12 junho 2007

Uma História da Maçonaria Britânica (1717-1737)

Continua-se a divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield.


É no contexto de uma reacção contra a existência do grupo dos Aceites na Companhia dos Maçons de Londres que se insere a criação da Grande Loja em 1717. Esta organização reclamou a jurisdição sobre os construtores de Londres e arredores e um dos seus objectivos nos primeiros vinte anos da sua existência foi a organização e articulação de uma estrutura administrativa de controlo sobre as Lojas existentes nessa área, designadamente com a emissão de cartas-patente das Lojas pela Grande Loja e a exigência desta de que aquelas obedecessem às regras por si instituídas. Paralelamente a este controlo administrativo. foi desenvolvida uma apreciável actividade cultural e social, para além de um alinhamento político no apoio ao Príncipe de Gales contra seu pai, o rei Jorge II. Por outro lado, exerceu um forte esforço no estudo e divulgação da geometria, em conexão com os desenvolvimentos do pensamento científico da época. Teve também um papel importante ao nível estético, pois as primeiras actividades da Grande Loja estiveram explicitamente ligadas ao suporte da arquitectura vitruviana, em oposição à tradição gótica.

Esta Maçonaria inovadora não fazia distinções religiosas, como se prova pela existência de Judeus e huguenotes nas primeiras Lojas. Mas a crescente insistência numa particular agenda política, cultural e social veio a revelar-se fonte de litígios. Tal expressou-se, designadamente, no abandono de William Hogarth, por volta de 1736. Por outro lado, ocorreram também tensões com os maçons de outras zonas das Ilhas Britânicas, como por exemplo com York, onde o historiador Francis Drake reclamava que a verdadeira origem da Maçonaria residia naquela região, A criação de Grandes Lojas na Escócia e na Irlanda também ocorreu em reacção às pretensões hegemónicas da Grande Loja de Londres.

As tensões decorrentes da criação, implantação e pretensões hegemónicas da Grande Loja de Londres agudizaram-se com a Iniciação, em 1737, de Frederick Lewis, Príncipe de Gales. Este acto abertamente político da Grande Loja de Londres inaugurou um período de grande tensão e cisão.

Rui Bandeira

11 junho 2007

Boas noticias

Em Fevereiro Rui Bandeira no seu post Carta a um Irmão deu-nos a conhecer que a filha de um Irmao da Loja tinha graves problemas de visão. Problemas que foram detectados alguns dias após o nascimento.

Este Fim de Semana este Irmão usando da palavra no momento apropriado e agradecendo a todos informou que a sua filha tinha recuperado a visão a praticamente 100% num dos olhos e que no outro a evolução era muito boa e que se esperava que recuperasse também.

Foram alguns meses de angustias para a familia proxima do Irmão mas com felicidade podemos dizer que as coisas correram bem.

Correram bem porque R&G (chamemos-lhes assim) não desistiram não se conformaram e foram para a guerra. Correram bem porque o sistema de saude portugues ( hospitais publicos) tem equipamento e pessoas qualificadas tal qual como no estrangeiro. Correram bem porque também o Grande Arquitecto assim o quis.

PAra R&G e evidentemente para a filha, que vivam até aos 120 anos com saude e prosperidade.

José Ruah

06 junho 2007

Transparências 2

O nosso JoséSR passou a assinar José Ruah, conforme Ele próprio disse, na sequência na notícia da Sábado, abandonando o “pseudónimo” que eu continuarei a usar sempre que a Ele me refira.
Tal como digo num comentário, o “SR”, muito mais do que abreviatura do nome é a abreviatura do “Senhor” que ele é na vida, dentro e fora da Maçonaria.
O Rui já antes era Rui Bandeira e assim continua, naturalmente.
E eu mantenho o JPSetúbal que foi a “alcunha” (na linha será um “petit-nom”…) que me foi colada ao meu “Eu” quando em 1973 entrei na Xerox.
Naquela casa, na altura pelo menos, todos os colaboradores, desde o “director geral” ao “paquete dos cafés”, eram conhecidos por 3 letras, iniciais dos nomes, atribuídos por uma lógica que nem sempre era coerente, e com exclusão total e absoluta de quaisquer outras designações, honoríficas ou profissionais.

