16 outubro 2008

Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 - Base XII


BASE XII

DO EMPREGO DO ACENTO GRAVE

1º) Emprega-se o acento grave:

a) Na contração da preposição a com as formas femininas do artigo ou pronome demonstrativo o: à (de a+a), às (de a+as);

b) Na contração da preposição a com os demonstrativos aquele, aquela, aqueles, aquelas e aquilo ou ainda da mesma preposição com os compostos aqueloutro e suas flexões: àquele(s), àquela(s), àquilo; àqueloutro(s), àqueloutra(s).

Esta Base, simples, curta e de fácil compreensão, consagra o uso do acento grave como se vem fazendo desde há já algum tempo, em ambos os lados do Atlântico.

Uma das dificuldades de quem está a aprender a escrita do português ou tem apenas conhecimentos básicos sobre a língua é, por vezes, distinguir, na escrita, à de (terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo haver). Sendo a pronúncia de ambas as palavras idêntica, por vezes algumas pessoas hesitam quanto à forma de exprimir graficamente uma delas. Eis um método simples e rápido de desfazer a dúvida: substituir mentalmente na frase a palavra que se tem dúvida se é à ou por existe. Se a frase continuar a fazer sentido, então está-se perante a flexão verbal do verbo haver e deve escrever-se ; se a frase não fizer sentido, então está-se usando a contração da preposição com o artigo ou pronome e deve escrever-se à.

Não tem propriamente a ver com o Acordo Ortográfico, mas recordar este pequeno truque pode ajudar-nos a superar uma dúvida repentina...

