10 setembro 2010

Simplicidade, lógica, razão e o comportamento humano


O mundo que nos rodeia é cada vez mais complexo. Dos telemóveis aos automóveis, dos despertadores aos computadores, dos estacionamentos aos aquecimentos, tudo nos impõe mais conceitos, mais técnicas, mais botões. O lamento pela perda da simplicidade de outrora é constante. Então, num mundo dominado por máquinas de lavar cheias de botões, luzinhas e manípulos, um conhecido fabricante de máquinas de lavar roupa desenvolve um projeto revolucionário: uma máquina que pesa a roupa, da qual determina o grau de sujidade, através dos quais doseia automaticamente a quantidade de detergente e escolhe o mais eficiente programa de lavagem.

Cúmulo da simplificação, a máquina é apresentada pelo Departamento de Engenharia com apenas dois controlos: um botão de ligar/desligar, e a escolha entre "roupa de cor ou muito suja" e "roupa de limpeza fácil"; o resto do programa é determinado pelo próprio aparelho, que dispõe de um automatismo tal que, com toda a simplicidade, parcimónia e racionalidade, reduz ao mínimo os gastos de água, detergente, tempo e energia. Contudo, esta máquina acaba por ser apresentada ao público com uma profusa quantidade de controlos adicionais, impostos pelo resultado de estudos feitos pelo Departamento de Marketing!

Pois é. Todo o racionalismo na conceção, toda a simplificação do uso, toda a sofisticação do funcionamento, esbarraram em dois factores de peso. Por um lado, a perceção por parte do consumidor, quando compara as máquinas em exposição à procura da que vai adquirir, de que quanto mais funcionalidades a máquina tiver, melhor é - e que as funcionalidades têm, forçosamente, que se traduzir em mais comandos e botões. Por outro lado, um sentimento primário absolutamente contrário aos clamores por mecanismos mais simples, e que pode ser traduzido por algo como "mas queres uma máquina que mande em ti, ou vais tu mandar na máquina?" e que deita por terra os automatismos mais argutamente desenvolvidos.

A razão é um valor que a Maçonaria muito preza. Contudo, a mente humana não paira no éter: reside no cérebro, que por sua vez está agarrado ao resto desta coisa a que chamamos corpo. E mesmo a mente humana não é, como podemos ver, um bastião de razão pura. Por isso a Maçonaria insiste na tolerância, no equilíbrio e na diversificação dos saberes enquanto medidas conducentes à harmonia entre corpo e espírito, à aceitação das diferenças, e à interiorização de que, no fundo, somos frágeis, falíveis e imperfeitos - primeiro passo para pretendermos tornar-nos melhores.

Paulo M.

Para quem tenha curiosidade quanto à história rerferida:
http://www.jnd.org/dn.mss/simplicity_is_highly.html
http://www.joelonsoftware.com/items/2006/12/09.html

08 setembro 2010

33.º = 3.º


Uma das razões pelas quais quem está de fora da Maçonaria tem dificuldade em compreender, na sua plenitude, o que esta é resulta - bem vistas as coisas, naturalmente - de aquele que vê do exterior julgar, apreciar, avaliar, a instituição segundo o paradigma da sociedade em que se insere e não através do paradigma próprio criado pela Maçonaria.

Quem vê de fora tem tendência a conceber a Maçonaria segundo o cânone da hierarquia, que é comum à maior parte das instituições humanas. O Governo é dirigido por um Primeiro-Ministro, que manda nos, ou coordena os, Ministros, que, por sua vez, mandam no seu Ministério, dando ordens aos seus Secretários de Estado, e estes aos Diretores-Gerais, que ordenam aos Diretores de Serviço, que mandam nos Chefes de Repartição, que exercem autoridade sobre os Chefes de Secção, que dão instruções aos Administrativos, que... E todo o titular de um cargo superior hierarquicamente exerce autoridade não só sobre o seu inferior hierárquico imediato, mas por todos os que hierarquicamente estão abaixo deste e de si.

Se pensarmos nas Forças Armadas, idem, aspas, apenas com a diferença de o superior ter o título de General, aquele que está na base da pirâmide, o praça, ser o soldado e, entre um e outro, haver toda uma cadeia hierárquica de Oficiais, Sargentos e Cabos.

Se nos lembrarmos de um clube desportivo, lá está: facilmente visualizaremos a cadeia hierárquica que vai do Presidente da Direção ao roupeiro, passando pelos Diretores, Treinadores, Adjuntos, Capitão de Equipa e seus substitutos, jogadores e demais pessoal.

Se nos detivermos na Igreja do credo religioso maioritário em Portugal, lá temos a omnipresente hierarquia de Papa, Cardeais, Arcebispos, Bispos, Cónegos, Padres e, na aparente base da pirâmide, afinal a sua única razão de ser e de existir, a massa dos crentes.

Em suma, e para não me alongar em exemplos, a maneira comum de ver as instituições da sociedade é de forma hierárquica, em que alguém manda, alguém é mandado e manda, em sucessivos patamares até se chegar a quem só obedece.

A tendência de quem olha de fora para a Maçonaria é vê-la segundo este paradigma e, portanto, considerar que, se no Rito Escocês Antigo e Aceite há 33 graus, os detentores do grau 33.º são os que estão no topo da hierarquia e "mandam" em todos os que se integram nos graus inferiores e o mesmo sucede ao longo da "cadeia hierárquica".

Esta forma de ver a instituição maçónica é profundamente errada e conduz a graves vícios de análise. Persiste quer pelo contágio das demais instituições sociais, quer porque os próprios maçons têm negligenciado o esclarecimento do erro. É por isso que não me escandalizo quando um dos nossos interlocutores afirma - como por vezes sucede - que Fulano era do grau 33 e portanto pertencia ao topo da hierarquia e o que disse ou escreveu há de ter um especial significado, pois integrava o escol dos que mandam. Se este erro persiste, a culpa não é só dos meus interlocutores - é também minha! É, pois, tempo de alijar o fardo da minha culpa e esclarecer!

A Maçonaria não se organiza segundo o princípio da hierarquia. A Maçonaria funciona estritamente segundo o princípio da Igualdade!

A única - e temporária - derrogação destes princípio respeita aos Aprendizes e Companheiros (graus 1.º e 2.º), os quais, por estarem em processo de formação e integração, têm uma diminuição de faculdades, não tendo (ainda) o direito de voto nem o direito de palavra (em reunião formal). Mas esta derrogação da plena Igualdade é temporária e estritamente decorrente da natureza do processo de formação e de integração de Aprendizes e Companheiros. O seu percurso far-se-á com naturalidade até que - sem demasiada demora, mas também sem grandes pressas - aquele que um dia se apresentou à Iniciação se submete ao Ritual de Elevação ao 3.º grau e assume a condição de Mestre Maçom.

A partir desse exato momento, é um Mestre com exatamente os mesmos direitos e deveres e a mesma e igual posição hierárquica que todos os outros Mestres. Nem a antiguidade importa. Nem esta é um posto. O maçom acabado de ser elevado a Mestre pode, no minuto seguinte, ver ser-lhe confiado o exercício de um ofício em loja. E, logo que tenha exercido o ofício de 2.º ou de 1.º Vigilante, pode ser eleito Venerável Mestre, em estrito pé de igualdade com todos aqueles que estão na mesma situação há 1, há 10 ou há 30 anos. E todo aquele que tenha exercido o ofício de Venerável Mestre de uma Loja pode ser eleito Grão-Mestre.

É indiferente, em Loja, se A tem "apenas" o 3.º grau, B o 9.º, C o 15.º, D o 33.º. Todos são estritamente iguais e aquele que tem "apenas" o 3.º grau pode ser eleito Venerável Mestre e dirigir os outros, os que têm o 9.º, o 15.º ou o 33.º grau. Todos os Mestres maçons são estritamente iguais, independentemente do grau dos Altos Graus a que cada um tenha acedido. Um maçom do 3.º grau não é menos, nem mais, do que um maçom do 33.º grau. São ambos Mestres maçons - e com um estatuto rigorosamente igual em Loja. Um dos Mestres maçons da Loja é eleito para, durante um ano, exercer o ofíci0 de Venerável Mestre. Outro dos Mestres maçons da Loja é eleito para, durante o mesmo período, exercer o ofício de Tesoureiro da Loja. O Venerável Mestre eleito designa, segundo os costumes e os critérios próprios da Loja, estabelecidos ao longo do tempo, os Mestres maçons que exercem os demais ofícios necessários para o bom funcionamento da Loja. Independentemente do grau que tenha ou deixe de ter cada um dos designados. Durante um ano, os Oficiais da Loja exercem os poderes e cumprem os deveres inerentes aos respetivos ofícios e os demais elementos da Loja respeitam esse exercício e, se assim o quiserem, colaboram. Em qualquer assunto que se debata, todos - mas rigorosamente todos! - os Mestres maçons, independentemente do grau que porventura adicionalmente detenham ou do ofício que no momento cada um exerça ou não, têm exatamente o mesmo direito à palavra e o mesmo direito ao voto, com exatamente o mesmo valor.

Igualdade absoluta, pois.

Também as Lojas são estritamente iguais. Nenhuma tem mais direitos ou deveres do que as outras.

Sendo assim, perguntará, e bem, quem está de fora, porque há 33 graus, que relação existe entre eles, se não é hierárquica, em que consiste esse paradigma de graus "iguais"?

Essa é matéria que procurarei esclarecer no próximo texto, dedicado aos Altos Graus.

Rui Bandeira

06 setembro 2010

Uma loja maçónica não é uma tertúlia (II)



Dois grandes factores de distinção entre uma tertúlia e uma loja maçónica são o objetivo e forma da intervenção de cada um. Numa tertúlia as intervenções sucedem-se, e cada um vai tomando a palavra repetidamente tantas vezes quantas queira (ou lho permitam...), sucessivamente acrescentando ao que disse antes, refutando os argumentos deste ou daquele, e fortalecendo - ou alterando - a sua posição de cada vez que se dirige aos demais. Cada um vai tentando fazer prevalecer a sua posição através de argumentos e contra-argumentos ao que foi dito antes, esperando-se que, a partir de um certo ponto, se tenha atingido um equilíbrio em que já tudo foi dito e cada um (re)contruiu já a sua posição face ao assunto em debate.

