Em Maçonaria, não discutimos política partidária, mas reflectimos, com a profundidade que o silêncio da Loja permite, sobre as forças que moldam a sociedade onde o Homem vive, trabalha e aperfeiçoa a sua Obra.
A greve, enquanto direito fundamental, é uma dessas forças, expressão da Liberdade, afirmação da Igualdade, busca pela Justiça. Mas, como em tudo o que é humano, também a greve pode afastar-se da sua natureza original quando o seu uso deixa de servir o Homem e passa a servir outros desígnios.
A greve geral da passada quinta-feira convida-nos a essa meditação.
Historicamente, salvo uma única excepção marcada por fortes pressões externas (pré-troika) ao País, todas as greves gerais em Portugal surgiram quando um determinado lado do espectro político se encontrava mais representado no nosso parlamento. Não é este detalhe que importa, o que verdadeiramente nos deve inquietar é a regularidade do padrão, como se a decisão de parar o Trabalho do país obedecesse mais a ritmos de conjuntura política do que à real necessidade da defesa dos trabalhadores.
E isto, a meu ver, revela algo mais profundo:
A Greve, como instrumento nobre que deveria proteger o Trabalhador parece hoje preso a mecanismos que não iluminam, antes obscurecem, interesses não dos trabalhadores, mas de quem vive à conta deles.
A greve, quando usada como ferramenta de construção, ergue pontes e corrige injustiças, mas quando se transforma em arma de sombra, perde a sua Luz.
A Maçonaria ensina-nos que nenhum direito é absoluto se não estiver equilibrado com o direito do outro. Assim, o direito à greve deve sempre coexistir com o direito ao trabalho, com o direito ao serviço público, com o direito à Harmonia Social.
Tal equilíbrio exige reflexão serena e reforma justa, e, à luz dos nossos princípios, alguns caminhos parecem naturalmente emergir:
1. Que a representação laboral brote do próprio local de trabalho, onde os Homens constroem juntos o seu caminho, e não de vínculos externos que desviam a sua voz. Que os representantes sirvam a empresa e a comunidade que conhecem, e não interesses partidários alheios ao Labor.
2. Que sejam garantidos serviços mínimos universais, porque todos os ofícios são dignos e todos os cidadãos merecem igual protecção, não penso existirem funções mais ou menos importantes, apenas funções com propósitos diferentes.
3. Que nenhuma greve seja decretada sem a voz livre, expressada por voto secreto, daqueles que a irão cumprir, para que a decisão seja justa e não imposta. Que lideres sindicais seguiam a vontade dos trabalhadores e não que lideres sindicais imponham a sua vontade (interesses) aos trabalhadores.
4. Que nenhum Trabalhador seja tocado pela força nem pela sombra da força, pois a liberdade de consciência é sagrada. E que os piquetes, que actualmente tantas vezes se transformam em instrumentos de intimidação, regressem ao seu propósito legítimo de esclarecer antes da decisão, nunca condicionar no dia da greve, sobretudo se esta foi votada livremente pelos próprios trabalhadores.
5. Que exista sempre equilíbrio entre o direito de parar e o dever de fazer continuar aquilo que a sociedade não pode deixar de sustentar. E que, nesse equilíbrio, as empresas possam assegurar a continuidade mínima do seu labor, substituindo temporariamente quem está em greve, desde que assumam as contrapartidas justas, para que a protecção do direito não se transforme em prejuízo para o todo, nem a continuidade em injustiça para quem exerce o seu legítimo protesto.
Nada disto diminui o direito à greve, pelo contrário, purifica-o, resgata-o do ruído, devolve-lhe a dignidade e reconduz-lo ao seu papel de instrumento de Justiça.
Porque, no silêncio sagrado da Loja, compreendemos que o verdadeiro Trabalho não é apenas o que fazemos com as mãos, mas aquilo que procuramos aperfeiçoar na sociedade que deixaremos às gerações que virão.
João B. M∴M∴
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