24 abril 2013

Ser Mestre Maçom é...



... mais do que uma chegada, uma nova partida, não um objetivo atingido mas um projeto sempre em execução. A Exaltação à Mestria possibilita que o Obreiro atento o entenda desde logo.

Simplesmente, enquanto até aí o maçom teve guias e apontadores de caminhos, quando a Loja concede a um maçom a sua “carta” de Mestre, este sente-se um pouco como aquele que, após as suas lições e o seu exame de condutor, recebe a sua carta de condução: está habilitado a conduzir (a conduzir-se...) mas... inevitavelmente que sente alguma ansiedade por estar por sua conta e risco, sem rede que ampare suas quedas em possíveis erros.

Assim, apesar de serem as mais visíveis manifestações da mudança de estado conferida pela Exaltação à Mestria, não são o seu direito à palavra e o seu direito ao voto que são importantes. Importante é a sua total capacidade de exercer o seu verdadeiro e pleno direito ao seu caminho. O direito a trilhar o seu caminho por si, só, se assim escolher ou assim tiver que ser, ou acompanhado por quem quiser que o acompanhe e que o queira acompanhar, se assim for de vontade dos interessados, pelo tempo que quiser, por onde quiser, como quiser, para o que quiser.

O direito ao seu caminho enquanto cidadão já o tinha desde que atingiu a idade adulta e como adulto foi pela lei do Estado considerado. O direito ao seu caminho enquanto maçom, ou seja, o caminho do aperfeiçoamento, da busca da excelência, da proximidade tão próxima quanto humanamente possível for, da Perfeição, a ser trilhado por si só, como quiser, quando quiser, pela forma que quiser, adquire-o o Maçom com a sua Exaltação à Mestria, após o tempo de preparação que necessário foi para que não seja em vão que esse direito lhe seja conferido, para que efetivamente o exerça. Porque é um direito que o Mestre Maçom deve exercer como um dever, com a diligência do cumprimento de uma obrigação.

Ser Mestre Maçom é, assim, essencialmente cumprir o dever de exercer o seu direito de escolher e percorrer o seu caminho para a excelência.

Para quem andou longo tempo a ser guiado, não é fácil ver-se, de um momento para o outro, responsável pelo seu caminho, sem ajuda, sem orientação, sem rede. Responsável, porque livre, porque pronto, porque assim é o destino do homem que busca o brilho da Luz, da sua Luz. Mas, após uma pausa para ganhar orientação e pesar as suas escolhas, todos os Mestres Maçons seguem o seu caminho – porque para isso foram preparados, por isso são Maçons, com isso são verdadeiramente Mestres.

O caminho que cada Mestre Maçom decide escolher tem em conta a primacial pergunta que faz a si mesmo: Que fazer, como fazer, para ser melhor? A essa pergunta cada Mestre Maçom vai obtendo a sua resposta, pessoal, íntima, tão diferente das respostas de outros quanto diferente dos demais ele é. E é na execução da resposta que vai obtendo, no traçar do trabalho que essa resposta propõe, que o Mestre Maçom constrói, porque construtor é, o seu percurso. E a cada estação conquistada, novamente a mesma pergunta de sempre se lhe coloca: que fazer, como fazer agora para ser de novo melhor? E nova resposta e novo percurso e nova paragem, com nova e sempre a mesma pergunta, com outra resposta e outro percurso, incessantemente se apresentam.

Mas o Mestre Maçom não sabe apenas buscar a resposta à sua pergunta. Sabe também que, embora cada um trilhe o seu solitário caminho, os caminhos dos maçons têm muito de comum e sobretudo são postos por eles muito em comum.

O Mestre Maçom sabe assim que o que adquire, o que ganha, o que aprende, o que consegue, não é para ser avaramente fruído apenas por si, antes é para ser posto em comum com a Loja, pois também é do comum da Loja que recolhe contributos, ajudas, meios, ferramentas, para melhor e mais frutuosamente obter respostas às suas perguntas.

Ser Mestre Maçom é, assim, sempre, dar o seu contributo à Loja, seja no que a Loja lhe pede e ele está em condições de dar, seja no que ele próprio considera poder tomar a iniciativa de proporcionar à Loja. Porque ser Mestre Maçom é também saber que, quanto mais der, mais receberá, que a sua parte contribui para o todo mas também aumenta em função do aumento desse todo e que, afinal, não é vão o dito de que “dar é receber”.

