27 setembro 2010

Correlação e causalidade (II)



Quando, ainda pequenos, começamos a aperceber-nos do mundo que nos rodeia, tudo é inesperado, e o controlo que temos sobre a nossa realidade imediata é muito reduzido. Com a repetição dos acontecimentos em circunstâncias semelhantes vamo-nos apercebendo de padrões, coisa que o nosso cérebro está especialmente "afinado" para detetar. Apercebemo-nos, deste modo, que logo após uma coisa sucede, normalmente, uma segunda e, ao fim de algumas repetições, quais cães de Pavlov, começamos a salivar logo que ouvimos a sineta.

Pode ser impossível memorizar todas as ocorrências de um fenómeno frequente, mas muito fácil recordar uma regra que as traduza e resuma. A questão que se coloca é, por um lado, a da fiabilidade da regra para explicar os acontecimentos passados, e por outro a capacidade de prever os acontecimentos futuros. E, mesmo quando a encontramos - a regra perfeita que explica a correlação perfeita - nada fica explicado, apenas registado.

Suponhamos que eu pego num copo de água e o provo. Não sabe a nada - ou não deve saber, pois a água pura é insípida e inodora. Agora pego num pouco de açúcar, deito-o na água e provo. A água passou a "saber a doce"! Posso repetir esta experiência as vezes que quiser, até chegar a uma conclusão: de todas as vezes que deitei açúcar na água a água ficou doce. A partir desta constatação vou inferir uma regra que, espera-se, seja universal: sempre que alguém deitar açúcar na água, esta fica doce. Estabelecemos uma correlação.

Esta informação é útil? Claro que sim. Perguntem-no a qualquer pessoa que trabalhe numa cozinha. Mas explica verdadeiramente alguma coisa? Claro que não. Ficamos a saber que a água fica doce, mas não sabemos porquê. Para isso, teremos que estudar as papilas gustativas, os recetores que detetam os iões presentes no açúcar, e os estímulos gerados nas mesmas para o cérebro. Aí, sim, podemos dizer que entendemos o fenómeno, e que, da correlação, passámos à causalidade: o açúcar é, de facto, a causa do sabor a doce. Com base nesta informação, e cientes de como funciona a nossa língua, podemos, agora, inventar coisas novas, como adoçantes que não tenham as propriedades do açúcar. E que nos adianta isso sobre o conhecimento inicial de que o açúcar adoça a água? Por vezes, muito; as mais das vezes, nada para além da satisfação de entendermos um pouco melhor o nosso mundo.

A maioria do conhecimento que temos é meramente correlacional, e não estabelece qualquer prova quanto à causalidade. Uma correlação consegue-se pegando nos dados, na observação dos fenómenos repetidos muitas vezes, e inferindo, através de métodos matemáticos, uma ligação entre eles. A correlação, contudo, nada demonstra por si mesma. Peguemos, por exemplo, no crescimento semanal, em centímetros, das tulipas de uma certa estufa, ao longo de alguns meses; e no preço, em euros, das botas de neve numa loja de desporto.  Poderia suceder, por mero acaso estatístico - ou por qualquer outra razão - que houvesse um a correlação perfeita entre ambas as medidas. Uma correlação é algo de objetivo e indesmentível por definição: contra factos não há argumentos, como se costuma dizer.

Já o mesmo não pode dizer-se das conclusões de causalidade supostamente decorrentes de tal correlação. Seria, por exemplo, pouco sensato dizer-se que "o crescimento das tulipas torna as botas mais caras", ou que "as tulipas crescem tanto melhor quanto mais caras estiverem as botas de neve". Pior, ainda, seria aumentar-se o preço das botas esperando que isso aumentasse a taxa de crescimento das tulipas... Já, por outro lado, dizer-se que "quanto mais alta a temperatura, mais crescem as tulipas por um lado, e mais raras são as botas de neve nas lojas - pois terão sido vendidas na época fria - o que as torna mais caras" pode ter todo o cabimento - mas carece de demonstração para se poder estabelecer uma causalidade.

Contrariamente à correlação, estritamente objetiva, a causalidade implica sempre uma dose de especulação e de juízo sobre os dados objetivos que lhe darão suporte. Estabelecer uma correlação é, muitas vezes, trivial; provar uma causalidade é, por outro lado, frequentemente um desafio, para não dizer impossível. É, quase sempre, um trabalho árduo. Contudo, provar-se uma causalidade permite-nos chegar mais fundo, entender melhor, alargar o conhecimento dos conceitos em causa, coisas que a mera correlação não garante. Deveremos, por isso, abandonar as correlações e focar-nos nas causalidades? Claro que não. Devemos é saber distingui-las, dar a umas e a outras o devido valor e, acima de tudo, não tomar por causalidades o que não passa de meras correlações - falácia que muitos órgãos de comunicação social, ávidos da nossa atenção, repetem vezes sem conta.

Paulo M.

7 comentários:

jpa disse...

Parabéns pelo texto.
A imagem dos pinguins evocando a "treta" do aquecimento global, que tão bons negócios tem criado para "alguns" é elucidativa.

