Conhece-te a ti mesmo
Morre o autor, vive a obra. Mesmo apócrifa, sabe-se ou supõe-se que a expressão conhece-te a ti mesmo terá sido proferida pela primeira vez na antiga Grécia há mais de vinte séculos. A tradição diz-nos que estaria gravada nos pórticos do Oráculo de Delfos, e atribui-a a uma multiplicidade de autores. Qual ditado popular, o γνῶθι σεαυτόν grego dá origem ao nosce te ipsum latino, e terá sido depois apropriada por uns e por outros, e sucessivamente redescoberta.
Mesmo perdida a fonte, chegou a nós a ideia, que é a pedra de toque da filosofia e método de Sócrates. A busca do autoconhecimento é essencial, instrumental e inevitável ao homem que procura saber mais. Afinal, a importância do que aprendemos reflete-se no quanto nos confronta connosco mesmos, na medida em que nos torna diferentes, em quanto abala do que temos sido para acomodar o que passamos a ser. Aprender não é só confirmar, incrementar e consolidar; é também - e sobretudo - questionar, derrubar e destruir, não só a ignorância, mas sobretudo algum saber já incrustado e inquestionado pela sua idade que, de repente, nos apercebemos não se harmonizar num todo equilibrado com o novo conhecimento que laboriosamente viemos a adquirir. É, por isso, imprescindível que nos recolhamos de vez em quando, paremos de acumular, olhemos para o que temos e tentemos aperceber-nos do que temos de bom, útil e belo - e deitar fora o que não serve.
Tudo isto a propósito do meu "desaparecimento". Escrevi o primeiro texto aqui no "A-partir-pedra" em Julho de 2010 - há quase dois anos, portanto. Tinha acabado de ser elevado a Mestre Maçon, e podia, por fim, escrever! De facto, durante três meses, com as palavras a brotar forte, escrevi dois textos por semana. Porém, a fonte começou a secar, deixando-me com algumas dificuldades em manter o ritmo. Bem me tinham avisado que isto não era um sprint, mas uma maratona... Nesse contexto, foi-me sugerido que passasse para um texto por semana, ritmo que mantive durante mais nove meses. Fechava-se, assim, um ano de textos, no fim do qual fiz uma paragem de um mês - de férias! Todavia, ao retomar a publicação de textos no blogue esperava-me o vazio. As ideias esvaiam-se, as palavras teimavam em não se perfilar, e os textos resistiam à sucessão das linhas, tornando a escrita de umas poucas linhas num extenuante parto semanal. Teimoso, lutei contra ele ainda durante quatro meses - de setembro a dezembro - período ao fim do qual tive que parar. Enquanto a transição do escrever por prazer para o escrever por obrigação fora suportável - deixando até um certo sabor a "dever cumprido" - não consegui persistir quando se tornou, afinal, num enorme sacrifício. Parei, sem data de regresso marcada.
Seis meses de silêncio fizeram-me bem. Tive tempo para trabalhar algumas ideias sem pressa de as apresentar. Tive tempo para, simplesmente, saborear as sessões de Loja sem a preocupação de procurar tema para os textos seguintes. Tive, por fim, tempo para consolidar o que fora apreendendo, para colocar em prática as conclusões a que fui chegando, e para me avaliar em face dos meus propósitos. Pude identificar o que preciso de trabalhar a seguir, as falhas que devo corrigir, as lacunas que devo suprir com mais estudo. E, fruto talvez deste serenar, recobrei a vontade de escrever. Vamos ver quanto dura.
Paulo M.
4 comentários:
Estimado Paulo M.;
É bom te-lo de novo aqui no blogue, o silêncio, mesmo na palavra escrita, é também ele uma fonte de aprendizagem, quer para quem lê, quer para quem escreve.
O ato da construção do verbo deve sem dúvida ser feito com prazer e ação sentidamente vivida, fazer por fazer, dizer/escrever só por dizer/escrever e apenas marcar presença, nem sempre traz sentido e ou gera mais-valia para quem ouve/lê.
Paulo M. fico expectante pela edificação das suas construções escritas, consciente da qualidade reconhecida que do passado ficou registada.
Bem-haja.
M.A.
Paulo M.
Todos necessitamos do nosso "tempo".
Agora é tempo de escreveres.
Cá estamos para te lêr.
A3raço
JPA
"Ainda ontem pensava que não era mais do que um fragmento trêmulo sem ritmo na esfera da vida. Hoje sei que sou eu a esfera, e a vida inteira em fragmentos rítmicos move-se em mim. Eles dizem-me no seu despertar: 'Tu e o mundo em que vives não passais de um grão de areia sobre a margem infinita de um mar infinito.' E no meu sonho eu respondo-lhes: 'Eu sou o mar infinito, e todos os mundos não passam de grãos de areia sobre a minha margem.' Só uma vez fiquei mudo. Foi quando um homem me perguntou: 'Quem és tu?' - Gibran Khalil Gibran
Paulo M.´.
Que grato retorno! É muito bom relê-lo.
Não me abstenho de revelar o bem fazer que suas reflexões insuflam em minha´lma.
Amplio, mui sinceramente, este singelo depoimento a todo o "A Partir Pedra".
Após minha In.´. (Sim! finalmente - no dia 26 de maio - me veio a honra de receber a Luz), todos os textos passaram a fazer um sentido que até então me escapava.
Ora! É claro que havia entendimento (pelo intelecto) mas era algo de rudimentar (ainda mais pelo espírito).
O "A Partir Pedra", portanto, firma-se (pois já profanamente já o era)como uma importante extensão de minhas instruções para minha caminhada na senda M.´.
Meus sinceros e profundos agradecimentos a vós meus I.´.
À Glória do Grande Arquiteto do Universo.
Então força @Paulo...partilhe essa luz que com o aproximar de Sirius, contém em si,o poder de elevar e iluminar a todos aqueles que a procuram.
Venham esses textos.
Nuno
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