Ser Mestre Maçom é portanto saber que o seu percurso pessoal será mais bem e mais facilmente percorrido se o for com a Loja, pela Loja, a bem da Loja. Porque o bem da Loja se traduz em acrescido ganho para o maçom, que assim consegue realizar o paradoxo de ser um individualista gregário, porque integra e contribui para um grupo que é gregário porque preza e impulsiona a individualidade dos que o compõem.

Ser Mestre Maçom é descobrir que a melhor forma de aprender é ensinar e assim escrupulosamente executar o egoísmo de ensinar os mais novos, os que ainda estão a trilhar caminhos que já trilhou, dando-lhes o valor das suas lições e assim ganhando o valor acrescido do que aprende ensinando – e sempre o homem atento aprende mais um pouco de cada vez que ensina.

Ser Mestre Maçom é comparecer e trabalhar na Loja, mas sobretudo trabalhar muito mais fora da Loja. Porque o que se faz em Loja não passa de “serviços mínimos” que apenas permitem a sobrevivência da Loja e o nível mínimo de subsistência do maçom. O trabalho em Loja é apenas um princípio, uma partícula, uma gota, uma pequena parte do trabalho que o Mestre Maçom deve executar em cada um dos momentos da sua existência.

Ser Mestre Maçom é portanto mais do que aguardar que algo lhe seja pedido, antes tomar a iniciativa de fazer algo – não para ser reconhecido pela Loja, mas essencialmente por si, que é o que verdadeiramente interessa.

Ser Mestre Maçom não é necessariamente fazer grandes coisas, excelsos trabalhos, admiráveis construções. Mais válido e produtivo é o Mestre Maçom que dedica apenas cinco minutos do seu dia a fazer algo muito simples em prol da sua Loja, da Maçonaria, afinal de si próprio, desde que o faça efetivamente todos os dias, do que aqueloutro que uma vez na vida faz algo estentório, notado, em grande estilo, mas sem continuidade. Porque a vida não se esgota num momento, nem numa hora, nem num dia. A vida dura toda a vida e é para ser vivida todos os dias de toda a vida.

Ser Mestre Maçom não é necessariamente ser brilhante, mas é imprescindivelmente ser persistente E o Mestre Maçom que persistentemente realize dia a dia, pouco a pouco, o seu trabalho, pode porventura passar despercebido, não receber méritos nem medalhas nem honrarias, mas tem seguramente o maior mérito, a maior honra, a melhor medalha, o maior reconhecimento a que deve aspirar: o de ele próprio reconhecer que fez sempre o seu trabalho, deu o seu melhor, persistiu na sua tarefa e, de cada vez que olhou para si próprio, viu-se um pouco, um poucochinho que seja, melhor do que se vira da vez anterior. E assim sabe que, pouco a pouco, no íntimo do seu íntimo, sem necessidade que outros o honrem por tal, ganhou um pouco mais de brilho, está um passo mais próximo do seu objetivo, continua frutuosamente percorrendo o seu caminho para o que sabe ser inatingível e, no entanto, persiste em procurar estar tão próximo de atingir quanto possível: a Perfeição!

Em suma, ser Mestre Maçom define-se com o auxílio de uma frase que li há algum tempo e que foi dita por alguém que creio até que nem sequer foi maçom, Manuel António Pina, jornalista, escritor, poeta, laureado com o Prémio Camões em 2011, falecido em 19 de outubro de 2012: o Mestre Maçom é aquele que aprendeu e que pratica que o mínimo que nos é exigível é o máximo que podemos fazer.

Rui Bandeira

17 abril 2013

Oriente Eterno


Oriente Eterno é a designação que os maçons dão ao que nos aguarda depois da morte física. Porquê Oriente e porquê Eterno?

