12 dezembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXXII

Se o Grão-Mestre em exercício, após conferenciar com os Mestres e Vigilantes em particular, antes do jantar, concordar em continuar como tal no ano seguinte, alguém da Grande Loja, nomeado para esse efeito, fará o elogio, perante todos os Irmãos, da sua gestão, etc, pedindo-lhe  humildemente, para dar a Grande Honra à Fraternidade (no caso de ser um Nobre; e se não o for, dirá a "grande gentileza"), de continuar a ser o seu Grão-Mestre no ano seguinte. Então o Honorável declarará o seu consentimento, através de uma vénia ou um discurso, como desejar. Após o que, o dito delegado membro da Grande Loja, proclamá-lo-á Grão-Mestre, e todos os membros das Lojas devem saudá-lo como tal. E todos terão, então, alguns minutos para que manifestem a sua satisfação. prazer e congratulações. 

Esta Regra retoma o que já constava da Regra XXIX: previamente ao jantar, em privado, os Veneráveis Mestres e os Vigilantes de todas as lojas, isto é, os representantes de todas as Lojas decidiam sobre a continuidade ou não do Grão-Mestre em exercício; optando pela afirmativa, chamavam o Grão-Mestre em exercício e solicitavam-lhe a continuidade. Tal como no final da Regra XXIX se postulava, só após o jantar, na formal Assembleia a decisão tomada era divulgada.

É tipicamente britânico o cuidado posto na prévia definição do cerimonial: um porta-voz dos representantes das Lojas efetua análise, necessariamente elogiosa (pois se a análise do mandato do Grão-Mestre tivesse sido negativa, este não teria sido convidado a continuar), da gestão do Grão-Mestre que termina o mandato e  pede-lhe que dê à Fraternidade a Grande Honra (se se tratar de um nobre) ou a "grande gentileza" (se se tratar de um plebeu) de continuar a exercer o ofício de Grão-Mestre por mais um ano. 

Esta Regra ilustra bem uma prática que acompanha a Maçonaria ao longo de toda a sua evolução: a prática da cortesia!

A cortesia nunca passa de moda. Não é algo que já não se usa. Pelo contrário, é intemporal e sempre atual. Distingue aqueles que prezam e respeitam os seus semelhantes dos que apreciam prioritariamente a sua própria imagem e cuidam exclusivamente dos seus interesses. O maçom deve ser sempre cortês. Porque praticar a tolerância, isto é,  respeitar os outros e as suas opiniões e as suas escolhas, independentemente de concordar ou não com elas (sobretudo quando com elas não concorda) também é dedicar-lhes um tratamento correto, digno, em suma, cortês.

A Maçonaria ensina aos seus obreiros que não basta a Sabedoria e não é suficiente que àquela se junte a Força. A obra, a conduta, que aspira a aproximar-se da Perfeição tem de ser simultaneamente Sábia, Forte e Bela.  Entre algo que é sábio e forte, mas não é belo e o que, sendo sábio e forte também é belo, qualquer um escolhe a segunda opção. Ao incluir a Beleza na trindade de caraterísticas dos atos, palavras e obras merecedores do nosso esforço, a Maçonaria chama a nossa atenção para o relevo que a Estética tem em tudo o que é humano e civilizado.

Não basta estar certo, tomar a decisão acertada, seguir o caminho correto. Isso é, obviamente essencial, pois é a substância do comportamento e das escolhas desejáveis. Mas, tal como o conteúdo só o é porque está dentro de um continente, a Substância, tendo inestimável valor intrínseco, necessita de Forma. Tanto melhor se aproveita a substância quanto esta se apresentar na Forma adequada. E mais fácil, mais agradável, mais suscetível de obter a nossa preferência, é a utilização de substância que esteja dotada de uma Forma que consideramos bela, agradável.

Os maçons aprendem assim que não basta ter Razão, há que saber expô-la de forma compreensível e tão agradável, bela, quanto possível. Um Sábio que seja um Bruto não deixa de ser Sábio - mas continua a ser um Bruto! Entre o Sábio Bruto e aquele que, talvez até porventura um pouco menos sábio, menos experiente, ainda precisando de fazer um pouco de caminho para chegar onde o Bruto já está, mas que, ao contrário dele, sabe expor o seu pensamento, apresenta a sua um pouco menor sabedoria com o atavio da Beleza, é este último que será seguido, que singrará, que fará valer as suas ideias. E, no entanto, o Bruto sabe um pouco mais...

