Estabelecer programas de formação e de apoio à aquisição e implementação de novas competências.
  • Gerir a mudança para que não seja brusca ou implique rupturas.
  • Implementar mentalidades que permitam errar... a chamada gestão do erro.
  • Outras…
Relativamente à aquisição e implementação de novas competências, importa reflectir sobre o processo de aprendizagem, que podemos estruturar em quatro fases:
  1. Somos Inconscientemente Incompetentes, ou seja, não sabemos e nem sequer sabemos que não sabemos. Os processos de avaliação de desempenho ou uma análise de “gaps” entre o que sabemos e o que teremos de saber no futuro, poderão ajudar a passarmos para a próxima fase.
  2. Conscientemente Incompetentes – não sabemos, mas já sabemos que não sabemos. Aqui importa ter formação que nos permita adquirir novos conhecimentos.
  3. Conscientemente Competentes – já sabemos como se faz, mas ainda não sabemos fazer. Usando o desporto como analogia, é nesta fase que devemos treinar, praticar; devemos conscientemente utilizar os novos conhecimentos até que sejam interiorizados e os possamos utilizar de forma inconsciente.
  4. Inconscientemente Competentes – esta é fase que se pretende atingir, ou seja, estamos em condições de usar as nossas novas competências e assim acompanhar o processo de mudança, ou seja Mudámos.
Naturalmente que este processo deve ser acompanhado com apoio e envolvimento que permitam criar um ambiente “psicologicamente seguro” onde a aprendizagem fique facilitada.

A cultura que possa existir de “gestão do erro”, poderá facilitar ou dificultar a mudança e a aprendizagem. Numa organização em que quem erra é quase que “crucificado” por o ter feito, haverá certamente resistência à mudança, já que todos quererão continuar na sua zona de conforto e a fazer como sempre fizeram. Este aspecto aplica-se também ao nível individual; a forma como lidamos com os nossos erros, pode facilitar ou dificultar bastante a adesão a novas formas de estar, pensar ou agir.

Relativamente à segunda ansiedade – a de Sobrevivência -, deixo à imaginação e criatividade dos meus irmãos a forma de o conseguir, já que nem sempre é possível reduzir a Ansiedade de Aprender para níveis inferiores à de Sobrevivência e há que actuar nesta, aumentando-a.

A forma como se utilizam as duas ansiedades pode ajudar também a analisar o estilo de direcção de um qualquer gestor. Um líder tenderá a dar prioridade à Ansiedade de Aprendizagem, quase esgotando a sua utilização, antes de se voltar para a outra. Por outro lado, um chefe recorrerá muito mais precocemente à Ansiedade de Sobrevivência, estabelecendo regras e definindo penalidades.

Fazendo um parêntesis nesta prancha, se analisarmos à luz desta teoria, as dificuldades que algumas organizações têm para implementar mudanças, facilmente entendemos porque assim é. A Ansiedade de Sobrevivência é muito baixa e é muito difícil de subir.

Gostaria também de vos apresentar o conceito de “instabilidade Contida” desenvolvido por Ralph Stacey. Segundo ele, as organizações, sejam de que tipo forem, devem ter estabilidade suficiente para que as pessoas não desperdicem tempo e energia a “reinventar a roda” e a criar mecanismos de defesa, mas ter também suficiente instabilidade que leve as pessoas a serem motivadas para mudar, para serem criativas e para procurar novas formas de actuar e fazer as coisas, mesmo quando esse processo possa eventualmente ser doloroso.

E o que é que tudo isto tema ver com a Maçonaria?

Tudo!!!

A Maçonaria visa ajudar a criar homens melhores e de alguma forma esperar que estes sejam cristalizadores na sociedade. Nós aderimos à Ordem porque sentimos que podemos melhorar e porque reconhecemos a Ordem como um espaço para isso.

Quem muda ou faz as nossas próprias mudanças somos nós e nós somos Maçons. A Maçonaria disponibiliza-nos um espaço de mudança onde não há Ansiedade de Sobrevivência, já que nada nos será cobrado se não evoluirmos, e onde cada um muda ao seu ritmo e na direcção que quer, respeitando naturalmente os nossos princípios e regras.

Termino atrevendo-me a acrescentar algo Às palavras de Mahatma Gandhi, apresentadas no início: “podemos mudar os outros, começando por nos mudar a nós próprios”

António Jorge - Mestre Maçon

02 outubro 2018

Comunicação do Grão-Mestre da GLLP/GLRP por ocasião da sua Instalação, no equinócio de outono de 2018


Meus queridos Irmãos,

Agradeço a vossa presença e a todos saúdo com um tríplice fraternal abraço.