Em 1973 esta forma de relacionamento foi uma lição de democracia, ainda mais significativa por sair de uma multinacional americana, naturalmente apelidada então de “capitalista, inimiga do povo…”.
Bem, mas o tema não é esse, e o que aconteceu é que a partir daquela data passei a ser o “JPS”, JPSetúbal quando era necessária alguma clarificação das iniciais, e assim fiquei até hoje.
Assim permanecerei por hábito e vontade própria.
Com Sábado ou sem Sábado, com denúncias ou sem denúncias.
Filho de Mário Calvário Setúbal e de Joana Queiroz de Paiva, o primeiro herói na guerra de 39/45 e a segunda “dona de casa”, como se dizia e era uso na época.
Já agora e só para terminar esta “transparência”, tenho 5 (cinco) netos, liiiiindos !

Como já é “amanhã” e tenho que me levantar cedo… boa noite a todos. Durmam bem e descansem.



JPSetúbal

05 junho 2007

Transparências


Há algum tempo, 1 ano e tal, exprimi a minha opinião sobre o “estado da arte” no relacionamento da Maçonaria com o mundo profano.
Desde sempre pensei que o “secretismo” maçónico deveria ser equacionado de maneira a que, sem perder a condição de organização discreta, pudesse transmitir à sociedade envolvente a verdade dos sentimentos, da vontade, da actividade e dos objectivos dos maçons.
A curiosidade legítima do mundo profano sobre o que se passa na Maçonaria origina, se não tiver resposta adequada, toda a sorte de hipóteses e de “deitar a adivinhar”, que levam ao surgimento de ideias fantasistas, sistematicamente muito afastadas da realidade.
É frequente ser confrontado com a opinião de que a Maçonaria não é senão uma organização secreta, qual antro de piratas, destinada à protecção dos interesses próprios, à conquista do poder político e económico para os seus membros, com ligações obscuríssimas aos centros de decisão nacionais e internacionais.
Devo dizer que foi muito por esta razão que dei todo o apoio que me foi possível ao Irmão Rui Bandeira quando, há 1 ano e picos, me falou na criação de um blogue e entusiasmou para este projecto, a mim e ao JoséSR.
Pareceu-me desde logo que poderia ser a oportunidade que eu procurava para dizermos de nossa justiça sobre o que é a nossa vida como Maçons e da Maçonaria como organização orientada para o bem do Homem, para o aperfeiçoamento das relações humanas, para a divulgação da Paz entre os Povos, sem discriminação de nenhum tipo, aceitando como iguais todos, mas mesmo todos, os homens que queiram pôr o interesse da Humanidade acima dos seus interesses privados.
A Paz, a Alegria e a Força que são os três vectores base da nossa actividade como maçons devem poder ser explicadas ao mundo profano de maneira a que a falta de informação não possa ser aduzida como desculpa para muitas das mentiras que circulam a nosso respeito.
Verdade seja que grande parte dessas mentiras são publicitadas e postas a circular por entidades que fazem o que podem para manter o obscurantismo nas mentes dos seus seguidores, essas sim, com a certeza de que se a verdade completa sobre a sua actividade for realmente conhecida perderiam grande parte da influência que têm no mundo.
Já escrevi, mesmo aqui no blogue, que a Maçonaria não é uma organização perfeita de homens perfeitos.
Pelo contrário, reconheço, reconhecemos, que na Maçonaria encontramos bons e maus maçons, tal como em todas as organizações de Homens.
Talvez numa organização divina seja possível ter só “bons”, mas esse não é o caso da Maçonaria, que pretende caminhar sob orientação divina mas que é uma organização de humanos e como tal, com bons e maus.
É inevitável !
Estamos convencidos que a percentagem de homens bons é bem superior à de homens maus, entre os que integram esta irmandade, e essa é mais uma razão para não haver necessidade de esconder ao mundo profano muito do que se passa internamente.

Acontece que a revista “Sábado” tem feito o possível para “sensacionalizar” o que não tem nada de sensacional, e temos pena que a Sábado tenha que ganhar o seu dinheiro com o aproveitamento sensacionalista de informações que obtém, fatalmente, por processos ilegítimos.
Ilegítimos na origem pela forma como são obtidos ou ilegítimos no final pela forma como são publicados.
Neste processo alguém está a faltar a compromissos assumidos, muito provavelmente sob juramento, e isso é um péssimo sinal quanto à estatura humana dos intervenientes.