Os maçons procuram que o Sábio Bruto remova as suas asperezas e aprenda a expor a sua Sabedoria com a Força da sua inteligibilidade e a Beleza que a torna apetecível - e simultaneamente que o menos Sábio mas loquaz e elegante aprenda o que lhe falta para vir a saber o que o outro já sabe. Não lhe interessa decidir se é melhor a Sabedoria ou se o são a Força e a Beleza. Pretende juntar todas e assim obter o melhor resultado possível. Entre o Sábio Bruto e o menos sábio Convincente e Elegante, prefere deles fazer dois Sábios Convincentes e Elegantes, pois é isso que é o melhor para eles e para todos os que com eles privam...

A prática do cerimonial, o treino contínuo da cortesia, que os maçons praticam contribui para a sua melhoria no seu comportamento social. Aquele que se habitua, se treina, que dá atenção,  a comportar-se com cortesia adquire a naturalidade nesse comportamento. Consequentemente, virá a distinguir-se por esse traço, a ser reconhecido por ele, a ser mais bem considerado devido a essa sua capacidade.

Também  o hábito de ser cortês nos evita alguns erros de reação dominada pela impulsividade. Aquele que se habitua a agir com cortesia aprende a não responder desbragadamente, a moderar os seus impulsos, a agir, não sob o efeito da ira, mas racionalmente. Assim se evitam erros que se poderiam pagar caro.

Muito se enganam, pois, todos aqueles que consideram obsoletos o cerimonial e a cortesia que os maçons continuam a observar!

Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, páginas 143-144. 

Rui Bandeira

05 dezembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXXI


Depois do jantar a Grande Loja reúne, não em separado, mas na presença de todos os Irmãos, mesmo os que dela ainda não são membros, os quais, no entanto, não poderão falar exceto se autorizados e se a palavra lhes for concedida. 

Esta Regra elucida-nos que, na assembleia anual, festiva, a reunião formal da Grande Loja encerrava o dia. Com efeito, a festividade que tinha lugar pelo São João iniciava-se com uma reunião de trabalho, administrativa, onde eram resolvidos os assuntos urgentes e deliberada a continuidade do Grão-Mestre em funções ou escolhido quem iria ser apresentado para eleição formal, seguindo-se o jantar e terminando o dia com a assembleia formal, cerimonial, mas na qual era formalmente reeleito ou eleito o Grão-Mestre.

Nos dias de hoje, a refeição tomada festivamente em conjunto costuma ocorrer depois do encerramento dos trabalhos, até porque, com frequência, essa refeição é um  ágape branco, em honra das senhoras e não faria sentido que, finda a refeição, as senhoras ficassem plantadas enquanto se retomavam trabalhos...

O texto da Regra é algo enigmático, mesmo contraditório, aos olhos de hoje: a Grande Loja reúne "na presença de todos os Irmãos, mesmo os que dela ainda não são membros...". Se ainda não são membros, então não são Irmãos. Quando muito, seriam apenas candidatos... Não faz, porém, muito sentido que fossem admitidos não-iniciados na Assembleia de Grande Loja... A frase não é, seguramente, feliz, e carece de uma cuidada interpretação. Deve atentar-se que, como elucida a Regra XII, a Grande Loja era constituída pelos Mestres (Veneráveis Mestres) e Vigilantes de todas as Lojas, além do Grão-Mestre e seu Vice Grão-Mestre. Estes os membros da Grande Loja. Na sessão anual, festiva, são admitidos a assistir todos os Irmãos, todos os obreiros de todas as Lojas, mesmo que dela, Assembleia, ainda não sejam membros - isto é, mesmo que não sejam Veneráveis Mestres ou Vigilantes de Lojas e, portanto, não integrem a Grande Loja.

O interessante desta passagem acaba por ser o advérbio "ainda", porquanto mostra o que é uma vocação da Maçonaria, desde o seu início: a plena Igualdade dos seus membros e a assumida potencialidade de que todos cheguem a assumir o ofício de Venerável Mestre ou, pelo menos, o de Vigilante.

