23 março 2011

O Padrinho


Em Maçonaria, designa-se por Padrinho o primeiro proponente da candidatura de um profano à iniciação.

Com esse ato, o primeiro signatário dessa candidatura afiança perante a Loja a boa fé do candidato, o seu reto propósito, a posse das características e da maturidade indispensáveis ao profícuo trabalho de desenvolvimento e aperfeiçoamento pessoal que é o objetivo primeiro de cada maçom regular e a capacidade de harmoniosa integração no grupo, na Loja, do candidato proposto.

Com efeito, não deve ser admitido às provas da Iniciação quem não detenha a necessária maturidade para efetuar o trabalho de um maçom, quem não possua características compatíveis com o trabalho maçónico, quem, por índole ou feitio, não seja capaz de harmoniosamente se integrar num grupo de desconhecidos que pré-existe em relação à sua entrada, existirá com a sua presença e permanecerá após a sua partida. E é claro que a boa fé de quem se apresenta é absolutamente essencial...

Só pode ser padrinho de um candidato um Mestre Maçom, pois é indispensável a realização do percurso de aprendizagem, a interiorização do que é e como trabalha a Maçonaria, de como é a Loja, das virtudes, defeitos e insuficiências do grupo, enfim, o conhecimento do que é a Maçonaria e a Loja, para, com o mínimo de erro, poder aferir da compatibilidade entre o candidato e a Instituição, a Loja e os seus obreiros.

À Maçonaria não interesa iniciar por iniciar. Não se trabalha para números, para "crescimento". À Maçonaria interessa acolher homens bons que querem e podem ser homens melhores. Só isto - e muito é! À Maçonaria não interessa perder tempo, trabalho e energias com quem não quer, ou não pode, efetuar o persistente e solitário e apenas interiormente gratificante trabalho do aperfeiçoamento pessoal, moral e espiritual. Nem a Maçonaria tem qualquer gosto em que alguém perca seus tempo, trabalho e energias entrando para uma Instituição que verdadeiramente não lhe interessa.

Por isso procura minimizar os (inevitáveis) erros mediante um exigente, ponderado (e demorado...) processo de admissão, que nunca se inicia sem a indispensável caução de um Mestre proponente, acompanhada de idêntica ação de um outro Mestre.

O Padrinho deve, assim, inevitavelmente, conhecer pessoalmente o candidato, com a profundidade necessária para poder fazer o juízo de prognose favorável à sua integração que o habilita a caucionar o pedido de adesão.

Caucionada que esteja a candidatura, o Padrinho retira-se de cena durante o decurso do processo de análise da mesma. Não tem nada mais que dizer. Cabe à Loja assegurar-se de que o seu juízo está correto, que não foi perturbado por amizade, parentesco, consideração ou dependência que o tenham induzido em erro.

Mas, uma vez decidida a admissão do candidato, então o Padrinho começa verdadeiramente a exercer a sua função. O seu papel não se esgotou na caução dada. Só após esta decisão verdadeiramente começa! O Padrinho é o elo de ligação entre a Loja e aquele que um dia, estando de fora (Profano), nela quis entrar (Candidato) e nela foi admitido (Maçom Iniciado; Aprendiz). Como tal, é o primeiro responsável por tudo o que respeita à integração deste novo elemento no grupo. Desde logo por algo tão básico como caber-lhe a ele informar o Candidato das obrigações financeiras que a sua Iniciação implica, providenciar para que, no dia da sua Iniciação o Candidato saiba onde, quando e como se deve apresentar e conduzi-lo ao local físico onde a Cerimónia terá lugar. Mas também, consumada a Iniciação, pelo longo e complexo processo de integração do novo elemento no grupo.

Muitas vezes, o Padrinho é a única cara na Loja que o novo Aprendiz reconhece, o único que não lhe é completamente estranho. Quando assim é, é o padrinho o único ponto de apoio de que o novo elemento dispõe, até que, a pouco e pouco, às vezes mais lentamente, outras com maior facilidade, consoante a personalidade de cada um, as relações pessoais se vão estabelecendo com os demais elementos do grupo e daí evoluindo até onde as compatibilidades e empatias estabelecidas com cada um permitam evoluir.

