17 julho 2010

Os Segredos da Maçonaria, o silêncio e o saber calar-se


Por poucos que sejam, há, de facto, segredos na Maçonaria. Num tempo e numa sociedade em que a vida de cada um se encontra cada vez mais exposta, não é senão natural que a simples existência de segredos cause curiosidade e mesmo perplexidade. Contudo, a existência dos segredos tem mais do que uma justificação.

Em primeiro lugar, há as razões culturais, morais e éticas. Diz-se da Maçonaria ser "um sistema peculiar de moralidade, velado por alegorias e ilustrado por símbolos". Ora, se os sistemas de moralidade variam de sociedade para sociedade, as raízes anglo-saxónicas da Maçonaria são bem visíveis através daquilo que esta valoriza, como a delicadeza de trato associada aos gentlemen, ou essa mistura de contenção e refreamento que constitui a tão conhecida fleuma britânica. Pode, nesta perspetiva, dizer-se que o segredo, o silêncio e o "saber calar "são manifestação de três virtudes que a Maçonaria muito preza: a circunspeção, a discrição e o auto-controlo. Terá sido esta atitude, a par de um contexto histórico de guerras religiosas e de luta política de que a Maçonaria queria (e quer) manter-se afastada, que ditou o 6º Landmark, "A Maçonaria impõe a todos os seus membros o respeito das opiniões e crenças de cada um. Ela proíbe-lhes no seu seio toda a discussão ou controvérsia, política ou religiosa. Ela é ainda um centro permanente de união fraterna, onde reinam a tolerante e frutuosa harmonia entre os homens, que sem ela seriam estranhos uns aos outros." Quantas vezes uma frágil harmonia se consegue, sabe-se lá com que custo, pela exaltação dos pontos de concórdia, e pela minimização da exposição dos pontos de dissenção... É por isso que, em Maçonaria, se respeita em absoluto a liberdade de expressão de cada um - ao mesmo tempo que se espera que cada um tenha aprendido a, no seu exercício, não ameaçar a harmonia, o equilíbrio e a fraternidade.

Em segundo lugar há razões simbólicas e metodológicas. Diz-se que, nos tempos da Maçonaria Operativa, seria através de sinais secretos, próprios de cada uma das classes de operários, que os seus membros se identificariam perante os tesoureiros para assim receberem os seus salários diferenciados. Do mesmo modo, cada grau - Aprendiz, Companheiro e Mestre - tem os seus próprios sinais de reconhecimento, os seus próprios segredos que não podem ser revelados aos de grau inferior. A natureza do que se cala é menos importante do que a aprendizagem do guardar silêncio, do calar-se e do refrear-se. Sem calar não se pode ouvir; é por isso que nas sessões é imposto absoluto silêncio aos Aprendizes e aos Companheiros. Como exercício, fora destas, são-lhes confiados os "segredos de grau", que não passam, neste sentido, de um mero exercício de contenção. Por outro lado, a separação entre os graus evidencia e promove o progresso de cada maçon, e permite que, expostos aos mesmos conceitos na mesma ordem cronológica, todos percorram caminhos relativamente semelhantes. Os símbolos marcam o caminho, e a sua interpretação ou o aprofundamento do seu estudo constituem segredos na medida em que antecipação do conhecimento dos mesmos poria em risco a sua frutuosa interiorização. O silêncio não termina, porém, com a elevação a Mestre, antes se transfigura de silêncio imposto em silêncio voluntário. De facto, um Mestre deverá ter já interiorizado o que a sabedoria do povo nos repete: que, se a palavra é de prata, o silêncio é de ouro.

Por fim, e em terceiro lugar, encontra-se a reserva da identidade dos irmãos, o que não deixará de fazer sentido face à incompreensão, rejeição e mesmo perseguição de que os maçons foram - e, infelizmente, são ainda em muitos lugares - alvo, pelas mais diversas razões, das políticas às religiosas. Não obstante ser cada um livre de assumir publicamente a sua condição de maçon, está-lhe absolutamente vedado revelar a de quem o não fez. Por poder causar danos reais na vida daqueles cuja identidade fosse indevidamente revelada considero ser este, de entre os vários que os maçons juram guardar, o único segredo verdadeiramente digno desse nome.