Com efeito, na Maçonaria não há distinções de qualificações ou aptidões intrínsecas. Todos, desde que minimamente interessados e participativos, têm oportunidade de assumir ofícios de crescente responsabilidade, até assegurar a direção de uma das Colunas da Loja ou mesmo a direção desta.

Na GLLP/GLRP, aliás, é condição necessária para se poder ser eleito Venerável Mestre o prévio exercício de ofício de Vigilante.

Finalmente, a Regra pontua que, no entanto, os obreiros que podem assistir à Grande Loja, mas dela não fazem parte, não podem usar da palavra (e muito menos votar, acrescento eu...). Segue-se a indicação de uma exceção um pouco bizarra: "exceto se autorizados e se a palavra lhes for concedida". Esta exceção é algo bizarra porque, mesmo os participantes de pleno direito da Grande Loja só podem usar da palavra quando para tal autorizados e a palavra lhes for concedida, sob pena de não se estar numa assembleia ou reunião, mas numa algazarra desordenada... Mais uma vez, a frase é algo infeliz e carece de cuidada interpretação. No fundo, o seu alcance é de que o direito ao uso normal da palavra (bem entendido, após concessão da mesma) se restringe aos participantes de pleno direito da Grande Loja. No entanto, excecionalmente, por qualquer razão, podia ser concedida a palavra a um obreiro não participante de pleno direito na Grande Loja.


Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 143. 

Rui Bandeira

29 novembro 2012

Que significa Huzza, Huzza, Huzza?

A pergunta que dá título a este texto, foi a mesma que um I:. da R:.L:.Fernando Pessoa, me colocou há uns tempos atrás, por ocasião da minha primeira visita à sua Loja.

Não lhe soube oferecer resposta alguma, porque, efetivamente não tinha forma de lhe responder, eu, pura e simplesmente não tinha informação suficiente para lhe responder com a assertividade que o momento exigia.

Não considero grave não saber a resposta, seria enquanto maçom, muito mais grave não saber a resposta e ignorar esse desconhecimento, portanto o que havia a fazer era trabalhar para, investir para e por fim, ter aprendido. Pareceu-me um bom móbil para escrever um artigo sobre isso.

E o texto que se segue é o fruto desse trabalho.

Assim:

Huzzé, tem origem hebraica, que pronuncia-se “Huzzá”, há mesmo várias formas de a escrever, desde Uzé, Huzzé, Houzzé e claro está Huzzá. Para os antigos árabes, Huzzá era o nome dado a uma espécie de Acácia, consagrada ao Sol, sendo símbolo da imortalidade, que significaria, “Força e Vigor”.

Exotericamente a palavra é formada por duas sílabas, que constituem a aclamação no seu todo, assim, deve ser pronunciada com voz forte, tratando-se de uma descarga para o nosso organismo e, segundo o dicionário maçónico, ao pronunciar a aclamação estamos a expulsar o “ar impuro”, mandando embora todo o negativismo que carregamos no dia-a-dia profano.

Por outro lado, Huzza! Huzza! Huzza! é uma velha aclamação escocesa que significa “Viva o Rei” e que se pronuncia “Houzé”.

Para Alberto Lantoine, Maçon e Ensaísta Francês, a palavra Huzzá, é apenas sinónimo de Hurra, aclamação vulgarmente conhecida por todos nós como, Hip, Hip, Hurra, mas acrescenta este que, há no inglês o verbo “To Huzza” que quer dizer aclamar, repare-se nas seguintes definições:

“Definition: huzza: “A shout of huzza; a cheer; a hurrah” e Specialty definition:huzza “A shout of joy; a foreign word used in writing only, and most preposterously, as it is never used in practice. The word used in our native word hoora, or hooraw.”.

Para o médico, escritor e historiador, José Castellani, a palavra é francesa, é uma aclamação e não uma exclamação, que seria usada em honra a um acontecimento feliz, quer para a Loja, quer para um I:.. Há quem sugira que a palavra foi adoptada do inglês, pelos maçons franceses, logo em inglês a sua grafia é Huzza e a pronúncia ÚZÊ, em Francês é Huzzé, com uma grafia diferente mas com uma pronúncia muito semelhante, ou seja, UZÊ.

Em hebreu por exemplo, OZA significa “força”, que por extensão significa “VIE”, tal como a palavra “Vivat”.

