26 junho 2013

Os "Taus" não são Taus ?


É comum ouvirmos designar as três formas geométricas que decoram o corrente avental de Mestre Instalado por "Taus". Tau é a décima nona letra do alfabeto grego, graficamente muito semelhante ao latino "T". É claro que já tinha notado que as ditas formas geométricas no avental de Mestre Instalado estavam invertidas em relação à forma gráfica do Tau, apresentando o elemento vertical sobre o elemento horizontal, enquanto que na dita letra do alfabeto grego o elemento horizontal está sobre o elemento vertical. Mas confesso que não dei grande importância  ao assunto e não procurei aprofundar a razão da notada discrepância. Até que recentemente li um excelente texto de um não menos excelente e conhecedor maçom brasileiro, Kennio Ismail, publicado, já desde outubro de 2011, no seu muito elucidativo blogue No Esquadro, com o título Desvendando o "Triplo Tau".

A tese exposta nesse texto pelo Irmão Kennio Ismail é que, afinal, as ditas formas geométricas não são Taus, não têm nada que ver com essa letra do alfabeto grego, antes reproduzem algo que tem diretamente muito mais que ver com a Maçonaria, uma ferramenta utilizada pelos maçons operativos, especificamente o Esquadro T (em inglês: T-square), também designado por Régua T, ferramenta que, além de se utilizar para desenhar ângulos retos, é útil para desenhar retas paralelas.

Como se vê pela imagem de duas réguas T, também há diferença em relação à representação no avental de Mestre Instalado, não em relação à disposição dos elementos horizontal e vertical (já que, a régua T pode ser posicionada em qualquer sentido), mas em relação à dimensão e proporção do elemento vertical, sensivelmente maior na régua T que na representação no avental. 

Mas o raciocínio exposto pelo Irmão Kennio Ismail parece-me lógico: uma vez que a simbologia maçónica é inspirada na Maçonaria Operativa e nas suas ferramentas, tem mais cabimento que se considere que no avental está triplamente representada uma ferramenta do que uma letra grega...

Pontua seguidamente o referido Irmão que também o vulgarmente designado Triplo Tau do Arco Real 


não é afinal um Triplo Tau, mas sim um "T" sobre um "H", sigla de "Templum Hierosolymae", que em latim significa "Templo de Jerusalém", ou seja, o Templo de Salomão.

Esta hipótese parece-me um pouco mais rebuscada. Ou seja, considero-a possível, mas não beneficiando da simplicidade da referência direta a uma ferramenta operativa que, e a meu ver com muito peso, suporta o argumento anterior. Com efeito, entre várias explicações possíveis, a experiência mostra-nos que, na maior parte das vezes, a mais simples é a correta. É isso que me faz propender para a aceitação da tese de que as formas geométricas no avental de Mestre Instalado possivelmente representam réguas T e não Taus. Já no caso do Arco Real, a hipótese alternativa não só não tem a vantagem da simplicidade como apresenta a dificuldade de o pretenso "H" estar muito deformado, demasiado largo...

Não sou particularmente versado no Arco Real (a minha praia é o Rito Escocês Antigo e Aceite...) e assim abstenho-me de dar opinião definitiva sobre esta segunda situação. A meu ver, a melhor explanação sobre o assunto (ainda assim não conclusiva) é a que se encontra no artigo "1868 Sterling Silver Mark Master Keystone", que encontrei no também muito interessante sítio http://www.phoenixmasonry.org/, (administrado pelo ilustríssimo maçom Frederic L. Milliken) e de que traduzo a passagem mais relevante, no meu entendimento:

A Cruz de Taus, ou Cruz de Santo António, é uma cruz na forma de um Tau grego. O Triplo Tau é uma figura formada por três destas cruzes unidas pelas bases, assim se assemelhando à letra "T" sobreposta na barra transversal de um "H". Este símbolo, colocado no centro de um triângulo inscrito num círculo - ambos símbolos da Divindade - constitui a joia do Arco Real, tal como praticado em Inglaterra, onde é tão estimado que é considerado o "símbolo de todos os símbolos" e "o grande símbolo da maçonaria do Arco Real". Foi adotado nessa forma como emblema do Arco Real pelo Grande Capítulo Geral dos Estados Unidos em 1859. O significado original deste símbolo tem tido variadas explicações. Alguns supõem que ele inclui as iniciais do Templo de Jerusalém, "T" e "H", Templum Hierosolymae; outros que é um símbolo da união mística do Pai e do Filho, "H" significando Jehovah e "T", ou a Cruz, o Filho. Um autor no Moore's Magazine engenhosamente considera-o ser uma representação de 3 Réguas T, aludindo às três joias dos três Grão-Mestres (da Lenda da construção do Templo de Salomão: Salomão, Hiram, rei de Tiro, e Hiram Abif). Também tem sido dito ser o monograma de Hiram de Tiro; e outros sustentam que é apenas a modificação da letra hebraica shin, que é uma das abreviaturas judaicas do Nome Sagrado.  

