A Maçonaria NÃO É uma sociedade secreta (II)
No século XIX, o Papa Leão XII publica, em 1823, a bula "Onde Graviora" (texto em inglês aqui) que de novo condena Maçonaria como uma sociedade secreta, retomando os argumentos dos seus antecessores:
To be sure, even as the very voice of the public testifies, it has become known to Us that spreading far and wide and each day gaining strength are some societies, assemblies, meetings, gatherings, fellowships, or associations commonly called de` Liberi Muratori or Francs--Macons, or identified by whatever other designation according to the variety of idioms in which men of any religion and sect whatsoever, satisfied by a certain feigned appearance of natural honesty, are mutually united by a strict as well as impenetrable covenant according to the laws and statues established by them, and which at the same time they both secretly dedicate themselves to by a strict oath administered on the Sacred Bible, and which under the accumulation of severe penalties they are bound to conceal by an inviolable silence.
But since such is the nature of a crime, that it betrays its very self, and emits a cry as a herald of itself, on this account the societies or associations mentioned above have impressed upon the minds of the faithful a powerful suspicion to such an extent, that to enroll in these same fellowships is, before prudent and likewise approved men, absolutely the same as incurring the mark of depravity and perversion. For if they were not acting wickedly, they would never have such great hate for the light. Which voice has continually become more frequent, that in many regions the above mentioned societies have appeared for a long time to be outlawed by the secular authorities as being in adverse to the security of the realms and providentially banned.
O Papa que seguidamente volta ao assunto é Pio VIII, pela primeira vez na solene forma da Encíclica Traditi Humilitati, de 24/5/1829, que constitui o programa do seu pontificado. Encontrei o seu texto em inglês e, na parte que releva para o assunto em análise, lê-se no seu ponto 6:
When this corruption has been abolished, then eradicate those secret societies of factious men who, completely opposed to God and to princes, are wholly dedicated to bringing about the fall of the Church, the destruction of kingdoms, and disorder in the whole world. Having cast off the restraints of true religion, they prepare the way for shameful crimes. Indeed, because they concealed their societies, they aroused suspicion of their evil intent. Afterwards this evil intention broke forth, about to assail the sacred and the civil orders. Hence the supreme pontiffs, Our predecessors, Clement XII, Benedict XIV, Pius VII, Leo XII, repeatedly condemned with anathema that kind of secret society. Our predecessors condemned them in apostolic letters; We confirm those commands and order that they be observed exactly. In this matter We shall be diligent lest the Church and the state suffer harm from the machinations of such sects. With your help We strenuously take up the mission of destroying the strongholds which the putrid impiety of evil men sets up.
Nesta Encíclica, Pio VIII dispara em todas direções: as heréticas doutrinas que "atacam a fé católica", entre as quais os "sofistas ds nossa era", os que publicam a Bíblia nas línguas vernáculas (!) e, pior ainda, os que ousam comentá-la (de forma diferente da doutrina oficial, bem entendido), as sociedades secretas (não se referindo expressamente à Maçonaria, mas entendendo-se que a esta se refere através das referências aos documentos dos seus antecessores), repetindo o já usual argumento de que "porque esconderam as suas sociedades levantaram suspeitas sobre o seu maléfico intento". Mas, não sem razão, reconheça-se - tenha-se em conta que a intervenção política e revolucionária dos maçons já ocorria então, em vários países -, pela primeira vez concretiza-se: "Depois, este maléfico intento saiu à luz do dia, através do assalto às ordens sagradas e civis". A Maçonaria pagava o preço da sua intervenção!
Por sua vez, Pio IX, na sua encíclica Quanta Cura (texto em inglês aqui) repudia o entendimento dos que defendem que "apesar de as sociedades secretas serem condenadas (quer um voto de segredo seja ou ou não requerido nessas sociedades) e apesar de os que as frequentam e as favorecem serem punidos com o anátema, tal não tem validade nas regiões do mundo onde tais associações são toleradas pelo governo civil."