Talvez a mais remota manifestação da crença humana numa Entidade Superior se encontre nos cultos solares. Cedo a humanidade percebeu que o Sol era condição indispensável para a existência e manutenção da Vida, neste pequeno planeta que todos habitamos. Cedo observou que o negrume da noite era quebrado, primeiro pela luminescência da aurora, depois pela aparição do Astro-Rei, sempre a Oriente. Cedo se associou o Oriente ao ponto cardeal de onde provém a luz. Da constatação do fenómeno físico à consideração figurada de que a LUZ nasce, vem, existe, revela-se, no Oriente medeou apenas um pequeno passo.

Por outro lado, são condições imprescindíveis para se ser maçom regular, para além da condição de homem livre e de bons costumes e do efetivo propósito de aperfeiçoamento, a crença no Criador e na vida depois da morte. O Grande Arquiteto do Universo, por definição e à escala humana, é Eterno. A LUZ que dele provém naturalmente que compartilha dessa caraterística.

O Oriente Eterno é, assim, para os maçons o simbólico lugar de onde provém a LUZ, onde está o Grande Arquiteto do Universo, onde o que resta de nós depois de tudo o que de nós é físico se extinguir tem lugar, se reintegra.

Não existe uma conceção, uma figuração, uma imaginação, comum aos maçons de como é o Oriente Eterno. Tal como é deixada a cada um a pessoal conceção do Criador, exigindo-se apenas a efetiva crença na sua existência, também as condições e formas de vida após a vida são assunto do foro íntimo e pessoal de cada um. Em função da crença individual, o Oriente Eterno pode ser associado ao Paraíso cristão, ao Reino de Jehovah, ao Paraíso islâmico, ao Nirvana, ou àquilo em que cada um crer.

A única certeza compartilhada pelos maçons regulares é que a morte física é apenas uma passagem do que de nós é verdadeiramente essencial para outro estádio, outro plano. E, portanto, que incumbe a cada um de nós o dever de se aperfeiçoar, de se polir, de melhorar, de se capacitar em todos os aspetos, para que, chegada a hora, esteja preparado e em condições de se integrar  no seu lugar nesse novo plano da existência.

O que será, afinal, o Oriente Eterno, nenhum maçom o poderá, de ciência certa e segura, afirmar. Apenas que crê na sua existência e que dedica a sua vida a preparar-se para o papel que ali desempenhará. Afinal, a Luz só é plenamente visível depois de ultrapassada a cortina da morte física e superadas as limitações do nosso corpo físico...

Rui Bandeira

10 abril 2013

Luz


Em Maçonaria, como em vários ramos da espiritualidade, incluindo crenças religiosas, é utilizado ou referido o conceito de "Luz", como algo a procurar, objetivo a atingir, mediante o trabalho do iniciado, do crente. Mas o que é, afinal, a Luz? Que simboliza? Cada um tirará as suas conclusões.  A minha resulta da consideração, designadamente, dos elementos que seguidamente exponho. 

Segundo a Infopédia, Enciclopédia e Dicionário Porto Editora, "Luz" é um "fluxo radiante capaz de estimular a retina para produzir a sensação visual", "claridade emitida ou refletida pelos corpos celestes", "clarão produzido por uma substância em ignição". Em sentido figurado, segundo a mesma fonte, é "verdade, evidência, certeza", "perceção, intuição", "guia, orientação", "iluminação espiritual, fé".

O Génesis, primeiro Livro da Bíblia, inicia-se assim:

No princípio criou Deus os céus e a terra.
E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas.
E disse Deus: Haja luz; e houve luz.
E viu Deus que era boa a luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas.
E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite. E foi a tarde e a manhã, o dia primeiro. 
Gênesis 1:1-5

No entanto, um pouco adiante, consta:

E disse Deus: Haja luminares na expansão dos céus, para haver separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais e para tempos determinados e para dias e anos.
E sejam para luminares na expansão dos céus, para iluminar a terra; e assim foi.
E fez Deus os dois grandes luminares: o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para governar a noite; e fez as estrelas.
E Deus os pôs na expansão dos céus para iluminar a terra,
E para governar o dia e a noite, e para fazer separação entre a luz e as trevas; e viu Deus que era bom.
E foi a tarde e a manhã, o dia quarto. 
Gênesis 1:14-19

Portanto, só na quarta jornada da Criação o Grande Arquiteto do Universo criou o Sol e a Lua, "para haver separação entre o dia e a noite", para "iluminar a terra e para governar o dia e a noite e para fazer a separação entre a luz e as trevas". Então que Luz criou Ele logo na primeira jornada, que separação entre a luz e as trevas foi essa bem antes de criar os astros que, na quarta jornada, de novo se refere destinarem-se à "separação da luz e das trevas? Que "Dia" e que "Noite" (note-se as maiúsculas...) são esses referidos na descrição da primeira jornada se só na quarta jornada são criados os astros destinados a governar o dia e a noite?

