04 fevereiro 2009

Pergunta de profano


Há dias, publiquei e comentei um texto que me foi enviado por um profano, sobre Aikido e Maçonaria. Esse contacto inicial tem proporcionado a continuação de uma agradável troca de correspondência. Mais do que isso, um precioso diálogo com um profano, a propósito do que neste blogue se escreve. Precioso para mim, porque este blogue destina-se, em primeira linha, precisamente ao esclarecimento de todos sobre a Maçonaria, do que trata, do que nela se faz. Ter - como periodicamente acontece - reações de profanos, seja em comentários aos textos publicados, seja em mensagens privadas, permite-me ir aferindo da forma e da eficácia com que é atingido o propósito de esclarecimento.

Transcrevo então de uma mensagem de José Restolho, onde ele coloca uma questão muito concreta:

Penso que é importante salientar que não quero de forma alguma tornar-me inoportuno. Simplesmente vejo neste blogue um sitio de reflexão e uma fonte de grande conhecimento que ajuda a saciar esta "fome" constante de conhecimento.

Entretanto e com profunda humildade, gostaria de lhe colocar uma questão. Uma das coisas que mais é realçada na maçonaria vista de fora são os seus ritos e símbolos, sobre os quais tanto se especula (não estou a incluir as ridículas teorias da conspiração, tais como a conquista do mundo pelos maçons, terem recebido os conhecimentos dos símbolos dos extra-terrestres ou ainda serem o instrumento do diabo na terra). Visto por mim não me parece que esses símbolos e ritos existam só porque sim, ou porque gostam de fazer teatro ( tal como ja vi referido num documentário do Discovery Channel). Então a minha pergunta é a seguinte:

Serão esses símbolos e ritos "guidelines" para a viagem que cada um tem de percorrer? Será errado dizer que os significados dos mesmos ultrapassam a comparação linear e lógica deles (por exemplo, esquadro = rectidão) e que o verdadeiro significado depende de cada um, sendo resultado de uma profunda introspecção?

É importante salientar que tenho consciência do facto de ser um profano e, como tal, compreendo se não me poder responder na plenitude a esta questão.

Antes de tudo, esteja José Restolho descansado que a resposta em nada fica limitada pelo facto de quem inquire ser profano, isto é, não maçon. Como acima referi, este blogue destina-se, em primeira linha, a propiciar o esclarecimento dos não maçons em relação à Maçonaria. Por outro lado, a matéria questionada em nada interseta matéria que possa estar coberto pelo chamado segredo maçónico - e que eu já tive oportunidade de mencionar que é muito mais restrito, simples e justificado do que normalmente se pensa: ver aqui.

A questão colocada permite resposta simples e direta: quanto à primeira pergunta, SIM; quanto à segunda, NÃO.

SIM, os ritos e símbolos são "guidelines" para a viagem que cada um tem de percorrer. Marcos. Estações. Indicadores. O estudo dos símbolos permite a cada maçon aprofundar o seu conhecimento das matérias relativas à espiritualidade e à moral. O domínio dessa técnica permite que vá cada vez mais longe, cada vez mais fundo, designadamente dentro de si - que é o mais longínquo lugar onde cada um pode ir, acreditem! E, a algum momento dessa viagem, porventura o maçon terá a satisfação de ter conseguido obter algumas das respostas por que ansiava.

Quanto à referência a ritos, existe uma imprecisão terminológica na pergunta (rito, ritual) que fica esclarecida, creio, com a leitura deste texto. Mas assentemos, por agora, que a execução do ritual é mais uma forma de colocar símbolos perante os maçons.

NÃO. Não é errado dizer que os significados dos símbolos ultrapassam a comparação linear e lógica deles e que o verdadeiro significado depende de cada um, sendo resultado de uma profunda introspeção. Também por esta via tem sentido e significado a designação de Maçonaria Especulativa. Especulativa também porque o trabalho primordial do maçon é especular, hipotizar, analisar, tentar, errar e recomeçar, aprender, cair, levantar-se e prosseguir. Por outro lado, cada um é diferente dos demais. Tem diferente combinação de genes. Diferente história de vida. Diversas influências. Os símbolos, enquanto elementos destinados a análise, a descoberta, são, por natureza, dotados de plasticidade que permite que cada um, do mesmo ponto de partida, chegue a destinos completamente diferentes.