Paulo M.

14 julho 2010

A nota de um dólar dos Estados Unidos e as teorias da conspiração (I)


A propósito do simbolismo presente na nota de um dólar americano, e particularmente do "olho que tudo vê", o nosso amigo Diogo comentou:

O facto de George Washington ter sido Grão-Mestre da Grande Loja do seu Estado não lhe dá o direito de colocar um símbolo da Loja na nota. O símbolo era uma imagem de uma sociedade a que ele pertencia (ainda por cima secreta). Parece-me uma impertinência

E, mais adiante:

A Maçonaria Americana pode ter sido ou ser CRENTE. Mas isso não lhe dá o direito de impor os seus símbolos a uma esmagadora maioria que não é maçónica.

Quanto à afirmação de George Washington ter sido Grão-Mestre da Grande Loja do seu Estado (Virgínia), já tive oportunidade de a corrigir no texto Retomando o curso... Quanto à afirmação do Diogo que George Washington não tinha o direito de colocar um símbolo maçónico na nota... a resposta é: não colocou! Pela simples razão de que a nota de um dólar americano foi concebida e fabricada muitíssimo depois do tempo de vida de George Washington - que faleceu em 14 de dezembro de 1799!

A primeira nota de um dólar americano foi criada e fabricada no ano de 1862 (mais de sessenta anos depois da morte de Washington) e nem sequer tinha a configuração atual: apresentava a imagem de Salmon P. Chase, que foi Secretário de Estado do Tesouro na Administração de Abraham Lincoln.

A primeira efígie de George Washington só aparece na segunda nota de dólar, criada em 1869. Também esta versão era diferente da atualmente existente: a imagem de George Washington, ao centro, estava acompanhada, à esquerda, de uma imagem de Cristóvão Colombo avistando terra...

Em 1886, é criada a nota de um dólar "Silver Certificate", com a imagem de... Martha Washington, a mulher do primeiro Presidente norteamericano!

Em 1896, imprimiu-se a nota de dólar denominada de "série educacional", em cuja frente figuravam os retratos de George e Martha Washington, constando no verso uma imagem alegórica da História instruindo a Juventude.

Em 1899, a nota de dólar passou a apresentar as imagens de Abraham Lincoln e Ulysses S. Grant, sob uma imagem contendo o Capitólio, a águia careca (animal símbolo dos Estados Unidos) e uma bandeira americana.

Todas estas notas (e outras versões que foram emitidas, mas que aqui não refiro, por menos interessantes ou curiosas) apresentavam uma dimensão superior à nota de dólar atual.

A primeira nota de dólar com a dimensão da atual foi introduzida em 1929, com a efígie de George Washington.

Só em 1957 foi introduzida na nota de dólar a divisa IN GOD WE TRUST.

A introdução, no verso da nota de dólar da frente e verso do Grande Selo dos Estados Unidos (que tem a tal imagem com a pirâmide inacabada e o "olho que tudo vê" que alimenta as disparatadas teorias da conspiração que por aí circulam) só ocorreu em 1935, durante a Presidência de Franklin D. Roosevelt.

Portanto, nem George Washington, nem nenhum dos "Pais Fundadores" dos Estados Unidos tiveram nada a ver com a introdução dos símbolos que as teorias da conspiração acusam os maçons de subrepticiamente terem feito introduzir na nota de dólar...

As informações contidas neste texto, para além das obtidas nos locais para onde apontam os atalhos supra colocados, foram obtidas na entrada da Wikipedia em inglês United States - one dollar bill. Tão simples como isso! Desmontar as disparatadas teorias da conspiração requer apenas um pouco de informação, que nem sequer dá um grande trabalho a obter...