Nós, maçons portugueses do R:.E:.A:.A:., pronunciamos a aclamação dizendo a palavra com a vogal “a”, aberta: Huzzá! Huzzá! Huzzá!

Claro que as diferenças de pronúncia pouco importam para os maçons, pois na realidade a aclamação é mais um momento de união, que fortalece o espirito de grupo e de família que tão bem nos carateriza, onde cada um está consigo próprio e ao mesmo tempo está com todos os Irmãos. E esta união, este espírito de grupo não é, naturalmente, algo nosso, da Maçonaria, é algo de vários “mundos” e nomeadamente em desportos coletivos, já todos assistimos ao tradicional Haka da equipa de rugby da Nova Zelândia, ainda que seja uma antiga dança do povo Maori, é ao mesmo tempo um grito de incentivo para toda a equipa.

É, não mais que uma forma de potenciar a vontade coletiva do grupo, contando com o melhor desempenho possível a nível individual de cada um dos elementos que o compõem em prol do grupo.

Daniel Martins

Fontes: 

http://pt.scribd.com/doc/509839/DICIONARIO-DA-MACONARIA

http://www.samauma.biz/site/portal/conteudo/opiniao/r009uzze.html

http://www.maconaria.net/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=34

http://www.obreirosdeiraja.com.br/huzze/

28 novembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXX


Após esta conversa, os Mestres, Vigilantes e todos os Irmãos podem conversar livremente, ou entreterem-se juntos, até que o jantar seja servido, devendo cada Irmão tomar o seu lugar à mesa. 

Esta singela Regra aparenta ser desnecessária, ou mesmo sem dignidade suficiente para ser incluída no conjunto das Regras Gerais da Fraternidade. Com efeito, nada de especial, aparentemente, consigna.

Mas se a considerarmos com um pouco mais de atenção, não é tão  inútil ou fútil como aparenta, porquanto, ao inocentemente referir que, entre a reunião preparatória da Assembleia anual e a deliberação sobre a continuidade, ou não, do Grão-Mestre em funções e o Jantar Festivo, a que se seguirá a reunião pública da Grande Loja,  haverá um período de descontração, de convívio livre entre Irmãos, está também a referir o que não se pode fazer! E o que não se pode fazer é prosseguir na discussão ou comentário dos assuntos tratados na reunião preparatória ou relativos à deliberação de recondução, ou não, do Grão-Mestre em exercício.

A Maçonaria, desde a sua transformação na atual vertente especulativa que se assume como um espaço e método de aperfeiçoamento pessoal dos seus membros, incluindo-se neste conceito também a noção de escola e prática de Valores morais e correspondentes e adequados comportamentos sociais.

No seu processo de autoaperfeiçoamento, o maçom necessariamente que tem de olhar para o interior de si mesmo, de se conhecer a si próprio, mas, em simultâneo deve manter presente que o Homem é um animal social, que cada um verdadeiramente é o que é, não apenas em si e por si, mas também enquanto elemento enquadrado socialmente e socialmente interagindo. Por isso o maçom, em bom rigor, não declara ser maçom, afirma que os seus Irmãos como tal o reconhecem. O Homem não é uma ilha, não basta Ser perante si próprio apenas; o seu Ser só adquire pleno significado enquanto ator social.

Esta noção implica que o maçom permanentemente deve agir sobre si perante si, mas também perante todos aqueles com quem se relaciona. Pouco importará se alguém cultiva um coração de ouro, uma exemplar tolerância, se, por outro lado, permanece um intratável bicho-do-mato, incapaz de agir de forma a que os demais possam entrever o seu dourado coração e beneficiar da sua estimável tolerância...

A aquisição destes conceitos e, sobretudo, o adequado trabalho, em equilíbrio, nestas duas vertentes diversas, o Eu perante mim e o Eu perante os outros, não é fácil, não é algo intuitivo, inevitavelmente gera erros, recuos, hesitações, sobretudo na fase inicial de aprendizagem desse trabalho que perpetuamente se deve efetuar. Daí a absoluta necessidade do período de silêncio a que os Aprendizes e Companheiros são sujeitos - e cuja utilidade, por vezes, demora a ser entendida...