Rui Bandeira

15 outubro 2008

Teísmo


Em textos anteriores, mostrei como as versões em inglês, francês e português da Wikipedia apresentavam definições aparentemente diversas e, até, opostas, do conceito de deísmo e como, afinal, vendo-se com mais atenção todas acabavam por confluir na noção de que o deísmo "pretende enfrentar a questão da existência de Deus, através da razão, em lugar dos elementos comuns das religiões teístas tais como a "revelação divina", os dogmas e a tradição".
Esta noção de deísmo parece conter em si, como contraponto, uma noção de teísmo, ou seja, que este enfrenta a questão da existência de Deus através de elementos constantes nas religiões estabelecidas, tais como a Revelação divina, o dogma ou a tradição.
Proponho que não nos fiquemos por aqui e testemos a validade da afirmação utilizando o mesmo método com que atingimos a noção de deísmo.
Na versão em inglês da Wikipedia, define-se teísmo como (tradução livre minha) sendo, no significado mais abrangente, a crença em, pelo menos, uma divindade. Um significado mais restrito exige que a divindade em que se crê seja uma entidade distinta e identificável, assim excluindo do conceito o panteísmo. Outro significado igualmente mais restrito especifica que a divindade ou divindades deve ou devem constituir uma força imanente e ativa no Universo, assim excluindo alguns entendimentos de deísmo (já nos dois artigos sobre a matéria por mim refutados) . O teísmo pode ser dividido em diferentes categorias, como, por exemplo, monoteísmo e politeísmo.
Já na versão em francês da enciclopédia virtual, podemos ler que (ainda tradução livre minha) o teísmo (do grego theos, Deus) é uma crença ou doutrina que afirma a existência de de um Deus ou de deuses e a sua influência no Universo, tanto na sua criação como no seu funcionamento. Segundo o teísmo religioso, a relação do homem com Deus ocorre através de intermediários (a religião). Segundo o teísmo filosófico, Deus rege o Universo diretamente. O teísmo opõe-se ao ateísmo. Entre as formas de teísmo, pode-se referir o panteísmo, o monoteísmo e o politeísmo.
Por fim, atentemos no que vem escrito na versão em português da Wikipedia: Teísmo (do grego Theós, "Deus") é um conceito surgido, no século XVII (por R. Cudworth, 1678), que sustenta a crença em Deus, opondo-se ao ateísmo. Podemos dividir o Teísmo em Monoteísmo (crença em um só Deus), Politeísmo (crença em vários deuses) e Henoteísmo (composta de veneração de um Deus Supremo, mas não nega a existência de outros).
Como vemos, a confusão entre as diferentes versões da Wikipedia permanece. Neste caso, porém, nem a versão em português se salva, pois remete para uma definição de um autor do século XVII, que se revela - como iremos ver - viciada.
Quanto ao que afirma a versão em inglês, começo por fazer notar que a definição de um conceito é a enunciação das suas caraterísticas intrínsecas e distintivas das demais realidades. Não faz, pois, sentido considerar como definição do conceito, o significado geral e os particulares, ou um destes. Há que optar! A versão em inglês da Wikipedia limita-se a dar conta de diversas posições, sem optar em termos de mérito ou acerto. O que faz é despejar várias noções, incompatíveis entre si e, quem quiser, que raciocine, que escolha, que opte, que critique. Ou seja, não fornece propriamente uma definição do conceito, já que não pode constituir definição o que pode ou não pode incluir o panteísmo, o que pode ou não pode incluir o deísmo. As versões "restritas" destinam-se. manifestamente, a excluir algo com que os seus cultores não concordam que integre o conceito.
Para uns panteísmo não é teísmo. O que, se partirmos do princípio que teísmo se opõe a ateísmo, classifica os panteístas como ateus. É uma discussão antiga, mas não é peditório para que aqui se deva dar... Aqui e agora trata-se de verificar o que é teísmo, não de "decretar" se um panteísta é crente ou ateu. Esta singela constatação basta para demonstrar como a conceção "restrita" de teísmo que exclui do conceito o panteísmo está viciada de inversão: foi criada primacialmente para excluir, para considerar ateu o panteísta, não para procurar entender o conceito de teísmo. Não é uma definição - é um preconceito!
Mais grave ainda, em termos lógicos, parece ser a conceção restrita de teísmo que exclui do âmbito do conceito o deísmo (e já em textos anteriores vimos que a distinção teísmo /deísmo através da crença intervenção divina ativa no funcionamento do Universo está incorreta e é uma falácia). É que, se teísmo se opõe a deísmo, qual deles se opõe a ateísmo? Ou opõem-se ambos e então temos dois conceitos opostos mas três conceitos opostos entre si, numa espécie de oposição triangular: teísmo opõe-se a ateísmo; teísmo opõe-se a deísmo; deísmo opõe-se a ateísmo)?. Tanto basta para se verificar um salto lógico (já anteriormente denunciado) no critério "crença num Deus interventivo/ crença num Deus passivo" para definir teísmo e deísmo...
Os conceitos "restritos" oferecidos pela enciclopédia virtual em inglês não são, pois, satisfatórios. Mas também não satisfaz o conceito "abrangente2, que postula ser teísmo a crença em, pelo menos, uma divindade. É que esta definição, bem vistas as coisas, não define completamente. Esclarece-nos que teísmo é diferente de ateísmo, por isso que este pressupõe que este não crê na existência de divindade. Mas, declarando apenas o que declara, inclui no conceito o deísta. Com efeito, o deísta crê em, pelo menos, um Deus... De onde a definição não distingue o conceito de todos os outros. É incompleta. Algo mais há que lhe acrescentar. Sabemos que deísmo e teísmo partilham a crença no Divino. Falta saber em que se diferenciam.
A versão em português da Wikipedia navega nas mesmas águas, não distinguindo teísmo de deísmo.
A versão em francês desta enciclopédia também não ajuda muito! A primeira definição que fornece é exatamente a mesma que forneceu quanto a deísmo. Ou seja, para esta versão, teísmo e deísmo têm exatamente a mesma definição - apesar de serem conceitos diferentes... O disparate prossegue com a distinção entre "teísmo religioso" e "teísmo filosófico", sendo que, aparentemente, aquele considera que Deus intervém através de capatazes e este que Deus, se quer o trabalho feito, tem de o fazer ele próprio... Obviamente que não são distinções destas que nos esclarecem....
Qual então, a meu ver, a definição de teísmo que devemos considerar? Simplesmente a que decorre da sua contraposição (não oposição, note-se...) ao deísmo: Teísmo resulta da crença na existência de Deus através da fé, designadamente resultante da crença na Revelação em textos sagrados e ou nas profecias de portadores de mensagens tidas como oriundas da Divindade.
Neste sentido, as Religiões do Livro (judaísmo, cristianismo e islamismo) pretendem todas que os seus seguidores sejam teístas, isto é, sejam crentes nas Revelações das Escrituras e dos Profetas.
Esta noção é importante para analisarmos a relação entre deísmo e teísmo. Será esse o objeto de um próximo texto.
Rui Bandeira

14 outubro 2008

Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 - Base XI


BASE XI

DA ACENTUAÇÃO GRÁFICA DAS PALAVRAS PROPAROXÍTONAS

1º) Levam acento agudo:

a) As palavras proparoxítonas que apresentam na sílaba tónica/tônica as vogais abertas grafadas a, e, o e ainda i, u ou ditongo oral começado por vogal aberta: árabe, cáustico, Cleópatra, esquálido, exército, hidráulico, líquido, míope, músico, plástico, prosélito, público, rústico, tétrico, último;

b) As chamadas proparoxítonas aparentes, isto é, que apresentam na sílaba tónica/tônica as vogais abertas grafadas a, e, o e ainda i, u ou ditongo oral começado por vogal aberta, e que terminam por seqüências vocálicas pós-tónicas/pós-tônicas praticamente consideradas como ditongos crescentes (-ea, -eo, -ia, -ie, -io, -oa, -ua, -uo, etc.): álea, náusea; etéreo, níveo; enciclopédia, glória; barbárie, série; lírio, prélio; mágoa, nódoa; exígua, língua; exíguo, vácuo.