Começo por saudar tão vasta representação de Representantes das delegações de potências maçónicas estrangeiras, que muito nos honram e sensibilizam com a sua presença.

Permitam-me que saúde de forma muito especial os Antigos Grão-Mestres, aqui presentes: o M. R. I. José Manuel Anes, o M. R. I. José Moreno e o M. R. I. Júlio Meirinhos que acabou de me instalar na cadeira de Salomão, o que muito me honrou.

Recebo das suas mãos uma Ordem mais forte. A Grande Loja teve um enorme incremento nos últimos 4 anos, fortaleceu-se internamente e aumentou significativamente a sua influência internacional. E isso resultou do esforço e empenho no exercício do cargo. Agradeço-te, pois, M. R. I. Júlio Meirinhos o teu empenho e dedicação à nossa Grande Loja.

Mas todos tiveram um papel notável na edificação da nossa Augusta Ordem. Foram o garante da nossa unidade e regularidade. Com o seu entusiasmo e dedicação, foram protagonistas relevantes da nossa história, e muito contribuiram para o crescimento da nossa Fraternidade. A todos eles devemos o que somos hoje. Agradeço em meu nome, em nosso nome, a todos os que me antecederam.  

Permitam-me ainda lembrar, com muita saudade, dois grandes e notáveis Maçons que marcaram, de forma indelével, o meu percurso e maturidade maçónica: Mário Martin Guia e Rui Clemente Lelé. A eles devo, ainda que de forma distinta, grande parte do que sou hoje como maçom.

Ao longo dos últimos anos, tive o privilégio de conhecer muitos Irmãos que enobreceram e enobrecem a nossa Augusta Ordem. Percorri um amplo número de Lojas e ajudei a fundar algumas. Fiz um trajeto que muitos outros Irmãos também fizeram e que muitos mais podem e, com certeza, virão a fazer.

No tempo que considerei certo, apresentei-me como candidato a Grão-Mestre da GLLP/GLRP, apresentei-me com a simplicidade e a normalidade de um qualquer Irmão que assim o desejasse e estivesse conforme à regularidade e aos regulamentos.

As últimas eleições para o cargo de Grão-Mestre reafirmaram a pluralidade e diversidade de opiniões e a enorme vitalidade da nosa Augusta Ordem. Cumprimento por isso todos os RR. II. que comigo as disputaram.

Em democracia as eleições são a pedra angular da liberdade e é sempre salutar que elas ocorram conforme os cânones que se lhe aplicam, com serenidade, igualdade, cordialidade e correção.

Na nossa Augusta Ordem, as eleições, no estrito cumprimento dos Regulamentos e do verdadeiro espírito maçónico assumem, ainda que assentes em princípios democráticos, contornos particulares. No nosso caso, exige-se que tal suceda em fraternidade. Ou seja: porque somos uma obediência fraternal, impõe-se que a disputa seja leal e em irmandade, pois ninguém está, enquanto pessoa e Irmão, acima de quem quer que seja e o "pleito eleitoral", sendo necessário e importante na vida da nossa Augusta Ordem, é apenas um momento de escolha, onde os Irmãos elegem um seu par para assumir a cadeira de Salomão.

Na cadeira de Salomão, o ocupante senta-se para governar o que lhe foi confiado, tentar resolver o insolúvel, preparar-se para o imprevisível, antever o possível, dirimir os conflitos, eliminar o que for injusto e negativo e procurar a harmonia, a paz e a concórdia.

É certo que crescemos muito. Foi meu compromisso "eleitoral" defender a máxima exigência na seleção daqueles que devemos aceitar na nossa Augusta Ordem e a quem possamos verdadeiramente reconhecer como Irmãos. A nossa dificuldade tem de estar em selecionar, não em recrutar. Selecionar, sempre com o intuito de ter connosco os melhores e mais bem preparados, pois só assim poderemos agir com maior significado junto da vida profana onde nos inserimos e só assim manteremos a união e a fraternidade que nos carateriza.

Vivemos um tempo de dificuldades no país, na Europa e no mundo, em que proliferam muitas desavenças políticas, conflitos bélicos, incertezas geoestratégicas e incapacidade para resolver os problemas sociais, como os das minorias e dos refugiados. Internamente, o país regista ambivalências, com esperança numa definitiva mudança, entre certezas e muitas dúvidas.

E reflito nisto aqui porque a Maçonaria náo vive fora do mundo e das realidades que a cercam e, por isso mesmo, não poderemos nunca ser um corpo amorfo e indiferente em tão vasto horizonte de eventos com que nos confrontamos.

Num mundo em permanente evolução, a mudança deve estar ancorada num quadro de valores que, em momento nenhum, esqueça as pessoas e a liberdade individual como principal motor dessa dinâmica e, em última instância, da garantia da própria felicidade humana.

