Exortação solsticial
Seria bom, mas não podemos esperar que todos os templos sejam utilizáveis e utilizados pelos crentes de todas as religiões.
É bom que, como referi no texto da semana passada, esteja projetado num hospital português um espaço de assistência espiritual e religiosa concebido para ser utilizado pelos crentes e ministros de todas as religiões, mas essa é (ainda?) uma exceção.
Deve-se aspirar a que a tolerância religiosa seja, mais do que um facto, uma naturalidade, e que locais de culto utilizáveis e utilizados por crentes de todas as religiões não só existam, como sejam uma banalidade.
Mas o ótimo é inimigo do bom e não devemos confundir sonhos e aspirações com a realidade. Até que a tolerância religiosa seja tão banal e tão natural que se entenda, sem rebuço, que o que importa é que cada um cultue o Criador e não a forma como o faz e seja comummente entendido que o espaço de culto pode ser indiferentemente utilizado pelos crentes de qualquer religião, muitas águas passarão debaixo de muitas pontes de muitos rios, muitas pontes se construirão, serão derrubadas e reconstruídas, muitas gerações têm de passar. É assim a vida e a evolução da espécie humana. Tudo tem o seu tempo, tudo tem de medrar e crescer, de evoluir e de florescer. O sonho de ontem tem de ser a aspiração de hoje, o desejo de amanhã, a hipótese de depois de amanhã, o trabalho do dia seguinte - e isto a uma escala temporal obviamente bem mais alongada.
Mas no presente de cada um há lugar e modo e tempo para a concretização desse ideal, desde que cada um tenha a noção de que o que importa não são as pedras, as edificações, os lugares, os locais, o que verdadeiramente importa somos nós, cada um de nós, elemento individual e importantemente imprescindível da imensa comunidade que chamamos de espécie humana e que tem dentro de si, no íntimo do mais íntimo do seu íntimo, a centelha divina que nos fez, desde tempos imemoriais, descer das árvores e caminhar, eretos, pela terra, evoluir da brutidão à civilização e que em nós desperta e mantém o insaciável apetite de aprender, aprender sempre, melhorar, melhorar sempre, paulatinamente aproximando o bruto primata da inefável Perfeição que tudo originou.
O que importa, repito, não são as pedras, somos nós - cada um de nós. Não é assim, no fundo, essencial que haja um, vários ou muitos locais edificados que sejam utilizáveis e utilizados para o culto do Criador segundo as diversas crenças, religiões, tradições. O essencial é que cada um tenha a noção de que pode procurar a aproximação, o convívio, a comunhão, o culto, o louvor, a adoração - chame-lhe cada um o que quiser chamar - com o Criador, não importa onde esteja.
Mais importante que haver um local onde todos os crentes de todas as religiões possam praticar os seus cultos é que todos os crentes de todas as religiões tenham a noção e a prática de que podem praticar os seus cultos em qualquer lugar, em qualquer edificação, em qualquer templo de qualquer religião. Porque Aquele que se cultua é sempre o mesmo, independentemente de nome, de hábitos, de culturas, de tabus, de proibições e de obrigações.
Eu sinto-me bem e confortável em qualquer local de culto, seja ele católico, adventista, de Testemunha de Jeová, islâmico, judeu, bahá'í, mitraico ou de candomblé. Em qualquer desses locais sinto -me em paz e sinto a predisposição para a ligação ao Divino. Não me importam as diferenças - interessa-me apenas e sempre e só o essencial: o Criador.
Os verdadeiros templos não são feitos de pedra e cal e tijolo e telha. São feitos de carne e osso e sangue e, sobretudo, espírito. Cada um de nós é o mais livre e essencial dos templos, onde se pode e deve, em todos os momentos, cultivar a ligação com o Criador, trilhar o Caminho, desbastar o que de impuro se tem para que, em toda a sua glória, se descubra a Luz que cada um de nós É - e tantos não o sabem, por isso a mantêm escondida, velada, inacessível a todos os olhares, até aos de si próprios.
Vejo e sinto e exorto todos a que vejam e sintam todos os locais de culto de todas as religiões como seus locais de culto e que, mais ainda, não precisem realmente de locais para o exercer, cientes de que cada um é o seu próprio e insubstituível local do seu culto.
Que assim seja e, se assim for, quando assim for, mais um (grande) passo no sentido da melhoria terá dado a Humanidade. E esse passo, como sempre, depende sempre e só de cada um de nós.
Esta a mensagem que eu, maçom, sem segredos, aqui deixo, a menos de vinte e quatro horas do solstício, de inverno no hemisfério norte e de verão no hemisfério sul, de 2011.