2º) Levam acento circunflexo:

a) As palavras proparoxítonas que apresentam na sílaba tónica/tônica vogal fechada ou ditongo com a vogal básica fechada: anacreôntico, brêtema, cânfora, cômputo, devêramos (de dever), dinâmico, êmbolo, excêntrico, fôssemos (de ser e ir), Grândola, hermenêutica, lâmpada, lôstrego, lôbrego, nêspera, plêiade, sôfrego, sonâmbulo, trôpego;

b) As chamadas proparoxítonas aparentes, isto é, que apresentam vogais fechadas na sílaba tónica/tônica, e terminam por seqüências vocálicas pós-tónicas/pós-tônicas praticamente consideradas como ditongos crescentes: amêndoa, argênteo, côdea, Islândia, Mântua, serôdio.

3º) Levam acento agudo ou acento circunflexo as palavras proparoxítonas, reais ou aparentes, cujas vogais tónicas/tônicas grafadas e ou o estão em final de sílaba e são seguidas das consoantes nasais grafadas m ou n, conforme o seu timbre é, respetivamente, aberto ou fechado nas pronúncias cultas da língua: académico/acadêmico, anatómico/anatômico, cénico/cênico, cómodo/cômodo, fenómeno/ fenômeno, género/gênero, topónimo/topônimo; Amazónia/Amazônia, António/Antônio, blasfémia/blasfêmia, fémea/fêmea, gémeo/gêmeo, génio/gênio, ténue/tênue.


Esta Base em nada inova relativamente ao praticado, quer em Portugal, quer no Brasil, quer nos demais países lusófonos.

Mantém o critério, que é uma das traves-mestras do Acordo Ortográfico, de prever variantes de acentuação, consoante a pronúncia de vogal seja aberta ou fechada. Em regra, havendo discrepância de pronúncias, verifica-se que em Portugal se pronuncia a vogal tónica aberta, logo, devendo ser acentuada, utiliza-se o acento agudo e que no Brasil se pronuncia a vogal fechada que, se dever ser acentuada, o é com acento circunflexo.

Palavras proparoxítonas são as palavras cuja sílaba tónica é a antepenúltima, também designadas por palavras esdrúxulas.

Esta Base é um exemplo evidente de como o texto do Acordo Ortográfico, na preocupação de ser cientificamente correto e completo, se torna de leitura árida, difícil e complicada. Com efeito, todas as previsões desta Base se podem resumir numa única frase, certamente de mais fácil entendimento do que o indubitavelmente completo, mas complexo, texto nela utilizado:

A
vogal da sílaba tónica/tônica das palavras proparoxítonas (esdrúxulas) é sempre acentuada, com acento agudo ou acento circunflexo, consoante o seu timbre é, respetivamente, aberto ou fechado nas pronúncias cultas da língua.

Bastante mais simples, não é?

Rui Bandeira

13 outubro 2008

Excalibur


Excalibur é o nome da espada do Rei Artur, na saga dos Cavaleiros da Távola Redonda. Excalibur é também o nome da Loja n.º 46 do registo da Grande Loja Legal de Portugal / GLRP.

Há dias, fiz algo que, por temperamento, opção e condições de vida, muito raramente faço: fui visitar uma outra Loja - precisamente a Excalibur. Normalmente, o meu estilo é mais bicho-do-mato, acantonado na sua toca de que, seguro e confortável, conhece todos os cantos, recantos e esconderijos. No meu caso, e no que respeita à Maçonaria, a minha toca é a Loja Mestre Affonso Domingues. Do seu espaço, por regra só saio em bando, isto é, em grupo com outros elementos, em visitas programadas, agendadas e meticulosamente preparadas. Vamos todos ou bastantes, vai a Loja e eu nela. Não vou sozinho. É assim uma espécie de vou, mas fico... Coisas de bicho-do-mato... Mas, uma vez não são vezes, estava para ali virado e, pronto, apenas acompanhado de mim mesmo resolvi aproveitar uma noite livre e ir visitar outra Loja. E lá fui à Excalibur!