Na 5ª feira passada saiu mais uma notícia (4 ou 5 páginas com grande chamada na capa) sobre a vida interna da Maçonaria.
Da 1ª vez, há 1 mês (?), referi-me a uma estranha caixa informativa complementar à notícia, porque as dissonâncias nela contidas eram tão grandes que alguma coisa teria de ser esclarecida sobre o assunto.
Desta vez o conteúdo global da notícia é bastante escorreito no que toca aos rituais descritos, sem ser exaustivo nem perfeito é no entanto um texto quase verdadeiro.
Não refere a existência de vários rituais, nem a qual ritual pertencem os procedimentos ali divulgados.
Há alguma confusão entre o que é a GLLP/GLRP, a Casa do Sino e o GOL, assim como algumas imprecisões quanto aos nomes e sua relação com as Lojas respectivas, mas de modo geral não está mal.
Ou melhor, não estaria mal caso a informação publicada fosse obtida por métodos legítimos.
Como não foi, esse facto envenena desde logo todo o processo.

O extraordinário da coisa está em que os interessados têm à disposição toda aquela informação, e muita mais, sem sensacionalismo, sem “gafes” ou incorrecções em centenas de locais da “net”, sendo que um deles está aqui mesmo, neste blogue.
Basta ler o que Rui Bandeira tem escrito, principalmente ele, sobre a vida da Maçonaria, práticas e usos, para se ter uma colecção de informação fidedigna, validada e legitimamente divulgada, muito mais profunda e completa do que a da “Sábado”.
O que é que falta a esta informação e que a “Sábado” completa ?
São os nomes dos Ministros que são ou foram, dos Secretários que são ou foram, dos Directores que são ou foram, dos Maçons que são ou foram…
Essa é a informação que realmente falta nos textos do Rui.
E falta por 2 razões principais:

1- porque na grande maioria dos casos não sabe se fulano A ou B é maçon;
2- porque se soubesse não os publicaria, e aqui também por duas razões:

2.1- porque essa divulgação é totalmente desinteressante;
2.2- porque não estaria autorizado a fazê-lo.

Por caminhos nada louváveis e fugindo completamente ao seu objectivo (digo eu), a “Sábado” acabou prestando um bom serviço à causa da Maçonaria.
Não foi essa a intenção, garantidamente, mas está a ajudar a limpar algumas teias de aranha.
Se conseguir distinguir, dentro da confusão informativa das várias obediências, quem é quem, então direi mesmo que prestou um muito bom serviço à causa.
E já agora ponham lá também no que é que os maçons gastam o seu tempo.
Talvez dê algum trabalho adicional aos jornalistas ou talvez os jornalistas (aqueles) não estejam interessados em esclarecer por completo esse “quem é quem”, mas isso seria a cereja em cima daquele bolo.
E se os textos forem correctos, sem entrelinhas nem ambiguidades, todos ficarão com ideias
claras quanto ao verdadeiro papel da Maçonaria na sociedade e com o que a sociedade pode contar da parte dos Maçons.

Mas insisto, não vale a pena gastar dinheiro com o preço da revista.
Aqui no blogue está tudo o que interessa, e é de borla.

Apetece-me trazer ao texto o “ovo de Colombo” e a transparência do cristal, assim, tudo junto.






(foto de Gun Legler)

JPSetúbal

04 junho 2007

Balanço

Este é o primeiro texto do segundo ano deste blogue. Parece-me adequado que seja um texto de balanço do blogue, desde o dia 4 de Junho de 2006, em que o JPSetúbal publicou um texto, ainda com o título CHEGÁMOS fora do sítio (pois é, fomos aprendendo a lidar com isto da blogosfera à medida que... íamos fazendo).

365 dias passados, publicámos 375 textos. Desses, 191 (51%) foram publicados por Rui Bandeira, 93 (25%) por José Ruah, 81 (22%) por JPSetúbal, 5 (1%) por PauloFR e os restantes 5 (1%) por Fernão de Magalhães (2, um em Junho, o outro em Julho de 2006 e depois... entrou de férias prolongadas!), Erato (2 em Julho de 2006) e Templuum Petrus (1 experiência em Julho de 2006). Até agora, portanto, 7 Mestres Maçons da Loja Mestre Affonso Domingues publicaram aqui textos. Mas só três o fazem com regularidade, tendo publicado textos todos os meses (Rui Bandeira, José Ruah e JPSetúbal). PauloFR tem publicado textos ocasionalmente (três em Julho de 2006, 1 em Janeiro e outro em Abril de 2007.

