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12 outubro 2007

Profanidades


Uma das mais interessantes características de um blogue é a possibilidade que existe de uma profícua interacção entre quem escreve e quem lê, resultante da utilização da caixa de comentários. Essa interacção, se cultivada, permite a quem escreve ter uma melhor noção dos interesses de quem lê, permite a quem comenta, para além de exprimir a sua opinião, inquirir, sugerir, afinal influenciar o que se escreve no blogue. No limite, uma profícua interacção entre autores de textos e comentadores faz de um blogue um espaço comum de interesse intelectual, evoluindo, não apenas ao sabor da vontade do(s) seu(s) autor(es), mas no percurso dos caminhos desbravados, em conjunção, por quem escreve e por quem lê e comenta.

Pessoalmente, sempre que um comentário me estimula o interesse pela referência a qualquer assunto, prefiro, em vez de responder, sucintamente, na própria caixa de comentários, elaborar e publicar um ou mais textos sobre o tema. O que tem a consequência de, por vezes, alterar o rumo da publicação de textos.

Vem isto a propósito de um comentário que nuno_r (que anteriormente se identificava como o profano) produziu relativamente ao texto O maçon e as luvas. Nele, nuno_r escreveu, designadamente:

Já foi abordado em post anterior o Avental e agora as Luvas.
Como estamos a falar de "peças de vestuário", gostava, se possível, saber como faz um Maçon para adquirir estas peças.
É fácil comprá-las no mundo profano ou é a Loja (ou Grande-Loja) que fornece ou as vende aos Maçons?

Antes do mais, é justo referir que o "culpado" (no sentido de ter sido ele o catalisador de tal facto) de ultimamente eu ter escrito dois textos sobre "peças de vestuário" (O maçon e as luvas e O avental do Aprendiz) foi precisamente o nuno_r que, então ainda como o profano, perguntou, num comentário ao texto A integração do Aprendiz (II), a razão porque o Aprendiz usa a aba do seu avental levantada. Essa questão despertou a minha tendência para a associação livre e, da resposta à pergunta, saltei para o avental e deste para as luvas. Hoje, tencionava escrever mais um texto sobre vestuário, mas a nova questão do nuno_r leva-me a mais uma deriva. Assim, o projectado texto sobre vestuário fica para um dia destes e... vamos então às profanidades (em jeito de homenagem ao interesse do nuno_r e, já agora, aproveitando para um titulozito jeitoso...) de onde e como se adquirem luvas e aventais de maçons.

Adquirir luvas brancas é fácil: qualquer boa luvaria ou estabelecimento de peças de vestuário com secção de luvaria as tem disponíveis.

Já para adquirir luvas enfeitadas com o esquadro e o compasso, bem como para adquirir aventais de maçon, a coisa fia mais fino: o mercado de interessados é muito pequeno em Portugal e não se compram luvas e aventais todos os dias, nem sequer todos os anos, e portanto o interesse comercial nesses artefactos tem a mesma dimensão.

Não sei o que se passa noutras estruturas mas, quanto à GLLP/GLRP, esta dispõe de um fornecedor importador de artefactos maçónicos que lhe garante o fornecimento do que é necessário. Qualquer maçon da GLLP/GLRP pode, consequentemente, através da sua Loja ou dirigindo-se directamente aos serviços da GLLP/GLRP, adquirir o que precisa.

Quando alguém é iniciado, a sua Loja fornece-lhe o avental de Aprendiz e as luvas. O custo destes objectos está já integrado na jóia de iniciação que o candidato pagou. Também quando o maçon é passado ao grau de Companheiro e elevado ao grau de Mestre a Loja lhe fornece os respectivos aventais. E também os respectivos custos estão incluídos no pagamento a que o maçon procede aquando desses actos.

Nenhum maçon é, porém, obrigado a adquirir os seus artefactos através da sua Loja ou Grande Loja. Pode adquiri-los onde lhe der jeito ou onde pretenda. E qualquer Loja pode obter os artefactos para disponibilizar aos seus obreiros onde pretender. Não tem qualquer obrigação de os adquirir na Grande Loja ou ao fornecedor desta. Por exemplo, a Loja Mestre Affonso Domingues adquiriu parte dos artefactos que a ela, Loja, pertencem, a um fornecedor no estrangeiro, mediante encomenda efectuada por Internet e os seus obreiros estão também a habituar-se a fazer o mesmo, pois consegue-se artefactos de boa qualidade a preços favoráveis. Normalmente, quando alguém projecta efectuar uma encomenda, inquire se mais alguém quer aproveitar para encomendar e vem tudo ao mesmo tempo. Sempre se poupa nos custos de transporte...

Sítios na Internet dedicados à comercialização de objectos e artefactos maçónicos, há vários. Basta efectuar uma pesquisa num motor de busca. Mas atenção à língua em que se faz a pesquisa... Se for em português, provavelmente aparecem páginas de fornecedores no Brasil (por exemplo, o Triângulo Atelier Maçónico); se pesquisar em francês, muito provavelmente vai deparar com páginas de fornecedores franceses (por exemplo, Arts et Symboles), em inglês, obtém páginas de fornecedores ingleses ou americanos (por exemplo, Central Regalia ou The Freemason Masonic Supplies), etc..