Numa loja maçónica, porém, as coisas não poderiam ser mais diferentes. Começa por que, no que respeita cada assunto, cada um pode fazer apenas uma única intervenção - e só muito excecionalmente poderá fazer uma segunda, sempre muito curta, e apenas se absolutamente impreterível, como por exemplo para clarificar algo que não tenha sido dito da forma mais inteligível. Esta imposição obriga a que se tenha um cuidado multiplicado com aquilo que se diz, de forma a dizê-lo bem à primeira.

Há uma ordem estrita a ser seguida. Primeiro começa-se pelas colunas (do Norte e do Sul), para que os mestres maçons que aí se sentam possam, querendo, pedir a palavra. Depois de não haver mais pedidos de intervenção, os dois Vigilantes podem pedir a palavra para si mesmos, primeiro o 2º Vigilante e depois o 1º Vigilante. É então dada a indicação de que não há mais intervenções nas colunas, e esta passa ao Oriente, onde residem o Venerável Mestre, o Secretário, o Orador, o Ex-Venerável e eventuais visitas a quem tenha sido dada essa distinção. A palavra é dada, no Oriente, a quem quiser dela fazer uso, e o Venerável Mestre é o último a intervir. Caso esteja em causa uma decisão, esta poderá ser tomada pelo Venerável Mestre de imediato, ou este poderá consultar a Loja através de uma votação. De qualquer modo, a intervenção do Venerável Mestre deve ser sempre no sentido de procurar encontrar uma conclusão que seja harmoniosa para a loja, e com que a maioria se identifique.

Para além da forma, já exposta, há o objetivo. Idealmente, cada intervenção destinar-se-ia a que cada um, na medida em que considerasse ser isso útil, apresentasse a sua posição ou opinião a respeito do assunto em causa, e sem que o seu conteúdo fosse condicionado por ser a primeira ou a última intervenção a ser efetuada. O que se diz não deve ser dirigido a ninguém em particular, mas a toda a Loja, e não deveria sequer referir-se alguma intervenção anterior, mas apenas fazer-se referência ao tema que esteja em discussão. Não deve haver interpelações, refutações ou contraditório, uma vez que isso colocaria em desvantagem aquele que já fez a sua intervenção e não pode agora responder. Pretende-se, assim, que cada um possa dar a conhecer a sua posição, sem que tente impô-la aos demais, e sem que explicitamente contrarie alguma posição já exposta, e por outro lado que cada um tenha a oportunidade de ser confrontado com opiniões alheias - porventura distintas das suas - num tom e numa postura que não ameacem a posição com que cada um se identifica.

A Maçonaria cria, deste modo, um contexto que induz cada um a confrontar-se com opiniões e posições distintas da sua, num ambiente de boa fé, entre iguais, sem que ninguém possa impor a ninguém nenhuma obrigação, mas em que cada um possa, querendo, tomar para si as palavras do outro, seja como as recebeu seja na forma que as queira incorporar naquilo que constitui a sua identidade.

Por fim, é costume - se bem que não creia haver nenhuma regra escrita a esse respeito - serem públicos os louvores e privados os reparos. Quando um bom trabalho é apresentado, é frequente que, nas palavras proferidas por cada um, sejam manifestadas palavras públicas de louvor e de encorajamento. Quando, porém, foi dito algo passível de ser interpretado como menos bom ou menos correto, a correção fraterna - que raramente falha - surge quase sempre em voz baixa directamente ao ouvido do "prevaricador". A franqueza e honradez manifestadas, de mão dada com a genuína preocupação que os maçons têm uns com os outros, levam a que seja frequente surgirem amizades muito fortes entre irmãos da mesma loja - e mesmo entre irmãos de lojas diferentes. A este respeito não me sai da cabeça uma frase que li há tempos numa entrevista em que alguém dizia: «A maçonaria é a única organização em que se faz amigos de infância aos 40 anos». Não sei se é a única, mas que se faz, faz.

Paulo M.

P.S.: Devo recordar que a Loja Mestre Affonso Domingues está integrada numa Obediência Regular - a Grande Loja Legal de Portugal / GLRP, e que o que descrevi se aplica a esta. Noutras obediências far-se-á de forma distinta; um destes dias escreverei um texto sobre isso.

03 setembro 2010

Uma loja maçónica não é uma tertúlia (I)


«Tenho um grupo, que com as vicissitudes da vida se foi afastando, mas que durante uns bons 15 anos formou uma tertúlia que se encontrava quase todos os dias. Tivemos incontáveis debates e polémicas. Aprendemos todos muito uns com os outros. Hoje, ainda continuamos todos amigos. Não há necessidade de proibições no que toca a troca de ideias.» (Diogo, num comentário recente)

Este comentário explica, quase por si mesmo, porque é que uma Loja Maçónica não é - nem pode ser - uma tertúlia. Ora comecemos, como quem analisa, escrutina e disseca um texto numa aula de Português.

Ter um grupo «... que com as vicissitudes da vida se foi afastando...» é uma das coisas que se pretende evitar numa Loja. Pertencer a uma Loja é como que um casamento. Não é forçosamente para toda a vida, pode-se ter "outras" ao mesmo tempo (se bem que seja difícil de gerir) mas, mesmo quando isso acontece há sempre uma que é a "principal"; pode-se cortar os laços com essa, e ou arranjar outra "principal" ou mesmo passar a não ter nenhuma, mas ambas são situações dolorosas. Uma Loja é como que uma família. Uns nascem, outros morrem, mas a família é a mesma - se não se extinguir; numa Loja, são iniciados uns, adormecem ou partem para o Oriente Eterno outros, mas a Loja permanece - se não abater colunas. Há lojas várias vezes centenárias, e esse vínculo a algo que existia antes de nós e continuará a existir depois é uma das coisas boas que a Maçonaria nos proporciona; ao mesmo tempo que nos reduz à nossa pequenez de meros "passadores de testemunho" dá-nos a satisfação de saber que pertencemos a essa cadeia de continuidade.

Pertencer a um grupo «...que se encontrava quase todos os dias» deve ser algo de muito exigente, e pouco consentâneo, suponho, com os deveres conjugais, laborais e parentais. Claro que isso é questão que só se põe a quem esteja sujeito a esses deveres... Por outro lado, encontros diários não serão, como dizia Shakespeare, "too much of a good thing"? Não terão esgotado em 15 anos conversa que dava para uma vida inteira? Em contraste, a maçonaria alerta os seus membros de que os seus principais deveres são para com a família, para com o Criador (qualquer que seja a conceção que dele se faça), e para com o país; a maçonaria vem depois.

Dizer-se, ao fim de 15 anos, que «ainda continuamos todos amigos» implica ter-se começado por aí: pela amizade enquanto vínculo genitor. Ora, quando se ingressa uma loja é-se integrado num grupo de desconhecidos; as amizades que surjam são paralelas ao grupo, não são condição prévia do mesmo. Os nossos amigos são pessoas que nós conhecemos e cujo contacto decidimos manter e aprofundar, e com quem nos identificamos mais; numa loja, pelo contrário, não se escolhe nada; um pouco como a família  do cônjuge, fica-se com o que nos calha na rifa. A um amigo perdoa-se mais, aceita-se mais e tolera-se mais do que a um desconhecido; por isso, as regras e os pressupostos de uma loja e de um grupo de amigos não podem deixar de ser diferentes, pois que numa loja a diversidade é maior do que num grupo de amigos.

Tertúlias como aquela de que o Diogo fala são próprias da adolescência e da juventude. Nos debates, frequentemente acesos, cada um tenta marcar a sua posição, convencer os demais, ensinar e impor o seu ponto de vista. Contudo, é normal que os seus membros, uma vez "crescidos", tendo adquirido a sua própria individualidade e identidade fora do grupo, se afastem progressivamente.; é normal que haja menos disponibilidade para um contacto tão íntimo e envolvente, para uma exposição tão prolongada, para um desnudar-se tão profundo - até porque as ideias se vão cimentando e há cada vez menos temas novos a debater sem que o resultado do debate esteja determinado a priori. Assim, a maturidade acaba por estabelecer o limite. Em loja, pelo contrário, o objetivo não é "converter" ninguém a um determinado ponto de vista, mas permitir que cada um encontre o seu.

Paulo M.

01 setembro 2010

A Cadeia de União


Em todas as reuniões das Lojas que trabalham no Rito Escocês Antigo e Aceite (mas não só neste rito: por exemplo, também no Rito de Schröder) se reserva um momento para que todos os maçons presentes formem a Cadeia de União.

É um dos momentos marcantes da reunião: ao formarem e integrarem a Cadeia de União, os maçons relembram que cada um individualmente faz parte de um Conjunto. Conjunto que é mais forte do que a mera soma das forças individuais, porque a todas estas se agrega a força da união de todos.

A Cadeia de União simboliza e demonstra ainda o princípio fundamental da plena Igualdade dos maçons. Todos os presentes, desde aquele que dirige a Loja ao mais recente Aprendiz se unem, na mesma exata e igual postura, cada um mero elo de uma cadeia. Não há, naquele momento, distinção alguma, não se atende a graus, a funções, a antiguidades. Todos iguais em comunhão!

É um momento de reflexão, de solidariedade, de união, em que cada um sente que contribui para o grupo - mas também sente que beneficia da força comum do grupo.

A Cadeia de União forma-se perto do final dos trabalhos, já depois de finalizados os debates da ordem do dia. Por muito acesos que tenham sido esses debates, por muito díspares que tenham sido as opiniões formuladas, por muito distantes que porventura estivessem as conceções confrontadas, o debate já terminou, a decisão já foi tomada, ora uma bissetriz traçada com as contribuições de todos, ora uma opção que não será a de todos. Mas todos contribuíram, leal e esforçadamente, para a assunção da decisão, contra a qual nenhum militará. Todos se reúnem na cadeia de União, onde não há lugar a desacordos, pontos de vista ou discordâncias: cada um assume a sua função de elo de uma cadeia, igual a todos os outros elos, solidário com todos os outros elos. De muitos, e diferentes, se faz um, o grupo, o conjunto.

A Cadeia de União é a expressão da rara capacidade que os maçons adquirem e praticam: conformar e utilizar a diversidade para o bem e o objetivo comum. Todos são diferentes, todos colocam as suas diferenças em prol do grupo, todos são ali iguais.

A Cadeia de União é a prática sempre repetida, que, em iguais proporções, reforça o elemento "cadeia" (cada um é um elo, uma peça de um conjunto) e "união" (todos juntos, todos em comum, solidários).