Cumprimentos
JPA

Paulo M. disse...

@jpa: Há ideias que são apenas questão de opinião, e que eu respeito e aceito apesar de poder ter opinião diversa. Outras, porém, são matéria de facto, e não há como concordar com elas. Não posso, por exemplo, concordar com quem defende que as vacinas causam autismo e, por isso, priva os filhos das mesmas, e arrisca a vida e a saúde deles e de outros. As vacinas não causam autismo, e isso não é uma questão de opinião - é um facto médico.

Do mesmo modo, o aumento da percentagem de dióxido de carbono na atmosfera provoca aquecimento do planeta. Esse é um facto científico. O que não está estabelecido é, por um lado, o nexo de causalidade entre o consumo de combustíveis fósseis e o aumento da percentagem de dióxido de carbono (pois as plantas poderiam tratar de reequilibrar as coisas) e, por outro, quais as consequências reais do aumento de um par de graus na temperatura da Terra. Há quem diga que, no fim, poderíamos não ficar pior...

De qualquer modo, é um equilíbrio frágil: a atmosfera terrestre é composta por 78,08% de azoto, 20,95% de oxigénio, e 0,93% de árgon. Sobram cerca de 0,04% para outros gases - entre os quais o dióxido de carbono, que corresponde a cerca de 0,0387%. Muito pouco, não é? De facto, corresponde a cerca de um vigésimo de um por cento. Como vê, basta muito pouco para alterar este equilíbrio. Será mesmo uma treta?

Um abraço,
Paulo M.

jpa disse...

Olá Paulo M.

Não conheço nenhum cientista que prove que efectivamente exista aquecimento global.
O que verdadeiramente nos aquece é o sol. Prevendo-se que este astro vá deixar de queimar tanto num futuro próximo, baixando um pouco as temperaturas, por algum período de tempo.
Tenho um avô com 83 anos e um tio com 86, que se lembram de situações idênticas.
Não acredito no aquecimento global, e muito menos o CO2 ser a sua causa. Vejam é os negócios que por aí proliferam, tendo como base esta ideia.

Cumprimentos
JPA

Candido disse...

É o efeito de estufa que nos matem vivos! O sol é fonte de energia que aquece a terra conforme a sua posição e inclinação, mas a habitabilidade é dada pelo efeito de estufa. Alterando a composição desta... alterando o equilibrio existente, esperamos o quê?
Não estamos a falar de alterações climáticas!
abraços

Paulo M. disse...

@jpa: "O que verdadeiramente nos aquece é o sol." Corretíssimo, mas são gases como o CO2, presentes na atmosfera da Terra, o que a mantém quente. Sem esses gases a temperatura da Terra seria cerca de 30 graus mais baixa do que é.

"Não conheço nenhum cientista que prove que efectivamente exista aquecimento global." Isso agora depende do que cada um entende pelo conceito, mas os dados falam por si. Há métodos que permitem estimar de modo razoavelmente preciso a temperatura de há alguns séculos para cá, e todos apontam para um aumento substancial no último século. Mas note-se que "substancial" não são 5 ou 10 graus; estamos a falar de um pouco menos de um grau, e de um valor médio. Algo que um ser humano, sem um termómetro, não tem forma de notar, mas que os instrumentos acusam com clareza.

A partir daqui, se quiser, certamente encontrará muitos links a partir das páginas que lhe apontei. E, querendo, pode também não ler nada e manter a sua convicção. A beleza da liberdade é essa mesma!

Um abraço,
Paulo M.

Fly disse...

Boas

acerca do aquecimento global provocado pelo co2, aconselho esta imagem que mostra a camada de neve no hemisfério Norte por décadas, a fonte é a Univ. Rutgers:

http://4.bp.blogspot.com/_hrgRgSNj0mo/S-PCvu1EplI/AAAAAAAAArQ/s8c8o6Clobw/s400/Snowcover+HN.jpg

onde se pode ver que até o ano 2000 houve uma diminuição, mas depois disso até 2010, já voltou ao normal.

é de referir que o ano de 2000 é o ano limite que o IPCC (o tal que veio ao mundo nos dizer que somos os culpados do suposto aquecimento) usa nos seus gráficos para nos mostrar o aquecimento. Gráficos estes que são os que os média mostram, logo não informam as pessoas como deve ser e depois dá nisto.

Sobre este tema aconselho a leitura do

http://mitos-climaticos.blogspot.com/

do falecido Rui Moura, que nos deixou um grande espólio de material para pesquisa no seu blogue.

Abraço

P.S. é a 1ª vez que comento por aqui, embora passe por aqui às vezes. Gosto de ler alguns dos textos que por aqui escrevem...

Paulo M. disse...

@Fly: Obrigado pelo seu comentário, pelo link para o blogue do Rui Moura (já dei uma vista de olhos e vou mesmo gastar algum tempo a ler com atenção) e, acima de tudo, pela iniciativa de comentar! Não perca o embalo, e comente sempre que quiser. E seja bem vindo!

Um abraço,
Paulo M.