Não foi tão por acaso quanto isso e quanto dou a entender no parágrafo anterior - confesso! Há uns meses tinha sido convidado para lá ir e entendi por bem declinar o convite. Pruridos meus... Na instalação do atual Venerável Mestre da Loja Mestre Affonso Domingues, a Excalibur deu-nos o prazer de estar connosco e de se fazer representar pelo elemento que me tinha dirigido o declinado convite. Mal me viu, atirou à queima-roupa: "Estás-nos a dever uma visita!" E eu lá assobiei para o lado, fingindo que não era nada comigo, mas interiormente remoendo que o atirador da frase me atingira em cheio, que a mim isto de ser devedor é coisa que me deixa com um desconforto moinhento, que não mata nem dói, mas me vai paulatinamente moendo e moendo... Fraquezas... Foi assim que lá decidi tirar as minhas tamanquinhas e lá ir saldar a minha dívida!

Não é por acaso que um dos costumes maçónicos mais apreciados é precisamente o de visitar outras Lojas. Bem o sei, mas a minha bicheza-do-mato e outros condicionalismos vão-me puxando para a raridade de tais cometimentos. O que tem a inegável vantagem de me permitir apreciar superlativamente visita que, lá de muito longe em longe, faço. Afinal de contas, aprecia-se muito mais o que é raro do que o que é corriqueiro, não é? (Façam o favor de reparar na habilidade com que me auto-justifiquei da raridade das minhas visitas, assim a modos que a deixar cair que haverá quem seja um habitué de visitas, mas eu cá sou muito mais requintado, sou um visitante gourmet que faz questão de apreciar o que é raro...).

Chegados a este quinto parágrafo, quem (ainda) me está lendo já vai sendo titilado pelo pensamento de que "hoje este tipo / gajo / fulano (considerar a opção preferida) não ata nem desata e nunca mais avança: já se percebeu que é raro ele ir visitar outras Lojas. Pronto, uma frase chega, e está este ##### (introduzir insulto favorito) para aqui a engonhar para quê?".

Eu explico: a visita à Excalibur deixou-me realmente muito bem disposto e quando eu estou neste estado de boa disposição exaltada fico como vocências podem constatar, dá-me para escrever assim ligeirinho, borboleteando texto fora sem rumo definido, escrevendo apenas pelo prazer de escrever.

A visita à Excalibur foi gloriosa! Conheci gente 5 *****, vi a Loja Excalibur trabalhar umas vezes como a minha Loja, outras fazer diferente dela (esta é uma das riquezas das visitas de maçons a outras Lojas: apreciar as semelhanças e diferenças em relação à sua), estive numa reunião interessante, bem conduzida pelo Venerável Mestre e bem trabalhada pelos Oficiais em exercício, participei num convívio que só se pode adjetivar com justiça se se usar agradável no superlativo.

Sobretudo, tive o grande prazer de ver um grupo coeso, fraterno e dedicado. Não é um grupo muito grande. A Loja Excalibur não é uma Loja com uma grande dimensão. É relativamente recente, passou por uma grande crise, de que ainda está a recuperar. E fiquei muito feliz por ver,
ao vivo e a cores, que está a recuperar muito bem, que os mais antigos da Loja saíram fortalecidos da crise e hoje transpiram confiança e satisfação por o seu esforço começar a dar frutos, e que os mais novos são elementos de apreciável valor que, a seu tempo, pegarão no testemunho e saberão prosseguir a senda de crescimento e de inovação que visivelmente a Excalibur já trilha.

As Lojas são como as pessoas: não se medem aos palmos. E a Excalibur, atesto-o, certifico-o, assino por baixo, ponho lacre e selo em branco, é UMA GRAAAANDE LOJA!!!

Percebem agora porque estou contente como um cachorrinho e me deu para esparvoar em texto ligeirinho e errante. É que não há nada que me ponha melhor do que ver os meus Irmãos bem! E, sabendo como sabia que a Excalibur tinha tido que ultrapassar uma crise e superar dificuldades não negligenciáveis, vê-la pujante, esperançosa, inovadora, só podia deixar-me com esta boa disposição toda!

E, já agora, também ficaram a perceber a sorte que têm em eu ser bicho-do-mato e só muito raramente ir visitar outras Lojas. Já viram o que era se começasse a tornar-se um hábito a boa disposição dar-me para me pôr a usar o teclado em textos como este? Não havia nem ponta de paciência para me aturar! E vocês é que ainda acabavam A Partir Pedra - para ma atirarem à cabeça....

(Bom, hoje não dá; é melhor mesmo parar por aqui, antes que o nível de disparate atinja níveis intoxicantes...!)

AH! GAND'A EXCALIBUR! FIQUEI FÃ! (Até sou capaz de vos voltar a visitar... daqui a uns anos...)

(Raio do teclado! Nunca mais para! Como é que se tiram as pilhas desta coisa? Eu bem disse que a ideia de me darem com a Excalibur na cabeça ia dar mau resultado...)

Rui Bandeira

11 outubro 2008

Se eu soubesse ...