A Cadeia de União é uma prática pela qual se forma, reforça e assinala a coesão do grupo. Nos momentos em que o grupo assim se une, desvanecem-se os individuais egos, avulta o coletivo, na busca de uma egrégora fortalecida e fortalecedora. Todos os espíritos se unem no mesmo objetivo, na mesma intenção, na mesma prece, na mesma celebração, seja o que for, mas o mesmo...

A Cadeia de União é um gesto, mas é muito mais do que um gesto. É parte integrante do nosso segredo de maçons, não porque guardemos ciosamente a notícia da sua existência (este texto prova o contrário...), mas porque é realmente impossível explicar a quem nunca participou numa Cadeia de União o efeito, a paz, a comunhão, a força, que produz nos membros de uma Loja assim unidos. É um gesto, mas é muito mais do que um gesto. E o seu significado só é plenamente apreendido por quem nele participa, uma e outra e ainda outra vez e muitas vezes. É um significado que não se ensina. Aprende-se vivendo-o!

Fora de Loja, só se forma Cadeia de União em homenagem fúnebre a maçom que passou para o Oriente Eterno. E aí, então, têm lugar como elos nessa cadeia todos aqueles que se reclamam de ser maçons. Aí não importam reconhecimentos, nem regularidades, nem nada dessas miudezas. Aí, pessoas de boa vontade e com muito em comum homenageiam uma pessoa de boa vontade que nos precedeu no caminho que todos trilharemos.

Rui Bandeira

30 agosto 2010

Os símbolos e os rituais maçónicos: ferramentas de trabalho

 
Conta-se que um novo monge, chegado a um mosteiro, é incumbido de auxiliar os outros monges na cópia de textos antigos à mão. Nota, porém, que estão a copiar a partir de cópias, e não de textos originais., o que o leva a perguntar a razão ao superior, notando que, em caso de erro em qualquer cópia, esse seria propagado por todas as cópias seguintes. O superior responde-lhe: «É assim que temos feito há séculos, mas é uma boa questão, meu filho.»
Assim, o velho monge desce com uma das cópias à cripta para a comparar com o original, e por lá fica horas esquecidas. Não o vendo regressar, os monges, preocupados, enviam um deles ao seu encontro. Este, ao aproximar-se, ouve o ancião soluçar debruçado sobre um dos livros antigos. Pergunta-lhe o que se passa, ao que ele lhe responde, com os olhos rasos de lágrimas: «Aqui diz "celebrado", não diz "celibato"...»

O tempo e as sucessivas passagens de testemunho encarregam-se de que as palavras, os símbolos e os gestos percam o seu significado original, adquirindo eventualmente outros completamente distintos. "Quem conta um conto acrescenta um ponto", diz com razão a sabedoria popular. Aquilo que, na sua génese, poderia constituir mero artifício literário destinado a ilustrar uma ideia pode, ao fim de algum tempo, ser distorcido pela própria evolução linguística. Ainda hoje se discute a que se referiria, precisamente, a frase bíblica que diz ser "mais fácil um camelo passar por um buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus". O camelo seria o bicho de duas bossas, ou uma má tradução da palavra grega que significa "cordel", ou ainda um tipo de cabo usado nos barcos para os amarrar ao cais? E o buraco da agulha, é mesmo um buraco literal de uma agulha vulgar, ou é uma porta, uma passagem, um estreito, como especulam alguns? As palavras - simbólicas - ficaram connosco; o seu contexto original perdeu-se. Ficou a ideia que se pretenderia passar: de que aos ricos é difícil "entrar no Reino dos Céus".

Por outro lado, algumas mentes têm tendência para tomar os símbolos por aquilo que representam. A partir deste instinto formam-se verdadeiros cultos: veja-se o das personalidades políticas nos países do bloco soviético ou , mais proximamente, o do Doutor Sousa Martins. Cientes deste facto, várias religiões têm duras regras de condenação da idolatria, que mais não é do que a adoração de um símbolo, ao tomar-se o objeto por aquilo que ele representa. O Islão proíbe, por exemplo, qualquer representação de pessoas ou animais, não vá alguém tentar-se e lançar-se em sua adoração; e os protestantes costumam acusar os católicos de idolatria por terem nas suas igrejas imagens humanas.

Quer as restrições alimentares estipuladas por certas religiões como o Islão ou o Judaísmo (segundo as quais não se pode consumir carne de porco, e se impõe que os animais sejam abatidos de forma ritualizada e sangrados) quer a proibição de consumo de álcool pelo Islão, parecem refletir hábitos e costumes anteriores ao surgimento dessas mesmas religiões. Recordemo-nos de que o álcool desidrata, e que quem o consuma no calor do deserto pode correr perigo de vida; que a carne de porco, rica em gordura, se decompõe facilmente com o calor, podendo provocar epidemias; que o mesmo se pode dizer do sangue, que, se retirado da carne, permite que esta chegue a secar ou, pelo menos, dure mais em temperaturas altas. Estas medidas constituem, por si mesmas, sensatas medidas sanitárias de defesa da saúde pública. Se a sua inclusão enquanto preceito das religiões em causa decorreu de causa humana ou revelação divina já é questão a ser respondida no foro íntimo de cada um.

A Maçonaria tem os seus símbolos e os seus rituais. Os símbolos - que representam princípios, ideias e deveres - servem para evocar, e não para que se lhes preste culto. Não há nada de idólatra nos símbolos maçónicos. Há, de facto, símbolos e lendas cuja génese se perdeu; mas persiste o seu significado, que não podemos garantir que seja o original. Há entre os maçons, como em todo o lado, quem tome os símbolos por mais do que eles representam, atribuindo-lhes sentidos oblíquos, afectando-lhes significados ocultos, e mesmo especulando encerrarem os mesmos verdades inalcançadas. Esta "corrente" existe desde que a Maçonaria existe - e existe ainda hoje - mas a maioria dos maçons tem os pés mais assentes na terra, e considera serem os símbolos, rituais e lendas simples ferramentas de trabalho. Cada um é, todavia, livre de crer no que quiser, e mesmo de fabricar o próprio objeto da sua crença, mas essa é uma postura que, em certa medida, é contrária ao espírito da Maçonaria, segundo o qual o Homem deveria caminhar para a Luz e para o Esclarecimento.

E aqui se suscita uma questão essencial: onde acaba a liberdade religiosa e começa a superstição e o disparate? Como se concilia, a este respeito, o facto de a Maçonaria defender a liberdade individual (que passa pelo direito de cada um crer no que quiser) com a defesa da Razão enquanto fonte de autoridade e de legitimidade? Perante princípios antagónicos temos que estabelecer hierarquias; e a Maçonaria dá primazia ao respeito pela liberdade individual, o direito de cada um acreditar no que queira, sobre o interesse em que todos sejam racionais e esclarecidos. Assim, cada um é senhor de si mesmo e do caminho pessoal que escolheu e, desde que respeite os ideais e princípios maçónicos e a liberdade alheia, tem o direito de não ver questionado, escrutinado ou dissecado aquilo em que acredita.

Paulo M.

27 agosto 2010

Brincadeira de "gente crescida"




Perguntou um dos leitores habituais do A-Partir-Pedra, no comentário ao texto "Os sinais de reconhecimento": "Continuo a considerar tudo isto um brincadeira de “gente crescida”. Para quê? Ensinamentos que os maiores filósofos do mundo não tenham explicado?" A pergunta é tão pertinente que, tendo tencionado inicialmente responder-lhe nos comentários, acabei por decidir dedicar-lhe o texto de hoje.

Comecemos então por uma analogia. Existem milhentas formas de perder peso: dietas equilibradas, dietas malucas, jejum, exercício moderado, exercício pesado, exercício combinado com dietas, bulimia, enfim... Há para todos os gostos. No fim, todas têm o mesmo objetivo: perder peso. De uma forma mais lata, podemos ainda explorar o objetivo "ser saudável". Aí entram, além das dietas e do exercício, as pulseiras magnéticas milagrosas, os chás de tudo e mais alguma coisa, as noites de sono bem passadas, as almofadas mágicas, o auto-controlo, a alternância equilibrada entre períodos de descanso e períodos de trabalho, os amuletos, o cumprimento de determinados rituais, enfim... Todas elas nos prometem mais e melhor saúde. Umas serão globalmente mais eficientes do que outras - e não esqueçamos que a eficiência é diferente de pessoa para pessoa - e umas terão mais contra-indicações do que outras. No fim, cada um deverá procurar aquela que mais se lhe adequa, e pode, até, conseguir bons resultados combinando vários métodos ou aplicando apenas parte deles.

Do mesmo modo, tudo o que a Maçonaria ensina de substantivo pode ser encontrado de muitas outras formas: através de várias religiões, de diferentes correntes filosóficas, de palestras, de "gurus" privados, ou, para quem se disponha a despender algum do seu tempo, através até de uma boa biblioteca pública. O que a Maçonaria tem de único é o método, o meio, a forma. Não há ensinamentos exclusivos da Maçonaria que não sejam instrumentais, ou seja, que não digam respeito ao método e não ao fim, ao objetivo. Por isso, quem procura na Maçonaria ensinamentos exclusivos, secretos, reservados, e que o resto do mundo desconheça, então desengane-se: não há. Já aqui foi dito, bem como explicado o que a Maçonaria não revela e porquê. Os símbolos, as alegorias, os "segredos de grau"? Não passam de instrumentos, simples andaimes, meros artefactos que suportam, ilustram e consolidam os verdadeiros ensinamentos.

Mas que ensinamentos são esses, afinal?! Ah, esses são tão únicos como único é cada indivíduo! Pretender sabê-los seria como, através da descrição das técnicas de pintura de um dos grandes Mestres, pretender saber o que viriam a representar as telas pintadas por cada um dos seus discípulos... A Maçonaria apenas indica os princípios, e esses são bem simples: a fraternidade, a entre-ajuda, a tolerância perante a diversidade, a crença num Princípio Criador, o trabalho como meio de obter resultados, o desenvolvimento intelectual, a procura do Bem e da Virtude, o combate ao Vício e às Paixões, e tudo isto focado em cada um, do modo que este melhor entenda que mais lhe aproveita para atingir os objetivos que definiu para si mesmo. É, por isso, impossível dizer-se que ensinamentos é que a Maçonaria transmite: era preciso, para isso, que cada um estivesse ciente dos mesmos - que, tantas vezes, são absorvidos quase que "por osmose", pelo contacto com ideias alheias, sem que sejam propriamente sequer verbalizados, e por vezes nem mesmo conscientemente apercebidos, o que traz a segunda dificuldade: mesmo que apercebidos, podem não se conseguir transmitir senão de forma imperfeita. Pensemos como explicaríamos como se pinta a alguém que nunca pegou num pincel, mas sem o fazer passar pela experiência de conspurcar dezenas de telas brancas, nem se besuntar nas tintas, ou passar pelo experimentar, olhar e tentar de novo...

