(imagem proveniente de Google Images)
De tempos a tempos e em vários países do mundo, é
posta em questão a obrigação da assumpção da pertença dos cidadãos em alguns
tipos de associações, sejam de carácter privativo ou não. E por estes dias o assunto veio novamente a debate a nível parlamentar.
Naturalmente que apenas irei dar a minha opinião sobre o que à
Maçonaria concerne, pois é geralmente em relação à Maçonaria que este
tipo de situações se torna mais evidente.
1. A liberdade de consciência, religião e de culto é inviolável.
3. Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis, nem ser prejudicado por se recusar a responder.
1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
1. Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer
autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover
a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.
2. As associações prosseguem livremente os seus fins sem interferência
das autoridades públicas e não podem ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as
suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial.
3. Ninguém pode ser obrigado a fazer
parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela.
4. Não são consentidas associações
armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, nem organizações
racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.
E como a Instituição Maçónica não promove a violência, não tem qualquer desígnio contrário à lei do país (aliás um maçom no seu juramento assume a concordância e o dever de
respeitar as leis do país onde se encontra!), não faz proselitismo nem
obriga ninguém a aderir à mesma (quem a ela adere, fá-lo de livre consciência e
vontade), não é uma Ordem militar nem a tal se propõe, objeta contra o racismo e
a xenofobia em todas as suas formas e é acima de tudo uma Ordem de caractér
iniciático e filantrópico, que defende os valores da Liberdade, Igualdade e da
Fraternidade e que promove a evolução da sociedade e do seu progresso através do
auto-aperfeiçoamento dos seus membros e da sua ação no mundo profano.
Logo, a Maçonaria e os seus membros podem e devem ser encarados como englobados nestes artigos da nossa
legislação.
Desta forma, é uma “falsa questão” se tentar obrigar os maçons
a assumirem ou não a sua condição maçónica, uma vez que a mesma não decorre de nada que seja considerado ilegal pelas leis portuguesas.
Não
obstante, o que me parece que é o real problema de quem tenta obrigar os
maçons, membros de alguma Obediência Maçónica a declarar a sua pertença a esta
Augusta Ordem não seja apenas por desejar conhecer o nome dos
seus membros, até porque a maioria é gente
anónima do conhecimento público, não ocupam cargos importantes nas empresas
onde trabalham ou nas associações e agremiações profanas a que pertencem.
Quem
quer legislar contra a Maçonaria no que toca a cercear o direito ao livre
associativismo e à privacidade dos seus membros, quer saber acima de tudo, se os membros de alguma Loja Maçónica nas suas
profissões e nas suas relações profanas poderão cometer alguma ilegalidade em
virtude dos seus juramentos e/ou relações fraternais.
Quero acreditar que tal não
acontece e se tal efetivamente acontecer, a pessoa ou pessoas em questão não
podem ser consideradas realmente como sendo maçons, uma vez que agem contráriamente àquilo a que a
Maçonaria se propõe fazer e atentam contra os valores morais da própria Ordem e contra aquilo que juraram cumprir.
Mas,
quem deseja criar leis e condições que permitam a obrigatoriedade de ser assumida a filiação maçónica para justificar também a sua ignorância e a sua curiosidade sobre o que se passa no seio
de uma Loja Maçónica, será também para se informar sobre quem esteve
presente e o que se debateu nessas reuniões maçónicas. Pois em relação ao povo em geral, estes o que querem conhecer é saber se o
fulano” X” ou “Y” é reconhecido como maçon e com isso justificar a opinião que poderão
ter sobre essa(s) pessoa(s). Tanto que
comparo isso com a mesma avidez com que a generalidade da população lê
revistas “cor-de-rosa” para
saberem o que se passa na vida de fulano “A” ou “B”. No fundo meros fait-divers, porque na prática o
conhecimento de tais informações não
lhes trarão qualquer mais valia e
apenas servirá para “matar” a sua curiosidade sobre a vida dessas pessoas, pois essas informações serão
irrelevantes para a sua vida em particular.
Mas o
que é para mim o mais relevante a reter, é o ataque que se faz aos direitos e
garantias dos cidadãos, uma vez que o livre associativismo e a liberdade
de um cidadão pertencer a qualquer tipo de agremiação ou associação num futuro
quiçá talvez não tão longínquo assim, irá ser posta também em causa.
Para já, o
assunto apenas aborda quem pertencer a associações secretas ou de carácter discreto, mas basta se aceitar
que tal possa ser exequível, também qualquer outro direito de pertença e militância poderá também ser posto em questão e com toda a
legitimidade por quem o fizer.
Para quê e para quem importará saber quem pertence a uma Obediência Maçónica se também
não nos é possível saber o que se passa no interior de outras associações e conhecer a identificação dos seus membros?
Não
terão essas mesmas associações o mesmo direito que a Maçonaria se arroga a
ter?!