No próximo texto, tratarei dos símbolos incluídos no Grande Selo dos Estados Unidos (a tal pirâmide inacabada e o "olho que tudo vê"), sempre apontados como "provas" pelos inefáveis teóricos da conspiração.

Rui Bandeira

07 julho 2010

Retomando o curso...


O capítulo "comemoração dos 20 anos da Loja Mestre Affonso Domingues" está quase encerrado. O livro Loja Mestre Affonso Domingues - 20 anos de História foi lançado (muito obrigado aos muitos amigos que estiveram presentes) e está agora em curso de comercialização normal, ao preço de capa de 14 Euros. Quem ainda não adquiriu o livro, pode fazê-lo através do sítio http://esquadroecompasso.com (acedendo ao sítio, clicar em livros; ou, em "procurar produto", colocar "Mestre Affonso Domingues" ou "20 anos de história", ou ainda simplesmente "RLMAD01"), encomendando-o, ou diretamente no "showroom" da "Esquadro e Compasso", situado na Rua do Patrocínio, n.º 19 B, Lisboa (horário de abertura: 14,30-18,30 horas, de 3.ª a sábado). Pode ainda encomendar através do endereço de correio eletrónico mestreaffonsodomingues@gmail.com.

A sessão e o jantar comemorativo do 20.º aniversário da Loja ocorrerão no próximo sábado, dia 10 de julho.

E pronto! Basta de recordar o passado! Retome-se o regular curso de viver o presente e preparar o futuro!

Este blogue vai assim retomar o seu curso normal. Nas próximas semanas, tenciono responder a algumas questões colocadas pelo Diogo, na sequência de uma sua pergunta e uma resposta minha. Para que quem nos segue possa localizar-se, transcrevo aqui as pergunta e resposta iniciais:

Pergunta: Pode-me explicar uma coisa? Porque é que o olho que tudo vê – símbolo maçónico – aparece nas notas de dólar?

Resposta: Como deverá saber, grande parte dos Pais Fundadores dos Estados Unidos da América foram maçons, designadamente George Washington, que foi Grão-Mestre da Grande Loja do seu Estado e cuja efígie figura na nota de 1 dólar, aquela em que, no verso, está o "olho que tudo vê". Por outro lado, o "olho que tudo vê" é também uma conhecida representação do Criador. E, se reparar, no mesmo lado da nota de dólar onde está essa imagem, está a divisa "In God we trust", divisa adotada pelos USA. Quer pelo significado simbólico religioso, quer pelo significado simbólico maçónico, os criadores da nota de dólar decidiram colocar lá o símbolo. O que demonstra ainda uma outra coisa: nos EUA, a Maçonaria Americana é CRENTE e uma interventora social conhecida e reconhecida, daí que por lá uma coisa como esta seja encarada como natural - e é-o. Essa é uma das razões porque entendo que a Maçonaria Europeia do século XXI, particularmente a Maçonaria Regular Portuguesa deve rejeitar a fama e o (mau) proveito de secretismo, divulgando o que faz, porque faz, como faz e dizendo abertamente o pouco que reserva para si, e porquê - como nós procuramos fazer aqui no A Partir Pedra.

A propósito desta resposta, uma pequena correção: não consegui confirmar que George Washington tenha sido efetivamente eleito Grão-Mestre da Grande Loja da Virgínia (a colónia e, depois, o Estado americano onde residia). Conforme verifiquei na página da História dessa Grande Loja, aquando das diligências para a sua criação, foi sugerido para seu primeiro Grão-Mestre George Washington, mas declinou o convite, em virtude das suas obrigações como Comandante na Guerra da Independência dos Estados Unidos (cfr. aqui) e o primeiro Grão-Mestre da Grande Loja da Virgínia veio a ser, em 1778, John Blair Jr..