Este processo de integração pode, por vezes, ser mais difícil ou demorado do que o antecipado e, até que esteja ultimado, o seu sucesso em muito depende do Padrinho. Este tem que elucidar o novo Aprendiz das regras (muitas não escritas e algumas não facilmente apreensíveis) de funcionamento, de cooperação, de relacionamento, existentes no grupo (e cada Loja é um grupo diferente, com uma história, um passado, uma evolução, diferentes, com dinâmicas de grupo próprias), para que as conheça e nelas se integre harmoniosamente.

Mas também deve intermediar, prevenir e colmatar possíveis incompreensões ou desagrados do grupo ou de algum elemento do grupo perante atitudes ou características do novo Aprendiz. A Maçonaria não é um grupo de amorfos, privilegia gente assertiva, livre pensadora, que busca o seu lugar e define e trabalha e atinge objetivos. É natural que um novo elemento queira mostrar a sua valia ao grupo, encontrar nele o seu lugar. Muitas vezes, no seu afã de tal, esquece que há regras e modos e meios que ainda não aprendeu e comete erros, às vezes excessos, outras vezes omissões, que podem a um ou outro desagradar. Há que compatibilizar, esclarecer, moderar, ajudar a que o espaço a que o novo elemento tem direito seja encontrado, de forma a que todos beneficiem.

Esta tarefa - quase que diplomática - de garante da boa integração do novo elemento no grupo e do bom acolhimento do grupo ao novo elemento incumbe, em primeira linha, ao Padrinho.

É dever do Padrinho assegurá-la, sob pena de a integração falhar, de um bom elemento se perder, de o grupo e o indivíduo gastarem tempo e energias em vão.

Costumam os maçons dizer que cada candidato iniciado é um Venerável Mestre (e um Grão-Mestre...) em potência. Para garantir que essa potencialidade possa, a seu tempo, evoluir para a possibilidade, depois a probabilidade, finalmente a realidade, é indispensável que o Padrinho exerça efetivamente a sua função e não se limite a rabiscar displicentemente a sua assinatura num formulário de candidatura.

Rui Bandeira

11 comentários:

Marcos Amaro disse...

R.:. M.:. Rui Bandeira;

Em primeiro lugar quero exaltar a magnífica “Prancha” que aqui apresenta, creio que ela se enquadra plenamente no seguimento das últimas “pranchas” / temas aqui apresentadas e aos profanos, como eu, disponibilizadas, quer pelo R.:. M.:. Rui Bandeira, quer pelo R.:. M.:. Paulo M.

Da curiosidade e da expectativa ninguém fica isento depois de ter batido à “Porta do Templo”, tal como quando vamos a casa de alguém e ou visitamos um parceiro de negocio em que chegados ao local ficamos sempre na expectativa se vamos ser “aceites” / “recebidos”, por quem está para além da “Porta”.

Mas tal como no mundo profano acontece a única coisa que temos garantido é sempre o “não”, por isso creio que o melhor a fazer, para quem “Bate à Porta do Templo” (tenta ter algo mais que o “não”), é estar ciente e consciente das suas valias e da sinceridade do seu ato e depois apenas esperar que o “não” se transforme num “talvez” (foi essa a razão que o levou a “Bater à Porta do Templo) e que esse “talvez” se torne num “sim”.

Depois do “sim” é só seguir com a firmeza das suas convicções e princípios, bem como com a flexibilidade que quem vai iniciar um novo percurso de aprendizagem e que para aprender é necessário livrar-se de preconceitos e de ideias pré definidas, para poder receber ao máximo toda a informação que lhe irá ser disponibilizada.

Nesta etapa, como tudo na vida, depois de “Bater à Porta do Templo” creio que o melhor é aprender com o tempo em que deve de esperar, para que da “Porta”, a que bateu, alguém, no devido tempo, lhe responda.

Independentemente da resposta o que deve fazer é continuar a sua caminhada, de acordo com o caminho que lhe é apresentado, claro que fazendo os ajustes necessários e de acordo com as características do caminho apresentado, mas mais uma vez sem nunca perder os seus princípios e convicções de respeito pelos outros, lealdade para com quem a mão lhe estende, partilha do saber para com quem está preparado para o receber e claro interessado nesse mesmo saber e acima de tudo que nunca viole o principio da sua honra e dignidade enquanto “Homem”, na verdadeira ascensão da “Palavra” “Homem”.