O mês em que Rui Bandeira publicou mais textos foi o de Março de 2007 (21) e aquele em que menos publicou foi em Agosto de 2006 (7). Quanto a José Ruah, teve o seu pico de produção em Julho de 2006 e Janeiro de 2007 (19 textos em cada um desses meses) e esteve falho de inspiração em Outubro e Novembro (apenas um texto em cada um desses meses). Finalmente, JPSetúbal teve a pena mais ocupada também em Julho (14 textos) e deu-lhe mais descanso em Novembro de 2006 e Abril de 2007 (3 textos em cada um desses meses).

O mês em que foram publicados mais textos foi o de Julho de 2006 (56, com a curiosidade de esse ter sido também o único mês em que os 7 elementos publicaram textos no blogue); aqueles em que menos textos foram publicados foram Novembro de 2006 e Abril de 2007 (23 em cada).

168 dos textos publicados receberam comentários (45% do total - nada mau!). Até ao momento em que escrevo este texto, o texto que mais comentários mereceu foi o recente (de 31 de Maio) "Não que me preocupasse, mas...", em que José Ruah publicou a sua identidade (11 comentários).

Só foi instalado contador de visitas no blogue em 9 de Julho. Desde então, e até ao final do dia de ontem, recebemos 26.773 visitas, com a particularidade de o seu número ter aumentado significativamente a partir do mês de Março, no qual tivemos mais visitas (4.053) do que no conjunto de todos os meses anteriores (3.783). E em Abril quase duplicámos o número de visitas em relação ao mês anterior (7.033). E em Maio voltámos a ver o número de visitas a aumentar (8.193). Quanto a Junho, no momento em que escrevo, já contabilizámos 818 visitas (em 4 dias incompletos!), mais do que em qualquer dos meses de 2006, excepto Novembro (906).

41% das visitas chegam do Brasil (10.984). De Portugal registamos 6.483 visitas (24% do total). 3% das visitas foram oriundas dos Estados Unidos (826). O top-25 dos países de onde recebemos visitas completa-se, por ordem descendente do número destas, com França, Suíça, Itália, México, Japão, Alemanha, Canadá, Moçambique, Bélgica, Argentina, Holanda, Espanha, Grã-Bretanha, Angola, Colômbia, Austrália, Uruguai, Luxemburgo, Peru, Hungria, Roménia e Chile.

Os três textos directamente mais vezes acedidos foram O sítio das tatuagens maçónicas, Cinco motivos para NÃO SER maçon e Simón Bolívar, Revolucionário e Maçon.

Os três marcadores mais consultados foram maçonaria, energia e Acácia.

As três palavras-chave que mais visitantes trouxeram ao blogue foram "imagens de tatuagens", "maçonaria" e "pedra madeira".

As 26.773 visitas originaram 53.404 páginas acedidas, isto é , em média cada visitante, além da página de acesso, consultou uma outra.

Estes números superam todas as nossas expectativas. Nunca pensámos que um blogue temático como este merecesse tanto interesse de tantos. A todos o nosso Bem Hajam. Procuraremos, no segundo ano do blogue, continuar a merecer o vosso interesse.

Rui Bandeira

01 junho 2007

A Santificação do Homem

O post de hoje, para desanuviar, é sobre um tema um pouco diferente da maçonaria , ou talvez não.

Reproduzo aqui uma comunicação que apresentei há umas semanas atrás no coloquio:
" Turres Veteras X - a Historia do Sagrado e do Profano"

O Texto foi escrito para ser lido e por isso perdoarão alguma incorrecção. As citações são extridas do Livro " Torá" editado recentemente pela editora Sefer do Brasil e consequentemente estão escritas em português do lado de lá.


A Santificação do Homem


Quando me foi lançado este desafio, de vir aqui falar sobre o Sagrado e o Profano do ponto de vista do judaísmo, aceitei sem saber bem o que iria dizer sobre o tema.

É importante lembrar que não sou Rabino nem estudioso de matérias religiosas pelo que corro o sério risco de vos apresentar algo que fique muito aquém das expectativas, mas é a minha visão do assunto.