Se algum dia eu soubesse que nunca mais te veria,
Dar-te-ia um abraço mais forte e pediria ao G.'. A.'. D.'. U.'.
Para o guardar para a ressurreição.

Se eu soubesse que seria a última vez que te via
Saindo para sempre do templo, do Ágape,
Dar-te-ia um fortíssimo T.'. F.'. A.'.
E chamar-te-ia para te dar mais um.

Se eu soubesse que seria a última vez que ouvia a tua voz
Na Palavra a Bem da Ordem,
eu gravaria cada movimento e cada palavra,
Para revê-los depois todos os dias.

Se eu soubesse que seria a última vez
Que eu poderia parar mais um ou dois minutos
Para te dizer "meu querido Ir .'. como gosto de ti"
Eu diria, ao invés de deixar que tu presumisses.

Se eu soubesse que hoje seria o último dia
A compartilhar contigo,
tenho certeza de que o sentiria muito mais intensamente
em vez de deixá-lo simplesmente passar.

Sempre acreditamos que haverá o amanhã para corrigir
um descuido e para ter uma segunda chance de acertar.

Será que haverá, sempre, um outro dia
Para expormos os nossos sentimentos?

Haverá sempre uma chance para dizer
"Meu Querido Ir.'., posso fazer alguma coisa por ti"?

O amanhã não é garantido para ninguém,
Sejam para jovens ou mais velhos,
e hoje pode ser a última oportunidade
De abraçarmos aqueles que amamos.

Então, se estamos à espera do amanhã,
Por que não agirmos hoje?

Assim, se o amanhã nunca chegar,
não teremos o arrependimento
De não termos aproveitado
um momento para um sorriso,
para um abraço, uma gentileza,
porque estávamos muito ‘ocupados'
para dar a um Ir.'. o que poderia ser o seu último desejo.

Abracemos hoje aqueles IIr.'.
Que amamos, falemos mais de perto,
se peciso for até nos seus ouvidos,
dizendo-lhes o quanto nos são caros
e que sempre os amaremos.

Encontremos tempo para dizer:

"Desculpa-me"
"Perdoa-me"
"Obrigado"
"Eu perdou-te"
"Eu adoro-te"

Meu Querido Ir.'.
Como tu és importante pra mim!

"Como é bom ter-te como Ir.'. e Amigo"

Adaptado de (autor desconhecido)

10 outubro 2008

O estropiado

Quem costuma visitar este blogue já se apercebeu que, em muitas sextas-feiras, aqui publico pequenas histórias que são pretextos ou pontos de partida para alguma reflexão. São historietas que seleciono de entre as muitas coisas que recebo por correio eletrónico, normalmente de autoria desconhecida e que eu reescrevo à minha maneira. A de hoje é um pouco diferente. Porventura a primeira reação que provocará em quem a ler será de alguma perturbação. Mas convido à leitura da história e depois se verá que caminhos de reflexão ela nos abre.

Esta é a história de um soldado que, finalmente voltava para casa, depois de ter lutado na guerra. Os pais, em sua casa, receberam dele um telefonema:


- Mãe, pai, vou voltar para casa, mas antes quero pedir-lhes um favor. Tenho um amigo que eu gostaria de levar comigo.


- Claro. Nós adoraríamos conhecê-lo também! - responderam os pais.


O filho, porém, continuou:


- Há algo que precisam de saber antes. O meu amigo foi terrivelmente ferido em combate. Pisou uma mina e perdeu um braço e uma perna. O pior é que ele não tem nenhum outro sítio para onde ir.


- Credo!!! Que tragédia, filho! Talvez possamos ajudá-lo a encontrar algum sítio para viver!


- Não, mãe, eu quero que ele possa viver connosco na nossa casa!


- Filho, não vês o que nos estás a pedir? Não tens a noção da gravidade do problema? - interrompeu o pai.


A mãe, concordando com o marido, reforçou:


- Alguém com tantas dificuldades seria um fardo para nós. Temos as nossas próprias vidas e não queremos que uma situação dessas interfira no nosso modo de viver. Acho que deves voltar para casa e esquecer esse rapaz. Ele encontrará uma maneira de viver por si mesmo!


Nesse momento, o filho desligou abruptamente o telefone e nunca mais os pais ouviram uma palavra dele.


Alguns dias depois, os pais receberam um telefonema da polícia, informando que o filho tinha morrido de uma queda de um prédio. A polícia acreditava em suicídio.

Os pais, angustiados, deslocaram-se à cidade onde o filho se encontrava e foram conduzidos à morgue para identificar o corpo. Reconheceram o seu filho e, para o seu terror e espanto, descobriram algo que desconheciam:

“O FILHO DELES TINHA APENAS UM BRAÇO E UMA PERNA!”