Um bem-haja R.:. M.:. Rui Bandeira e todos aqueles que de bem e por bem para consigo próprio e para com os outros estão nesta caminhada (Vida).

Jocelino Neto disse...

Mestre Rui Bandeira,

Caso não haja um apadrinhamento, é possível a um profano bater à "Porta do Templo"? Como se dá o processo de avaliação sem esta benção? Designa-se um padrinho para acompanhá-lo?

Abraços Fraternos!

À Glória do Grande Arquiteto.

Unknown disse...

Boas!
Faço minhas as questões do caro Jocelino Neto...

LzS

Rui Bandeira disse...

@ Jocelino Neto e Luiz:

Cada Loja terá o seu critério e método. Na Mestre Affonso Domingues, o que chamamos de "candidaturas espontâneas" são tratadas do seguinte modo: é nomeado um Mestre que tem por missão conhecer o melhor possível o candidato, até poder tomar a decisão de o apadrinhar ou não. Se a sua decisão for negativa, o processo para aí. Se for positiva, solicita a um outro Mestre da Loja que também contacte e conheça o candidato, com vista a decidir se se dispõe a coapadrinhar o candidato. Se este segundo Mestre decidir negativamente, o processo para aí. Se decidir positivamente, estão encontrados os dois proponentes e, a partir daí, o processo de candidatura segue o seu curso normal.

Jocelino Neto disse...

Mestre Rui Bandeira,

Agradeço imensamente a oportunidade de esclarecimento.

Vejo que o canditado espontâneo, passa por uma seleção quiça mais apurada (peneiras de gramaturas cada vez mais finas) do que um candidato "apadrinhado".

Não obstante a esta parca teoria, parabenizo a todos que doam-se ao ofício de construir (-se) à Glória do Grande Arquiteto!

Abraços Fraternos.

Nuno Raimundo disse...

Obrigado pelo texto, Padrinho :)

TAF

Unknown disse...

@ Rui Bandeira:

Agradeço o seu esclarecimento...
Apenas terei de "me informar melhor" acerca das "existências" na minha proximidade...

Bem haja!

LzS

JPA disse...

Para já quero dar os parabéns ao(s) Padrinho(s) destes excelentes obreiros que são o Nuno Raimundo e o Paulo M. que me parece terem sido duas candidaturas espontâneas. "Colheita Vintage".
Penso que além de tudo o mais, a Loja é o Grande Padrinho.

Cumprimentos
JPA

Jocelino Neto disse...

@JPA

>Penso que além de tudo o mais,
>a Loja é o Grande Padrinho.

Não creio que a Loja seja o Grande Padrinho.
Entretanto, ouso dizer, que este A.:. R.:.
blogue o é.

:-)

Abraços Fraternos!

Jose Ruah disse...

Gostava de participar nesta discussao.

@MA - nem todos os trabalhos de um maçon são pranchas, mesmo quando sobre maçonaria. Podem ser apenas textos, uma vez que a noçao de prancha tem subjacente também o modo e o local de apresentaçao.

@Luiz - não percebi a sua questao sobre existencias por perto, mas provavelmente como tenho andado longe

@ Rui, o titulo deste post teria sido mais correcto se fosse só " Padrinho" porque quando vi " O Padrinho" até pensei que estavas a escrever sobre mim!!!!!!!!

Pois é eu já quase nao escrevo, mas continuo andando por aí !!!

Marcos Amaro disse...

@R.:.M.:. Jose Ruah;

Agradeço a sua correcção, a qual fica desde já registada e corrigida. No entanto relembro que sempre coloquei o termo “Prancha” entre comas, o que para mim tem apenas o sentido de reforçar e enfatizar o termo e a qualidade.

Mas de qualquer forma não deixo de também de manifestar o meu desconhecimento sobre a diferença, pelo menos até ao momento em que na sua participação apresentou esse esclarecimento, de um trabalho (texto) apresentado dentro, ou fora, de uma R.:. L.:., e de acordo com o ritual (Modus Operandi) correcto, o que agora ficou para mim claro.

Isto é o que faz deixar um profano, como eu, comentar textos (trabalhos) de R.:. M.:. Maçons.

Um bem-haja pela sua esclarecedora informação e intervenção.