O judaísmo enquanto religião e forma de vida visa sempre a santificação do homem numa perspectiva de o tornar mais próximo de Deus.

A religião judaica prescreve mandamentos e regras que se integralmente cumpridas representarão o respeito máximo por Deus e pela sua Santidade, e que não cumpridas farão do homem um profano que ao contrario do seu irmão cumpridor, no dia do julgamento poderá ser considerado como indigno de se manter vivo.

Todavia o homem está sempre a tempo de se arrepender e retornar ao caminho da santidade com isso glorificar Deus. Este arrependimento, que pode surgir a qualquer altura, está muito associado com o dia do Kipur. Dia de penitencia e arrependimento e também o dia em que cada judeu se apresenta perante Deus e lhe apresenta contas do que fez, esperando que o seu nome seja inscrito por Deus no Livro da Vida e que o seu arrependimento seja aceite.

Neste sentido e de forma a realçar a importância do percurso do homem, de cada homem, no sentido a elevação espiritual decidi ir buscar exactamente os trechos da Torá que explicam e regulamentam o dia de Kipur e de lá extrair o que me pareceu fundamental para ilustrar a perspectiva judaica sobre o sagrado e o profano, do ponto de vista do homem.

Uma breve explicação prévia, a Torá é composta por 5 livros (Bereshit – Génesis, Shemot – Êxodo, Vaycrá -Levitico, Bamidbar – Números e Devarim – Deutronomio) e constitui a lei fundamental do judaísmo, a lei dada por Deus a Moisés no deserto. Nestes livros poderemos encontrar desde a criação do Mundo aos preceitos alimentares e regulamentos familiares. Estes livros são lidos em capítulos semanais de maneira a que num período de um ano todos os livros tenham sido integralmente lidos e se recomece.

Estes são os livros de base do que se convencionou chamar de Bíblia.

Para ilustrar o tema de hoje escolhi algumas passagens e respectivos comentários, que penso poderão ajudar a explicar o que o judaísmo pensa e preconiza. Estas passagens estão incluídas no capítulo que regula o Dia de Kipur.


“... E tomarás os dois cabritos e os farás ficar diante do Eterno à porta da tenda da reunião. E lançará Aarão sobre os dois cabritos, sortes, uma para o Eterno e outra para Azazel. E aproximará Aarão o cabrito sobre o qual caiu a sorte para o Eterno e o oferecerá como oferta de pecado. E o cabrito sobre o qual caiu a sorte para Azazel colocar-se-á vivo diante do Eterno, para expiar por meio dele, para envia-lo para Azazel no deserto.


E colocará Aarão suas duas mãos sobre a cabeça do cabrito vivo, e manifestará sobre ele todas as iniquidades dos filhos de Israel, todos os seu delitos e todos os seus pecados, e os porá sobre a cabeça do cabrito e o enviará, por mão de um homem designado para isso para o deserto. E levará o cabrito todas as iniquidades à terra desabitada e deixará o cabrito ir pelo deserto… “

Vaikrá (Levitico) 16: 7 a 10 e 21 a 22

Sobre este trecho da Torá o Rabino Mendel Diesendruck, que na década de 50 do sec. XX foi Rabino em Lisboa escreve o seguinte:


“ Sortes: os nossos exegetas interpretam esta cerimónia de sortear os cabritos como indicação simbólica para os dois diferentes elementos humanos e a sua maneira distinta de encarar os problemas da vida. Um encarna com o seu estilo de viver e pela pureza das suas acções e pensamentos aquela máxima gravada em muitas sinagogas com letras douradas por cima da Arca Sagrada, Shiviti Hashem Lenegdi Tamid (Tenho o Eterno sempre à minha presença), ou seja tudo o que eu faço e pretendo fazer é orientado e guiado por uma única motivação: Viver sempre dentro das prescrições da Torá, amar a Deus, o meu povo e a humanidade inteira; e para concretizar este meu ideal sublime não receio qualquer sacrifício.

Este elemento humano que representa pela nobreza do seu carácter a perfeição da criação Divina é o símbolo de “ para o Eterno” .

Mas existe também um elemento radicalmente oposto. É aquele ser humano cuja vida é claramente profana, cujos interesses nesta vida são de um materialismo vil, uma abjecção grosseira; o tipo de ser humano cujo maior ideal é o seu próprio ego, para o qual o meio ambiente não existe, porque ele é incapaz de dar algo de si.

