Uma (nova) idade das trevas?
É conhecida a expressão "Idade das Trevas" como referência à Baixa Idade Média (séc. XI a séc. XV). Neste período de generalizado analfabetismo, o estudo era privilégio de uns quantos, e o conhecimento transmitido quase sempre em contexto monástico - e objeto de rigorosa filtragem de conteúdos que pudessem contrariar o statu quo e os dogmas vigentes. Não obstante, a produção intelectual e científica não cessou, e os avanços então decorridos vieram a constituir a base da Ciência Moderna.
O Iluminismo, movimento que surgiu no século XVIII de entre a elite dos intelectuais europeus da época, procurou promover a razão, o intercâmbio intelectual a ciência, opondo-se ferozmente à superstição, à intolerância e aos abusos por parte do poder vigente. Kant definiu assim o Iluminismo: "O Iluminismo representa a saída dos seres humanos de uma tutelagem que estes mesmos se impuseram a si. Tutelados são aqueles que se encontram incapazes de fazer uso da própria razão independentemente da direção de outrem. É-se culpado da própria tutelagem quando esta resulta não de uma deficiência do entendimento mas da falta de resolução e coragem para se fazer uso do entendimento independentemente da direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem para fazer uso da tua própria razão! - esse é o lema do Iluminismo".
O fogo iluminista varreu a Europa e propagou-se à América. Muitos países, porém, viriam a manter-se arredados dos seus princípios até aos dias de hoje. "É uma questão de tempo", poderíamos dizer, "até que os povos atinjam a maturidade necessária; quando isso suceder, reclamarão para si também o que outros conquistaram já." Infelizmente, a história recente vem apontar-nos uma alternativa bem menos risonha.
Nos Estados Unidos da América - um dos países que nasceu, precisamente, do Iluminismo, e fundado nos seus princípios - há, hoje em dia, uma considerável fatia da população anti-intelectual que, evidentemente, renega e rejeita esses mesmos princípios. Ainda muito recentemente foi notícia o facto de o Partido Republicano, no Texas, ter publicado a sua "plataforma de princípios", dos quais consta este:
"Knowledge-Based Education – We oppose the teaching of Higher Order Thinking Skills (HOTS) (values clarification), critical thinking skills and similar programs that are simply a relabeling of Outcome-Based Education (OBE) (mastery learning) which focus on behavior modification and have the purpose of challenging the student’s fixed beliefs and undermining parental authority."
Numa tradução livre: "Educação baseada no Conhecimento - Somos contra o ensino de «Competências Elevadas de Raciocínio», proficiência de pensamento crítico e programas semelhantes, que não passam de novos nomes para «Educação Baseada em Resultados» que se focam na modificação do comportamento e têm o propósito de desafiar as crenças do aluno e minar a autoridade dos pais." Vejamos agora o que isto quer dizer.
De acordo com a taxonomia de Bloom, há seis níveis de objetivos educacionais: o conhecimento, a compreensão, a aplicação, a análise, a síntese e a avaliação. As "Competências Elevadas de Raciocínio" são, então, a análise, a síntese e a avaliação. Estes três níveis de proficiência são os mais importantes para o pensamento crítico.
A "Educação Baseada em Resultados" passa pela definição de aptidões que os alunos devem adquirir e pelas quais são avaliados, por oposição à educação tradicional mais centrada na memorização e aquisição de conhecimento. Os alunos são, assim, avaliados de acordo com a capacidade de executar determinadas tarefas mensuráveis - como, por exemplo, a capacidade de correr 50 metros em menos de um minuto - e não pelos inputs recebidos - como o número de aulas assistidas, ou os livros lidos.
As "crenças" de que se fala (fixed beliefs") são aquelas que definem o indivíduo e estabelecem a sua identidade; constituem a imagem que temos de nós mesmos, dos outros e das circunstâncias da vida e que de tão repetidas ao longo do tempo se tornaram arraigadas e difíceis de alterar.
Os maçons são cidadãos, e a maçonaria pretende promover o melhoramento da sociedade através do aperfeiçoamento de cada um. Lá porque numa loja maçónica não se discute política, não quer dizer - pelo contrário! - que os maçons - individualmente! - não tomem este ou aquele partido quanto a esta ou àquela questão. Quanto a esta questão concreta, fico horrorizado só de imaginar um maçon a subscrevê-la, tão contrária que é à própria essência da maçonaria. Mas se tal maçon existe, respeitaria a sua posição sem a discutir; pois se é certo que quem não aprende com os erros da História está condenado a repeti-los, não menos certo é que o direito ao erro está na essência da liberdade humana.