11 agosto 2008

Sobre o Grande Arquitecto do Universo

A G D G A D U

Ao meu ultimo post, Desfazendo uma confusão responderam com perguntas dois leitores assíduos deste blog. Um deles mais “perguntador” e algumas vezes mais “provocador”, outro mais leitor e que de vez em quando arrisca a escrever.

O Mês de Agosto é mesmo para isso, os leitores perguntam e eu respondo. Por isso aqui vai.

Pergunta-nos Simple:

“Aproveito a dúvida do "Anónimo" quanto à crença no Grande Arquitecto para colocar uma questão - para variar, daquelas "simples"...
Existem várias concepções possíveis de "Grande Arquitecto", que podem variar em diversas dimensões. Podem ir de um pessoalíssimo e proverbial "velho de barbas" a uma essência cósmica pouco definida, impessoal e pouco preocupada connosco. Há quem o considere Uno, Trino, ou mesmo que há Múltiplos Grandes Arquitectos - ou, ainda, um mesmo com várias "faces". Há quem O considere uma fonte de moralidade e de regras de comportamento para nós, e quem entenda que "Criador" e "Pastor" são coisas distintas, pelo que, uma vez criados (ou evoluídos...) estaríamos entregues a nós mesmos sem reportar a ninguém. Há quem acredite no Bem, na Ética, na Moral, mas que não considere, forçosamente, que os mesmos emanem de uma qualquer "divindade". Há quem espere um Paraíso com anjinhos barrocos a tocar lira, e quem entenda que o único "céu" que nos espera são as tripas de uma minhoca.
Já vi caracterizar o Grande Arquitecto como o Deus das religiões monoteístas - mais especificamente, das religiões ditas "do Livro" (Judaísmo, Cristianismo e Islamismo), eventualmente e com algum esforço englobando outras religiões, eventualmente politeístas, ou mesmo o Budismo, cuja crença não passa forçosamente (tanto quanto alcança a minha vasta ignorância a este respeito) pela fé na existência de um Ente superior.
Já sei que ser "humanista" não vale, pois muitos daqueles que assim se definem são considerados "ateus" ou "agnósticos" - e o GOL estará cheio deles, e na GLLP não haverá nenhum. Onde está, afinal, a linha divisória? Ou é tudo um certo "gradiente de cinzentos"?
Deve haver uma definição algures, ou haver um Landmark - ainda mais tão fracturante - sobre algo que não se define parece-me esquisito... a não ser que esteja subentendido.
Quererá o José Ruah deitar alguma luz sobre este assunto?
Um abraço,
Simple


Respondo eu:

Quando uma regra tem muitas excepções, então não é regra. Ensinou-me um Eng. Informático de grande gabarito que nestes casos em vez de tratar as excepções é necessário alterar a regra. E isso faz-se subindo um ou mais níveis de abstracção de maneira a englobar todas as excepções na regra. E se ainda persistirem casos não tratados, subimos mais um nível.

Aqui e para responder à questão posta por Simple no seu comentário, aplica-se este ensinamento. Nele, comentário, são referidas inúmeras possibilidades, às quais contraponho – Grande Arquitecto do Universo.

Esta abstracção a que a Maçonaria chegou, engloba essas noções todas. Esta abstracção é o máximo do simbolismo. Nela cabem todos os exemplos.

E o curioso é o raciocínio parte da Abstracção máxima, logo do modelo simples, para as excepções e para a complicação. O caminho é o inverso!

Não existem várias concepções possíveis de Grande Arquitecto, a concepção em si é única e logo englobante.

Existem sim, várias representações do Grande Arquitecto, e essas são tantas quantos os crentes. Ou seja cada um de nós ao ser crente tem a sua representação do Grande Arquitecto, evidentemente marcada e definida pela nossa, a de cada um, origem, religião, cultura e passado.

A cada candidato é feita apenas uma pergunta simples;

“ Acredita na existência de um Grande Arquitecto do Universo?”

e solicitada uma resposta simples;

“ Sim” ou “Não”

Não são solicitadas elucubrações sobre o tipo de crença do candidato.

Como se pode perceber a Maçonaria, com sua secular existência alicerçada na milenar experiência dos homens, atingiu graus de abstracção tão elevados que se permite ter uma regra simples que engloba todas as complicações dos homens.


Um segundo comentarista, David, tem a mesma dúvida na essência, formulada de maneira distinta.