Este tipo de homem vive na auto ilusão de ser um elemento útil à sociedade mas quem for capaz de deitar um olho para dentro da sua alma vazia e pobre, verificará facilmente que ele, coitadinho, não é mais que um bode isolado num deserto. Pois nós todos sabemos muito bem que existem não apenas desertos geográficos, mas também – e o que é mais lamentável – desertos espirituais, intelectuais, assim como existem climas que não dependem somente das condições atmosféricas, mas sim do calor das nossas almas e dos sentimentos de nossos corações. Este segundo elemento também não se importa em fazer toda a espécie de sacrifícios para alcançar o seu fim, mas é o fim próprio que distingue estes dois carácteres.

Enquanto para o primeiro o alvo é “ para o Eterno “ , a meta do segundo é orientada “ para Azazel “.
A cerimónia de sortear os bodes, oficiada no dia mais sagrado e pelo homem mais sagrado (o sumo-sacerdote) é talvez a mais bela e mais significativa demonstração de que o acaso pode ser um factor decisivo quando se trata de carneiros inocentes, mas nunca em relação ao homem responsável pelos seus actos. “

Mais à frente pode ler-se na Torá:

“… E falou o Eterno a Moisés dizendo: “ Fala a toda a congregação dos filhos de Israel, e lhes dirás: Santos sereis, pois santo sou EU o Eterno vosso Deus….” …”
Vaikrá (Levitico) 19: 1 e 2


A este propósito o Rabino Mendel Diesendruck escreveu o seguinte:

“Santos Sereis: Segundo Rashi (comentador mais importante da Torá) isto significa – “ afastai-vos de toda a espécie de imoralidade e da transgressão” – “

O Rabino Diesendruck retoma escrevendo:

“ O Judaísmo não conhece nenhum outro “santo” além de Deus. Em que consiste então a substancialidade de Deus? No “ser diferente”, no “ser fora” de toda a natureza e por isso na liberdade. A opinião que Deus Sive Natura é uma flagrante negação da doutrina básica do judaísmo. Fora da natureza é o reino da liberdade. “Santo” significa livre no grau mais transcendental. O homem nunca é fora da natureza; para o ser o humano só pode prevalecer sempre a “aspiração à santidade “, aspiração cujo objectivo é livrar suas acções de tudo o que é terrestre, material, fútil, mesquinho e profano, uma aspiração a que os seus sentimentos e desejos sejam determinados o máximo possível pela sua consciência divino-espiritual…”

O comentário é concluído com a seguinte afirmação:

“ Ser criado à imagem de Deus não é um facto consumado, mas sim uma elevada missão, uma potencialidade em constante desenvolvimento. “

Na mesma edição da Torá que utilizei e a propósito da mesma passagem os editores juntam o seguinte comentário:

“ Santos sereis: O homem não precisa de executar nenhum acto fora do comum ou feito extraordinário para ser santo. Em todas as esferas da vida o “fazer” e o “não fazer” de cada indivíduo é que o tornam santo. A singularidade do povo de Israel está no facto de que a vida e a santidade não são dois domínios separados. Quem deseja ser santo não precisa de se afastar da natureza, da vida, retirar-se da sociedade para ir viver no deserto, fechar-se asceticamente dentro de muros ou ir viver isolado para a floresta. Todos nós podemos ser “ um reino de sacerdotes e um povo santo” (Êxodo 19:6), e isso não se dará pelo afastamento ou renúncia da vida, mas sim através da santificação da vida, de acordo com o conselho: “ Reconhece-O em todos os teus caminhos” (Provérbios 3:6).”

Como podemos perceber destes comentários e do que atrás foi dito, no judaísmo é dado um especial enfoque ao homem como o decisor da santidade.

O Judaísmo preconiza valores e preceitos que permitem, se seguidos, ao homem tornar-se mais puro e mais santo, pois aproximam-no de Deus.

O homem tem a capacidade de progredir no caminho da sacralização por acção do seu livre arbítrio e vontade, cumprindo os mandamentos e preceitos e assim aproximando-se do seu Criador, à imagem do qual foi feito.

Este tema é no fundo uma das bases da sacralização pois podemos interpretar que o ter sido feito à imagem e semelhança quer dizer que lhe foi concedido raciocínio e poder de decisão.