George Washington veio, no entanto, a exercer funções de "acting Grand Master" (Grão-Mestre em exercício), isto é, a exercer ritualmente a função de Grão.Mestre em determinada cerimónia, em substituição do Grão-Mestre de ofício, designadamente na cerimónia da Colocação da Primeira Pedra do Capitólio, em 18 de setembro de 1793, cerimónia de que existe o conhecido quadro que se reproduz acima.

Rui Bandeira

30 junho 2010

19 horas: Grémio Literário; até lá: Eça




















Já na semana passada deixei o anúncio: hoje, pelas 19 horas, no Grémio Literário, Rua Ivens, n.º 37, Lisboa, vai ter lugar o lançamento do livro Loja Mestre Affonso Domingues - 20 anos de História. Será feita a apresentação e leitura de alguns excertos do livro, o mesmo será vendido a 12 euros o volume (a partir de amanhã, 14 euros) e haverá sessão de autógrafos. Todos, maçons ou profanos, estão convidados.

Mas reparo que ultimamente tenho enchido o espaço deste blogue com o livro. Temo que os habituais frequentadores deste espaço estejam a ficar fartos. Decidi, pois, compensá-los. A minha associação de ideias é simples: livro, Grémio Literário, literatura, Eça. Para compensar os nossos amigos de tanta referência ao nosso escrevinhamento, nada melhor do que um pouco da arte de um sublime escritor, o meu preferido, o grande José Maria Eça de Queiroz.

Apreciem então este excerto do conto Civilização (que, mais tarde Eça desenvolveria em A Cidade e as Serras):

Assim jantámos deliciosamente sob os auspícios do Zé Brás. E depois voltámos para as alegrias únicas da casa, para as janelas desvidraçadas, a contemplar silenciosamente um sumptuoso céu de verão, tão cheio de estrelas que todo ele parecia uma densa poeirada de ouro vivo, suspensa, imóvel, por cima dos montes negros. Como eu observei ao meu Jacinto, na cidade nunca se olham os astros por causa dos candeeiros - que os ofuscam: e nunca se entra por isso numa completa comunhão com o universo. O homem nas capitais pertence à sua casa, ou, se o impelem fortes tendências de sociabilidade, ao seu bairro. Tudo o isola e o separa da restante Natureza - os prédios obstrutores de seis andares, a fumaça das chaminés, o rolar moroso e grosso dos ónibus, a trama encarceradora da vida urbana... Mas que diferença, num cimo de monte, como Torges! Aí todas essas belas estrelas olham para nós de perto, rebrilhando, à maneira de olhos conscientes, umas fixamente, com sublime indiferença, outras ansiosamente, com uma luz que palpita, uma luz que chama, como se tentassem revelar os seus segredos ou compreender os nossos... E é impossível não sentir uma solidariedade perfeita entre esses imensos mundos e os nossos pobres corpos. Todos são obra da mesma vontade. Todos vivem da ação dessa vontade imanente. Todos, portanto, desde os Úranos até aos Jacintos, constituem modos diversos de um ser único, e através das suas transformações somam na mesma unidade. Não há ideia mais consoladora do que esta - que eu, e tu, e aquele monte, e o Sol que, agora, se esconde são moléculas do mesmo Todo, governadas pela mesma Lei, rolando para o mesmo Fim. Desde logo se somem as responsabilidades torturantes do individualismo. Que somos nós? Formas sem força, que uma Força impele. E há um descanso delicioso nesta certeza, mesmo fugitiva, de que se é o grão de pó irresponsável e passivo que vai levado no grande vento, ou a gota perdida na torrente! Jacinto concordava, sumido na sombra. Nem ele nem eu sabíamos os nomes desses astros admiráveis. Eu, por causa da maciça e indesbastável ignorância de bacharel, com que saí do ventre de Coimbra, minha mãe espiritual. Jacinto, porque na sua ponderosa biblioteca tinha trezentos e dezoito tratados sobre astronomia! Mas que nos importava, de resto, que aquele astro além se chamasse Sírio e aquele outro Aldebarã? Que lhes importava a eles que um de nós fosse José e o outro Jacinto? Éramos formas transitórias do mesmo ser eterno e em nós havia o mesmo Deus. E se eles também assim o compreendiam, estávamos ali, nós à janela num casarão serrano, eles no seu maravilhoso infinito, perfazendo um ato sacrossanto, um perfeito ato de Graça - que era sentir conscientemente a nossa unidade, e realizar, durante um instante, na consciência, a nossa divinização.