Esta singela e aparentemente inútil Regra é um afloramento de princípios de conduta social que são de evidente utilidade, não só para os maçons, como para todos os que se inserem civilizadamente na sociedade: há tempo e lugar adequados para tudo; não se deve misturar o que não deve ser misturado; os assuntos tratam-se nos lugares e momentos próprios para serem tratados.

A preparação das deliberações a assumir na Assembleia Anual tem lugar na reunião prévia. É aí que se tem de discutir o que se tiver de discutir, esclarecer o que houver para esclarecer, opinar o que cada um entenda por bem opinar. Uma vez saídos dessa reunião, não é útil, não é produtivo, não é acertado, não é socialmente adequado, continuar a discutir ou comentar, fora de local, fora de tempo, porventura na presença de quem não teve assento na reunião, os assuntos que a esta dizem respeito.

Esta atenção que os maçons cultivam, no sentido de não tratar os seus assuntos fora do local onde devem ser tratados, do tempo adequado para o fazer e apenas com a presença dos que os devem tratar, é, pelos detratores da Maçonaria, considerada como ultrajante e perigoso sigilo conspirativo. Coitados! Perdoai-lhes, senhores leitores, pois não sabem do que falam, nem sequer se apercebem de que se trata de um puro princípio de boa educação e de prática de conduta social que todos deveriam aprender e praticar desde criancinhas: que há tempos e locais próprios e adequados para tratar de tudo e que falar fora de tempo e do lugar adequado e perante quem não tem nada que ver com o assunto é, além do mais, demonstrativo de falta de educação e de desconhecimento de como as pessoas se devem comportar em Sociedade! Nem sequer se trata de sigilo versus coscuvilhice: é simplesmente boa-educação versus rudeza...

Ora vejam lá onde nos levou uma mais atenta reflexão sobre uma aparentemente insignificante Regra...

Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 143. 

Rui Bandeira

21 novembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXIX


Depois de todos esses assuntos discutidos, o Grão-Mestre e seu Vice Grão-Mestre, os Grandes-Vigilantes, ou seus representantes, o Secretário, o Tesoureiro, os Funcionários, e todas as pessoas, devem retirar-se e deixar só os Mestres e Vigilantes das Lojas para que possam discutir amigavelmente sobre a eleição do novo Grão-Mestre ou a continuidade do atual se não o tiverem feito no dia anterior. Se forem unânimes sobre a continuidade do atual Grão-Mestre, este deverá ser chamado e humildemente convidado a que honre a Fraternidade, dirigindo-a no ano seguinte. Mas só após o jantar será conhecida a decisão, pois tal só pode ser revelado como resultado do ato eleitoral. 

Esta regra regulava a tomada de decisão sobre a continuidade ou substituição do Grão-Mestre em funções. O mandato do Grão-Mestre era anual, podendo haver, sem limite, recondução do titular em exercício.

A regra da duração anual do mandato do Grão-Mestre permanece na maioria, se não na totalidade, das Grandes Lojas dos Estados Unidos da América. Na Europa e na América do Sul, os mandatos têm normalmente uma maior duração, podendo ou não haver recondução do titular e, quando a mesma é possível, podendo ou não haver limite ao número de reconduções possíveis. 

Aquando da fundação da GLLP/GLRP (então apenas GLRP), a duração do mandato  do Grão-Mestre era de cinco anos, sem possibilidade de recondução. Foi essa a duração dos mandatos do Grão-Mestre Fundador, Fernando Teixeira, e do seu sucessor, Luís Nandin de Carvalho. A partir do terceiro Grão-Mestre, a duração do mandato passou para três anos, também sem possibilidade de recondução. Assim se processaram os mandatos dos terceiro e quarto Grão-Mestres, José Manuel Anes e Alberto Trovão do Rosário. À beira do início do mandato do quinto Grão-Mestre, Mário Martin Guia, e muito por persuasão deste, foi alterada de novo a duração do mandato do Grão-Mestre, passando este a ser de dois anos, mas sendo permitida uma recondução. Sempre prudente e cauteloso, entendia Martin Guia - e obteve vencimento nesse seu entendimento - que assim se possibilitava a avaliação do desempenho do Grão-Mestre ao fim de dois anos. Se esse desempenho fosse bom, o mais natural e provável é que fosse reconduzido. Se fosse insatisfatório, seria eleito um outro Grão-Mestre e o abreviado período de exercício de funções com menos felicidade ou acerto não causaria grande mossa ou, pelo menos, causaria menor dano do que se um mandato menos bem conseguido perdurasse por quatro anos. Mário Martin Guia cumpriu assim  um primeiro mandato de dois anos, findos os quais foi reconduzido para um segundo mandato, que abreviaria em alguns meses, por vontade própria. O atual, e sexto, Grão-Mestre, José Moreno, cumpre agora o seu segundo mandato bianual.