O mercado é grande...

Rui Bandeira

11 outubro 2007

O maçon e as luvas

Em reunião de Loja ou de Grande Loja, os maçons usam sempre luvas brancas. Pode-se dizer que o uso de avental e de luvas brancas é a marca distintiva dos maçons.

Para além da cor, não existem requisitos especiais quanto ao tipo e qualidade de luvas a serem usadas. Podem ser de pele, algodão ou outro tecido. Podem ser completamente brancas ou ter estampado ou bordado algum enfeite. É muito utilizado um modelo de luvas com o desenho do compasso e do esquadro.

Tal como o avental, a origem do uso das luvas deve buscar-se na Maçonaria Operativa. O trabalhador em pedra, em muitas das suas tarefas, necessitava de proteger as mãos dos acidentes ou, mesmo, das normais consequências do manuseamento de materiais duros, rugosos, pesados, com arestas vivas, etc.. O uso de luvas previne pequenos ferimentos, arranhões, abrasões, decorrentes desse manuseamento. Com a transição da Maçonaria Operativa para a Maçonaria Especulativa, manteve-se a tradição do uso de luvas.

Mas se a tradição se manteve, ironicamente o propósito inverteu-se. É que, na Maçonaria Especulativa, o uso de luvas não se destina a proteger as mãos do ambiente, mas, pelo contrário, a proteger o ambiente das mãos. Explicando:

Uma das regras que é frequentemente lembrada aos maçons é a de que estes "devem deixar os metais à porta do Templo", isto é, não devem transportar para o interior da Loja condutas, conflitos, interesses, competições, comportamentos, de natureza profana. Em Loja, nada disso tem lugar.

O espaço da Loja - e não me refiro apenas ao espaço físico, mas também, e essencialmente, à dimensão espiritual - não deve ser conspurcado com imperfeições de natureza profana. Para que o maçon possa tranquilamente, com a ajuda de seus Irmãos, trabalhar no seu aperfeiçoamento, deve estar inserido num ambiente livre da poluição das imperfeições do dia a dia. O interior do Templo deve, assim, estar livre de metais, por estes se entendendo tudo o que é negativo, imperfeito, inerente às fraquezas humanas.

No entanto, o maçon, se busca aperfeiçoar-se, é porque se reconhece imperfeito. E imperfeito em si mesmo. Por muito que cuide, por muito que faça, embora procure deixar os metais à porta do Templo, alguns inevitavelmente ele transporta para o seu interior, porque ínsitos (ainda, espera-se...) nele mesmo. Então, assim se reconhecendo imperfeito, logo poluidor do ambiente do Templo, logo susceptível de dificultar o aperfeiçoamento de seus Irmãos - quando o objectivo comum é precisamente o inverso... - o maçon simbolicamente protege o ambiente e seus Irmãos de suas imperfeições, usando as luvas. Assim, a sujidade que ainda permanece em suas mãos não conspurca o Templo, os objectos nele existentes, os seus Irmãos.

Ou seja, o maçon em Loja usa luvas brancas, não para se proteger do que, exterior a si, o possa afectar, mas para proteger o ambiente e os demais daquilo que, existente em si, os possa prejudicar.

Este, no meu entendimento, a lição que se pode extrair do simbolismo do uso das luvas pelos maçons em Loja.

Daqui decorre, por exemplo, que, ao contrário da prática social, em que o enluvado se desluva para cumprimentar outrem, os maçons, no interior do Templo saúdam-se sempre com as respectivas luvas postas.

Há, no entanto, três situações correntes em que o maçon em Loja deve retirar uma ou ambas as luvas. Uma, quando manuseia dinheiro, pois, por natureza, o vil metal conspurca - e o seu manuseio em Loja, designadamente quando se reúnem fundos para acções de solidariedade, é um mal necessário - e não deve assim sujar a luva, que deve permanecer limpa; outra, quando o maçon assume compromissos sobre as três Grandes Luzes da Maçonaria - o Volume da Lei Sagrada, o Compasso e o Esquadro -, caso em que apõe a mão nua sobre esses três artefactos, em sinal de que o compromisso é assumido pelo Homem inteiro, com suas qualidades e defeitos, com suas forças e suas imperfeições, confiando em que o contacto entre essas três Grandes Luzes e si próprio redundará no seu aperfeiçoamento, não na perda de qualidades daquelas; a terceira, na Cadeia de União, em que os maçons se dão as mãos, despojadas de luvas, em sinal de união e de comunhão de esforços, juntando-se numa Cadeia em que cada um se reconhece como o elo mais fraco, mas em que todos buscam fortalecer-se, transmitindo-se e unindo todos suas forças e fraquezas, cientes de que as forças de todos combinadas gerarão um poder mais forte do que a mera soma delas e de que as fraquezas de cada um mais eficazmente são combatidas com a ajuda de todos.

Eis porque o maçon usa luvas brancas e eis por que razão pontualmente as não usa.

Rui Bandeira