Este é o tipo de situação que não é fácil de analisar nem evidente tirar lição. Os pais amavam o seu filho. Não tinham qualquer ligação com o desconhecido amigo que ele mencionava. Recebê-lo-iam de bom grado... se ele fosse "normal". Mas a perspetiva de ter indefinidamente a viver com eles um estropiado não lhes era agradável. Se fosse o filho quem estivesse nessa situação, não hesitariam em acolhê-lo e prestar-lhe todo o auxílio e assistência que necessitasse e de que fossem capazes. Mas não estavam dispostos a perturbar a sua vida por causa de um estranho e da sua infelicidade. Ele haveria de resolver o problema. Ou o Estado... Ou alguém...


Podemos, em bom rigor, criticar a reação dos pais? Podemos atirar a primeira pedra? Porventura não teríamos nós idêntica reação? Não damos nós absoluta prioridade à nossa família e só na medida em que esta não seja afetada estamos dispostos a auxiliar outrem?


Por seu turno, o filho, estropiado, temendo ser um fardo insuportável para os seus pais, quis testar a reação que teriam perante a perspetiva de verem a sua vida altamente perturbada com a presença de alguém tão incapacitado e a necessidade de o auxiliar. E a confirmação da sua suspeita de que o fardo que ele iria constituir seria demasiado penoso para os seus pais levou-o ao desespero.


Agiram mal os pais? Mas não agiríamos nós também assim? Não diferenciaríamos o nosso filho de um estranho? Não estaríamos nós dispostos a fazer sacrifícios pelo nosso filho que não faríamos por um estranho?


Agiu mal o filho? Mas não agiu ele por amor a seus pais, querendo certificar-se de que não seria um insustentável sacrifício para eles lidar com um filho estropiado?


Em bom rigor, há que reconhecê-lo, quer uns, quer o outro agiram de forma natural. No entanto, o resultado foi trágico!


A lição a extrair - digo eu! - é que não basta agir de forma natural, socialmente aceite. Pessoas de bem devem elevar os padrões de exigência perante as suas próprias escolhas e ações. Porque as escolhas naturais, as que a maior parte das pessoas faria, por vezes não chegam. Se pretendemos ter um elevado sentido ético, temos de entender que a equivalente responsabilidade pelas nossas escolhas também aumenta. Não basta ser normal. Devemos procurar ser melhores do que o normal. Porque só assim podemos tornar a normalidade melhor!


Os pais agiram de uma forma que achamos normal. Mas não agiram bem. É natural que o seu amor pelo filho se sobreponha à indiferença perante um estranho. Mas... deveriam ter indiferença perante um estranho? Em especial, AQUELE putativo estranho? É claro que não podemos, ninguém pode, resolver todos os problemas de todos em todo o mundo! É claro que nos toca mais quem nos está mais próximo e nos preocupamos menos com quem desconhecemos. Mas o facto de ser manifestamente importante para o filho acolher o putativo amigo estropiado deveria alertá-los, sacudir-lhes a indiferença, predispô-los a analisar a melhor forma de ajudar quem era importante para o filho, sem prejudicar a sua família. Na história, era o filho o estropiado. Mas podia ser um amigo que tivesse assim ficado ao salvar o filho... E então haveria uma dívida de gratidão a a pagar...


O erro dos pais foi não prestar atenção ao filho, não dar importância ao que o filho sentia e pretendia, sem se questionarem sobre a razão que estaria subjacente a essa pretensão. O filho não era louco. Alguma razão deveria existir para que ele pretendesse impor um tão pesado fardo à sua família. Recusar liminarmente a possibilidade, sem sequer questionar o porquê, a motivação, foi a receita para o desastre. Os pais amavam o filho, mas não o respeitaram o suficiente para analisar COM ELE os seus motivos e o seu propósito. Se o tivessem feito, se tivessem tido o respeito suficiente pela individualidade do filho, não teriam rejeitado liminarmente a sua pretensão, mostrar-se-iam dispostos a receber, ainda que porventura numa base provisória, o putativo estropiado que tão importante era para o filho e procurariam descortinar as razões que estavam por trás do seu pedido. Se assim tivessem procedido, teriam podido VER essas razões e teriam evitado a tragédia!


Eis portanto uma importante lição que podemos tirar desta história: não basta amar os nossos filhos: temos que também os RESPEITAR. Respeitar o suficiente para não rejeitarmos liminarmente as suas escolhas, as suas pretensões, sem sequer curar de saber os motivos que subjazem a essas escolhas, a esses pedidos. Ter presente esta lição e efetivamente praticá-la pode porventura evitar uma tragédia ou simples consequências desagradáveis, em relação aos que mais amamos.


E uma segunda lição, mais genérica, será: não basta ser bom; há que ser melhor!


A Maçonaria alerta-nos constantemente para isso!