Pergunta ele:

“O seguinte é tirado das 12 regras da GLLP:
"1. A Maçonaria é uma fraternidade iniciática que tem por fundamento tradicional a fé em Deus, Grande Arquitecto do Universo."
O Grande Arquitecto é D.eus. Mas quem é esse D.eus designado pela GLLP ?”

Respondo eu:

Mais uma vez é necessário a abstracção. Neste caso das palavras. Os homens têm que usar palavras para expressarem as suas ideias. E as limitações do vocabulário levaram a que fosse usada a palavra DEUS.

Há que entender o contexto e não enquadrar Deus como este ou aquele conceito subjacente a uma determinada religião, mas sim como a representação figurativa de uma entidade / ente Supremo.

Aqui no 1º Landmark aparece como reforço ao conceito de Grande Arquitecto do Universo.

Temos que ter presente que a Maçonaria é essencialmente simbólica e que tudo deve ser lido com cuidado e às vezes várias vezes. Devemos sempre parar para pensar, e tentar decifrar porque razão está escrito desta maneira e não de outra. A resposta muitas vezes é a mais simples.



Como podemos ver estes dois comentadores, seguramente com origens diferentes, com passados distintos, aparecem com a mesma dúvida de base. Exactamente porque são diferentes apresentam-na de forma diversa e recebem no fundo a mesma resposta, que cada um vai interpretar de maneira distinta.

Esta diversidade de maneiras de ver é o que existem dentro de uma obediência. O conceito Uno de Grande Arquitecto do Universo é a “ferramenta” que permite que todas as “diversidades” sejam respeitadas por igual.

José Ruah

7 comentários:

Nuno Raimundo disse...

BoAS...

hoje por sorte tive contacto com a internet ( pois no sitio onde estou de vacances esta "tecnologia" ainda não chegou lá) e aproveitei para me manter a par das actualizações do Blog.
E reparo que tenho perdido nestes dias a habitual e salutar discussão que por aqui abunda.
Aproveitei então para desvanecer as minhas "habituais" dúvidas com mais um comentário pertinente do ºSimple.

Abraços Profanos e de vacances...

Até Breve!

Jose Ruah disse...

@Nuno_R

Já estava a sentir a sua falta !!!

Boas férias

Paulo M. disse...

@José Ruah:
Não pretendo ser "provocador", apesar de as minhas perguntas assim poderem ser interpretadas. Apenas pretendo provocar... o surgimento de uma resposta! Já percebi que esta será difícil de obter, pelo que vou tentar outra via.

No novo (novíssimo!) site da RLMAD aparece a expressão "MAÇONARIA UNIVERSAL, DEÍSTA E REGULAR".

Segundo o artigo sobre deísmo na Wikipedia, "Deism is the belief that a supreme god exists and created the physical universe, but does not intervene in its normal operation. (...) That is in contrast to fideism which is found in many forms of Christianity, Islamic and Judaic teachings, which hold that religion relies on revelation in sacred scriptures or the testimony of other people as well as reasoning.".

Longe de pretender estabelecer o "Dogma da Infalibilidade da Wikipédia", pergunto: o conceito descrito é o mesmo que é referido no site da RLMAD e referente à Maçonaria?

A simples crença num "princípio de tudo" pareceu-me insuficiente e, acima de tudo, inconsistente com o (ainda pouco) que vou conhecendo da Maçonaria Regular. Procurei mais e, graças ao Google, dei com um texto donde consta esta "pérola" (no sentido de que parece ir ao encontro do que eu pretendia perguntar):

"An examination of the the degrees will reveal that there is a basic theology of Masonry, as follows:
- There is a Supreme Being
- Who created the Universe,
- Who has established and revealed a moral law,
- And to Whom we must give account
- in a life after this."


Encontrei, ainda, uma interessante discussão sobre o assunto.

Os pontos acima encontram-se muito mais próximos da concepção que tenho do Grande Arquitecto - e não me refiro à minha concepção pessoal, mas à do próprio "conceito agregador", se assim lhe quisermos chamar.

O José Ruah respondeu:
A cada candidato é feita apenas uma pergunta simples; “Acredita na existência de um Grande Arquitecto do Universo?” e solicitada uma resposta simples; “Sim” ou “Não”

Diz, ainda, que "Esta abstracção a que a Maçonaria chegou, engloba essas noções todas. Esta abstracção é o máximo do simbolismo. Nela cabem todos os exemplos."