Por fim, quem considere ser a Maçonaria uma "brincadeira de gente crescida" deve recordar que:
  • a Maçonaria Regular não faz proselitismo, ou seja, não faz convites nem recruta novos membros, pelo que ninguém pode acusar a Maçonaria de o ter arrastado para um erro; cada um dos que adere à Maçonaria fá-lo pelo seu próprio pé, por sua própria opção e no exercício da sua própria liberdade.
  • apesar de nem todos serem livres de entrar, todos são livres de sair quando entendam; não queremos entre nós gente contrariada; há inúmeras formas de aumentarmos o nosso potencial humano e espiritual, das quais a Maçonaria é apenas mais uma.
  • como os meios de emagrecimento, cada um deverá procurar o que mais se lhe adequa; de facto, aos olhos de quem faça exercício duro uma ou mais horas por dia, uma pessoa dedicar-se ao vegetarianismo como único meio de emagrecer pode parecer uma "brincadeira de gente crescida"; se de facto o é ou não, já é questão completamente diferente...

Paulo M.

25 agosto 2010

O terceiro Grão-Mestre

O terceiro Grão-Mestre da GLLP/GLRP foi José Manuel Morais Anes. Exerceu essas funções entre 2001 e 2004. Coube-lhe assumir a tarefa da retomada da normalidade, após o tumultuoso mandato do seu antecessor. Garantida que fora por este a continuação do reconhecimento internacional da GLLP/GLRP como a única Potência Maçónica Regular em Portugal, José Manuel Anes, na frente internacional consolidou a normalização das relações. Com ele, virou-se a página e retomou-se o caminho.

Também na frente interna o mote do trabalho do Grão-Mestre José Manuel Anes foi a retomada e consolidação da normalidade. Paulatina mas firmemente, deixou bem claro que o passado era passado e que, mais do que recordar eventos, o que interessava era que cada um prosseguisse o seu trabalho de aperfeiçoamento pessoal, que cada Loja exercesse a sua função de enquadramento e catalisador do trabalho dos seus elementos.

Bem-disposto, bonacheirão, sempre com um sorriso na cara, José Manuel Anes transmitiu a todos a sua confiança. E o seu mandato foi um percurso em crescendo para a normalidade...

O Grão-Mestre José Manuel Anes recebeu uma Grande Loja ainda marcada pelos eventos que ofuscaram o mandato do seu antecessor e transmitiu ao seu sucessor uma Grande Loja estabilizada, confiante e em velocidade de cruzeiro. Podemos e devemos, sem dúvida alguma, considerar, com toda a justiça, que foi o homem certo a segurar na altura certa o leme da Grande Loja Legal de Portugal / GLRP.

Eis o seu currículo, reunindo informação registada no sítio da GLLP/GLRP e na página a ele dedicada na Wikipédia:

Nascido em Lisboa a 21-6-1944.

Residente na Costa da Caparica.

Licenciado em Química, pela Faculdade de Ciências de Lisboa, em 1975 (Bacharel em 1973).

Nos anos 70 foi assistente de Biomatemática na Faculdade de Medecina de Lisboa (HSM) - 1976-77 e 1977-78 - e, tendo sido equiparado a bolseiro, frequentou um curso de pós-graduação em Química-Física Inorgânica na Fac. de Ciências da Universidade Complutense de Madrid e estagiou em Catálise e Catalisadores no Instituto de Química-Física do Conselho Superior de Investigações Científicas de Madrid. Foi durante vinte anos Perito Superior de Criminalística do Laboratório de Polícia Científica da P.J.; actualmente está na situação de aposentado.

Desde 1986,é docente convidado de Matemáticas para as Ciências Humanas do Departamento de Antropologia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Faculdade onde tem lecionado também Métodos Quantitativos no Departamento de História, Estatística e no de Ciência Política; desde o ano de 2000-2001, leccionou também, na FCSH da UNL, a cadeira de Antropologia da Religião no Departamento de Antropologia, nos anos de 2000-2001 e 2001-2002. Tem dado, desde 1998, Cursos livres sobre História das Correntes Esotéricas, Novos Movimentos Religiosos e "New Age", no Instituto de Sociologia e Etnologia das Religiões da mesma Faculdade, e também no Centro Nacional de Cultura, os último dos quais se intitularam "Violência e Novos Movimentos Religiosos" e "Esoterismo e Política". Foi Assessor Cultural da Fundação Cultursintra, em 1996 e 1997, sendo Medalha de Prata da C.M. de Sintra em virtude da sua iniciativa pessoal que conduziu à classificação da Quinta da Regaleira pelo IPPAR como imóvel de interesse público e também pelos estudos realizados (um dos quais foi apresentado em Londres na Cornerstone Society - ver o resumo da conferência em www.workingtools.org) e pela divulgação da mesma Quinta. Foi Presidente da Academia de Estudos Ibero-árabes (1995/97) e Vice-Presidente da Associação Fernando Pessoa (1999-2000).

É membro correspondente em Portugal da Associação "ARIES" (de Estudos e Informações sobre Esoterismo) dirigida pelo Prof. Antoine Faivre da EPHE (Sorbonne), do CIRET (Centro de Estudos sobre Transdisciplinaridade) dirigido por Basarab Nicolescu (Paris) e das seguintes Associações de estudos dos Novos Movimentos Religiosos: a francesa AEIMR dirigida por Bernard Blandre e a italiana CESNUR (Torino) dirigida pelo Doutor Massimo Introvigne (Torino). Foi Director da "Biblioteca Hermética" da Hugin Editores, onde publicou obras de diversos autores, entre os quais Lima de Freitas, Gilbert Durand, Adalberto Alves, Carlos Calvet, etc.

É um especialista de Correntes Esotéricas Ocidentais, sendo membro da ESSWE- European Society for the Study of Western Esotericism, dirigida pelos Profs. Wouter Hanegraaff (Univ. Amsterdão) e Antoine Faivre (Jubilado da EPHE-Sorbonne).

Organizou, em 2000, a pedido da Câmara Municipal de Cascais/Pelouro de Cultura, o Colóquio internacional "Fernando Pessoa, o Esoterismo e Aleister Crowley" que contou com as participações, entre outros, dos grandes especialistas universitários de esoterismo e de "novos movimentos religiosos", Antoine Faivre, Massimo Introvigne e Gordon Melton e dos pessoanos Maria Aliette Galhós, Manuela Parreira da Silva e Luis Filipe Teixeira.

Escreveu prefácios para vários livros, os últimos dos quais para “O Pensamento Maçónico de Fernando Pessoa” de Jorge de Matos (Sete Caminhos, Lisboa, 2006) e “La Franc-Maçonnerie comme Voie d’Éveil” de Rémi Boyer (Rafael de Surtis/Éditinter, Monts, França, 2006).

Para além da sua formação em Criminalística, desde 1999, tem-se dedicado também, no quadro da Socio-Antropologia, particularmente no domínio do estudo da Violência em “Seitas” e grupos religiosos radicais, tem sido Docente de cursos sobre Violência Religiosa e Terrorismo Religioso, quer no ISER, a partir de 2001, quer em 2006, na Reitoria da Universidade (Clássica) de Lisboa, na Universidade Autónoma de Lisboa e na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, num curso de Pós-graduação e Mestrado em Estudos Avançados de Segurança e Direito, onde lecciona as cadeiras de Violência Religiosa e de Criminalística. É co-autor no livro “As Teias do Terror” (Ésquilo, 2006).

Foi (desde 2004) Vice-Presidente do OSCOT- Observatório de Segurança, Crime Organizado e Terrorismo e é, desde o início de 2010, o seu Presidente. É Director da revista para o grande público intitulada “Segurança e Defesa”.

Bibliografia publicada:

"Re-creações Herméticas", Hugin, Lisboa, 1ª. ed. 1996, 2ª. ed. 1997; "O Esoterismo da Quinta da Regaleira", Hugin, Lisboa, 1ª. ed.1998, 2ª ed. 2000, 3ª ed. 2003. "Maçonaria Regular - Maçonaria Universal" - Hugin, Lisboa, 2003. "Re-creações Herméticas - II" - Lisboa, Hugin; “Fernando Pessoa e os Mundos Esotéricos” – Lisboa, Ésquilo, 1ª. E 2ª. Eds., 2004;“Os Jardins Iniciáticos da Quinta da Regaleira” – Lisboa, Ésquilo, 2005.
Com outros autores: "As Tentações de Bosh e o Eterno Retorno", Lisboa, Museu de Arte Antiga, 1994; "Poesia e Ciência", Lisboa, Cosmos/GUELF, 1994; "Caos e Meta-Psicologia", Lisboa, Fenda/ISPA, 1994; "Religião e ideal maçónico", Lisboa, ISER, 1990); "Seminário sobre Newton", Évora, Universidade de Évora/CEHFC, 1995; "Masoneria y religión", Madrid, Ed. Complutense, 1996; "A Vivência do Sagrado", Lisboa, Hugin, 1998, "A Quinta da Regaleira: história, símbolo e mito", Fundação Cultursintra, 1998; "Portugal Misterioso", Lisboa, SRD, 1998; "L'Âme secrète du Portugal", Paris, L'Originel, nº 9, 2000; "L'Homme à venir - Mémoire du XXe.siècle - nº.2", Paris, Rocher, 2000; "Discursos e práticas alquímicas - I", Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2001; "Esoterismo e Humanidades" -Colibri/Faculdade de Letras de Lisboa, 2001; "Discursos e práticas alquímicas - II" - Lisboa, Hugin/CICTSUL, 2002; "O Homem do futuro - um ser em construção" - São Paulo -Br., Triom/USP, 2002; "A Creação - La Création" - Lisboa, Atalaia/Intermundos, 2003; "Le Sacré aujourd'hui" - Paris, Rocher, 2003; “Templiers: les yeux du Baphomet” – Monts (Fr.), Rafael de Surtis/Editinter, 2004.