Rui Bandeira

09 outubro 2008

Ser maçon é...

...conciliar o egoísmo com o altruísmo...

Conceitos aparentemente opostos e impossíveis de harmonicamente se justaporem e operarem em simultâneo! No entanto, a natural e intuitiva conciliação entre estes dois opostos integra a essência da condição de maçon.

O maçon deve prosseguir o egoísmo de se aperfeiçoar a si mesmo, como objetivo principal. Não aperfeiçoar os outros, a Sociedade, a Loja ou seus Irmãos. Aperfeiçoar-se a si mesmo: este o verdadeiro e essencial objetivo do maçon. Nesse processo, o maçon descobre que uma ferramenta de inestimável valor é a sua interação com seus Irmãos, com eles e através deles aprendendo, intuindo, tateando, tenteando, reconhecendo e percorrendo o caminho do seu aperfeiçoamento pessoal, aqui largo e prazenteiro, ali rude e pedregoso, acolá estreitamente demarcado, mais adiante dificilmente reconhecível em suas fronteiras. E, egoística mas indispensavelmente, aproveita tudo o que pode - tudo o que deve! - do que seus Irmãos, a sua Loja, a sua Obediência, lhe proporcionam e que se revele útil para o pretendido aperfeiçoamento: uma ideia aqui, um pensamento acolá, uma lição deste, um conselho daquele, desejavelmente o exemplo de muitos, se não todos. Tudo, desde o mais brilhante artefato, ao simples resquício de uma sombra de um leve conhecimento, deve ser avaramente guardado, diligentemente aproveitado, oportunamente utilizado na construção a que cada um incessantemente se deve dedicar: a construção dele próprio, do seu caráter, do espírito livre e puro e capaz de evoluir, de pairar, de avançar para desconhecidos limites até para além do Ilimitado. E assim cada dia vai um pouco mais longe, é um pouco melhor, é, afinal, maçon!

Mas o maçon depressa aprende que, tal como os seus Irmãos são inestimável ferramenta para sua melhoria, assim também ele próprio é, por sua vez, não desprezável ferramenta para a demanda efetuada por cada um de seus Irmãos. Logo intui que, ao tirar, também põe, e é tirando e melhorando que cada vez mais põe para que outros também tirem, e por sua vez melhorem, e reponham, e lhe permitam de novo algo mais retirar, num infindável e frutuoso círculo virtuoso.

Nenhum maçon é maçon sozinho. Só se é plenamente maçon no confronto com seus Irmãos, dando e recebendo e todos assim aproveitando. O todo é, cada vez e cada vez mais, sempre superior à soma das partes. Esta inata cooperação, em que cada um gostosamente contribui para o Outro é condição indispensável para que cada um retire o seu salário da Arca da Loja - e cada vez retire mais e melhor salário.

Portanto, o maçon é altruísta como meio de prosseguir o seu egoísta objetivo de aperfeiçoamento e coloca o resultado em cada momento egoisticamente obtido ao altruísta dispor dos demais.

... viver a vida plenamente e não temer a morte...

Na demanda do Graal de cada maçon, rapidamente cada um se apercebe de que é bem mais do que mera acumulação de ossos e sangue e carne e vísceras, matéria fremente e animada, que um dia se gastará e quedará inanimada. Logo questiona a origem e a razão da existência da Vida e do Universo. E busca o seu significado. E encontra suas respostas, tendo presente e reconhecida a noção do Grande Arquiteto do Universo - do SEU Grande Arquiteto do Universo, seja o que reconhece da religião que pratica, seja o que entrevê através da sua própria Razão, em pessoal teologia, tão válida como qualquer religião instituída. E assim percebe o seu lugar na Vida e no Universo - e alcança a Paz. Paz consigo mesmo, Paz com o sentido da Vida, Paz com a perpétua evolução.

Cada maçon aprende - desejavelmente aprende, mais cedo ou mais tarde! - que a vida física, material, é apenas parte da Vida com V maiúsculo. Que o invólucro que é o nosso corpo, com suas dores e cansaços e doenças e envelhecimento e inexorável fim, é apenas isso, a vasilha que transporta e contém e protege o verdadeiramente valioso conteúdo que cada um de nós realmente TEM (que digo eu? É!), tantas vezes sem o saber, sem sequer o intuir. Conteúdo a que uns chamam alma, outros espírito, outros ainda outra coisa qualquer e que eu gosto de designar pela Centelha Divina que existe em cada um de nós, que é a razão de ser de cada um de nós e que sobrevive para além da materialidade de cada um de nós.

