Mais uma estória... velha.
Cá venho eu com uma estória velha.
Conheço-a há muitos anos.
Acho que ainda era míudo quando ma contaram (ou a li ?) e foi mais uma das "lendas" que me ficaram bem gravadas.
Há 2 dias um Amigo (também antigo, do tempo dos tiros) recordou-a e eu apanhei-a na "net".
Há 2 dias um Amigo (também antigo, do tempo dos tiros) recordou-a e eu apanhei-a na "net".
Não pensei muito na relação, mas há qualquer coisa entre esta estória e este dia.
Cá a "posto", não para encher a data mas tão sómente porque, lenda ou não lenda, vale a pena mantê-la na mesa de cabeceira da vida para a irmos recordando de quando em quando, não a deixando cair no esquecimento total.
Cá a "posto", não para encher a data mas tão sómente porque, lenda ou não lenda, vale a pena mantê-la na mesa de cabeceira da vida para a irmos recordando de quando em quando, não a deixando cair no esquecimento total.
Como de costume... enquanto há vida, há esperança. Pode ser que os homens algum dia consigam fazer "a vida universal" que a Humanidade precisa.
"Mais uma estória... velha"
Ricardinho não aguentou o cheiro bom do pão e falou:
- Pai, tô com fome!!!
O pai, Agenor , sem ter um tostão no bolso, caminhando desde muito cedo em busca de um trabalho, olha com os olhos marejados para o filho e pede mais um pouco de paciência...
- Mas pai, desde ontem não comemos nada, eu tô com muita fome, pai!!!
Envergonhado, triste e humilhado em seu coração de pai, Agenor pede para o filho aguardar na calçada enquanto entra na padaria a sua frente. Ao entrar dirige-se a um homem no balcão:
- Meu senhor, estou com meu filho de apenas 6 anos na porta, com muita fome, não tenho nenhum tostão, pois saí cedo para buscar um emprego e nada encontrei. Eu lhe peço que em nome de Jesus me forneça um pão para que eu possa matar a fome desse menino. Em troca posso varrer o chão de seu estabelecimento, lavar os pratos e copos, ou outro serviço que o senhor precisar!!!
Amaro , o dono da padaria estranha aquele homem de semblante calmo e sofrido, pedir comida em troca de trabalho e pede para que ele chame o filho...
Agenor pega o filho pela mão e apresenta-o a Amaro, que imediatamente pede que os dois se sentem junto ao balcão, onde manda servir dois pratos de comida do famoso PF (Prato Feito) - arroz, feijão, bife e ovo...
Para Ricardinho era um sonho, comer após tantas horas na rua...
Para Agenor , uma dor a mais, já que comer aquela comida maravilhosa fazia-o lembrar-se da esposa e mais dois filhos que ficaram em casa apenas com um punhado de fubá...
Grossas lágrimas desciam dos seus olhos já na primeira garfada...
A satisfação de ver seu filho devorando aquele prato simples como se fosse um manjar dos deuses, e a lembrança de sua pequena família em casa, foi demais para seu coração tão cansado de mais de 2 anos de desemprego, humilhações e necessidades...
Amaro se aproxima de Agenor e percebendo a sua emoção, brinca para relaxar:
- Ô Maria!!! Sua comida deve estar muito ruim... Olha o meu amigo está até chorando de tristeza desse bife, será que é sola de sapato?!?!
Imediatamente, Agenor sorri e diz que nunca comeu comida tão apetitosa, e que agradecia a Deus por ter esse prazer...
Amaro pede então que ele sossegue seu coração, que almoçasse em paz e depois conversariam sobre trabalho...
Mais confiante, Agenor enxuga as lágrimas e começa a almoçar, já que sua fome já estava nas costas...
Após o almoço, Amaro convida Agenor para uma conversa nos fundos da padaria, onde havia um pequeno escritório... Agenor conta então que há mais de 2 anos havia perdido o emprego e desde então, sem uma especialidade profissional, sem estudos, ele estava vivendo de pequenos "biscates aqui e acolá", mas que há 2 meses não recebia nada...
Amaro resolve então contratar Agenor para serviços gerais na padaria, e penalizado, faz para o homem uma cesta básica com alimentos para pelo menos 15 dias...
Agenor com lágrimas nos olhos agradece a confiança daquele homem e marca para o dia seguinte seu início no trabalho...
Ao chegar em casa com toda aquela "fartura", Agenor é um novo homem - sentia esperanças, sentia que sua vida iria tomar novo impulso... Deus estava lhe abrindo mais do que uma porta, era toda uma esperança de dias melhores... No dia seguinte, às 5 da manhã, Agenor estava na porta da padaria ansioso para iniciar seu novo trabalho...
Amaro chega logo em seguida e sorri para aquele homem que nem ele sabia porque estava ajudando... Tinham a mesma idade, 32 anos, e histórias diferentes, mas algo dentro dele chamava-o para ajudar aquela pessoa... E, ele não se enganou - durante um ano, Agenor foi o mais dedicado trabalhador daquele estabelecimento, sempre honesto e extremamente zeloso com seus deveres... Um dia, Amaro chama Agenor para uma conversa e fala da escola que abriu vagas para a alfabetização de adultos um quarteirão acima da padaria, e que ele fazia questão que Agenor fosse estudar...
Agenor nunca esqueceu seu primeiro dia de aula: a mão trémula nas primeiras letras e a emoção da primeira carta...
Doze anos se passaram desde aquele primeiro dia de aula... Vamos encontrar o Dr. Agenor Baptista de Medeiros, advogado, abrindo seu escritório para seu cliente, e depois outro, e depois mais outro... Ao meio dia ele desce para um café na padaria do amigo Amaro, que fica impressionado em ver o "antigo funcionário" tão elegante em seu primeiro terno...
Mais dez anos se passam, e agora o Dr. Agenor Baptista, já com uma clientela que mistura os mais necessitados que não podem pagar, e os mais abastados que o pagam muito bem, resolve criar uma Instituição que oferece aos desvalidos da sorte, que andam pelas ruas, pessoas desempregadas e carentes de todos os tipos, um prato de comida diariamente na hora do almoço... Mais de 200 refeições são servidas diariamente naquele lugar que é administrado pelo seu filho, o agora nutricionista Ricardo Baptista...
Tudo mudou, tudo passou, mas a amizade daqueles dois homens, Amaro e Agenor impressionava a todos que conheciam um pouco da história de cada um...
Contam que aos 82 anos os dois faleceram no mesmo dia, quase que a mesma hora, morrendo placidamente com um sorriso de dever cumprido...
Ricardinho, o filho mandou gravar na frente da "Casa do Caminho", que seu pai fundou com tanto carinho:
- "Um dia eu tive fome, e você me alimentou. Um dia eu estava sem esperanças e você me deu um caminho. Um dia acordei sozinho, e você me deu Deus, e isso não tem preço. Que Deus habite em seu coração e alimente sua alma. E, que te sobre o pão da misericórdia para estender a quem precisar!!!"
Vejam só que há coisas tramadas.
Então não é que para além da relação com o dia, dá-me a ideia que também conheço este Agenor ?
Ou será que não se chama Agenor ?
Ummmm, bem, vou ficar a matutar a ver se me lembro do nome. Mas acho que conheço, sim...
Bom 1º de Maio para todos. Abração.
JPSetúbal