22 novembro 2025

O Bicho Papão da IA - Inteligência Artificial

Estive há pouco tempo num workshop onde se falou muito sobre IA e aprendi ali uma lição importante. a Inteligência Artificial não substitui a inteligência humana, amplifica-a, para o bem e para o mal. Uma frase ficou-me particularmente na memória, dita por L. Skinner, um dos oradores:

“Not doing bad is not the same as doing good.”

Ou seja: não basta evitar erros; é preciso intenção, critério e propósito. Isto aplica-se que nem uma luva ao uso da IA. Ela não pensa por nós, não sente por nós e muito menos decide por nós.




A IA devolve-nos apenas a qualidade daquilo que lhe damos, se dermos pouco, devolve pouco, se dermos profundidade, devolve profundidade.

Para tentar demonstrar isto de modo claro escolhi um símbolo a nós familiar: a Coluna B. Não para explicar o tema, mas para mostrar como a IA só funciona bem quando a nossa prompt é clara, intencional e contextualizada.

Ex:1. Quando não damos contexto (resultado irrelevante)

Prompt:

“Escreve sobre a Coluna B.”

Output:

"A Coluna B é a segunda coluna de uma tabela ou folha de cálculo, usada para organizar dados e complementar a coluna A."

-  Sem contexto, a IA nem sequer sabe que estamos a falar de Maçonaria.


Ex:2. Quando damos pouco contexto (resultado vago)

Prompt:
“Escreve um parágrafo sobre o significado simbólico da Coluna B em tradições históricas.”

Output:

"A Coluna B surge em algumas tradições como símbolo de sustentação e força, marcando entradas ou momentos cerimoniais."

- Já tem mais um pouco de "sumo", mas continua longe da dimensão que pretendemos.


Ex:3. Quando dizemos que é maçónico (resultado aceitável)

Prompt:

“Explica o significado da Coluna B na Maçonaria, focando-te na sua dimensão de força moral e sustentação do Aprendiz.”

Output:

"Na Maçonaria, a Coluna B representa a força moral que sustenta o Aprendiz no início da sua jornada. Marca a passagem do profano para o trabalho interior, lembrando a necessidade de disciplina e carácter."

Já acerta, mas ainda não chega à profundidade do símbolo.


Ex4. Quando damos contexto completo (resultado verdadeiramente útil)

Prompt:

“Escreve um parágrafo profundo, historicamente fundamentado e simbolicamente rigoroso sobre a Coluna B, ou Boaz, no Rito Escocês Antigo e Aceite praticado em Portugal. Explica a sua origem bíblica no Livro de Rute, a linhagem de Boaz, a ligação ao Templo de Salomão, o significado de ‘em vigor’, as razões pelas quais os Aprendizes se sentam na Coluna do Norte e a relação com fenómenos solsticiais. Evita exageros esotéricos e privilegia uma leitura ética, histórica e humana.”

Output:

"Na Maçonaria no Rito Escocês Antigo e Aceite, a Coluna B, ou Boaz, tem raízes profundas no Livro de Rute, onde Boaz se destaca como homem justo, generoso e fiel, cuja união com Rute originou a linhagem de Jessé, David e, por fim, Salomão. É por isso que, ao erguer o Templo, Salomão nomeia a coluna esquerda como Boaz, “em vigor”, homenageando a rectidão e coragem do seu bisavô. Os Aprendizes sentam-se na Coluna do Norte porque, nos tempos operativos, ali se alinhavam para receber instrução e salário, carregando as pedras imperfeitas que iniciavam o labor. A posição a Norte relaciona-se ainda com fenómenos solsticiais, simbolizando menor luz e maior necessidade de trabalho interior. Assim, Boaz torna-se símbolo de força moral, humildade e perseverança, fundamentos que sustentam o caminho iniciático desde a Antiguidade."

-  Este nível de detalhe só é possível porque o input foi bastante claro. Mas como é lógico tem a ver com o meu input, o input (prompt) de qualquer outra pessoa, trará um resultado diferente.


Resumindo. a IA é uma grande tool, e goste-se ou não se goste veio para ficar. Ela já cá está há muito tempo, os primeiros standards da IA são de 1955 (se não me engano), o que acontece é que ela agora tem a capacidade de ser bastante mais rápida e acessivel para o comum dos mortais.