Ao compreender isto, o maçon entende que a vida física é parte do conceito mais abrangente da Vida (com V maiúsculo), como fator indispensável à evolução dessa Vida, por isso que existe, pois, se o não fosse, não teria razão para existir - seja-se criacionista, seja-se evolucionista, é território aprazivelmente neutro e comum a conceção de que o que não tem razão para existir, papel para desempenhar...não existe ou se, por erro ou acaso, existiu, extingue-se... Mas, sendo a vida física apenas parte da Vida (com V maiúsculo), é apenas um episódio, certamente importante, mas só um episódio. E, ao compreender isto, pode viver plenamente e em Paz esse episódio, aquilo a que chamamos a nossa vida, o tempo que nos é concedido entre o nascimento e a morte.

E, assim compreendendo, está em condições de não temer a morte física, que pode entender como mais uma Iniciação, uma Passagem, uma Elevação a um novo estádio da Vida (com V maiúsculo).

Uma obra do género designado por ficção científica, cujo título há muito esqueci e cujo autor também há muito olvidei, postulava que existia na vida da Humanidade um terrível segredo. Segredo que, algum dia, alguém descobriu e que era que, afinal, toda a Humanidade via o filme ao contrário: aquilo que temos por nascimento é afinal a morte, a degradação para o plano físico de algo mais puro e perfeito, e que aquilo que se tinha por morte é então o verdadeiro nascimento para o próximo passo da evolução da nossa Essência. Essa esquecida obra de esquecido autor será porventura mera e imaginosa caricatura. Mas não vemos nós que em toda a caricatura está, quiçá de modo deformado, o traço da realidade?

Ao entender que vale muito mais do que o seu invólucro material, o maçon aprende a viver plenamente a vida e a não temer a morte.

... viver a Iniciação em todos os dias da sua vida...

O maçon, quando iniciado, recebe lição, noções, princípios, afinal ferramentas que - muitas delas - não entendeu plenamente nessa ocasião. De algumas porventura nem mesmo se apercebeu então. Só mais tarde, revivendo a Iniciação, participando na Iniciação de outros, a pouco e pouco tudo vai entendendo e encaixando. E, fazendo-o, se bem refletir, verá que o que viveu , o que ouviu, o que sentiu, as lições que recebeu naquela ocasião são um guião de vida que deve ter sempre presente.

Se o maçon se comportar sempre de acordo com o que simbolicamente viveu na sua Iniciação, com o que ouviu, com as lições que aí recebeu, será efetivamente um Homem Livre e de Bons Costumes. Se viver de forma conforme com a lição da sua Iniciação, viverá bem, será útil a si próprio, aos outros e à sociedade. Nada mais precisa de fazer. Nada mais lhe é exigível.

No fundo, uma das coisas que é agradável na Maçonaria é a sua desarmante simplicidade: não são precisas grandes invenções, não são necessários etéreos princípios. Para se ser Digno, Justo e, tanto quanto humanamente possível, Perfeito, para aliar a Sabedoria à Força e à Beleza, para viver em Liberdade e em Fraternidade segundo os princípios da Igualdade, só é necessário proceder segundo o que aprendeu na Iniciação. E, chegada a hora, poderá pousar as suas ferramentas em Paz e com a noção do dever cumprido.

... conhecer e praticar os sinais , palavras e toques...


Não há que inventar! Está num texto que o Aprendiz deve conhecer e não se deve nudar o que está bem:

Um maçon é reconhecido pela sua forma de agir, sempre correta e franca (sinais); pela sua linguagem leal e sincera (palavras); por fim, pela solicitude fraterna que manifesta com todos a que se acha ligado pelos laços da solidariedade (toques).

É afinal tão simples ser maçon!

... Ser, simplesmente e verdadeiramente Ser - não Parecer!

O maçon, beneficiando da absorção, na sua personalidade, no seu caráter, na sua prática de vida, dos princípios que recolhe na Loja e na Fraternidade - afinal, dito mais simplesmente, aperfeiçoando-se - só precisa de Ser. Ser como é. Ser aquilo em que se transforma. Fazendo-o, vale a pena ser maçon, o salário está ganho, o objetivo é atingido.

No fim como no princípio, a noção-chave é a de aperfeiçoamento individual. Que se obtém pelo trabalho, pelo esforço, pela dedicação. Que se pratica. Que não se consegue parecer que se obteve!

Inútil é tentar "parecer" maçon. Tarde ou cedo - mais cedo do que mais tarde! - os que efetivamente são maçons reconhecem que quem quer "parecer" sem "ser" não é efetivamente um maçon. Quando muito, poderá ser um profano que passou por uma iniciação, mas não foi verdadeiramente iniciado. E esse pode continuar a tentar "parecer" à vontade. Nenhum verdadeiro maçon se incomodará com isso. Mas nenhum verdadeiro maçon o reconhecerá como tal, até que deixe de tentar Parecer e tente começar a Ser.

Rui Bandeira