A secularização das sociedades era, afinal, a principal preocupação nesta encíclica.
Leão XIII foi Papa entre 1878 e 1903, encerrando o século XIX e a lista de condenações da Maçonaria como "sociedade secreta".
Logo no início do seu pontificado, em 1878, promulga a encíclica Inscrutabili Dei Consilio, longo documento em que lamenta o declínio do Poder Temporal da Igreja e do Papa, se pronuncia contra as legislações civis que permitem o divórcio e reafirma, de forma geral, as posições doutrinárias da Igreja Católica. Sem se referir expressamente à Maçonaria ou fazer qualquer referência a "sociedades secretas", acolhe e reafirma as posições dos seus predecessores, como se pode verificar pela seguinte passagem:
"Our predecessors, and the last of all, Pius IX, of sacred memory, especially in the General Council of the Vatican, have not neglected, so often as there was need, to condemn wide-spreading errors and to smite them with the apostolic condemnation. This they did, keeping before their eyes the words of St. Paul: "Beware lest any man cheat you by philosophy and vain deceit, according to the tradition of men, according to the elements of the world and not according to Christ." All such censures, We, following in the steps of Our predecessors, do confirm and renew from this apostolic seat of truth (...)".
Mas as suas mais vigorosas condenações da Maçonaria ocorreram numa ainda mais longa encíclica, a Humanum Genus, de 20 de abril de 1884, talvez a mais conhecida e citada encíclica sobre o tema, e ainda, oito anos depois, em 8 de dezembro de 1892, na encíclica Custodi de quella fede. Foram encíclicas expressamente dedicadas, em exclusivo, à Maçonaria, expondo o entendimento que dela então havia no Vaticano e expondo as razões da condenação. Doutrinariamente, são, sem dúvida, os mais importantes documentos de condenação da Maçonaria pela Igreja Católica e merecem uma análise em texto ou textos apenas a si dedicados. Procurarei fazê-la, ou começá-la, no próximo texto desta série.
Rui Bandeira
To be sure, even as the very voice of the public testifies, it has become known to Us that spreading far and wide and each day gaining strength are some societies, assemblies, meetings, gatherings, fellowships, or associations commonly called de` Liberi Muratori or Francs--Macons, or identified by whatever other designation according to the variety of idioms in which men of any religion and sect whatsoever, satisfied by a certain feigned appearance of natural honesty, are mutually united by a strict as well as impenetrable covenant according to the laws and statues established by them, and which at the same time they both secretly dedicate themselves to by a strict oath administered on the Sacred Bible, and which under the accumulation of severe penalties they are bound to conceal by an inviolable silence.
But since such is the nature of a crime, that it betrays its very self, and emits a cry as a herald of itself, on this account the societies or associations mentioned above have impressed upon the minds of the faithful a powerful suspicion to such an extent, that to enroll in these same fellowships is, before prudent and likewise approved men, absolutely the same as incurring the mark of depravity and perversion. For if they were not acting wickedly, they would never have such great hate for the light. Which voice has continually become more frequent, that in many regions the above mentioned societies have appeared for a long time to be outlawed by the secular authorities as being in adverse to the security of the realms and providentially banned.
O Papa que seguidamente volta ao assunto é Pio VIII, pela primeira vez na solene forma da Encíclica Traditi Humilitati, de 24/5/1829, que constitui o programa do seu pontificado. Encontrei o seu texto em inglês e, na parte que releva para o assunto em análise, lê-se no seu ponto 6:
When this corruption has been abolished, then eradicate those secret societies of factious men who, completely opposed to God and to princes, are wholly dedicated to bringing about the fall of the Church, the destruction of kingdoms, and disorder in the whole world. Having cast off the restraints of true religion, they prepare the way for shameful crimes. Indeed, because they concealed their societies, they aroused suspicion of their evil intent. Afterwards this evil intention broke forth, about to assail the sacred and the civil orders. Hence the supreme pontiffs, Our predecessors, Clement XII, Benedict XIV, Pius VII, Leo XII, repeatedly condemned with anathema that kind of secret society. Our predecessors condemned them in apostolic letters; We confirm those commands and order that they be observed exactly. In this matter We shall be diligent lest the Church and the state suffer harm from the machinations of such sects. With your help We strenuously take up the mission of destroying the strongholds which the putrid impiety of evil men sets up.