Rui Bandeira

03 fevereiro 2009

Bodes do Asfalto em Portugal!

Foi já há quase ano e meio que publiquei aqui no blogue um texto sobre o Moto Clube Bodes do Asfalto. No final do ano passado, recebi uma simpática mensagem do Coordenador Estadual de Santa Catarina do dito Moto Clube, Irmão W. S. B., dando-me algumas informações de atualização.

Fiquei assim a saber - e, por esta via, ficam todos os que este texto lerem a partilhar esse conhecimento - que o Moto Clube Bodes do Asfalto tem presentemente cerca de 3.000 membros, no Brasil e em mais alguns países.

Agora a designação de EBA - Encontro do Bodes do Asfalto - ficou restrita aos Encontros regionais, sendo que agora existem também os EBA-"X", que se refere aos EBA realizados por estado (EBA-SP para o Encontro relativo ao Estado de S. Paulo, por exemplo) e o EBAN, que é o Encontro Nacional. É organizado um Encontro do Bodes do Asfalto Nacional anualmente, sempre mudando-se o local de realização.

E eis a grande novidade: para o final de Setembro do corrente ano, está prevista a realização do 1.ºEBAI - Encontro do Bodes do Asfalto Internacional!

E onde? Nada mais, nada menos do que percorrendo o Caminho de Santiago, a partir de Lisboa , obviamente, até Santiago de Compostela!

Está prevista a participação de 50 casais do Brasil, em motos de 600 cc alugadas.

Votos de grande sucesso para o 1.º EBAI!

Rui Bandeira

02 fevereiro 2009

As quatro dimensões do blogue


Quem consulta a banda direita do blogue, encontra, logo abaixo do Arquivo do Blogue, um espaço designado por Textos via RSS e, nele o ícone laranja com um ponto e dois arcos de círculo, a branco, que identifica o serviço de RSS, isto é, o serviço pelo qual o internauta pode ter assinalado, no local próprio do seu explorador da Rede, um atalho para o último texto publicado no A Partir Pedra.

Logo abaixo deste espaço, encontra um outro, intitulado Textos via correio eletrónico. Neste, encontra um atalho identificado como Receba os textos do A Partir Pedra por correio eletrónico. Este atalho dá acesso direto ao serviço de subscrição, gratuita, de uma funcionalidade útil para quem nem sempre tem tempo para navegar na Rede Mundial de Computadores, mas não quer perder a possibilidade de ler todos os textos que se publicam no A Partir Pedra: o envio, por regra entre as 21 e as 23 horas (hora de Portugal Continental, TMG), de uma mensagem de correio eletrónico para a caixa de correio eletrónico do subscritor do serviço, contendo o texto ou os textos (se foi publicado mais do que um) publicados no A partir Pedra nas 24 horas antecedentes.

Logo abaixo, tem um outro espaço, denominado Assinantes por RSS e por correio eletrónico, que contém uma imagem com a indicação, atualizada, do número de subscritores destes dois serviços, relativamente ao A Partir Pedra.

Estes espaços já existem há algum tempo e têm sido objeto de apreciável interesse e utilização, por parte dos nossos leitores, particularmente o relativo à subscrição da receção dos textos publicados no A Partir Pedra por correio eletrónico. Em menos de um ano, subscreveram os dois serviços 137 interessados, dos quais 125 para a receção dos textos por correio eletrónico e 12 por RSS - números à data da publicação deste texto.

Estes serviços eram fornecidos através do norte-americano Feedburner, o qual foi adquirido, no ano transato, pelo Google. O Google decidiu agora integrar o serviço na sua gama própria, embora mantendo a designação de Feedburner. Em consequência, está a decorrer - creio que até final do corrente mês - o processo de migração da plataforma original Feedburner para a plataforma Google.

A razão de ser principal deste texto é informar os nossos leitores que procedemos hoje à migração da conta para a nova plataforma. Em princípio, e se tudo correu bem, todos as já existentes requisições de feeds e de receção dos textos por correio eletrónico migraram para a nova plataforma e os leitores aderentes continuarão a receber os feeds e as mensagens de correio eletrónico, sem perturbações e sem necessidade de qualquer atuação. Mas, se porventura alguma anomalia ocorrer, solicito que me deem conta do facto para o endereço mestreaffonsodomingues@gmail.com e tentarei ver o que se passa. Mas, no limite, qualquer anomalia será fácil e rapidamente superada através de uma nova requisição do serviço, a efetuar já para a nova plataforma (o atalho já está atualizado para o efeito).