Ou há grossa contradição logo na primeira página do Volume da Lei Sagrada judaico-cristão, ou então, a Luz , o Dia e a Noite referidos na primeira jornada não são os mesmos referenciados na quarta etapa da Criação...

Entendo que ajudará a esclarecer-nos o início do Evangelho segundo São João (não se estranhe a referência: a Maçonaria é originariamente teísta cristã; sobre a camada original, passou a incluir também a noção deísta, mas esta não anula aquela, tal como aquela não impede esta...):

1 No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus.
2 Ele estava no princípio junto de Deus.
3 Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito.
4 Nele havia a vida, e a vida era a luz dos homens.
5 A luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam.
6 Houve um homem, enviado por Deus, que se chamava João.
7 Este veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos cressem por meio dele.
8 Não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz.
9 [O Verbo] era a verdadeira luz que, vindo ao mundo, ilumina todo homem.

Analisando os contributos dados por estes dois textos, chama a atenção, no texto do Génesis, a distinção aí feita entre "Deus" e o "Espírito de Deus", aquele realizando, executando a dinâmica da Criação, este apenas movendo-se "sobre a face das águas", mas sem atividade dinâmica.

Esta distinção encontra-se também na Filosofia Pitagórica, designadamente nos conceitos de UM (princípio criador estático, força criadora em potência) e de DOIS (a ação do Criador, a concretização da potência da força criadora).

Mas, regressando ao tema, na primeira jornada o Criador fez a LUZ, a separação entre a luz e as trevas, àquela chamando Dia e a estas Noite.

Esta LUZ não é, seguramente a luz física, pois essa só foi criada na quarta jornada, com a criação do Sol e da Lua e das estrelas, "para haver separação entre o dia e a noite" e "para iluminar a terra". A LUZ da primeira jornada tem um significado metafórico.

Olhando para o início do Evangelho segundo São João, verificamos que o Verbo estava junto de Deus e era Deus; nele havia a vida e a vida era a luz dos homens; era a verdadeira luz...

A LUZ metafórica referida na primeira jornada da Criação, explicitada no início do Evangelho segundo São João, é, no meu entendimento, a Consciência de Si do Criador, que proporciona que a Potência Criadora se realize. O Espírito de Deus movia-se no Caos Primordial, com a potência de tudo criar. Mas só a consciência de Si, da Vida que É, possibilitou a concretização da potência criadora. Essa consciência foi a LUZ que se separou das Trevas da inconsciência da Existência, da Vida e da fabulosa Potência Criadora. Separou-se assim o Dia (da consciência, da aquisição da visão sobre as capacidades e possibilidades) da Noite (em que o Espírito Criador, embora dotado da Potência Criadora não tinha consciência de tal e portanto apenas vogava, inerte e sem concretizar a sua Força). Havia o Verbo, o pensamento concretizável na palavra e, assim, na ação, que estava junto de Deus e era Deus, mas ainda inerte, que ficou ativo quando Aquele que É tomou inteira consciência de Si próprio e do seu Poder e da sua Força.

Portanto, para mim, a LUZ simboliza mais que o Conhecimento, a Sabedoria ou a Fé. Simboliza a Consciência do Criador e da Vida, Consciência essa que cataliza, ativa, a potência criadora que tudo criou e tudo regula.

Sendo assim, em que consiste a busca humana pela LUZ? Na criação de condições, na sublimação da nossa materialidade, de forma a que se possa ver a LUZ, adquirir a Consciência do Criador e da Vida, assim finalmente compreendendo o significado e objetivo da Criação, da Vida e do ínfimo, mas indispensável, papel de cada um nelas. É que tal Consciência é indispensável para ativar a necessária dinâmica para o que segue... Mas isso é já outro tema, crença individual que não tem cabimento neste espaço - que é de divulgação, não de proselitismo.