Voltando à regra XXIX, é interessante notar como a mesma traduz bem o equilíbrio entre o poder (originário) das Lojas e o poder do Grão-Mestre. Finda a reunião preparatória sob a direção do Grão-Mestre, ele e todos os Grandes Oficiais e, mesmo, os funcionários da Obediência, retiravam-se, ficando a reunião restrita aos representantes das Lojas (Mestres - hoje, Veneráveis Mestres - e Vigilantes). Era nessa configuração restrita, e obviamente livre de pressões e constrangimentos, que era tomada a deliberação de reconduzir, ou não, o Grão-Mestre em exercício. A deliberação de recondução tinha de ser unânime. Era a manifestação do poder originário das Lojas em todo o seu esplendor! Mas, havendo deliberação unânime de recondução do Grão-Mestre em funções, este era chamado e humildemente convidado a que honrasse a Fraternidade, acedendo a dirigi-la por mais um ano. O poder originário das Lojas, uma vez escolhido por estas o dirigente máximo da Obediência, era-lhe de imediato transmitido, ao ponto de a própria solicitação de permanência em funções ser humildemente apresentada e de ser considerada uma honra para a Fraternidade que o Grão-Mestre acedesse a continuar em exercício...

Este extraordinário equilíbrio entre o Poder originário e o Poder delegado ou conferido é uma marca da Maçonaria Especulativa desde o seu início. As Lojas são, e assumem-se como tal, a fonte do Poder na Obediência. Mas, uma vez escolhido um dirigente para a Obediência, e enquanto durar o seu mandato, esse Poder é-lhe transmitido sem reservas, sendo tal evidente no próprio comportamento de absoluto respeito assumido perante o escolhido.

Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 143. 

Rui Bandeira

14 novembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXVIII


Todos os Membros da Grande Loja devem apresentar-se bastante antes do Jantar, incluindo o Grão-Mestre, ou o seu Vice Grão-Mestre, para reunirem, dirigidos por este, a fim de: 
1 - Receber qualquer Apelo devidamente apresentado, como atrás regulamentado, para que o queixoso seja ouvido, e para que o assunto seja amigavelmente decidido antes do jantar, se possível; mas se assim não for possível, deve ser adiado até que o novo Grão-Mestre seja eleito; e se não puder ser decidido após o jantar, a decisão deve ser adiada e o caso entregue a um comité especial, que deve resolver o mesmo em harmonia, relatando o resultado na Reunião Trimestral seguinte; para que o amor fraternal seja preservado. 
2 - Prevenir que qualquer querela ou diferença ocorra nesse Dia; para que nada perturbe a harmonia e o prazer dessa Grande Festa. 
3 - Analisar tudo o que diga respeito à decência e decoro dessa Grande Assembleia, para evitar qualquer indecência, mau comportamento ou promiscuidade. 
4 - Receber e considerar qualquer moção, ou matéria importante e oportuna, trazida pelos representantes das Lojas, ou seja, Mestres e Vigilantes.

No século XVIII, o que ocorria pelo S. João era a Festa Anual dos maçons de Londres e Westminster. O ponto alto, o essencial da mesma, era o Jantar de Confraternização. Antes dele, havia a reunião preparatória do mesmo. Depois dele ocorria então a Grande Assembleia formal.

A reunião preparatória do jantar anual destinava-se, como claramente resulta do texto da regra, a prevenir, tratar e resolver quaisquer pontos de conflito que tivessem surgido ou se previsse que podiam surgir, de forma a que nada ensombrasse a festividade e a preparação da mesma. Só residualmente se previa o tratamento de qualquer questão que fosse colocada pelo representante de qualquer Loja. 

Com efeito, a Festa Anual era isso mesmo, uma festividade. Os assuntos substantivos que devessem ser decididos pela Grande Loja deviam ser, preferentemente, tratados nas assembleias trimestrais.