A todos, Boas Festas!
Rui Bandeira
É bom que, como referi no texto da semana passada, esteja projetado num hospital português um espaço de assistência espiritual e religiosa concebido para ser utilizado pelos crentes e ministros de todas as religiões, mas essa é (ainda?) uma exceção.
Deve-se aspirar a que a tolerância religiosa seja, mais do que um facto, uma naturalidade, e que locais de culto utilizáveis e utilizados por crentes de todas as religiões não só existam, como sejam uma banalidade.
Mas o ótimo é inimigo do bom e não devemos confundir sonhos e aspirações com a realidade. Até que a tolerância religiosa seja tão banal e tão natural que se entenda, sem rebuço, que o que importa é que cada um cultue o Criador e não a forma como o faz e seja comummente entendido que o espaço de culto pode ser indiferentemente utilizado pelos crentes de qualquer religião, muitas águas passarão debaixo de muitas pontes de muitos rios, muitas pontes se construirão, serão derrubadas e reconstruídas, muitas gerações têm de passar. É assim a vida e a evolução da espécie humana. Tudo tem o seu tempo, tudo tem de medrar e crescer, de evoluir e de florescer. O sonho de ontem tem de ser a aspiração de hoje, o desejo de amanhã, a hipótese de depois de amanhã, o trabalho do dia seguinte - e isto a uma escala temporal obviamente bem mais alongada.
Mas no presente de cada um há lugar e modo e tempo para a concretização desse ideal, desde que cada um tenha a noção de que o que importa não são as pedras, as edificações, os lugares, os locais, o que verdadeiramente importa somos nós, cada um de nós, elemento individual e importantemente imprescindível da imensa comunidade que chamamos de espécie humana e que tem dentro de si, no íntimo do mais íntimo do seu íntimo, a centelha divina que nos fez, desde tempos imemoriais, descer das árvores e caminhar, eretos, pela terra, evoluir da brutidão à civilização e que em nós desperta e mantém o insaciável apetite de aprender, aprender sempre, melhorar, melhorar sempre, paulatinamente aproximando o bruto primata da inefável Perfeição que tudo originou.
O que importa, repito, não são as pedras, somos nós - cada um de nós. Não é assim, no fundo, essencial que haja um, vários ou muitos locais edificados que sejam utilizáveis e utilizados para o culto do Criador segundo as diversas crenças, religiões, tradições. O essencial é que cada um tenha a noção de que pode procurar a aproximação, o convívio, a comunhão, o culto, o louvor, a adoração - chame-lhe cada um o que quiser chamar - com o Criador, não importa onde esteja.
Mais importante que haver um local onde todos os crentes de todas as religiões possam praticar os seus cultos é que todos os crentes de todas as religiões tenham a noção e a prática de que podem praticar os seus cultos em qualquer lugar, em qualquer edificação, em qualquer templo de qualquer religião. Porque Aquele que se cultua é sempre o mesmo, independentemente de nome, de hábitos, de culturas, de tabus, de proibições e de obrigações.
Eu sinto-me bem e confortável em qualquer local de culto, seja ele católico, adventista, de Testemunha de Jeová, islâmico, judeu, bahá'í, mitraico ou de candomblé. Em qualquer desses locais sinto -me em paz e sinto a predisposição para a ligação ao Divino. Não me importam as diferenças - interessa-me apenas e sempre e só o essencial: o Criador.
Os verdadeiros templos não são feitos de pedra e cal e tijolo e telha. São feitos de carne e osso e sangue e, sobretudo, espírito. Cada um de nós é o mais livre e essencial dos templos, onde se pode e deve, em todos os momentos, cultivar a ligação com o Criador, trilhar o Caminho, desbastar o que de impuro se tem para que, em toda a sua glória, se descubra a Luz que cada um de nós É - e tantos não o sabem, por isso a mantêm escondida, velada, inacessível a todos os olhares, até aos de si próprios.
Vejo e sinto e exorto todos a que vejam e sintam todos os locais de culto de todas as religiões como seus locais de culto e que, mais ainda, não precisem realmente de locais para o exercer, cientes de que cada um é o seu próprio e insubstituível local do seu culto.
Que assim seja e, se assim for, quando assim for, mais um (grande) passo no sentido da melhoria terá dado a Humanidade. E esse passo, como sempre, depende sempre e só de cada um de nós.
Esta a mensagem que eu, maçom, sem segredos, aqui deixo, a menos de vinte e quatro horas do solstício, de inverno no hemisfério norte e de verão no hemisfério sul, de 2011.
A todos, Boas Festas!
Rui Bandeira