O conjunto de ferramentas de acesso aos textos do A Partir Pedra completa-se com o espaço Seguidores - atualmente 11. Este espaço destina-se a informais quais os detentores de contas Google que decidiram obter da plataforma o seguimento de todos os textos publicados no a Partir Pedra, através do painel de acesso à respetiva conta.

Tudo isto faz com que 148 leitores do A Partir Pedra sigam este blogue sem necessidade de a ele acederem diretamente e, portanto, sem serem contabilizados pelo contador de visitas. Este dá-nos conta de visitas diárias que variam normalmente entre cerca de 150 e 250 (episodicamente, um pouco menos ou um pouco mais). Ou seja, presentemente, o A Partir Pedra chega a cerca de 300-400 leitores por esse Mundo fora.

Por nós, fazemos o que podemos para facilitar aos nossos leitores o acesso aos textos. Por isso temos um blogue a quatro dimensões: acesso direto, RSS, correio eletrónico e seguimento.

A todos o nosso muito obrigado pelo interesse e a minha garantia pessoal de que procurarei que os textos aqui publicados continuem a manter o vosso interesse. Nem sempre haverá o "suco da barbatana", mas espero que a qualidade média não vos desiluda.

Rui Bandeira

30 janeiro 2009

O cão velho, o leopardo e o macaco

Mais uma história para ler e refletir. Hoje, tem a ver com a experiência e a sabedoria que só esta traz. Como habitualmente, recebi-a por correio eletrónico, desconheço o seu autor e editei-a ao meu jeito, para publicação aqui.

Uma velha senhora foi para um safari na África e levou seu velho cão com ela.


Um dia, caçando borboletas, o velho cão, de repente, deu-se conta de que estava perdido.

Vagueando a esmo, à procura do caminho de volta, o velho cão percebeu que um jovem leopardo o tinha visto e caminhava na sua direção, com intenção de conseguir um bom almoço...

O cachorro velho pensou:

- Oh, oh! Estou mesmo enrascado !

Olhou à volta e viu ossos espalhados no chão por perto. Em vez de se apavorar ainda mais, o velho cão ajeitou-se junto ao osso mais próximo, e começou a roê-lo, dando as costas ao predador .


Quando o leopardo estava a ponto de atacar, o velho cachorro exclamou bem alto:

- Este leopardo estava delicioso ! Será que há outros por aí ?


Ouvindo isso, o jovem leopardo, com um arrepio de terror, suspendeu o seu ataque, já quase começado, e esgueirou-se na direção das árvores.

- Caramba! - pensou o leopardo, - essa foi por pouco ! O cão velho quase me apanhava!

Um macaco, numa árvore ali perto, viu toda a cena e logo imaginou como fazer bom uso do que vira: em troca de proteção para si, informaria o predador que o cão não tinha comido leopardo algum....

E assim foi, rápido, em direção ao leopardo. Mas o velho cachorro viu-o a correr na direção do predador em grande velocidade, e pensou:

- Aí tem coisa!

O macaco alcançou o felino, cochichou-lhe o que lhe interessava e fez um acordo com o leopardo.

O jovem leopardo ficou furioso por ter sido feito de parvo, e disse:

- Macaco! Sobe para as minhas costas, para veres o que acontece com quem se arma em esperto comigo!


Agora, o velho cão via um leopardo furioso, a vir na sua direção, com um macaco nas costas, e pensou:

-E agora, o que é que eu posso fazer ?

Mas, em vez de correr (sabia que suas pernas doridas não o levariam longe...), o cachorro sentou-se, mais uma vez dando costas aos agressores, fazendo de conta que ainda não os tinha visto, e quando estavam suficientemente perto para o ouvirem, o velho cão disse:

- Mas afinal onde está o raio daquele macaco? Estou a morrer de fome! Ele disse que ia trazer outro leopardo para mim e nunca mais chega!


Moral da história: não mexa com cachorro velho... Idade e habilidade sobrepõem-se à juventude e intriga. A
Sabedoria só vem com a idade e a experiência.