Que maravilha! Há tempos, num diálogo com um nosso leitor e comentador assíduo, perguntava-me ele como concebia eu Deus e eu manifestei-lhe a minha impotência para o fazer. Pois bem, o grande Eça fê-lo com esta beleza toda!

Rui Bandeira

27 junho 2010

Eleição do Grão Mestre

Decorreu hoje (26 de Junho) a contagem de votos para a eleição do próximo Grão Mestre da GLLP, que será o 6º desde 1990 e consequentemente desde o inicio da maçonaria regular actual.

Foi eleito para o cargo o Muito Respeitavel Irmão José Moreno, que recolheu a maioria dos votos expressos.

O Irmão José Moreno é obreiro efectivo da Loja Mestre Affonso Domingues. Isso deixa-nos muito orgulhosos pois, apesar de nao ser o primeiro GM que militou pela nossa Loja é o primeiro que é eleito sendo membro da Nossa Loja e nela tendo sido iniciado e permanecido desde 1992.

Queremos desejar-lhe um mandato Justo e Perfeito.

Irmão José Moreno, ou melhor MRI Irmao, contas sempre com o nosso apoio.


José Ruah

23 junho 2010

30 de junho, 19 horas


Estão enviados todos os livros que, via correio eletrónico, nos foram encomendados e pagos. Atingimos o objetivo de, antes do lançamento do livro, ter vendidos pelo menos dez por cento dos exemplares da edição.

De hoje a uma semana - 30 de junho, 19 horas - tem então lugar, no Grémio Literário, Rua Ivens, n.º 37, em Lisboa, a sessão oficial de lançamento do livro "Loja Mestre Affonso Domingues - 20 anos de história". Em colaboração com a instituição anfitriã, serão servidos um pequeno beberete e alguns aperitivos. A apresentação do livro será feita por três dos seus coautores. Seguir-se-á uma sessão de autógrafos, através da qual os interessados poderão ter os seus exemplares autografados pelo Venerável Mestre em exercício - o vigésimo Venerável Mestre - da Loja Mestre Affonso Domingues.

30 de junho, 19 horas é a derradeira oportunidade de adquirir o livro em preço de lançamento - 12 Euros. A partir daí, o livro é vendido pelo seu preço de capa de 14 Euros.

O livro "Loja Mestre Affonso Domingues - 20 anos de história" não interessa somente a maçons. Foi pensado, estruturado, organizado e escrito tendo em vista não apenas os maçons mas também - quiçá principalmente - os que não o são.

A Loja Mestre Affonso Domingues acredita que a melhor forma de destruir o mito de a Maçonaria Regular ser uma "sociedade secreta" é... agir de forma aberta. A melhor forma de quem não é maçom não se enredar nas malhas deste mito é dispor de informação fidedigna e clara sobre o que é a Maçonaria, uma Loja maçónica, o que são e o que fazem os maçons.

É isso que procuramos possibilitar com este livro. Quem o ler ficará com uma ideia razoavelmente clara do que foi e é a Loja Mestre Affonso Domingues, dos seus sucessos e insucessos ao longo de vinte anos, das alegrias e tristezas, dos bons e dos maus momentos. Lerá as homenagens e evocaões que fazemos daqueles que um dia foram dos nossos e já partiram na derradeira viagem. Lerá trabalhos que foram expressamente feitos para serem apresentados em Loja e que o foram. Enfim, ficará a saber - por si, pelo que lerá, pelo juízo que pessoalmente fará - o que fazem os maçons. E verá que, afinal, são homens comuns, que fazem coisas comuns e têm a comum ambição de se tornarem cada dia melhores. Tão só - e, sendo pouco, tanto é!