Presentemente, as formais Assembleias de Grande Loja são essencialmente cerimoniais e festivas, reduzindo-se a atividade administrativa ao mínimo, seja a breve apresentação dos relatórios de atividade, seja a ratificação de deliberações tomadas na sessão administrativa. Para tanto, em regra as Sessões de Assembleia de Grande Loja formais são precedidas de assembleias administrativas, onde têm assento os representantes das Lojas, que, sem formalismos rituais, analisam os assuntos pendentes e tomam as deliberações pertinentes. 

Na GLLP/GLRP é também habitual fazer-se preceder as assembleias administrativas de uma sessão do Conselho dos Veneráveis, onde têm assento os Veneráveis Mestres de todas as Lojas e que, como o próprio nome indica, tem competências consultivas do Grão-Mestre. Dessa forma, o Grão-Mestre pode auscultar o sentimento dos Veneráveis Mestres das Lojas e assim preparar a assembleia administrativa tendo em conta esse sentimento, de forma a permitir uma mais rápida e eficaz deliberação dos assuntos da agenda.

Após a sessão formal de Grande Loja, por regra segue-se um ágape, sempre branco e em honra das Senhoras.

Não sendo uma regra, há a tendência de as Assembleias de Grande Loja dos solstícios terem um pendor mais cerimonial e festivo e as dos equinócios serem mais dedicadas á resolução das questões administrativas.
 
As sessões formais de Grande Loja efetuam-se em ritual de Grande Loja, sendo admitidos a participar nelas todos os maçons da Obediência, incluindo os Aprendizes e Companheiros, além dos Visitantes de outras Grandes Lojas e Grandes Orientes e representantes dos Corpos de Altos Graus. No entanto, essa participação tem essencialmente um caráter de assistência. O uso da palavra é reservado aos representantes das Lojas, aos Grandes Oficiais e aos Visitantes. O direito de voto incumbe exclusivamente aos representantes das lojas.

Mas deve ter-se presente que, se há aspeto em que a diversidade das práticas entre Obediências é mais patente, é precisamente este, da preparação e realização de Assembleias de Grande Loja. Cada Obediência, como entidade maçónica soberana que é, tem as suas regras e práticas, por vezes decorrentes de longa Tradição, que, como é evidente, são totalmente respeitadas pelas demais. Assim, os Visitantes das Grandes Lojas com quem a Obediência mantém relações fraternais, comportam-se segundo as indicações que resultam da prática da Obediência visitada.

Num aspeto, porém, verifica-se uma tendência para a homogeneidade: a entrada ritual dos Visitantes, quando ela se processe. Por regra, os Grandes Oficiais das Obediências com quem se mantém relações fraternais dão entrada na sala da sessão por ordem inversa da antiguidade da Obediência, sendo, portanto, sempre o representante da Grande Loja Unida de Inglaterra, quando presente, o último a entrar.

Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, página 143. 


Rui Bandeira

07 novembro 2012

Regras Gerais dos Maçons de 1723 - XXVII

Os Grandes Vigilantes, ou os seus Ajudantes, deverão nomear, antecipadamente, um certo número de Irmãos para servir à mesa, de acordo com que achem necessário para a execução de tal tarefa; se desejarem poderão aconselhar-se com os Mestres e Vigilantes das Lojas, sobre quais as pessoas mais capazes para tal função, e seguir as suas recomendações, mas só podem ser maçons livres e aceites, para que nesse dia a reunião seja livre e harmoniosa.

A regra XXVII insere-se num conjunto de regras que regulavam a Festa Anual dos maçons de Londres e Westminster que tinha lugar pelo S. João. No ágape integrado nessa festa apenas podiam participar maçons. Daí a necessidade de providenciar quem efetuasse o serviço de mesa, já que as vitualhas e bebidas não se movimentam sozinhas e, na época, ainda não  se praticava o conceito de repasto em self service...

Ainda hoje, nos ágapes formais, onde apenas estão presentes maçons, se procede de forma semelhante, sendo a tarefa de transportar e servir os alimentos e bebidas efetuada pelos Aprendizes da Loja, incluindo para eles próprios. Os demais comensais, Companheiros e Mestres, aguardam que os aprendizes, terminada a sua tarefa e também eles próprios já servidos, tomem o seu lugar na mesa para, então e só então, começarem a consumir os alimentos.