É o que vos deixa aqui hoje este já maduro

Rui Bandeira

29 janeiro 2009

Ainda o Movimento Pijaminha

Em 30 de setembro do ano passado, o JPSetúbal publicou aqui no blogue um texto intitulado Movimento PIJAMINHA (da treta!). Faça o favor de seguir o atalho e ir lá (re)ler, antes de continuar a ler este texto... ... ...

Já está? Então ficou a saber ou recordou-se. Quem teve o cuidado de ler os comentários ao texto, tem já todos os elementos para prosseguir a leitura deste escrito. Quem não teve, faça o favor de voltar ao atalho e ler também os comentários. Este escrito espera e não foge, entretanto... ... ... Já está? Ótimo! Estamos então todos quase devidamente enquadrados para entender plenamente o que segue. Só falta saber dos antecedentes. Mas isso resolvo já no parágrafo seguinte...

O JPSetúbal, sempre solidário, tinha recebido uma daquelas mensagens-corrente que proliferam pela Rede Mundial de Computadores, no caso sobre o Movimento Pijaminha, e inquiriu dois ou três outros elementos da Loja sobre a possibilidade desta apadrinhar a campanha e ajudá-la. Da conversa havida, resultou que era uma possibilidade a ponderar, mas que, antes de tudo, havia que investigar sobre a efetiva existência da campanha, a bondade dos seus propósitos, o real interesse dos seus objetivos, a sua relevância social - enfim, as verificações que habitualmente fazemos antes de decidirmos dar o nosso apoio a qualquer entidade ou iniciativa. O JPSetúbal encarregou-se de obter algumas informações e... logo na primeira diligência, no IPO, apanhou com um banho de água fria: não só o IPO não necessitava de pijaminhas, como não caucionava a iniciativa e, até, a considerava perturbadora dos seus serviços. Daí o texto do JPSetúbal referenciado no atalho acima.

Parecia assunto acabado. Mas alguns comentários àquele texto puseram-me o ninho atrás da orelha... O simple, embora confessando o seu ceticismo, informou da existência de um blogue do Movimento Pijaminha. Elsa Nascimento assumia-se como elemento desse movimento e também assinalava o dito blogue.

Quando alguém dá a cara, merece-me, pelo menos, o benefício da dúvida. Resolvi ir espreitar o tal blogue e ver por mim próprio. Encontrei lá este texto da assumida líder do movimento. Pareceu-me esclarecedor, mas continuei a reservar a minha opinião e decidi ir acompanhando o assunto.

Em novembro último, recebi uma mensagem dando-me conta deste comunicado de imprensa do IPO. Novo mau sinal...

Já este mês, li esta entrada no blogue do Movimento Pijaminha.

Creio já ter elementos suficientes para ter uma opinião formada.

Segundo o Movimento, este ano, apesar de afetados pela polémica, conseguiram recolher donativos que lhes permitiram distribuir 310 pijamas no Hospital D. Estefânia, 20 pijamas e 20 pares de meias na Casa da Criança de Tires e 44 pijamas e 30 pantufas e chinelos e vários pares de meias no Instituto da Sãozinha, na Abrigada, Alenquer. Não é já feita nenhuma referência ao IPO.

O IPO, por sua vez, continua a rejeitar a associação do seu nome ao movimento.

Em face das duas posições, as minhas conclusões são:

1. O Movimento terá sido iniciado por pessoas bem intencionadas, mas voluntaristas.

2. Algo inorgânico, mas desorganizado e vulnerável a entusiasmos avulsos, deu origem a mensagens eletrónicas e apelos descoordenados, utilizando o nome de Movimento Pijaminha e associando-o, indevidamente, ao IPO - o que esta instituição não apreciou nada!

3. O núcleo inicial do projeto tenta salvá-lo e fazê-lo ultrapassar a polémica e dirige a sua atividade em benefício de outras instituições que não o IPO.

4. Se na minha mente permanecem algumas dúvidas sobre a efetiva necessidade social de distribuir pijamas no Hospital público de D. Estefânia, admito que seja relevante o auxílio prestado a instituições de acolhimento de crianças.