Consequentemente o homem, ao contrário dos animais que agem por instinto, pode separar o bem do mal e pode escolher ser mais “santo” fazendo sobressair a centelha Divina que lhe foi incutida, ou por outro lado decidir uma vida mais profana.

É todavia importante perceber e diferenciar esta santificação do homem na religião judaica, da santificação / beatificação na religião Cristã. No judaísmo a Santificação é interior e exclusiva de quem segue o caminho dos mandamentos e será apenas reconhecida por Deus. Não existirá em caso algum a veneração de um homem por parte de outros homens.

Concluo com uma incerteza e uma certeza. A incerteza de vos ter trazido algo de utilidade, a certeza de ter aprendido com este trabalho e desta forma ter progredido um ínfimo passo no meu melhoramento.

Todavia se porventura a minha incerteza se tornar certeza então tenho que agradecer-vos pela oportunidade que me deram de dar mais um pequeno passo, neste caminho que todos deveremos levar no sentido da santidade.

Apenas com o trabalho interior de cada um independentemente da religião que seguimos poderemos de forma afirmativa progredir. A nossa progressão individual terá seguramente como consequência a progressão dos nossos semelhantes em direcção a um futuro que esperamos melhor.


José Ruah

Uma história da Maçonaria Britânica (1583-1717)

Prossseguindo com a divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott por ele apresentado na sua lição de despedida do Center for Research into Masonry da Universidade de Sheffield:

1583-1717


Em 1583, à fase do sindicalismo sucedeu a que David Stevenson chamou de “Século da Escócia”. Em 21 de Dezembro de 1583, William Schaw foi nomeado Mestre das Obras pelo rei James VI da Escócia. Dois dias mais tarde, surgiu um novo manuscrito, contendo, além do mais, cópias das lendas constantes primeiramente nos manuscritos de Regius e de Cooke. Esse novo manuscrito é hoje conhecido por Old Charges (Antigos Deveres). Circulou primeiramente entre trabalhadores de construção (maçons) escoceses. Schaw reformou radicalmente a organização dos maçons escoceses, através de dois conjuntos de regras aprovados em assembleias de maçons escoceses, em 1598 e 1599. Essas reformas incluíram, designadamente, o estabelecimento de Lojas separadas, organizadas numa base territorial, respondendo directamente perante um Vigilante Geral, realizando reuniões regulares e mantendo actas das mesmas. Há indícios de que Schaw procurou também interessar os membros destas Lojas nos novos desenvolvimentos existentes na época nos campos do esoterismo e da filosofia, tal como a designada “arte da memória”. As Lojas estabelecidas por Schaw começaram a ser pólos de atracção de elementos que não trabalhavam na construção, tais como Sir Robert Moray, que se tornou profundamente interessado nas lendas e no simbolismo do ofício de construtor (maçon).

Embora a organização dos maçons ingleses tenha permanecido mais informal e ad hoc, algumas das características evidenciadas pela organização escocesa começaram a surgir também em Inglaterra a partir de meados do século XVII. Em particular, as reuniões dos maçons também ganharam o interesse de elementos estranhos à profissão, como o cientista e antiquário Elias Ashmole e Randle Holme.

Em Londres, este processo de criar um grupo do elite com as organizações dos construtores (maçons) a fim de suportar as reivindicações e o prestígio da profissão conduziu ao aparecimento de um grupo interno dentro da Companhia dos Maçons de Londres, conhecido como os Aceites, que incluiu alguns dos mais prósperos arquitectos / construtores, bem como outros elementos como Ashmole.

Prescott elucida-nos assim acerca da evolução ocorrida com as organizações profissionais de construtores, criação no âmbito destas de lendas que suportassem as reivindicações profissionais daqueles, criação de Lojas separadas mas subordinadas a uma autoridade profissional central e progressiva evolução destas Lojas para além dos meros interesses corporativos, também para o esoterismo e a filosofia e, por via disso, integração nas Lojas de elementos estranhos à profissão, mas Aceites nas Lojas. É esta evolução que fundamenta a expressa denominação de muitas Obediências como sendo de Maçons Livres e Aceites. E assim ocorre também a evolução de uma organização meramente corporativa ou operativa, para uma outra realidade, a moderna Maçonaria especulativa.

Rui Bandeira