Usem-na, explorem-na e principalmente, conduzam-na. O futuro é "Human-Led, AI Powered"

Não se esqueçam, que como o malho que desbasta a pedra bruta não trabalha sem mão que o segura e que o cinzel não corrige sem intenção, A IA não produz se nós não a orientarmos.

Quando usada com critério, rigor e propósito, pode elevar, mas nunca substituir,  o trabalho do maçom. 

Não se esqueçam que na IA,  como em maçonaria, é a intenção que faz toda a diferença.

João B. M∴M∴ 

15 novembro 2025

Entre espiões, lojas e fantasmas

Andava eu a vaguear pelas internets, a ler as notícias, até que me deparei com mais um artigo de opinião a anunciar, com dramatismo as “ligações perigosas” entre maçonaria e os nossos serviços secretos. Daquelas notícias que de tempos a tempos, aparecem. Sempre com o mesmo titulo de a maçonaria exercer uma influência excessiva e colocar pessoas no topo.

Podem ler aqui

Pois bem, sejamos justos. Sim, é verdade que nós influenciamos excessivamente. Eu próprio o faço todos os dias. Influenciamos para que consigamos ser melhores, a crescer intelectualmente, a estudar mais, a trabalhar o carácter, a questionar preconceitos, e também a tentar, com maior ou menor sucesso, chegar ao dia de amanhã um degrau acima daquilo que fomos ontem, na nossa caminhada até ao nosso topo.


Se isto é influência excessiva, então assumo a culpa.

O artigo apresenta a “descoberta” de que vários responsáveis do SIS e do SIED, ao longo dos anos, passaram por lojas maçónicas, algo que, aparentemente, é notícia sempre que convém incendiar um pouco o imaginário popular. Recorda também as famosas “lojas de poder”, como a Mozart, a Mercúrio ou a Brasília, num tom entre o policial e o mitológico. Eu aqui tenho que discordar, pois a meu ver, mais poderosa que a RLMAD n5, a minha loja, não há. Mas esta é a minha humilde, mas poderosa opinião. 

O autor diz, por exemplo, que “a maçonaria atrai até os espiões” e que estas lojas tinham “objetivos estratégicos de intervenção social e política”. Acredito nesta parte de atrair espiões, penso que A maçonaria atrai pessoas curiosas, cultas, inquietas, atrai quem procura reflexão, filosofia, ética, simbolismo, camaradagem, silêncio interior e, sim, também debate civilizado.  E até aceito que se diga que debatam políticas, não partidárias, mas politicas importantes para a humanidade, filosóficas, civilizacionais, éticas e sociais, política no sentido clássico, ou seja, aquilo que molda a sociedade e o ser humano.

Agora se entre os maçons, há espiões, médicos, professores, militares, advogados, camionistas ou calceteiros… é porque somos um espelho (imperfeito) da sociedade. Nada mais. Na RLMAD, e isto talvez desiluda os mais ávidos de teorias, não há um único político, mas, nas cento e muitas lojas da maçonaria regular em Portugal, é óbvio que existirá de tudo: presidentes de câmara, secretários de estado, médicos, engenheiros, calceteiro, pedreiros e até desempregado, todos homens livres e de bons costumes.

A maçonaria não escolhe profissões, aceita pessoas.

Há também a velha tese de que a maçonaria vive num reino de sombras, reunindo-se secretamente em lugares misteriosos e maquiavélicos. Reunimo-nos discretamente, sim. Não para esconder algo obscuro, mas porque aquilo que cultivamos exige silêncio, interioridade e foco, é difícil “elevar o espírito” com jornalistas ou lives no Instagram. A discrição protege também os Irmãos da caricatura fácil, num país onde basta dizer “maçonaria” para acender fantasmas e suspeições. Se fôssemos totalmente públicos, autores como o do artigo em questão teriam matéria infinita para reduzir pessoas reais a personagens de conspiração. A discrição não oculta, preserva o essencial e evita que o trabalho humano e interior que fazemos seja transformado em ruído.