5. As intenções dos promotores do movimento parecem ser louváveis e, pelo menos, quanto aos lares de acolhimento de crianças, são suscetíveis de suprir ou ajudar a suprir algumas necessidades reais.

6. No entanto, o "pecado original" da polémica ocorrida, afeta, talvez irremediavelmente, a "marca" Movimento Pijaminha.

Correndo o riso de dar uma opinião que me não é pedida, penso que a iniciativa tem possibilidades de ser relevante para ajudar a suprir efetivas necessidades sociais, designadamente no particular "nicho" das instituições de acolhimento de crianças, mas, para tal, necessita de fazer duas coisas:

1. ORGANIZAR-SE. ESTRUTURAR-SE. Evoluir do voluntarismo de simples boa-vontade para uma instituição particular de solidariedade social, que conquiste a confiança pública. Hoje em dia, as pessoas, de tão solicitadas, começam a ser mais seletivas na consideração dos apelos à sua solidariedade e penalizam ou não dão o apoio, que porventura seria justificado, a iniciativas que suspeitem de desorganizadas, amadoras, insuficientemente controladas e, logo, não lhes dando suficientes garantias de boa aplicação dos seus donativos.

2. SUBSTITUIR A "MARCA" MOVIMENTO PIJAMINHA POR OUTRA. Justa ou injustamente, a "marca" Movimento Pijaminha está afetada, talvez irremediavelmente, pela polémica e desconfiança. Queira-se ou não, potencia desconfianças e, logo, desmobiliza vontades de ajudar. A superação da desconfiança será porventura possível, mas implicará esforços acrescidos, que melhor aproveitados seriam na atividade central de solidariedade. Embora eu compreenda o capital afetivo que esta "marca" implicará para os promotores originais do movimento, objetivamente ela prejudica já mais do que beneficia.

Esta a minha análise, o meu juízo, a minha opinião - que ninguém pediu!

Rui Bandeira

28 janeiro 2009

Ver de fora

O texto de José Restolho sobre aikido e maçonaria alertou-me ainda para um outro aspeto digno de reflexão, que tem a ver com a forma como as organizações ou as atividades são vistas por quem está de fora. Isso releva, quer para os juízos exteriores sobre as organizações e atividades, quer para a motivação de quem ganhe interesse nelas.

Para mim, observador exterior e não particularmente interessado, o aikido era visto simplesmente como uma variante das Artes Marciais orientais. Ponto. Basicamente, defesa pessoal e capacidade de travar uma luta. Defesa e ataque. Defender-se de agressões ou golpes da modalidade, aplicar uns quantos golpes e, mais queda, menos nódoa negra, estava tudo visto. Essencialmente uma atividade física, um desporto de combate, em que a mente exerceria um papel específico ao nível da concentração, mas que, grosso modo, dependia da rapidez de reflexos e certeza, força, amplitude e agilidade de movimentos. Nunca me passou pela cabeça a vertente exposta no texto, de busca de aperfeiçoamento, de luta essencial consigo próprio, de propósito e trabalho no sentido de chegar tão perto da inantigível perfeição quanto possível.

E eu considero-me, modéstia à parte, um espírito aberto!

Similarmente, a maçonaria também possibilita que quem está no seu exterior tenha dela uma imagem errada, desfocada. Tão mais errada e tão mais desfocada, quanto mais opaca para o exterior ela for. As circunstâncias e necessidades, mas também as escolhas da maçonaria envolveram-na num véu de secretismo, de desconhecimento, que só agora, nos tempos mais recentes, e apenas pelos espíritos mais abertos, vai sendo entreaberto. Não admira, pois, que haja muita gente que tenha ideias erradas sobre a Maçonaria e faça dela um juízo que nada corresponde com a sua realidade, o seu propósito, a sua essência, a sua prática.

No limite, a culpa não é de quem faz o juízo errado, é de quem mantém as condições que propiciam uma alta probabilidade de existência de muitos juízos errados. Eu fazia um juízo errado do aikido - e, por extensão, da generalidade das Artes Marciais - por desconhecer em absoluto a dimensão que me foi mostrada por meia dúzia de linhas de um texto do aikidoca José Restolho. Bastaram meia dúzia de linhas para me dar toda uma diferente noção do alcance da prática daquela modalidade! O desconhecimento gera distância, desinteresse, desconfiança. Um pouco de conhecimento transmitido pode fazer a diferença na mudança de atitude para quem está de fora.