A sociedade em que hoje vivemos encerra, em acelerada mudança, um conjunto de desafios de proporções ainda desconhecidas e de consequências imprevisíveis. Os riscos da incerteza exigirão firme e determinada intervenção das lideranças das principais instituições que compõem a sociedade.

A nossa Augusta Ordem, ontem como hoje, pela força da sua génese e pela sua responsabilidade histórica, será inevitavelmente chamada a, mais uma vez, constituir-se como farol da evolução, saber de experiência feita sobre o essencial da libertação do Homem, luz sobre os valores que mudança alguma pode colocar em causa.

Consciente destes desafios, ciente da responsabilidade secular que o cargo impõe, proponho-me, se soberba, ativamente contribuir para resgatar para a maçonaria o papel central sobre este processo de evolução, recolocando-a como referência maior e escola de vida para os Homens Bons que pretendem apurar-se na relação com os outros, tornando-se Homens Melhores.

Honrando a herança recebida desde o exemplo maior de Jacques de Molay, 704 anos após a sua morte às mãos da tirania de Filipe IV, curiosamente de cognome "O Belo", propomo-nos continuar a combater por uma sociedade mais livre e mais solidária, onde o génio individual liberte todo o seu poder criativo à luz da razão, conquistando a verdadeira beleza que resulta da perfeição.

Quando atendemos à dimensão de todos aqueles que se sacrificaram em nome dos nossos ideais, só podemos ter orgulho na condição de maçons que transportamos em nós.

Por todas estas razões, escolhi como lema do meu Grão-Mestrado "O Orgulho em Ser Maçom".

Quanto maior a alma, maior o desafio. E por tudo isto, liderar o grupo de Homens Bons que integram a nossa Augusta Ordem é, não só um privilégio, uma honra, mas uma enorme responsabilidade. É orgulho, felicidade e ambição, que só a profunda admiração que nutro por cada um me fazem imaginar sequer poder estar à altura.

Num momento, também, em que a maçonaria enferma de uma injusta perceção pública, numa época em que tudo vale, muitas vezes entre nós próprios, para fazer vingar um qualquer fim, mais do que nunca teremos que travar a queda por este declive obscuro e recolocar a Maçonaria no caminho e no patamar que sempre a distinguiu ao longo da História.

A Maçonaria em Portugal esculpiu pela sua ação alguns dos momentos maos épicos dos feitos nacionais. Da democracia à consagração das diferentes liberdades, muitas são as medalhas que podemos exibir com brio e dignidade.

É pois tempo de voltarmos a contribuir ativamente para o apuramento do Homem e da sociedade, é tempo de voltarmos a fazer História.

Para este desígnio, tenho plena consciência que o caminho a que me proponho não será nem fácil nem pacífico. Tenho total certeza das inúmeras tormentas que nos esperam e dos múltiplos ataques que nos aguardam.

A Maçonaria sempre existiu, e existirá, para melhorar o mundo. Mas para isso é preciso, primeiro, melhorar o homem. É essa a função primordial da Maçonaria.

Chegado aqui, cumpre-me, obviamente, refletir sobre o nosso momento, a realidade da nossa fraternidade. O certo é que, sendo uma Fraternidade, somos também uma Ordem onde impera a lealdade e a irmandade. Mas não nos esqueçamos que somos ainda uma Obediência e esta obriga-nos, a todos, a uma sã relação de respeito para com o Grão-Mestre e deste para com os todos os Irmãos.

Ninguém é obrigado a ser Maçom, mas, em o sendo, tem de se conformar com as constituições e as regras da Maçonaria Universal.

E é por isso que, quando prestamos os juramentos, comprometemo-nos a cumpri-los. Podemos não concordar com o que quer que seja, mas temos de cumprir e, sobretudo, em fraternidade, cumprir e agir irmãmente. Nunca por objeções, maledicências, deslealdades ou críticas que atingem a dignidade  de qualquer Irmão.

Não poderemos, nunca, como em qualquer outra instituição, obter a total aceitação ou unanimidade sobre tantos e tão delicados assuntos em que nos envolvemos. Mas podemos e devemos, sempre, aproximar ideias, objetivos e obter consensos alargados que traduzam a vontade generalizada dos Irmãos.

É iso que farei nos próximos 2 anos, com total empenho e dedicação, aprimorando o talhe da pedra, cuja beleza não cessará de ser trabalhada, visando a solidificação da Ordem e o crescimento da Fraternidade.

A condição de Maçom exige que o eleito se convença da sua humildade, pois ela será a sua grandeza, mas humildade em excesso ou pouco sentida não são mais que vícios e vaidades escondidas. Contudo, Humildade não é inação ou falta de determinação, uma vez que não se pode renunciar a governar em plenitude, mas tal apenas o determina no sentido do "Bem da Ordem".