Percurso Maçónico

Foi iniciado Maçon no Grande Oriente Lusitano, em 1988, tendo saído em 1990, para constituir a Grande Loja Regular de Portugal-GLRP, onde fundou a Loja "Quinto Império" e onde foi sucessivamente, até finais de 1996, Grande Inspector, Assistente de Grão-Mestre e Vice Grão-Mestre. A partir de 1997, continuou a integrar a Grande Loja Legal de Portugal/GLRP - potência regular internacionalmente reconhecida pela Maçonaria Universal - de que foi, a partir dos começos de 2001, Grão Mestre, até Março de 2004.

Foi de 1995 a 2000, Grão Prior do Grande Priorado Independente da Lusitânia da Ordem dos CBCS (Altos Graus do Rito Escocês Retificado).

É CBCS-Cavaleiro Benfeitor da Cidade Santa (armado na Prefeitura de Genève do Grande Priorado Independente da Helvécia, de que é Membro de Honra), Cavaleiro maçónico de Malta - KM (armado no Grande Priorado da Gálias, em Paris), do Grande Priorado de Inglaterra e Gales) e 33º., Grau honorário do Rito Escocês Antigo e Aceite (Supremo Conselho para Portugal).

É membro do Supremo Grande Capítulo do Arco Real de Portugal e do Conselho Críptico para Portugal (Mestres Reais e Escolhidos) - altos graus do Rito de York. É ainda Cavaleiro do Conclave "Henrique de Borgonha" do Grande Conclave Imperial para a França da Ordem Maçónica e Militar da Cruz Vermelha de Constantino e das Ordens do Santo Sepulcro e de S. João Evangelista. É IXº. Grau e membro honorário do Colégio dos "Supreme Magus" da Sociedade Rosacruciana dos EUA ("Societas Rosacruciana in Civitatibus Foederatis" e ainda membro da "Societas Rosacruciana in Lusitania (SRIL).

É membro de honra da Loja "Oldest Ally" da Grande Loja Unida de Inglaterra, Companheiro do Arco Real inglês (Capítulo "Benaventa" de Northamptomshire), Cavaleiro Templário - KT de Honra (Capítulo "Holy Cross" de Northamptonshire, "Supreme Ruler" da Ordem inglesa do "Secret Monitor" e do Conclave "Olissipus Fidelis" (a Oriente de Lisboa) da OSM, Cavaleiro Rosa Cruz da Ordem Real da Escócia (Grande Loja de Edimburgo), Maçon de Marca e do "Royal Ark Mariner" da Loja "Rose and Lilly" de Londres e membro (em Inglaterra, do Conselho do Grão-Mestre) dos 5 Ordens que constituem os Allied Masonic Degrees: St. Laurence the Martyr, Knight of Constantinople, Grand Tiler of Salomon, Red Cross of Babilon e Grand High Priest. É Knight Templar Priest do Tabernáculo «London Freemen» e membro da Sociedade «Operatives».

É detentor das mais altas distinções do Grande Oriente do Brasil - GOB, entre as quais, a Condecoração da "Estrela da Distinção Maçónica" (Conferida pelo Grão Mestre Geral do GOB), Diploma e Medalha de Honra ao Mérito "Gonçalves Ledo" (Conferida pelo Grão Mestre do Grande Oriente do Estado de São Paulo, federado ao GOB), Medalha do Mérito "Presidente Ivo Ramos de Mattos" (Conferida pela Assembleia Estadual Legislativa do Grande Oriente do Estado do Rio de Janeiro, federado ao GOB) e Medalha "Jubileu de Prata do GOERJ- 2003" (Conferida pelo Grão Mestre do Grande Oriente do Estado do Rio de Janeiro, federado ao GOB). É ainda detentor da Medalha do "Mérito Montezuma" do Supremo Conselho para o Brasil do Supremo Conselho do Grau 33 do REAA (atribuída pelo Soberano Grande Comendador).

É Grande Representante da Grande Loja do Estado de Nova Jersey (EUA) , junto da GLLP/GLRP, da Grande Loja da Suécia junto do Grande Priorado Independente da Lusitânia e Grande Oficial de Honra da GL Real de Marrocos.

É membro correspondente das seguintes sociedades de investigação maçónica: «Ars Quotur Coronati» (Inglaterra), «Villart de Honnecourt» (França) e «Scottish Rite Research Society» (EUA).

Rui Bandeira

23 agosto 2010

Os sinais de reconhecimento


Um dos segredos que os maçons devem guardar consiste nos sinais, palavras e toques próprios de cada um dos graus. A sua origem - os sinais pelos quais um artesão da maçonaria operativa identificava as suas aptidões perante mestres que o não conhecessem - já foi aqui sobejamente explicada. Mas quais a sua utilidade e significado atuais?

Desde o século XVIII que há exposés, ou revelações, de rituais maçónicos. Como seria de esperar, uma vez que cada Grande Loja tem autonomia para alterar os seus rituais - o que costumam fazer com alguma regularidade - rapidamente os sinais de reconhecimento estabelecidos nos rituais terão sido alterados em reacção a essas "inconfidências". Também não surpreenderá que, em função dessas alterações, os sinais de reconhecimento não sejam, hoje em dia, os mesmos nem em todo o mundo, nem em todos os ritos, nem em todas as obediências. Há variações, pelo que os maçons são delas instruídos para que possam reconhecer irmãos apesar das diferenças.

Entenda-se, por outro lado, que estes "meios de reconhecimento" são meramente rituais. O que é que isto significa? Significa que, em primeiro lugar, são usados no contexto das sessões rituais, e do acesso às mesmas. Assim, se um maçon se dirigir a um templo onde se vão reunir irmãos de outra Loja na qual não seja conhecido, e pretender assistir à sessão, é quase certo que o farão identifica-se através dos sinais rituais de reconhecimento. No entanto, quase certo é também que não se fiquem por aí. Nos nossos dias a maioria das Obediências emite cartões em nome e para uso dos seus obreiros que atestam estarem os mesmos com a sua situação regularizada. É também costume as Obediências emitirem, a pedido, o chamado "Passaporte Maçónico", que permite a identificação do seu portador perante Obediências estrangeiras. Sem qualquer destes documentos, e sem que sejamos conhecidos, é não só possível como quase inevitável vermos a nossa entrada negada numa sessão de Loja. E fora de uma sessão de Loja? Espero que ninguém imagine os maçons a fazer macaquices e "sinais secretos" a estranhos, não vá dar-se o caso de eles serem maçons também... Fora de Loja os maçons, ou já se conhecem previamente, ou reconhecem-se pela sua postura, forma de estar na vida e princípios que defendem.

Dados os modernos meios de identificação (cartões, passaporte maçónico, etc.), a utilidade original dos sinais de reconhecimento é reduzida. Por que se mantêm então, e qual a razão do seu secretismo? Não nos esqueçamos de que a Maçonaria se socorre de símbolos e alegorias para transmitir os seus ensinamentos. Assim, os segredos de grau recordam a cada maçon que deve ser um homem honrado, de bons costumes, capaz de guardar para si um segredo que lhe tenha sido confiado. Por outras palavras, os maçons guardam segredo desses sinais de reconhecimento, uma vez mais, por uma razão muito simples: porque juraram fazê-lo.

Paulo M.

21 agosto 2010

O Grifo



O grifo é um animal mitológico com corpo de leão e cabeça e asas de águia. O leão era considerado o rei dos animais, e a águia o rei das aves, pelo que o grifo era considerado uma criatura majestosa e poderosa. Os grifos eram conhecidos por guardar tesouros e outros bens sem preço.

Ora, o que poucos saberão é que este "tesouro" que é o A-Partir-Pedra tem um grifo a guardá-lo! Senão vejamos: a Águia é o símbolo do Benfica; e quem nasceu a 21 de Agosto é do signo Leão. Consequentemente, um Benfiquista que faça hoje anos é um Grifo: meio Águia e meio Leão!!!

Parabéns, Rui Bandeira! Um grande abraço, e um dia feliz!

Paulo M.

20 agosto 2010

A Maçonaria: tecnologia avançada (VI - Epílogo)


Muitos dos "segredos" da maçonaria operativa - especialmente os ligados à engenharia, à arquitetura e à ciência - fazem hoje parte do conteúdo curricular de cursos do ensino superior - e alguns mesmo do ensino obrigatório. Outros ainda, mais ligados à técnica do trabalho artesanal da pedra, ter-se-ão perdido irrecuperavelmente por falta de aprendizes que perpetuassem a arte. Outros, de cariz mais simbólico, apesar de subsistirem, terão distorcido o seu significado a ponto de ser irreconhecível o seu sentido original. A "tecnologia avançada" da época, que as Lojas tão ciosamente guardavam, deixou de ser sigilosa, encontrando-se hoje - com mais ou menos estudo - ao alcance de todos.

Por tudo isto, é inegável que a Maçonaria actual não tenha quase nada em comum com a maçonaria operativa da Idade Média. Então, o que é hoje a Maçonaria? A chave desta questão encontra-se na forma como a própria Maçonaria se define: "A Maçonaria é um sistema peculiar de moralidade, velado por alegorias e ilustrado por símbolos". A Maçonaria é, portanto, um sistema de moralidade, e um que, como vimos já, abraça os princípios do Iluminismo - com o primado da razão enquanto fonte de autoridade e legitimidade - bem como a tolerância religiosa. A Maçonaria, não obstante partindo do princípio da imortalidade e da crença num princípio criador regular e infinito, apresenta uma conceção do mundo afastada da ignorância, do obscurantismo e da superstição, promovendo a busca da virtude, entendida como a força de fazer o bem no seu sentido mais lato do cumprimento dos nossos deveres para com a sociedade e para com a nossa família sem interesse pessoal. A ética da Maçonaria é, por outro lado, uma ética de trabalho, não pondo nenhum obstáculo ao esforço na busca da verdade, nem reconhecendo outro limite nessa busca senão o da razão.

