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04 outubro 2025

E se a loja fosse tratada como uma empresa?


Grande parte dos irmãos das Lojas são empresários. Então, nada mais curioso que tentemos trazer uma visão estratégica para saber como nossa “empresa” está indo e para onde devemos rumar. Pensando nisso, imaginei como seria o Balanced Scorecard (BSC) de uma Loja Maçônica. Claro que é uma adaptação livre, mas ainda assim pode nos trazer algumas reflexões valiosas.

O BSC, é uma ferramenta de gestão utilizada em empresas para equilibrar objetivos em quatro dimensões: financeira, clientes, processos internos e aprendizado. Mas, e se transportássemos essa lógica para a Loja? Será que não encontraríamos paralelos interessantes?

Vejamos a tabela abaixo:

Perspectiva

Objetivos

Indicadores possíveis

Financeira

Garantir sustentabilidade da Loja e capacidade de beneficência

- Regularidade de contribuições; 

- equilíbrio entre receitas e despesas; 

- fundos para projetos sociais

Irmãos & Sociedade

Satisfação e engajamento dos Irmãos; impacto positivo na comunidade

- Retenção de membros; 

- participação nas sessões; 

- número de ações sociais realizadas

Processos Internos

Funcionamento ritualístico e administrativo com excelência

- Regularidade das sessões; 

- cumprimento do ritual; 

- clareza nas atas; 

- qualidade de eventos e ágapes

Aprendizado & Crescimento

Desenvolvimento moral, intelectual e espiritual dos Irmãos

- Frequência; 

- número de instruções e estudos; 

- evolução nos graus; 

- engajamento em cargos

Na dimensão financeira, por exemplo, a Loja precisa garantir sua sustentabilidade. Não apenas para manter as contas em dia, mas para estar preparada para investir em beneficência e projetos sociais, que são parte essencial de sua missão. Indicadores como regularidade de contribuições, equilíbrio entre receitas e despesas e fundos de reserva poderiam muito bem existir também no nosso ambiente.

Se olharmos pela ótica dos “clientes” (que aqui seriam os próprios Irmãos e, em sentido mais amplo, a sociedade), encontramos outro ponto crucial. A satisfação e o engajamento dos Irmãos são sinais claros da vitalidade de uma Loja. Uma Loja que não consegue acolher os novos Aprendizes ou manter o interesse dos mais antigos corre o risco de se esvaziar. Do mesmo modo, se ela não se projeta positivamente para além de suas paredes, perde a chance de cumprir sua função transformadora no mundo profano.

Nos processos internos, a Loja precisa assegurar tanto a boa condução ritualística quanto a gestão administrativa. Sessões regulares, rituais bem conduzidos, atas transparentes, eleições claras e eventos de qualidade são sinais de maturidade organizacional. Não basta que os símbolos brilhem, é preciso que a máquina funcione. Repare que apesar de claros, são objetivos difíceis de medir. O que é bom engajamento? O que são atas transparentes? Coloque isto em uma escala de 0 a 10 😅 

E, por fim, a dimensão do aprendizado e crescimento talvez seja a mais importante para nós. Afinal, nossa razão de existir é promover o desenvolvimento moral, intelectual e espiritual dos Irmãos. Isso se mede pela frequência, pelo número de instruções, pela evolução nos graus e, sobretudo, pelo engajamento. É nesse espaço que se cumpre a verdadeira missão da Maçonaria: lapidar o ser humano.

Quando colocamos a Loja sob essa lente estratégica, percebemos que ela não é apenas um espaço de reunião ritual. Ela é um organismo vivo que precisa de equilíbrio para prosperar. Muitas vezes nos concentramos apenas em uma dimensão, seja a ritualística, a beneficência ou até a administração, e esquecemos de que todas estão interligadas. Um caixa saudável não compensa uma Loja sem vida fraterna. Um ritual perfeito não substitui a ausência de impacto social. Uma grande obra filantrópica não resolve a falta de estudo e de instrução. É preciso harmonia e equilíbrio.

Talvez a maior provocação desse exercício seja justamente olhar para dentro da nossa Loja com a mesma clareza com que olhamos para uma empresa. Como está nossa saúde financeira? Os Irmãos se sentem acolhidos e motivados? Nossos processos são claros e regulares? Estamos promovendo de fato o crescimento humano dos nossos membros?

Equilibrar essas dimensões é o que mantém a Loja não apenas viva, mas vibrante. E se na vida empresarial buscamos resultados tangíveis, aqui buscamos algo ainda mais valioso: a transformação interior. Nossa “empresa” não vende produtos nem serviços. Ela transforma homens. E para isso é preciso tanto estratégia quanto coração.