"O Bem da Ordem" não é uma arbitrariedade ou uma aritmética administrativa. É essencialmente agir, garantindo a continuidade provinda de antanho e prossegir adiante, robustecendo a Fraternidade, constituída por Maçons livres que se congregaram para o aperfeiçoamento do homem e a melhoria do mundo. 

São estes os objetivos e os limites da governação. Tudo o mais não interessa, mas sem deixar de agir, liderar e trabalhar, fazendo o que tem de ser feito, antecipando o bom porvir e evitando o que é desajustado.

Afinal, tudo só pode ser feito com o empenho de todos os Irmãos, pois se é verdade que a Grande Loja tem de ser o vértice da Fraternidade, esse vértice tem que assentar numa base que são as Lojas, com proximidade e interação.

Reafirmo, pois, o compromisso assumido de intensificar a aproximação da Grande Loja com as Lojas e destas entre si, fortalecendo dessa forma as nossas relações e estimulando o fortalecimento da nossa Instituição.

Por isso, também, todos os Irmãos devem esforçar-se por trabalhar comigo, ajudando-me na obra comum. Quem, inconformado, passa para uma inorgânica "oposição", se afasta ou evita compromissos e serviços, "nunca será um bom Maçom". Será tão só um "membro da Loja", alguém que assinou uma proposta para ingresso na Maçonaria, como quem subscreve ou participa, anódino, numa associação social, recreativa, desportiva ou cultural.

Não sou dos que defende que haja nas Respeitáveis Lojas e também na Grande Loja portadores de cargos e colares e que apenas deambulam pelas Sessões e festividades, sem conhecimento e dedicação às funções.

Somos todos necessários e assim é inaceitável que, no meio dos "ELEITOS DA LUZ", não haja maçons disponíveis para o trabalho: só pelo trabalho o Maçom elimina as trevas.

A propósito da Luz, recorro-me da poesia do nosso Muito Querido e saudoso Mário Martin Guia e do poema Hino à Harmonia:

"Sendo o homem a sombra do Divino
e sendo também verdade
que a necessidade equilibra a Liberdade
o Espírito a Matéria, a Fé a Razão
e a sabedoria o Poder
para haver Harmonia
e alcançar a Felicidade
é também ponto assente
que a Luz deve vir do Oriente".

Desde o primeiro dia em que entrei para a nossa Augusta Ordem que sei fazer parte de um grupo que veio para ficar, com uma ideia de futuro e um plano para cumprir. É neste quadro que sustentamos a razão da nossa existência. É neste quadro que queremos crescer, ajudando os homens a serem bons e os bons a serem melhores. Ajudando as sociedades a rimarem liberdade com responsabilidade, alma com solidariedade. É este o legado que queremos deixar.

Darei por isso continuidade a tudo o que de bom foi feito, melhorando aquilo que tiver que ser, com o objetivo de cumprir o meu programa, mas respeitando o princípio da pluralidade e diversidade, ouvindo as vossas opiniões e propostas.

Importa criar e semear aqui e agora, olhando para o futuro e para a Augusta Ordem que queremos ter.

A equipa que me acompanhará é aquela que eu entendo ser o resultado da reflexão sobre a renovação das tradições que nos fazem maçons, conjugadas com a realidade, prioridades e objetivos que uma sociedade iniciática requer, num tempo imediatista e desinformado.

Disse sempre que não me candidatava contra ninguém, nem a favor de ninguém. Agora que sou o vosso GM fiquem certos de que não estarei contra ninguém, exceto aqueles cujos comportamentos e ações não respeitem os princípios e juramentos que nos unem.

O GM será o garante que nenum Irmão fica esquecido, que todas as palavras são escutadas, mas igualmente que nenhum outro se arroga de importâncias que não tem, ou de egos que deve, em primeira linha, combater. Este é o espaço da liberdade, da igualdade e da tolerância. 

Comprometi-me e vou demonstrar que somos uma organização virada para a sociedade, aceite e contributiva e onde os maçons são reconhecidos como homens de confiança, livres e de bons costumes.

É tempo de trabalhar muito, com dedicação, ética e entrega a esta causa que é de todos.

Assim, o futuro da GLLP/GLRP será risonho, não tenham dúvidas, porque a quantidade e qualidade dos Irmãos que a constituem assim querem, desejam e tudo farão para que tal suceda.

Para isso preciso de todos. Convosco, sei que chegarei lá. Convosco sei que, em paz e harmonia, todos faremos mais e melhor para a nossa Augusta Ordem.

À Glória do Grande Arquiteto do Universo.

Armindo Azevedo
Grão-Mestre