Lição de um Mestre ao seu Aprendiz - VI
Pedro Espanhol, 2009, óleo sobre tela, 90 x 120 cm
Reprodução publicada pelo autor em Masonic Art
Antes do mais, sê muito bem-vindo entre nós. Estás aqui por teus méritos e, sobretudo, por tuas potencialidades. A ti, e só a ti, deves a admissão no seio dos obreiros desta Oficina da Augusta Ordem da Maçonaria. Nós, os que vos acolhemos, limitámo-nos a reconhecer em ti a capacidade e a vontade de efetuar o longo – direi mesmo: interminável -, trabalhoso – acrescentarei: permanente – e minucioso – precisarei: rendilhado – processo de transformação de um Homem Bom num Homem Melhor.
Esta
frase, que de tantas vezes dita soa já como um lugar-comum, é, acredita-me, muito
mais simples de dizer do que de levar à prática. Passar de um simples e comum
Homem Bom – aquilo que nós, maçons, costumamos designar por homem livre e de bons
costumes – para se ser um Homem Melhor é tarefa, mais do que diária, de todos
os instantes, verdadeiramente permanente, que necessita de ser executada ao
longo de toda a vida – e que só faz sentido se for permanentemente executada ao
longo de toda a vida.
É
uma tarefa interminável, porque é de sua natureza sê-lo: o homem bom de hoje
que se transforma amanhã num homem um pouco melhor, em bom rigor, ao fim do dia
de amanhã não será mais do que um pouco melhor homem bom que poderá e deverá,
no dia seguinte, melhorar um pouco mais. E assim sucessivamente até ao momento
em que a nossa tarefa neste plano de existência terminar.
A
Arte Real é um guia para esse trabalho. O método que propõe e coloca à disposição de todos os seus obreiros é o estudo, compreensão e interiorização
dos significados – quantas vezes vários, ou mesmo múltiplos – dos muitos
símbolos com que nos deparamos.
Admito que, hoje, aqui e agora, não tiveste ainda tempo para te aperceberes de que tudo o que nos rodeia tem carga simbólica. Como certamente ainda não assimilaste convenientemente o significado do que se passou, do que viveste, desde o
instante em que entraste neste edifício até agora. Não te preocupes com isso.
É normal, é natural, é previsível, é até desejável que assim seja. Tivemos
o cuidado de nada de substancial te informar sobre o que irias viver neste
dia. Porque é necessário sem conhecimento prévio viver, sentir, a passagem que acabaste de efetuar
para depois melhor compreender o seu significado.
Não
esqueças nunca: a Razão complementa, completa, domina e interpreta a Emoção. O
que vale por dizer que a Emoção é forte alicerce da Razão, que o mero
conhecimento racional pode ser muito e vasto, mas é fraco e pouco consistente
se não estiver ancorado, se não tiver sido adquirido com a Inteligência Emocional
que integra também a nossa capacidade para estarmos, orientarmo-nos e
compreendermos o mundo em que vivemos. Se assim não fosse, não precisávamos de
viajar – bastava ler livros e ver filmes de viagens...
A tua primeira tarefa é também um labor permanente e será, afinal, o teu último trabalho: conhecer-te a ti mesmo. Isso é essencial. Porque tu és o centro, a origem, o início e o fim do teu mundo. Portanto, o mínimo que te é exigível é que te conheças verdadeiramente a ti mesmo. Não a imagem que
tens ou dás de ti, mas o que está por detrás dela, em tudo o que ali está e o que
foi, que é causa do que é e base para o que será. O que tem de agradável e
luminoso, mas também o que é mais sombrio e com que nos custa a deparar.
Esta
a base, o ponto de partida. Já há milhares de anos estava escrito no Templo de
Delfos: “Conhece-te a ti mesmo e conhecerás todo o Universo e os deuses, porque
se o que procuras não achares primeiro dentro de ti mesmo, não acharás em lugar
algum”.
Esta
asserção é, desde a mais remota Antiguidade, a base de toda a busca e jornada
iniciática. Não precisamos de inventar nada, não é necessário inventar o que já
está inventado.
Devo-te esclarecer o significado da Arte Real. Como o poderei fazer, se há mais de
vinte anos que o busco e ainda não o determinei completamente? Talvez a melhor
resposta seja esta: a Arte Real é um método de busca que tem princípio em ti
mesmo, como guia os símbolos, como rota a melhoria individual, como objetivo a
perfeição e como meta todo o Universo e o que mais haja.
Sei
bem que esta definição que acabei de te propor hoje, aqui e agora não é mais
do que um conjunto de palavras que se juntam a uma enorme quantidade de
informação que hoje recebeste e de sensações que experimentaste e que, portanto,
agora de pouco te vale. Não te preocupes tu com isso, que eu também não
estou nada preocupado. Tens à tua frente muito tempo para ordenar, para
assimilar, para compreender tudo o que hoje viveste, viste e ouviste. E tudo, a seu
tempo, te fará sentido. Até este arrazoado que tiveste a paciência de
ouvir...
Rui Bandeira
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