O direito dos seus membros poderem reunir em privacidade, sem ter de assumir a sua filiação publicamente e com isso não serem incomodados por tal?
Obviamente
que sim, a vida interna de uma associação apenas deve interessar aos seus membros ou a quem vive
dessas e para essas associações. É uma questão de justiça social!
E
numa época em que os cidadãos têm visto os seus direitos e garantias serem
limitados, independentemente de quem os governa (pois acontece assim no mundo
inteiro em virtude das crises financeiras e guerras que vão se sucedendo) , abrir-se mão de um direito tão básico e
ao mesmo tempo tão importante como este, será o abrir de uma “Caixa de Pandora”
que depois dificilmente será fechada. Porque neste momento a preocupação infundada
que existe sobre a Maçonaria facilmente se poderá alargar a outra associação
qualquer, independentemente do seu tipo ou classificação profana.
E uma vez que
é natural ao ser humano se associar a algo ou a outrém - isso está na nossa
natureza e no nosso ADN, pois o Homem é um animal gregário -,
ao criarem-se condições para que tal suceda, parece-me a mim que, para
além de ser anti-natura, é
regressar-se a tempos em que mal se podia abrir a boca ou simplesmente olhar
outrém nos olhos sem que se tivesse o receio de o fazer... Tempos esses que não deixaram grande saudade nos
portugueses.
Seria isso quanto a mim, um retrocesso civilizacional impensável para os dias de hoje!
Aliás, já no tempo do Estado
Novo, o deputado à Assembleia Nacional, José Cabral (16/09/1885 – 10/06/1950)
apresentou em 19 de janeiro de 1935 e posteriormente aprovado cerca de quatro
meses depois, a 12 de maio, um projeto-lei para extinguir as “Sociedades
Secretas” – este projeto-lei foi até hoje um dos mais vis ataques que a Maçonaria
sofreu no nosso país – que teve como réplica por parte do poeta e jornalista do
Diário de Lisboa, Fernando Pessoa
(13/06/1888 – 30/11/1935), um artigo bastante conhecido ainda hoje, denominado
por “"As Associações Secretas: Análise
Serena e Minuciosa a um Projecto de Lei apresentado ao Parlamento”, no qual Fernando Pessoa faz uma certa apologia da Augusta Ordem Maçónica e em que confronta
a Assembleia Nacional, na pessoa do deputado José Cabral, em que o exorta a deixar cair este
projeto-lei atroz para a liberdade dos portugueses. Liberdade esta, que mais
tarde veio a ser limitada quase na íntegra como todos nós o bem sabemos…
Por tudo isto, não quero acreditar que os direitos
e garantias que atualmente existem e que promovem a Liberdade dos cidadãos e que foram conquistados com lutas e
algum sangue derramado, sejam perdidos assim tão irresponsavelmente e de uma forma tão irrefletida como o aparenta ser .
Seria muito triste para mim, que defendo os valores da Liberdade e da Igualdade, assistir às consequências desse hipotético cenário que alguns se propõem a criar.
É que não basta se pensar que este é um problema exclusivo dos maçons, este é
um problema que afetará a todos nós como cidadãos livres que somos. Pois se “agora toca-me a mim, amanhã te tocará a ti”…
O que me leva a recordar o poema "A Indiferença" de Bertold Brecht (10/02/1898 - 14/08/1956), que foi baseado num sermão proferido pelo pastor luterano Martin
Niemöller (14/01/1892 - 06/03/1984), que irei aqui partilhar convosco dada a contemporaneadade que o mesmo tem para este assunto em particular:
"Primeiro levaram os comunistas,
Mas eu não me importei
Porque não era nada comigo.
Em seguida levaram alguns operários,
Mas a mim não me afectou
Porque não sou operário.
Depois prenderam os sindicalistas,
Mas não me incomodei
Porque nunca fui sindicalista.
Logo a seguir chegou a vez
de alguns padres, mas como não sou
religioso, também não liguei.
Agora levaram-me a mim
E quando percebi,
Já era tarde."
Concluindo,
esta visão que tenho sobre este assunto pode parecer demasiado pessimista, mas
basta se analisar o que se fez noutros tempos e noutros lugares e se
depreenderá com alguma facilidade que tal não será tão irrealista assim…
Urge
cada vez mais acabar com “falsos moralismos” e com os preconceitos ignobeis de
quem atenta indisplicentemente contra a Maçonaria.
Tudo o que há para ver, à vista está! Tudo é que é passível de ser conhecido, poderá
ser conhecido.
Se dá
trabalho obter tal conhecimento? Sim, dá trabalho! Mas nada nesta vida é obtido sem
trabalho.
Por isso deixem lá os
maçons com as suas lojas e as suas reuniões, que também eles não se importarão
com os outros que também têm o direito de se reunir em privado nas suas associações…
Em democracia, o direito de uns é o direito dos outros!
É o direito de Todos Nós!