Esse "sistema de moralidade" não é apresentado de uma vez; os princípios vão sendo apresentados de forma progressiva, e vão sendo desvendados novos "segredos" através de histórias alegóricas - que mais não são do que pontos de partida para a reflexão sobre potenciais imperfeições da nossa existência com o fim do auto-aperfeiçoamento. Por outro lado, as alegorias não são apresentadas de forma inequívoca, tendo cada um a liberdade de retirar delas os ensinamentos que lhe sejam mais proveitosos, o que é rigorosamente respeitado e promovido. Os símbolos, do mesmo modo, não têm significados universais, podendo ser interpretados por cada um da forma que entenda. A par de todo o aperfeiçoamento moral e espiritual, promove-se um saber diversificado, muito para além da especialização profissional que é a norma do nosso tempo. Cada um é, por exemplo, incentivado a apresentar oralmente trabalhos que tenha escrito e que podem ser sobre qualquer tema que possa interessar os obreiros da Loja, o que, promove para além do conteúdo apresentado, a prática da Retórica e da Gramática. Enquanto tudo isto sucede, vai cada um aprendendo a respeitar a posição alheia, mesmo que com ela não concorde; a calar um reparo se do mesmo não resulte senão a quebra da harmonia; a exercer a sua Liberdade dentro dos limites que a Igualdade e a Fraternidade impõem.

Mas então, porque continua a Maçonaria a manter "segredos" já revelados? Porque é que se continua a imitar uma profissão extinta, e a perpetuar lendas e símbolos de outros tempos? Por outras palavras, porque é que a Maçonaria é o que é, e porque é que, na Maçonaria, se faz o que se faz, e do modo que se faz? A resposta não poderia ser mais simples: porque funciona. De facto, o passar dos séculos tem demonstrado ter a Maçonaria uma metodologia eficaz de propagação dos princípios que esta acarinha e representa.

Por outro lado, pode dizer-se ser o seu "tradicionalismo" uma das causas da sua longevidade e, contrariamente a tantas associações que aparecem e desaparecem num curto espaço de tempo, a Maçonaria não tenciona deixar de existir de um dia para o outro. De facto, é inegável que nas sociedades atuais, como no século XVII, grassa a ignorância e a mediocridade, prevalece o fundamentalismo e o preconceito, e o oportunismo sobrepõe-se à retidão de princípios. Os propósitos da Maçonaria estão ainda longe de se ter concretizado, e longe de se ter esgotado os motivos da sua existência. Por esta razão, enquanto houver Homens com o firme propósito de se melhorar, de aprender a viver em proximidade com perspetivas diferentes das suas e de praticar a virtude e o bem, haverá lugar para que, por seu intermédio, a Maçonaria torne o mundo num lugar mais justo e mais perfeito.

Paulo M.

18 agosto 2010

Religião e espiritualidade


Raramente publico aqui no blogue textos que não são escritos por mim. Mas toda a regra tem exceções, quando as exceções o justificam. É o caso do texto que abaixo segue. Recebi-o através do Grupo Maçônico Orvalho do Hermon. Não confirmei a factualidade. mas a confiança em meus Irmãos do Grupo leva-me a não duvidar da mesma. E o texto do pastor Ed René Kivitz é de primeira água - e merece ser divulgao, lido e, sobretudo meditado.

Primeiro o enquadramento factual, tal como o recebi na mensagem do Grupo Maçônico Orvalho do Hermon:

No dia 1°/Abr/2010, o elenco do Santos, atual campeão paulista de futebol, foi a uma instituição que abriga trinta e quatro pessoas. O objetivo era distribuir ovos de Páscoa para crianças e adolescentes, a maioria com paralisia cerebral.
Ocorreu que boa parte dos atletas não saiu do ônibus que os levou.
Entre estes, Robinho (26a), Neymar (18a), Ganso (21a), Fábio Costa (32a), Durval (29a), Léo (24a), Marquinhos (28a) e André (19a), todos ídolos super-aguardados.
O motivo teria sido religioso, a instituição é espírita, o Lar Espírita Mensageiros da Luz, de Santos-SP, cujo lema é Assistência à Paralisia Cerebral
Visivelmente constrangido, o técnico Dorival Jr. tentou convencer o grupo a participar da ação de caridade. Posteriormente, o Santos informou que os jogadores não entraram no local simplesmente porque não quiseram.
Dentro da instituição, os outros jogadores participaram da doação dos 600 ovos, entre eles, Felipe (22a), Edu Dracena (29a), Arouca (23a), Pará (24a) e Wesley (22a), que conversaram e brincaram com as crianças.
Eis que o escritor, conferencista e Pastor (com P maiúsculo) ED RENÉ KIVITZ, da Igreja Batista de Água Branca (São Paulo), fez uma análise profunda sobre o ocorrido e escreveu o texto abaixo que tenho o prazer de compartilhar.

No Brasil, futebol é religião, por Ed Rene Kivitz

Os meninos da Vila pisaram na bola. Mas prefiro sair em sua defesa.Eles não erraram sozinhos. Fizeram a cabeça deles. O mundo religioso é mestre em fazer a cabeça dos outros. Por isso, cada vez mais me convenço que o Cristianismo implica a superação da religião, e cada vez mais me dedico a pensar nas categorias da espiritualidade, em detrimento das categorias da religião.
A religião está baseada nos ritos, dogmas e credos, tabus e códigos morais de cada tradição de fé. A espiritualidade está fundamentada nos conteúdos universais de todas e cada uma das tradições de fé.
Quando você começa a discutir quem vai para céu e quem vai para o inferno; ou se Deus é a favor ou contra à prática do homossexualismo; ou mesmo se você tem que subir uma escada de joelhos ou dar o dízimo na igreja para alcançar o favor de Deus, você está discutindo religião. Quando você começa a discutir se o correto é a reencarnação ou a ressurreição, a teoria de Darwin ou a narrativa do Gênesis, e se o livro certo é a Bíblia ou o Corão, você está discutindo religião. Quando você fica perguntando se a instituição social é espírita kardecista, evangélica, ou católica, você está discutindo religião.
O problema é que toda vez que você discute religião você afasta as pessoas umas das outras, promove o sectarismo e a intolerância. A religião coloca de um lado os adoradores de Allá, de outro os adoradores de Yahweh, e de outro os adoradores de Jesus. Isso sem falar nos adoradores de Shiva, de Krishna e devotos do Buda, e por aí vai. E cada grupo de adoradores deseja a extinção dos outros, ou pela conversão à sua religião, o que faz com que os outros deixem de existir enquanto outros e se tornem iguais a nós, ou pelo extermínio através do assassinato em nome de Deus, ou melhor, em nome de um deus, com d minúsculo, isto é, um ídolo que pretende se passar por Deus.
Mas, quando você concentra sua atenção e ação, sua práxis, em valores como reconciliação, perdão, misericórdia, compaixão, solidariedade, amor e caridade, você está no horizonte da espiritualidade, comum a todas as tradições religiosas. E quando você está com o coração cheio de espiritualidade, e não de religião, você promove a justiça e a paz.Os valores espirituais agregam pessoas, aproxima os diferentes, faz com que os discordantes no mundo das crenças se deem as mãos no mundo da busca de superação do sofrimento humano, que a todos nós humilha e iguala, independentemente de raça, gênero, e inclusive religião.
Em síntese, quando você vive no mundo da religião, você fica no ônibus. Quando você vive no mundo da espiritualidade que a sua religião ensina ou pelo menos deveria ensinar, você desce do ônibus e dá um ovo de
páscoa para uma criança que sofre a tragédia e miséria de uma paralisia mental.

Ed René Kivitz, cristão, pastor evangélico, e santista desde pequenininho.


Não sei se o Pastor Ed René Kivitz é ou não maçom. Nem sequer sei se ele aprecia os maçons. Sei que concordo em todas as frases, em todas as palavras, em todas as letras, com o que o Pastor escreveu.

Isto é o que a Maçonaria ensina. Isto é o que os maçons devem e procuram aprender. Que seja ensinado por quem, porventura, não é maçom, não interessa nada. Porque as boas lições são para serem aprendidas, venham de onde vierem. Hoje tenho muita honra em bradar que aprendi com este texto e em aqui o publicar para que outros possam também com ele aprender.
Rui Bandeira, maçom, advogado e benfiquista desde pequenininho.

16 agosto 2010

A Maçonaria: tecnologia avançada (V)


Na Inglaterra de meados do século XVII o poder do Rei e da Igreja começavam a ser postos em causa por toda uma classe média emergente, o que levou à guerra civil que devassou a Inglaterra entre 1642 e 1649 e à execução de Carlos I, o que deixou a Inglaterra sem rei. Sob um governo republicano liderado por Oliver Cromwell, a Inglaterra foi governada a ferro e fogo no período de pós-guerra (de 1649 a 1660), depois do que o Parlamento restaurou a Monarquia, tendo Carlos II - filho de Carlos I - sido coroado a 1661, com a idade de 30 anos. Um ano depois casaria com Catarina de Bragança. Carlos II, favorável à causa da liberdade religiosa e patrono das artes e da ciência, ficou conhecido como o Merrie Monarch, o Rei Alegre, quer pela sua boa disposição e pelo hedonismo da sua corte, como pelo alívio pelo retorno à normalidade após o governo de Cromwell.

Enquanto as autoridades política e religiosa em Inglaterra se encontravam diminuídas e fragilizadas - e eram agora mais fonte de desavença do que de união - surgia no Mundo um novo paradigma entre os meios intelectuais da época: o do primado da razão como fonte de legitimidade e de autoridade, num movimento que veio a ficar conhecido como Iluminismo. Este é, historicamente, coincidente com o século XVIII, mas as suas raízes podem ser encontradas algumas décadas antes.

Encontramos, logo após a guerra civil inglesa, a sociedade londrina efervescente de associações e clubes onde os cavalheiros podiam socializar uns com os outros; as temáticas decorriam dos novos interesses da época. Assistia-se, ao mesmo tempo, ao declínio das irmandades (associações de homens, normalmente profissionais do mesmo ramo, com fins de assistência mútua na doença ou na morte), que existiam desde o século XI; para congregar as pessoas já não bastava a ideia de assistência mútua. Foi neste contexto que, em 1660, com o propósito de juntar vários tipos de homens no estudo da Ciência, foi fundada a Royal Society. Robert Moray - um alto oficial do exército e também defensor da tolerância religiosa - conseguiu o apoio da família real para a sua fundação. A Royal Society, de que Moray viria a ser o primeiro presidente, tinha uma característica curiosa: não se iniciava aí discussões sobre política ou religião; falava-se de Ciência. Esta sociedade obteve considerável sucesso, graças ao qual a revolução científica atingiu a Europa através da obra de Isaac Newton, que propunha a visão de um mundo que obedecia a regras passíveis de ser formuladas e entendidas pela mente humana.