Nesta Encíclica, Pio VIII dispara em todas direções: as heréticas doutrinas que "atacam a fé católica", entre as quais os "sofistas ds nossa era", os que publicam a Bíblia nas línguas vernáculas (!) e, pior ainda, os que ousam comentá-la (de forma diferente da doutrina oficial, bem entendido), as sociedades secretas (não se referindo expressamente à Maçonaria, mas entendendo-se que a esta se refere através das referências aos documentos dos seus antecessores), repetindo o já usual argumento de que "porque esconderam as suas sociedades levantaram suspeitas sobre o seu maléfico intento". Mas, não sem razão, reconheça-se - tenha-se em conta que a intervenção política e revolucionária dos maçons já ocorria então, em vários países -, pela primeira vez concretiza-se: "Depois, este maléfico intento saiu à luz do dia, através do assalto às ordens sagradas e civis". A Maçonaria pagava o preço da sua intervenção!
Por sua vez, Pio IX, na sua encíclica Quanta Cura (texto em inglês aqui) repudia o entendimento dos que defendem que "apesar de as sociedades secretas serem condenadas (quer um voto de segredo seja ou ou não requerido nessas sociedades) e apesar de os que as frequentam e as favorecem serem punidos com o anátema, tal não tem validade nas regiões do mundo onde tais associações são toleradas pelo governo civil."
A secularização das sociedades era, afinal, a principal preocupação nesta encíclica.
Leão XIII foi Papa entre 1878 e 1903, encerrando o século XIX e a lista de condenações da Maçonaria como "sociedade secreta".
Logo no início do seu pontificado, em 1878, promulga a encíclica Inscrutabili Dei Consilio, longo documento em que lamenta o declínio do Poder Temporal da Igreja e do Papa, se pronuncia contra as legislações civis que permitem o divórcio e reafirma, de forma geral, as posições doutrinárias da Igreja Católica. Sem se referir expressamente à Maçonaria ou fazer qualquer referência a "sociedades secretas", acolhe e reafirma as posições dos seus predecessores, como se pode verificar pela seguinte passagem:
"Our predecessors, and the last of all, Pius IX, of sacred memory, especially in the General Council of the Vatican, have not neglected, so often as there was need, to condemn wide-spreading errors and to smite them with the apostolic condemnation. This they did, keeping before their eyes the words of St. Paul: "Beware lest any man cheat you by philosophy and vain deceit, according to the tradition of men, according to the elements of the world and not according to Christ." All such censures, We, following in the steps of Our predecessors, do confirm and renew from this apostolic seat of truth (...)".
Mas as suas mais vigorosas condenações da Maçonaria ocorreram numa ainda mais longa encíclica, a Humanum Genus, de 20 de abril de 1884, talvez a mais conhecida e citada encíclica sobre o tema, e ainda, oito anos depois, em 8 de dezembro de 1892, na encíclica Custodi de quella fede. Foram encíclicas expressamente dedicadas, em exclusivo, à Maçonaria, expondo o entendimento que dela então havia no Vaticano e expondo as razões da condenação. Doutrinariamente, são, sem dúvida, os mais importantes documentos de condenação da Maçonaria pela Igreja Católica e merecem uma análise em texto ou textos apenas a si dedicados. Procurarei fazê-la, ou começá-la, no próximo texto desta série.
Rui Bandeira