Por fim, o artigo conclui com a ideia de que, se o novo diretor do SIED for confirmado, teremos no topo das secretas portugueses vários “maçons adormecidos”. A palavra parece quase ameaçadora, “adormecidos”, como se estivessem prestes a acordar para tomar o país e em vez de Républica de Portugal, se tornasse a Maçonaria de Portugal.

O artigo é, no fundo, a velha narrativa de que a maçonaria é perigosa porque é discreta, que é poderosa porque é diversa, que influencia porque tenta educar e que tem segredos porque cultiva introspecção. Vistas pelo prisma individual de cada maçom, estas ideias até têm verdade:
- A discrição é “perigosa” porque, se se soubesse, o maçom poderia ser ostracizados pela sociedade.
- A diversidade é um poder real, o poder de escutar e aprender com mentes diferentes
- A influência existe, sim, mas é sobre nós próprios, na exigência de estudar e crescer.
- Os “segredos” não passam da nossa introspecção, que é só nossa, de mais ninguém.

A maçonaria regular portuguesa, com todos os seus defeitos e virtudes, continua a ser:

– um espaço de aperfeiçoamento,
– um laboratório de ideias,
– um lugar de tolerância activa,
– uma escola de liberdade,
– e uma comunidade de irmãos que tentam ser melhores do que eram.

Se isso incomoda, talvez o problema não esteja na maçonaria.

João B. M∴M∴ 

08 novembro 2025

Regularidade, a Geometria do Invisível

 


Numa conversa, pós um ágape regado de canhões cheios de pólvora amarela, falou-se sobre Regularidade. É um tópico onde cabem vários temas, o reconhecimento, as constituições, homens e mulheres, o que seja. Para mim, o foco da Regularidade é a crença no GADU, a Fé necessária para que possamos ser maçons.

Resumindo, a Regularidade de que falo não se escreve em papel timbrado, nem se confirma por decreto. Não nasce de um reconhecimento externo, mas sim de uma coerência interna, é o reflexo de algo que vibra no mesmo compasso da Luz, porque um homem pode ser reconhecido por todas as potências do mundo e, ainda assim, ser irregular, se o seu coração não for crente no Grande Arquitecto do Universo.

A Maçonaria, como é sabido, é uma Ordem Iniciática. E toda a iniciação é um ato de fé, não uma fé imposta, nem cega, mas lúcida. A confiança de que há sentido no invisível, ordem no caos, proporção naquilo que os olhos ainda não entendem.

Há quem lhe chame Deus, quem lhe chame Allah, quem lhe chame Javé, ou lhe chame seja o que for ou que lhe decidam chamar. Ele é o Grande Arquitecto do Universo, não é uma figura dogmática, mas o arquétipo da harmonia, o símbolo que torna o nosso trabalho espiritual possível.

É aqui que entra a fé do maçon, sem ela o juramento é apenas uma promessa dita no vazio, sem fé, o rito é teatro e o Templo é o cenário, onde o homem pode repetir as palavras, mas elas não ecoam.

Juramos porque acreditamos. Acreditamos porque reconhecemos, no silêncio do Templo, que há algo maior do que nós. Algo que escuta, que mede, que dá sentido às palavras que pronunciamos. Essa é a diferença entre um contrato e um juramento.

O primeiro vincula homens; o segundo liga almas.

Um juramento maçónico é uma aliança com o princípio da Criação, com o próprio GADU, é o instante em que o homem confia e coloca a sua palavra sob a Luz de algo superior, e meus caros isto só pode ser verdadeiro se houver fé.

Sem ela, o juramento até pode ser formal, mas nunca será sagrado. Pode ter som, mas não eco, pode ter forma, mas nunca alma.

A fé é o que liga a palavra ao espírito, é o que torna o verbo criador, o gesto vivo, o símbolo real, e dá corpo à promessa, tornando a obediência um ato de consciência, nunca de submissão.

Quando um homem jura sobre o Volume da Lei Sagrada, o que está em causa não é o livro, mas sim o que ele representa, pois é o espelho da fé, o elo entre o humano e o divino. Sem fé, são apenas palavras soltas em papel e tinta, com fé, é o alicerce da Regularidade.

A Regularidade não está na forma como seguramos o malhete, nem na ordem dos nossos rituais, mas na presença interior de quem acredita no que faz. Regular é aquele cuja palavra é verdadeira porque vem do espírito; irregular é aquele que repete palavras sem alma, que se ajoelha sem saber porquê.