O meu nome aqui no blogue trai a minha atracção pela simplicidade. Contudo, há a este respeito uma frase que me é muito querida: "For every complex problem, there is a solution that is simple, neat, and wrong." (Henry Louis Mencken)

Ultrapassado determinado ponto, o excesso de simplificação - neste caso, de generalização - pode atirar-nos para o campo do errado, por passarem a estar abrangidos conceitos que ultrapassam o pretendido.

Deixe-me ser advogado do diabo só por um bocadinho.

Suponhamos que aparece alguém, candidato a maçon, que acredita que o nosso Universo foi criado por uma raça muito avançada de extra-terrestres que, entretanto, se extinguiram.

Para essa pessoa, os "arquitectos do universo" seriam os tais extintos bicharocos - o que professaria sem reservas. Cumulemos que essa pessoa fosse livre e de bons costumes, e demais requisitos necessários.

Poderia tal indivíduo ser admitido na maçonaria regular?

A minha sensibilidade diz-me que não pois, apesar de estar cumprido, à letra, o descrito pelo José Ruah, não estaria cumprido o espírito do pretendido pela regra de regularidade. Ou, como comentava alguém na discussão que referi, "Perhaps we need to examine why Freemasonry requires a belief in a Supreme Being? Perhaps lied buried in the answer to that is the key (...)"

Os cinco princípios descritos mais acima parecem-me mais certeiros na delimitação da fronteira - por não englobarem crenças como a que acabei de descrever - do que a mera referência a um conceito que não se explica.

Estarei a pensar mal? Ou partilhará o José Ruah do meu entendimento?

E, a talhe de foice: uma troca de ideias como esta que vimos a ter é uma dessas "tais" que está proscrita em loja?

Um abraço,
Simple

P.S.: Um abraço ao Nuno_R, que anda desaparecido longe da "civilização"!

Jose Ruah disse...

Caro Simple

Se já sabe tanto para que anda a aborrecer os pobres de espirito ?

A não ser que seja a sua costela provocadora / cinica a dar horas e com isso a sua (da sua pessoa) virtude a ser tolhida pelas paixões.

Não pretendo entrar nos méritos das suas pesquisas.

Apenas lhe relembro que nem tudo pode ser lido com o valor facial. Algumas coisas têm que ser interpretadas.

Tenho eu a minha interpretação terá Simple a sua, não vou entrar sequer nessa discussão, pois ela seria estéril e inconclusiva.

Dou, no que lhe toca a si, este assunto por encerrado.

Estarei evidentemente à disposição de outros comentadores.

Paulo M. disse...

Caro José Ruah:

Eu, saber tanto?! Sobre isto só sei fazer buscas no Google e encontrar respostas contraditórias. Por isso perguntei, na esperança de que me deitasse alguma luz sobre o que fui encontrando.

Trabalho num meio no qual, por haver muita informação disponível, perguntar sem procurar primeiro é tido por preguiça. Sendo mesmo necessário perguntar-se a alguém, é costume indicar-se o que se procurou e o que se encontrou, quer como prova de que se fez o "trabalho de casa" quer para facilitar o trabalho de quem ajuda. Foi esta a única razão da menção do fruto da minha pesquisa - nem foi cinismo, nem retórica ou provocação.

Tampouco pretendo entrar em discussão ou comparar interpretações; apenas procuro factos incontroversos. A resposta que procuro pode estar, simplesmente, no enquadramento histórico da evolução do conceito (ou da subida do nível de abstracção, para usar a expressão do José Ruah) de "Grande Arquitecto do Universo" desde o século 18 até hoje, por exemplo; ou na discrepância de interpretação entre Grandes Lojas de diferentes países; ou na possibilidade de tal matéria ser, mesmo, deixada à consciência de cada um. Não sei.

Tenho para mim que a Verdade é uma virtude, e buscá-la nos torna melhores. Procuro, por isso, as melhores respostas possíveis para as minhas perguntas. Agradeço a companhia no pedaço de caminho que trilhou comigo; continuarei a procurar.

Um grande abraço,
Simple

David disse...

"Existem sim, várias representações do Grande Arquitecto, e essas são tantas quantos os crentes. Ou seja cada um de nós ao ser crente tem a sua representação do Grande Arquitecto, evidentemente marcada e definida pela nossa, a de cada um, origem, religião, cultura e passado."

Reúne-se no conceito abstracto de Grande Arquitecto do Universo, para além dos dogmas religiosos, uma sensibilidade ao divino, da mais intima que cada um dos maçons pode sentir.

Penso ter entendido.

Obrigado Sr.Ruah

David

Jose Ruah disse...

Não tem de quê, David.

Apareça sempre.