Isto não tem nada a ver com proselitismo. O facto de eu ter reconhecido que a imagem que tinha do aikido era imprecisa, fluida e incorreta, em face da informação obtida com a tal meia dúzia de linhas, não me vai fazer ir a correr adquirir uma calça Hakama e saltar para um tatami (para desapontamento da minha mulher, que veementemente verbera o meu sedentarismo de cinquentão...). Mas possibilita-me deixar de fazer erradas ideias, afastar preconceitos, ver e aprender e ajuizar com mais acuidade. O mesmo pode acontecer com o profano a quem é proporcionada alguma informação sobre o que é, o que faz, o que pretende, a Maçonaria.

Quanto àqueles que desejam integrar-se na Maçonaria, também não me preocupo demasiado com as suas ilusões, ideias feitas e erros de perspetiva. Como bem se pontuou no texto sobre o aikido, é curioso que quando iniciamos a prática do Aikido pensamos apenas em aprender uma arte de defesa, algo que sirva para nos defendermos. Durante a prática preocupamo-nos apenas em deitar o outro ao chão, sermos eficazes, etc. Mas então, à medida que o tempo passa, as coisas vão mudando radicalmente. Deixamos de centrar a nossa prática no “derrubar ou imobilizar o adversário”, centramo-la antes em nós, centramo-nos nos nossos defeitos técnicos e nas nossas limitações. Eis que começa a surgir o caminho que temos a percorrer. Também é, para mim, natural que quem entra na Maçonaria, não tenha uma ideia perfeita sobre os seus objetivos, o seu modo de trabalhar, etc.. E que, caminhando o caminho que lhe é apontado, acabe por trilhar vereda bem diversa da que pensava inicialmente seguir. Por isso, quando analiso um potencial candidato a ser admitido na minha Loja, preocupo-me muito pouco com o que ele pensa que é a Maçonaria e muito mais com o que a Maçonaria lhe pode dar, em que o pode auxiliar a crescer e a avançar. Interessa-me essencialmente o potencial, a disponibilidade para interagir e modificar-se. Não me interessam diamantes, lapidados ou por lapidar. Esses são primas-donas que porventura ficarão muito bem para enfeitar e para dar brilho, mas que são duros de mais para se modificarem. Não acrescentam nada , a não ser o brilho da ilusão. Nada se lhes acrescenta, porque se têm por acabados e já próximos do que julgam ser a sua perfeição possível. Interessam-me muito mais os patinhos feios que podem transformar-se em cisnes, o barro que, devidamente moldado e trabalhado, dará peça de apreciar. Não me interessam nada o que são. Interessam-me, e muito, o que podem vir a ser e se têm capacidade e potencial para tal.

Rui Bandeira

27 janeiro 2009

A Pedra Aikido

O texto sobre aikido e maçonaria que nos foi proporcionado por José Restolho suscita-me a reflexão de que é inerente à natureza humana a busca da sua própria superação individual. Será, talvez, conjuntamente com o polegar em oposição aos demais dedos e com o tamanho do cérebro, um dos fatores que contribuíram para que a espécie humana se tornasse a espécie dominante do planeta. Polegar em oposição, os restantes primatas também o têm. A capacidade cerebral é uma inegável vantagem, mas já é um produto da evolução. A vantagem competitiva da espécie humana acentua-se com a sua disposição, o seu anseio, pela busca do melhor possível. Sempre.

Esta busca da excelência, se bem repararmos, está presente em diversos setores da atividade humana. A divisa do olimpismo, altius, citius, fortius (mais alto, mais rápido, mais forte) espelha este anseio no desporto. Na ciência, a constante e persistente busca de novos conhecimentos, de novas soluções, da resolução de cada vez mais complexos problemas propiciou e propicia indizíveis progressos. Dos quais o menor dos quais não será, por exemplo, o que possibilita que o leitor esteja neste momento a ler algo que não existe, que é apenas virtual, mas que corresponde efetivamente a um pedaço do meu pensamento. Esta hoje já banal tecnologia que permite guardar, transmitir, disponibilizar, aceder, consultar, todo um manancial de informação sem suporte físico, existente apenas em energia, é algo que, há meras duas centenas de anos, seria tido por impossível, inacreditável, utopia ou bruxaria... E, no entanto, aqui está...