Esta a minha interpretação do significado simbólico da LUZ. Não a divulgo aqui para convencer ninguém do que quer que seja. Cada um analisará o que exprimo, tomará do meu pensamento o que lhe convenha, recusará o que não lhe agrade, complementará com outros indícios e raciocínios e teses e chegará à conclusão que, para si, será a certa. Se há algo que na Maçonaria é consensual é que há muitos caminhos para a LUZ...

Rui Bandeira 

03 abril 2013

Meia-noite


Meia-noite é a hora em que os maçons pousam as suas ferramentas e terminam os seus trabalhos - ou seja, o momento da morte física do maçom, a ocasião em que ocorre a sua Passagem para o Oriente Eterno, como é comum os maçons referirem. 

Ao referirem que os maçons iniciam os seus trabalhos ao meio-dia e pousam as suas ferramentas à meia-noite, querem estes significar que o trabalho do maçom sobre si próprio, o seu esforço de aperfeiçoamento da sua Pedra Bruta inicial, de alisamento das suas imperfeições até a transformar numa Pedra Aparelhada, que esteja já devidamente dimensionada para poder ocupar um lugar útil no Grande Templo da Humanidade, e de cultivo e polimento das suas virtudes, para dela fazer uma Pedra Polida que, além de útil, seja bela e agradável, uma vez começado, no momento em que atingiu a maturidade necessária para reconhecer dever iniciar esse trabalho, persiste incessantemente até ao seu último suspiro, até ao derradeiro alento da sua permanência neste plano de existência.

Com uma singela frase, transmitem os mais experientes aos mais novos a noção de que o trabalho que a sua Iniciação assinalou é uma tarefa de vida para ser prosseguida durante o resto dela - ou será apenas perda de tempo e de energias.

De nada vale procurar melhorar-se, aprimorar-se, durante um certo lapso de tempo - um mês, um ano ou uma década. No momento em que essa preocupação, esse esforço, que é simultaneamente um meio e um objetivo, cesse, nesse preciso momento começa a inevitável degradação do que se tenha logrado atingir. O polimento que tenha dado brilho à sua interação com os demais, se não for continuamente persistido com o incessante lustre das suas virtudes, inevitavelmente que esmaece, se apaga. O aparelhamento da sua utilidade na vida e na sociedade inevitavelmente se degrada, abre fissuras e falhas. O resultado do esforço - quantas vezes de anos - esvai-se com mesma rapidez que a areia se desvanece por entre os dedos, apesar do esforço, tempo e trabalho tido na sua acumulação na mão.

De pouco vale ter sido uma boa pessoa. O que importa é que se seja, se continue a sê-lo. Um cozinheiro, ainda que tenha obtido três estrelas Michelin no seu restaurante, se deixar de confecionar comida agradável de comer, se a salgar, se passar a utilizar produtos pouco frescos e ingredientes sem qualidade, verá a sua clientela desertar e o seu negócio ruir em menos de um fósforo. O significado de uma vida honrada fica indelevelmente manchado por uma única nódoa, um solitário deslize, afinal uma avultada traição a tudo o que se construiu antes. Assim sendo, o maçom, uma vez iniciado o seu trabalho, deve, tem que, não pode deixar de, prossegui-lo até ao derradeiro momento da sua vida, se não quiser deitar a perder, ou pelo menos a deixar desvalorizar, todo o esforço que tenha tido.

O trabalho do maçom sobre si próprio tem de ser prosseguido, com qualidade, cuidado e persistência até ao momento em que se esgota o seu tempo de permanência neste mundo. Só assim e então poderá, de consciência tranquila e com a noção do seu dever bem cumprido, finalmente pousar suas ferramentas. É no momento da sua morte que o maçom finalmente atinge aquilo por que busca durante toda a sua vida enquanto tal: a perfeição - a sua  perfeição, o melhor que pôde e conseguiu ser. 

E é assim na sua meia-noite, no exato momento em que atingiu a sua perfeição, que pousa as suas ferramentas, vê brilhar a Luz e passa ao Oriente Eterno! 

Rui Bandeira