Como se vê, interpretações há muitas... Quais são, nas duas situações, os significados corretos? No meu entendimento, também aqui se aplica o que eu considero dever ser a regra básica da interpretação simbólica em Maçonaria: não há significados obrigatoriamente corretos. Cada um analisará, tirará as suas conclusões, atribuirá a cada símbolo o significado que entender mais adequado. O significado correto para si é esse. O que não impede que o significado correto para outro Irmão seja outro, total ou parcialmente diferente. Nos casos referenciados neste texto, para o Irmão Kennio Ismail, os significados corretos são os que ele indica, a régua T no avental e "T" sobre "H" no símbolo do Arco Real. Quanto a mim, e no meu atual entendimento (em matéria de interpretação simbólica considero estar permanentemente em work in progress), no avental concordo estar representada triplamente a régua T, mas, quanto ao símbolo do Arco Real, ainda me mantenho ao lado da interpretação mais difundida, do triplo Tau. E daí não vem qualquer mal ao Mundo: a interpretação do Irmão Kennio Ismail é a correta para ele, a minha é a que eu acho correta para mim. E ambos, ora aqui concordando, ali debatendo, vamos percorrendo os nossos caminhos que, sendo diferentes, vão na mesma direção e têm muitos trechos comuns. 

Rui Bandeira

4 comentários:

Inexorabilidades disse...

Bom dia meu querido Ir. Rui.

O artigo de hoje é bastante interessante, sobretudo por suscitar reflexões acerca deste símbolo tão presente na Ordem. Tenho especial apreço por tudo o que nos retira da inércia e nos convida à meditação e ao exercício crítico do pensamento.

Particularmente, no entanto, em que pese concordar que o símbolo provavelmente não seja de fato a Letra Grega "Tau", nem, tampouco, um T sobre um H (alargado), acho pouco provável que seja a tal de regua em T, de fato comum entre Engenheiros (e penso, arquitetos) de nossos dias.

Contudo, em nenhum momento de nossas cerimônias há qualquer alusão a aludida régua em T. Ela não está elencada entre as ferramentas de qualquer um dos três graus estabelecidos da Ordem. E, portanto, não me parece plausível que ela só exista no avental do Mestre Instalado.

Faço referência, então, a uma explicação que ouvi do Ir. Pedro Juk, aqui do Estado do Paraná, no Brasil, de que o símbolo utilizado pelos MIs é um Prumo aposto sobre um Nivel, ferramentas simbólicas de um Companheiro Maçom, grau em que a cerimônia de instalação tem seu lugar, com a apresentação do ME, das Antigas Obrigações e Regulamentos e o Juramento como Mestre Eleito.

Fica, então, minha pequena contribuição à reflexão dos irmãos.

Fraternalmente,

André Dutra - PMI da Loja Lyceum Paranaensis, 4046 - GOB-PR.

Rui Bandeira disse...

@ André Luis F Dutra:

Prezado Irmão:

A sua argumentação é também ponderosa e a contribuição que retira do I. Pedro Juk (mais um distintíssimo e sabedor maçom, que leio com muito agrado no JB News, do I. Jerônimo Borges) também engenhosa.

Reforça-se o entendimento que constitui a minha conclusão no texto: em matéria de interpretação simbólica, não há "certo" nem "errado"; o que cada um,pelo seu raciocínio toma por acertado é que, para si, está certo.

Triplo Abraço Fraterno.

Kennyo Ismail disse...

André Luís F Dutra, sobre a régua-T, não sou eu quem digo, e sim literatura maçônica inglesa. O Prumo é emblemático do 2o. Vigilante, o Nível do 1o. Vigilante e o Esquadro do VM. Não haveria porque o VM sustentar níveis e prumos em seu avental enquanto carrega um esquadro em seus pescoço. Os "Ts" de seu avental são esquadros, mas esquadros de prancheta de delinear: "T-square".

Unknown disse...

Prezado irmão, embora os rituais das GL sejam um pouco diferentes do GO, existe uma passagem no Ritual de ap.'. que fala sobre a união do nível com o prumo, algo bem sutil, mas no contexto da explanação das joias o argumento toma força