Por isso, penso que um maçon sem fé é um pedreiro sem prumo, pode levantar muros, mas nunca erguer um Templo, pode trabalhar a pedra, mas não a si mesmo.

A fé é o prumo invisível da alma, e o GADU é o ponto fixo que mantém a geometria do nosso ser. Sem Ele, tudo se desfaz, tudo se relativiza, tudo perde proporção.

No fim, a Regularidade é isto: 
Harmonia entre o que o homem promete e o que o seu espírito acredita.
Harmonia entre o Templo exterior e o Templo interior.
Harmonia entre a palavra e o silêncio que a sustém.

Podem reconhecer-nos ou negar-nos, aceitar-nos ou afastar-nos, mas a verdadeira Regularidade não depende do olhar dos outros, depende apenas do GADU, que vê não o feito, mas a intenção.

A fé no GADU é a geometria do invisível.

João B. M∴M∴ 

01 novembro 2025

A honra de ser o Tesoureiro da RLMAD



O trabalho de Tesoureiro, como qualquer ofício que honra a Ordem, é começar a desbastar a Pedra Bruta. Não se trata de uma simples contabilidade fria, mas de construir a confiança mútua, que deve ser feita com o rigor de quem sabe que um erro pequeno pode comprometer o alicerce da Obra. O Tesoureiro é o guardião da integridade financeira da Loja. Servi aos Irmãos da Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues o que é uma honra e uma responsabilidade que carrego com a humildade de quem administra um legado. Esta Loja é um repositório da nossa história, e cada valor é um compromisso tecido na nossa tapeçaria. A dignidade de servir a uma coluna tão antiga exige um rigor que vai além dos débitos e créditos. 

O meu primeiro mandato de tesoureiro revelou que a Pedra Bruta do ofício exige um aperfeiçoamento constante. A gestão do fluxo de quotas, por exemplo, é um exercício que exige escrutínio. Como identificar um depósito feito sob o nome de "Joana", “Maria” ou “L&M LTD” (nomes fictícios)? O Irmão, por distração, usa uma conta de terceiro, e cabe ao Tesoureiro, o arqueólogo do recibo, ligar essa transação à identidade maçônica que lhe corresponde. Herdar a guarda do tesouro implica absorver a gestão anterior, não apenas os valores. Herdamos práticas, métodos de registo e contas de origem que precisam ser desvendadas. Reconciliar o passado com o rigor da nossa tradição exige paciência e, sobretudo, a disciplina de não trabalhar sozinho, consultando sempre a experiência dos obreiros que nos antecederam. 

O passado serve como aprendizado para o futuro, não como obstáculo. Das experiências vividas, extraí três princípios fundamentais que compartilho como aprendizagem para outros Tesoureiros:

Primeiro: A Tesouraria deve ser um sistema. Não confie na memória ou no laço afetivo; confie no registo exato. A clareza documental é o escudo da integridade.

Segundo: É imperioso que o Irmão associe o seu nome à transação para evitar mistérios. O uso de referências únicas é a ponte entre a contabilidade profana e o compromisso exigido pela Loja. 

Terceiro: É fundamental que qualquer depósito ou débito não identificado seja esclarecido o mais rapidamente possível, pois o tempo não facilita a resolução desses “mistérios”. Quanto mais cedo se procurar a origem de um valor, maiores são as probabilidades de o identificar corretamente e evitar equívocos futuros. O Tesoureiro deve, portanto, agir com prontidão, contactando os Irmãos ou cruzando informações logo que surja uma transação duvidosa, garantindo assim a lisura e o rigor exigidos pela função. A reconciliação da conta deve ser feita quase diariamente para evitar acúmulo de erros e trabalho excessivo. 

O trabalho do Tesoureiro é, em sua essência, um ato de confiança entre irmãos. É a prova concreta de que a Fraternidade se sustenta pelo compromisso material de cada um dos seus obreiros. A disciplina da conta é a expressão do respeito que dedicamos ao nosso Templo. Aos Irmãos da RLMAD, o meu profundo agradecimento pela confiança renovada. A reeleição como tesoureiro reflete o bom trabalho realizado. Continuarei a servir com propósito.