Também no confronto do Homem consigo mesmo (coloco H maiúsculo para significar que o Homem que aqui refiro é o elemento da espécie humana, independentemente de género, portanto, incluindo homem e mulher) esta busca da perfeição, este anseio do contínuo progresso, este desejo de superação, de ir tão longe quanto possível e mais além, existe enquanto característica inerente à nossa espécie. E manifesta-se de diversas formas, algumas podendo aparecer inesperadas.

Já várias vezes aqui escrevi que a Maçonaria é apenas um dos caminhos, das vias, para a busca da Luz, do Conhecimento, da compreensão do significado da vida e da criação, da razão última da nossa existência e do caminho que prosseguimos, enfim da essência do que somos e seremos. Nesta demanda, a Maçonaria é um dos métodos, das veredas, possíveis. Os misticismos, cristãos ou não, a via meditativa, a comunhão natural, que sei eu!, são outras pistas possíveis e utilizadas.

O texto do José Restolho iluminou-me o espírito para a evidência de que também as Artes Marciais, enquanto filosofia de vida e de busca de perfeição, se podem enquadrar neste grupo de sendeiros. No fundo, é essencialmente uma questão de Culturas, de escolha de caminhos em função das raízes e tradições e civilizações e sociedades.

Há muito que tenho por adquirida a noção de que o impulso religioso é basicamente similar em toda a Humanidade. As várias e variegadas religiões derivam das interpretações e usos e práticas particulares sobrepostas a esse impulso básico, em função das diferentes condições ambientais, sociais, civilizacionais, etc.. Por isso, sou estrangeiro, em absoluto, ao conceito de guerra, ou controvérsia, ou discussão religiosa. Porque é lutar, arrazoar, discutir em seco, em vão, sobre nada. Todos - mas literalmente todos! - falam do mesmo, apenas de formas e sob roupagens diferentes. É, pois, uma guerra, uma controvérsia, uma discussão absolutamente sem objeto, apenas com aparência de objeto... Lá diz o Povo, com toda a sua ancestral sabedoria, que as aparências iludem. Mas é apanágio do Homem (outra vez com maiúscula...) sensato, sábio, ver para além das aparências e ultrapassar as ilusões que elas proporcionam.

O texto do José restolho alargou-me a perspetiva: não é apenas o impulso religioso que é basicamente comum a toda a Humanidade. É-o, é certo, mas estando inserido num outro impulso ainda mais básico e alargado: a busca da Perfeição, da melhoria contínua, de ir mais alto, mais depressa, com mais força - e mais longe - tanto quanto se puder. Incessantemente. Em busca do inantigível, mesmo sabendo que não o pode atingir.

A Perfeição é o arquétipo de Deus. A Humanidade busca atingir a Perfeição, a Deus. Busca aproximar-se da Perfeição, de Deus. Busca obter a Perfeição, atingir a Divinização. A Maçonaria, o misticismo, as Artes marciais, em suma, a Vida, são tudo caminhos, vias, meios, ferramentas, que o Homem prossegue e usa na sua eterna demanda deste Graal. Por isso, com propriedade José Restolho aponta universalidade dos princípios que a Maçonaria (mas não só) defende.

Eis como o contributo profano ajuda o maçon. O contributo do José Restolho levou-me a ampliar o conceito do impulso de busca da Perfeição. Ao fazê-lo, ao evadir-me dos limites estreitos das crenças religiosas, ao integrar a busca da Perfeição como inerente ao impulso básico da Humanidade, consegui dar um outro salto na análise: no fundo, a ambição humana de atingir, ou de se aproximar, tanto quanto possível, da Perfeição, mostra que o Homem, afinal, é, ou projeto de Deus, ou corruptela de Deus. Ou destinado a evoluir para chegar onde pode, ultrapassando e indo além dos estreitos limites da existência desta dimensão, ou buscando recuperar de involução que o fez perder a perfeição que busca reganhar. Em qualquer dos casos, a busca da perfeição é um indispensável meio para procurar atingir ansiada integração ou reintegração.

Mais uma pedra na parede do meu Templo Individual. A esta chamarei a Pedra Aikido. Obrigado, José Restolho!

Rui Bandeira