Ora, Robert Moray fora iniciado maçon na Mary's Chapel Lodge, e não foi o único "gentleman mason" iniciado numa loja escocesa. Havia muitos outros que, juntando-se em Lojas em Londres ou constituindo clubes, trariam para esta cidade esta visão, esta forma de estar na vida. Sabemos hoje que muitos dos membros da Royal Society se interessavam pelos clubes maçónicos que acabavam de surgir, pois encontravam neles uma mistura dos princípios científicos e racionais que acarinhavam com os princípios morais a que aspiravam, de mais a mais embelezados por uma rica teia de ensinamentos místicos, o que a tornava muito atrativa.

A Maçonaria tornou-se, deste modo, na principal "corrente" - se assim se lhe pode chamar - de clubes de cavalheiros. É verdade que, à semelhança dos outros clubes que surgiam, as lojas constituíam um ambiente onde homens de diferentes convicções religiosas e políticas podiam encontrar-se e confraternizar amigavelmente; contudo, o que a Maçonaria tinha que as outras sociedades não tinham era um propósito mais sério, por assim dizer: tornar os seus membros em pessoas melhores, ensiná-los a ser cidadãos dos seus países, e incentivá-los a cultivar-se intelectualmente.

Através dos primeiros gentlemen masons, oriundos da clique intelectual da época, a Maçonaria abraçara os valores de um Iluminismo que dava os primeiros passos, cunho que se manteria até aos dias de hoje. Os gentlemen masons tinham conseguido propagar um novo paradigma de autoridade, um novo conjunto de princípios, um novo edifício ético. Tomaram os ideais do Iluminismo e um conjunto de princípios morais transversais às várias denominações religiosas da época, enformaram-nos num clube de cavalheiros com tradições seculares, e tornaram-nos apelativos ao cidadão vulgar. Finalmente, após as guerras religiosas e civis, após os ódios fratricidas, a Inglaterra dispunha de um movimento unificador que, em torno de uma espiritualidade não sectária, para além dos partidos e das religiões, juntasse homens que de outro modo se manteriam para sempre afastados.

De 24 de Junho de 1717 - data da fundação, em Londres, da primeira Grande Loja do mundo por quatro Lojas Maçónicas - a 1723 formaram-se, só em Londres, já mais de 30 Lojas Maçónicas, número que explodiu nos anos que se seguiram, com gente de todas as classes a juntar-se à Maçonaria. Os segredos e os conhecimentos tecnológicos dos antigos pedreiros estavam agora ao alcance de todos. As lições morais e a postura perante a própria existência retiradas dos antigos símbolos, associados aos princípios do Iluminismo, viriam a mudar primeiro a sociedade Inglesa, e depois o resto do mundo.

Referências:
http://libcom.org/library/trade-guilds-initiation-through-work-andre-nataf
http://en.wikipedia.org/wiki/Charles_II_of_England
http://en.wikipedia.org/wiki/Robert_Moray
http://en.wikipedia.org/wiki/English_Civil_War

Paulo M.

13 agosto 2010

A Maçonaria: tecnologia avançada (IV)


A admissão de um aprendiz numa Loja operativa não era feita em privado; pelo contrário, envolvia todos os obreiros. Feita à noite - depois de um dia de trabalho - envolvia um ritual durante o qual era exposta ao aprendiz a história e importância da arte, salientado o privilégio que era para ele ser admitido, e explicado o que dele se esperava. A progressão de um artesão era, assim, uma cerimónia em que, envergando os seus trajes e instrumentos de trabalho - nomeadamente o avental e as luvas - para acolher no seu seio um novo membro, participavam quantos já por ela haviam passado.

Para além da transmissão de conhecimento tecnológico, era inculcado no recipiendário todo um conjunto de ensinamentos históricos, religiosos, mitológicos e morais. A utilidade e o âmbito desses ensinamentos, por sua vez, ultrapassava de longe o do mero trabalho da pedra. Podemos compará-los - evidentemente, com alguma latitude de conceito - aos ensinamentos de deontologia e ética que são, ainda hoje, essenciais ao ingresso, por exemplo, nas Ordens dos Médicos ou dos Advogados, mas com um espírito que os tempos modernos já perderam. Na prática, estes rituais - com uma grande componente mística - giravam em torno da leitura das "old charges", episódios retirados da bíblia, da História, da lenda ou do imaginário que descreviam a importância, ascendência e grandes feitos dos construtores ao longo dos tempos, e mostrando serem eles os Mestres da Geometria. Um dos mais antigos manuscritos das "old charges" que persistiu até aos nossos dias remonta a 1588; encontra-se no museu da Grande Loja Unida de Inglaterra, e consiste num rolo de papel com a altura de um homem e um palmo de largura.

Mesmo no final do século XVI dá-se na Escócia um evento essencial ao surgimento da maçonaria moderna: William Schaw, funcionário da Coroa, leva a cabo a tarefa de regular o funcionamento das lojas que, até então, eram completamente autónomas. Fá-lo através de dois textos fundamentais, conhecidos pelos "Estatutos de Schaw", dois textos legais aprovados pela Coroa da Escócia - um em 1598 e o outro em 1599 - que, pela primeira vez, organizavam os pedreiros escoceses em entidades chamadas "lojas" e os sujeitavam a obrigações administrativas. Entre estas contava-se o pagamento de uma jóia para admissão nas lojas, a formalização da estrutura das reuniões, e a obrigatoriedade de existir um secretário que registasse o sucedido em todas as reuniões - aquilo a que hoje chamamos "atas" - o que permite que, por exemplo, a "Mary's Chapel Lodge" tenha registos ininterruptos das reuniões dos últimos mais de 400 anos.

Ficava também formalizado e regulado um antigo costume dos maçons operativos: o uso de senhas e sinais secretos. De acordo com o nível de conhecimento que um maçon obtinha, à medida que progredia na arte, era informado de certas palavras ou certos sinais de reconhecimento. Agora, de acordo com os estatutos de Schaw, tomava carácter obrigatório outro costume: a proibição de um Mestre dar trabalho a um operário a não ser que este lhe desse a sua "chave": a palavra e/ou o sinal que atestavam que estava capacitado a fazer determinado tipo de trabalhos.

Curiosamente, os Estatutos contemplam também um sistema de mnemónicas, de memorização. Recorde-se que, não obstante a maior parte dos artesãos ser iletrada - não sabiam nem ler nem escrever - era necessário que não esquecessem o que aprendiam. Para esse efeito, era-lhes ensinado um sistema de memorização a que os oradores do período Clássico recorriam para não esquecerem os leus longos discursos. Baseado na visualização mental de um edifício com várias divisões, cada uma com vários objetos, cada um dos quais se associava à ideia que se pretendia recordar, consistia na deambulação mental pelo edifício evocando os símbolos em sucessão. É deste método que vêm as "tábuas de traçar" ("tracing boards") ainda hoje usadas em Loja.

A partir de certa altura as lojas operativas terão aceite no seu seio pessoas que não trabalhavam a pedra: nobres, burgueses, oficiais do exército, em suma, pessoas de estratos sociais mais elevados, conhecidos por "gentlemen masons". Os primeiros destes eram aristocratas com funções dentro do governo, e responsáveis pela edificação de palácios, castelos e afins, pelo que havia com os mesmos uma ligação laboral. Por um lado, essas pessoas buscavam o conhecimento que era transmitido nas lojas, e que, por ser secreto, gerava curiosidade, para além do prestígio que a sua nova qualidade de membros lhes conferia. Por outro lado, as lojas, apesar de serem organizações conceituadas e prestigiosas, mais prestígio ganhavam através do reconhecimento social destes seus novos membros. Estes, durante a iniciação como aprendizes nas Lojas, recebiam, além dos segredos, o avental e as luvas (uma vez que não dispunham dos seus próprios objectos de trabalho), e era a última vez que eram vistos: apenas vinham por causa do fascínio com os segredos, e não estavam propriamente interessados no convívio com os trabalhadores.

A aura das lojas operativas prolongou-se até ao tempo dos Tudor, altura em que os pedreiros começaram a perder relevância em virtude do início do uso do tijolo, muito mais barato do que a pedra, que levou ao progressivo abandono desta última, usada a partir daí apenas nas partes mais nobres dos edifícios. Foi assim que, pelo início do século XVII já não havia em Londres lojas operativas em funcionamento. Não fora a admissão dos "gentlemen masons" e as Lojas ter-se-iam extinto de todo; contudo, à medida que o número destes foi suplantando o de membros operativos, foi mudando o funcionamento e o propósito das Lojas. Já não se dedicando à construção de edifícios de pedra, construiam agora templos simbólicos em que cada um aparava e polia as suas próprias asperezas de caráter no sentido de se tornar uma pessoa melhor, tomando com base as regras morais da maçonaria operativa, e como símbolos os instrumentos de trabalho desta bem como as mnemónicas que serviam para recordar as suas lições tecnológicas. Enquanto se extinguia a Maçonaria Operativa, ia surgindo em seu lugar a Maçonaria Especulativa.

Referências:
http://libcom.org/library/trade-guilds-initiation-through-work-andre-nataf
http://www.scottishkey.com/

Paulo M.

11 agosto 2010

O teórico da conspiração


Tendo mostrado, no conjunto de textos anteriores, como uma simples e fácil busca de alguma informação desmonta uma das mais persistentes teorias da conspiração envolvendo a Maçonaria, uma última ponta sobra para desenredar este afinal tão simples novelo: como é possível que uns criem tão toscas atoardas e outros tão candidamente nelas acreditem?

É possível porque a capacidade humana de fazer o inesperado é verdadeiramente inesgotável, digo eu!

Criar tão toscas atoardas decorre, ou de simples e canhestra má fé de quem procura atingir quem não gosta e inventa parlapatices para enganar os incautos - e desses não curo, porque a desonestos não dou importância -, ou de inesperada incapacidade de ajuizar com lógica sobre factos desconexos - e a estes, bem vistas as coisas, nem sequer censuro, porque quem a mais não pode, a mais não está obrigado.

Os verdadeiros teóricos da conspiração - porque os outros, os desonestos, são apenas cáfila inconsiderada e inconsiderável, de má memória e nula honra - são pessoas com uma incapacidade atroz de analisar factos dispersos com um mínimo de lógica, relacionando o que não é relacionável, generalizando o que não é suscetível de generalização (e pouco o é!), unindo o que não tem ponta por onde se lhe pegue. Qualquer boato assume o cariz de verdade absoluta, qualquer hipótese, por muito absurda que seja, atinge foros de certeza inabalável, qualquer especulação se transforma em verdade absoluta, num desvario em que a imaginação se sobrepõe à razão, o sonho à realidade, a hipótese à verificação.