Fábio Serrano M∴ M∴


30 julho 2025

O Equilíbrio que Mantém o Mundo e a filosofia

Frequentemente, associamos a vida a uma noção de equilíbrio. Contudo, do ponto de vista da física, esta ideia merece uma análise mais aprofundada. Os sistemas vivos, sendo sistemas abertos, não existem num estado de equilíbrio, mas sim num estado estável dinâmico. O equilíbrio, em termos termodinâmicos, define-se como o estado de máxima entropia, onde todas as diferenças de potencial se anulam e a capacidade de realizar trabalho desaparece por completo. É um estado de inércia final.

Pelo contrário, o aparente equilíbrio que observamos na vida, o seja,  o seu estado "estável" é um motor de trabalho constante. Exige um fluxo contínuo de energia para manter a distância que o separa do verdadeiro e derradeiro equilíbrio. É nesta dança que reside a essência da vida: manter-se através da mudança e conservar-se através da transformação. Esta coexistência de estabilidade e mudança é uma das suas características mais fundamentais.

A Hipótese de Gaia

Esta mesma ideia de um sistema dinâmico e autorregulado é expandida para uma escala planetária através da Hipótese de Gaia. Proposta na década de 1960 pelo cientista britânico James Lovelock, esta hipótese sugere que a biosfera e os componentes físicos da Terra formam um complexo sistema interativo. Este superorganismo, que Lovelock batizou de Gaia, mantém as condições climáticas e biogeoquímicas do planeta favoráveis à vida. Segundo esta visão, a vida, uma vez surgida, assumiu o controlo do ambiente inorgânico, moldando-o para garantir a sua própria perpetuação. A Terra, neste sentido, comporta-se como um gigantesco organismo vivo em busca de um estado estável.

A Ordem no Caos e a Busca Humana

No entanto, a natureza também nos apresenta o seu oposto: a perda de controlo. A Teoria do Caos demonstra que uma pequena alteração nas condições iniciais de um sistema pode gerar consequências futuras de uma magnitude imprevisível. Este "efeito borboleta" revela um universo que, na sua essência, é complexo e caótico.

O ser humano, por natureza, lida mal com esta imprevisibilidade. A nossa mente procura a ordem, a estrutura e o equilíbrio como forma de se manter e prosperar. Tentamos incessantemente classificar o que nos rodeia em categorias claras. Como referiu o filósofo Bertrand Russell, todo o conhecimento definido pertence à ciência; todo o dogma sobre o que transcende esse conhecimento pertence à teologia. Mas entre a ciência e a teologia existe uma "Terra de Ninguém", exposta aos ataques de ambos os campos: essa Terra de Ninguém é a filosofia.

A Maçonaria: Uma Senda de Equilíbrio

É precisamente nesta Terra de Ninguém que a Maçonaria encontra o seu lugar, enquanto instituição essencialmente filosófica, filantrópica, educativa e progressista. A sua busca é, na essência, a busca pelo equilíbrio. Classificamo-la como filosófica porque, nos seus atos e cerimónias, se debruça sobre a essência, as propriedades e os efeitos das causas naturais, investigando as leis da natureza e alicerçando as bases da moral e da ética pura.

Na nossa Ordem, a filosofia do equilíbrio está presente em múltiplos atos, símbolos e alegorias. Espera-se que um Maçom seja justo e tenha uma vida equilibrada, mas também que seja um promotor incansável da justiça e da igualdade, compreendendo que a harmonia reside muitas vezes entre a dualidade e a polarização.

É por isso que o número Três assume uma importância tão central, especialmente no Rito Escocês Antigo e Aceite. Ele simboliza a reconciliação e o ponto de equilíbrio que resolve a tensão do binário, representando a síntese que devolve a dualidade à unidade. Como escreveu Rui Bandeira neste mesmo blog:

"o TRÊS é o resultado, em equilíbrio e harmonia, da união do UM com o DOIS, a forma de resolução harmónica do conflito entre a potência e a ação do Princípio Criador, o resultado dessa resolução harmoniosa: a Criação."

Cabe a cada Irmão internalizar este ensinamento, agindo como catalisador de uma sociedade mais justa e perfeita. Esta é a nossa principal missão: promover a Verdade e combater a ignorância, sendo o ponto de equilíbrio que gera a luz.

Esta busca pela Verdade, que nasce da harmonia e se manifesta como a própria Criação, é uma força inevitável. E assim, a conclusão do nosso raciocínio encontra um eco perfeito nas palavras atribuídas a Buda. Ele disse: "Há três coisas que não podem ser escondidas por muito tempo: o sol, a lua e a verdade."

Nesta poderosa imagem, não temos apenas uma lista de três elementos. Temos o Sol e a Lua — a eterna dualidade, os polos que governam o dia e a noite, a luz e a sombra. E temos a Verdade, o terceiro princípio. Ela não surge ao lado deles, mas como a realidade fundamental que, tal como os dois grandes luzeiros, é inevitável e acabará sempre por se revelar. A Verdade é o equilíbrio manifesto, a luz que, inevitavelmente, dissipa todas as trevas.

Fábio Serrano, M∴M∴