Desde o início da maçonaria Especulativa que é dada grande importância ao ágape anexo ás sessões, porquanto é um momento privilegiado para convívio e estabelecimento de laços fraternais. Os Aprendizes e Companheiros, que em sessão de Loja têm que respeitar a regra do silêncio, podem e devem no ágape esclarecer as suas dúvidas e emitir as suas opiniões. 

Os ágapes podem ser formais, com execução de um ritual de ágape que é tão exigente e demorado como o ritual de Loja (hoje em dia, apenas em ocasiões especiais assim se procede), normal, com um formalismo aligeirado, ou branco, aberto à participação das senhoras, familiares e amigos, sem qualquer formalismo, a não ser, quando assim se entender, a execução dos brindes rituais.

Os brindes, nos ritos ingleses, são livres (e, por vezes, muitos...). No Rito Escocês Antigo e Aceite, executam-se sete brindes rituais, podendo, após os mesmos, serem propostos brindes livres.

Os sete brindes rituais, em ágapes em que estejam presentes Grandes Oficiais em funções (não quando obreiros da Loja que sejam Grandes Oficiais estejam presentes , mas não nessa qualidade, apenas como normais da Loja, nem quando visitantes efetuem a visita a título pessoal e não como Grandes Oficiais) são os seguintes, em Portugal:

1. A Sua Excelência o Presidente da República (referindo-se o nome de quem, no momento, exerce a função).
2. A todos os Soberanos e Chefes de Estado que protegem a Maçonaria (isto é, de todos os países em que é legal e licita a prática da Maçonaria, pois a única proteção que a Maçonaria reclama dos poderes públicos é a da Lei).
3. Ao Muito Respeitável Gão-Mestre.
4. Aos Grandes Oficiais.
5. Ao Venerável Mestre.
6. Às Senhoras.
7. A todos os maçons.

Quando não estiverem presentes Grandes Oficiais em funções, mas participarem visitantes no ágape, o quarto brinde é dedicado ao Venerável Mestre da Loja e o quinto aos visitantes. Quando nem Grande Oficiais em funções nem visitantes participem no ágape, o quarto brinde é dedicado ao Venerável Mestre e o quinto aos Oficiais da Loja.

Com exceção dos dois últimos brindes, a resposta ao brinde é dada pelos maçons presentes, de pé, empunhando as suas taças e proferindo, antes de beberem um pouco: Fogo!

O brinde dedicado às senhoras é também respondido por todos de pé, mas com as palavras: Às senhoras!  

Especial significado e beleza tem o último brinde, dedicado a todos os maçons, cujo texto (podendo haver variantes, mas sempre com o mesmo objeto essencial) é: A todos os maçons que se encontrem longe de suas casas, ou afastados dos seus, em sofrimento, ou em viagem, na terra, no ar, ou no mar, desejamos-lhes um pronto restabelecimento, e o seu regresso a casa, se assim o desejarem.

A resposta ao brinde é efetuada, por todos os maçons presentes, sempre de pé e empunham as suas taças, proferindo em uníssono: A todos os maçons!.

Este brinde é realizado pelo Aprendiz mais recente que estiver presente, que se coloca de pé imediatamente por detrás do Venerável Mestre (ou do Grão-Mestre, se for este a presidir ao ágape), coloca a sua mão esquerda no ombro direito daquele, ergue a sua taça e profere então as palavras acima transcritas, ou similares.

O Venerável Mestre, ou o Grão-Mestre, pode retribuir este brinde. Levanta-se, vira-se de frente para o Aprendiz, estando este com a taça erguida, toca-a com a sua, e diz: Meu irmão, eu não sou mais que tu; de seguida tocam-se outra vez as taças, e declara: Meu irmão, tu não és menos do que eu; depois, pela terceira vez, tocam-se as taças, e profere: Meu irmão, tu e eu somos iguais: bebamos juntos. De seguida, entrelaçam os braços e bebem simultaneamente. Os maçons presentes saúdam este final com uma salva de palmas.

Que melhor encerramento dos brindes rituais podia haver?

Fonte:

Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, páginas 142-143.

Rui Bandeira