O homem de ciência formula hipóteses e testa-as experimentalmente. Se as hipóteses se confirmam, em experiências repetidas e repetíveis, passam a ser consideradas verdades científicas; se as experiências não confirmam as hipóteses, disso busca o cientista ensinamento para, à luz dos resultados obtidos, formular novas hipóteses, que submeterá de novo à prova de fogo da experimentação.

O teórico da conspiração, pelo contrário, encanta-se por uma hipótese que assola o seu espírito e toma-a por verdadeira e apregoa-a como tal, não só sem se preocupar em testá-la através da experiência, como rejeitando toda e qualquer demonstração da inveracidade da sua adorada iluminação.

O cientista quer saber. Ao teórico da conspiração apenas interessa a sua especulação, elevada por artes da sua vontade ao patamar do que ele passa a considerar verdade absoluta e inderrogável.

O teórico da conspiração tem, mais que uma incapacidade, um desinteresse inato pela verificação das suas mirabolantes hipóteses, pela busca de informação que confirme, alicerçando, ou infirme, derrubando, a sua querida efabulação.

Que ninguém venha com os seus factos perturbar os belos argumentos de um teórico da conspiração - não só não são, sequer, ouvidos esses factos, como o que ousa atalhar com a simples e chã lógica é repelido como conspirador, cujo único objetivo é impedir, subverter, dificultar, o conhecimento generalizado da "verdade" proclamada pelo teórico da conspiração. Simples factos - verificáveis - são inaptos para abalar qualquer dos brilhantes argumentos do teórico da conspiração.

Ao teórico da conspiração não importa se e vero; basta-lhe que lhe pareça bene trovato.

O teórico da conspiração efabula alegremente ao sabor da sua inspiração, de forma a denegrir quem não gosta, ao arrepio da lógica, da razoabilidade, da verdade. Relacionar factos dispersos ao sabor da sua imaginação criadora, extraindo conclusões que se não podem extrair, vendo tenebrosas ligações entre factos independentes e coincidentes apenas pela força das coisas, é a sua especialidade, amorosamente cultivada contra e acima de tudo e de todos.

O teórico da conspiração facilmente extrai uma curiosa conclusão, por exemplo, deste acervo de factos, cada um por si verdadeiro, mas não relacionáveis necessariamente:

- A Loja Mestre Affonso Domingues trabalha no Rito Escocês Antigo e Aceite;
- A cor do Rito Escocês Antigo e Aceite da Maçonaria é o vermelho;
- A cor da camisola do equipamento principal do Benfica também é o vermelho;
-Os maçons Rui Bandeira, José Ruah e JPSetúbal são obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues
- O maçom Rui Bandeira é adepto do Benfica; o maçom José Ruah também; o maçom JPSetúbal, idem;
- Os maçons não revelam a identidade, os nomes, dos outros maçons (que, sendo ainda vivos, não se tenham assumido publicamente como tal) - ou seja, a quem lhes pergunta, respondem: No Names, Boy!;

CONCLUSÃO (obviamente brilhante e irrefutável): a claque adepta do Benfica No Name Boys foi criada pela Loja Maçónica Mestre Affonso Domingues!!!!

Pouco importa que isto não tenha qualquer lógica, que se extraiam conclusões de factos não interrelacionáveis. Uma vez que à mente do teórico da conspiração assole esta ideia, passa, de imediato, à categoria de Verdade Irrefutável, a ser divulgada e repetida, à exaustão, contra toda e qualquer demonstração da sua irrazoabilidade!

E isto não é o pior!

O pior é que, mal um teórico da conspiração lance esta excelsa "verdade", logo outro não menos diligente teórico da conspiração fará mais uma "extraordinária descoberta":

- Vários elementos da claque No Name Boys foram condenados, em 1.ª instância (no momento em que escrevo isto a sentença ainda não transitou em julgado, mas isso não interessa nada, para um teórico da conspiração que se preze...) por tráfico de drogas e posse de armas proibidas.

SEGUNDA CONCLUSÃO (não menos brilhante e obviamente não menos irrefutável):

Os maçons fazem tráfico de droga e possuem armas proibidas!!!

O exemplo é obviamente exagerado e disparatado (chama-se a isto, em Lógica, a Demonstração do Erro pelo Absurdo). Mas não ponho as mãos no fogo de que, um dia deste, não apareça um iluminado qualquer a clamar que os No Name Boys são todos maçons e que os maçons fazem tráfico de droga e possuem armas proibidas... invocando em abono da sua tese este texto, ao abrigo do princípio (obviamente irrefutável...) com a verdade me enganas...

Que os teóricos da conspiração, pobres espíritos que a mais não alcançam, se entretenham com alarvidades deste género, isso a mim não me preocupa. Afinal, dos simples é o Reino dos Céus... O que me admira, me faz abrir a boca de espanto, é que gente manifestamente inteligente, e culta, e capaz, aceite sem sombra ou rasto de espírito crítico, as baboseiras espremidas de tão simplórios espíritos, no fundo e afinal numa mistura de crendice acéfala com a mais pura preguiça de verificar a veracidade de factos e da sua efetiva possibilidade de relacionação.

Que um simplório qualquer tenha parido a abstrusa tese de que os maçons - vá-se lá saber porquê, para quê e com que vantagens - conseguiram, à socapa e à falsa fé do Povo, inserir símbolos seus na nota de um dólar americano, não me preocupa. O que me perturba é que, anos passados, ainda haja gente inteligente, culta e capaz que acredite nisto, sem sequer se dar ao trabalho de gastar cinco minutos (não precisa de mais...) para verificar a perfeita insanidade deste disparate!

Mas isto sou eu, que me sinto incomodado por estes maçadores dos teóricos da conspiração andarem para aí a denunciar tudo e todos e temo que ainda descubram o meu maçónico plano de agente de forças extraterrestres para dominar a Terra e entregar, de mão-beijada, a sua escravizada população ao domínio dos senhores de Sirius, que há uma mão-cheia de anos deram uns quantos segredos aos meus antepassados maçons, para com eles executarmos tão execrando plano (Uupppsss! Entusiasmei-me... Isto não era para escrever... Era segredo... Façam de conta que não leram esta última frase e continuem felizes enquanto preparamos o dia do Domínio Final...).

Rui Bandeira

09 agosto 2010

A Maçonaria: tecnologia avançada (III)



Uma das ordens profissionais mais poderosas na Idade Média era a dos pedreiros. Os "mestres pedreiros" eram uma mistura dos atuais arquitetos e engenheiros civis, dominando as vertentes técnica e estética; por produzirem obras duradouras e imponentes, boa parte das quais de caráter religioso, eram socialmente reconhecidos como servidores de Deus.

A construção de grandes edifícios de pedra era multi-disciplinar, e implicava conhecimentos avançados de física, mecânica e matemática para a conceção da estrutura, para além do domínio da metalurgia, escultura, pintura e química para a ornamentação, que por sua vez tinham motivos baseados no conhecimento da história, da teologia e da mitologia. Congregava, por isso, as mentes mais brilhantes da época, e eram detentores de "segredos" como o teorema de Pitágoras, ou o desenho de certos ângulos e figuras geométricas a partir de instrumentos simples como um fio e dois ou três pedaços de madeira.

Por essa razão, a par dos estatutos - que eram públicos e regulavam a relação das corporações com a sociedade envolvente – havia regulamentos que visavam a defesa dos segredos do ofício e que, por não se pretenderem revelados, eram apenas oralmente transmitidos de mestre para aprendiz ou de mestre para companheiro. Porque a maioria da população dessa época era analfabeta, essas técnicas, ao ser transmitidas, eram "embelezadas" com histórias que constituíam mnemónicas que pretendiam ajudar a que não esquecessem os passos da sua execução. Por outro lado, estas "histórias" permitiam que as técnicas fossem referidas simbolicamente entre quem as conhecesse sem revelar o seu sentido oculto.

Não esqueçamos, ainda, o contexto físico em que tudo isto se dava. Aquando da construção de um grande edifício, a primeira edificação a efetuar-se era um barraco onde os pedreiros se abrigavam, comiam, dormiam, guardavam as ferramentas e passavam os tempos livres - as "lojas". Ainda hoje este termo é usado em algumas regiões do nosso país para designar o espaço térreo sob a zona habitacional, e onde se guardam os animais e as alfaias agrícolas. Grupos de homens passavam aí juntos meses a fio, e por vezes anos; por isso era importante minimizar-se os conflitos, estabelecer uma hierarquia clara, e fomentar o espírito de grupo. Ora, nada torna um grupo mais coeso do que o estabelecimento de regras, costumes e valores partilhados. Não é difícil imaginar a formação dos aprendizes orientada não só para o aspeto prático do desempenho das funções como para o estreitamento destes laços entre os que habitavam a mesma loja.

Por outro lado, numa época em que as comunicações entre povoações mais longínquas podiam demorar semanas ou meses, era comum o estabelecimento de meios de reconhecimento; assim, quem chegasse a uma terra estranha e se dirigisse a alguém dizendo-se enviado por fulano, podia simplesmente identificar-se revelando um segredo apenas conhecido deste e do seu interlocutor. Deste modo, fazia parte dos segredos de algumas associações de artesãos os meios pelos quais se poderiam fazer reconhecer noutra terra ou perante um estranho que aparecesse.

Havia, por fim, outra razão para que algumas das técnicas não fossem reveladas. Numa época de grande superstição e ignorância, a simples aplicação de uma técnica científica podia ser - e era-o frequentemente - interpretada como bruxaria ou invocação de demónios. Não será, de facto, muito mais cómodo atribuir o sucesso alheio à ação de forças sobrenaturais do que admitir o seu mérito e, eventualmente, a sua superioridade intelectual? Para evitar "contratempos" dessa natureza é que muito do conhecimento da época, especialmente o ligado à química e à matemática, era cuidadosamente ocultado, não fosse confundido com artes de bruxaria ou adivinhação... Manter e saber guardar um segredo era, assim, mais do que o mero cumprimento de um dever ou a defesa do ganha-pão: era uma verdadeira "técnica de sobrevivência".

Paulo M.