30 de junho, 19 horas, sabemos que muitos maçons estarão no lançamento do livro "Loja Mestre Affonso Domingues - 20 anos de história". Teremos muito prazer, todo o agrado, muita felicidade, se também tivermos connosco muitos não-maçons. E em com eles trocarmos dois dedos de conversa. Abertamente!

Rui Bandeira

16 junho 2010

Esclarecimento


Publicado o texto de homenagem e evocação António Cunha Coutinho, maçom absoluto, recebi um telefonema de um familiar, que me manifestou o seu apreço pelo mesmo. Posteriormente, recebi um segundo contacto, agora de uma familiar, se bem percebi a sua viúva, que me solicitou que retirasse o texto de publicação.

Meditei sobre o pedido e resolvi que não o faria, pelas razões que abaixo exponho. Mas o respeito pela memória do António Cunha Coutinho e pelos seus familiares determinam que acrescente e publique aqui algumas informações que a senhora entende relevantes. Tão relevantes que, no seu entender, justificariam a retirada do texto de homenagem.

Não retiro o texto, desde logo pela inutilidade do ato, para os objetivos pretendidos pela mencionada familiar. As pessoas poderão não ter a noção da mudança de paradigma, mas, uma vez publicado um texto na Internet, é impossível apagá-lo de todo. No mesmo dia em que o texto foi publicado, foi automaticamente enviado por e-mail para os atuais 238 subscritores desse serviço, foi disponibilizado via Blogger, para os atuais 130 seguidores desse serviço, foi enviado para os atuais 17 seguidores no Facebook. Só no próprio dia 9 de junho, o texto foi acedido por 250 outros leitores deste blogue. E, só nos três dias subsequentes, por mais 564. Algumas destas pessoas têm ligados programas que publicam automaticamente os textos deste blogue nas suas páginas de Facebook. Qualquer destas 1199 pessoas pode ter guardado o texto no seu computador. Seguramente, algumas fizeram-no. Qualquer das pessoas que guardaram o texto pode publicá-lo, difundi-lo. enviá-lo por correio eletrónico, hoje, amanhã, para a semana, daqui por um ou dez anos. Apagar um texto que se publicou na Internet é uma ilusão: o texto "apagado" está. automática ou manualmente guardado num desconhecido número de computadores e bases de dados, apto a ressurgir, ser publicado, disponibilizado, a qualquer momento - independentemente da vontade de quem originalmente o publicou e porventura posteriormente o tivesse "apagado".

Mas também não retiro o texto, porque entendo não ter o dever de o fazer e não ter a vontade de assim proceder. Reli-o cuidadosamente. Em nada afeta a honra e a memória do António Cunha Coutinho. Pelo contrário, é uma homenagem. Mais: uma homenagem feita por quem assumidamente em muito divergia do pensamento, das ideias, das opções do António. O que não impediu de o admirar e de manifestar essa admiração pelo seu caráter. Retirar o texto era retirar a homenagem, trair a admiração e a amizade.

A familiar, se bem percebi viúva, do António baseou o seu pedido em duas informações que me transmitiu: que o António Cunha Coutinho veio a retirar-se da Maçonaria e que, no final da sua vida, expressou claramente a sua profissão de fé católica, tendo-se confessado pouco tempos antes de morrer.

Aqui ficam as informações adicionais e o esclarecimento.

Mas isso não invalida o que publiquei. Todo o maçom pode afastar-se (nós chamamos a isso "adormecer") quando o entender, pelas razões que entender. No caso do António, e estando ciente das convulsões que, no final do século passado, assolaram a Maçonaria Regular, percebo perfeitamente essa sua decisão. Por vezes, o único compromisso possível entre a lealdade pessoal e a manutenção de uma coluna vertebral direita e digna - como sempre o António, concordasse-se ou discordasse-se dele, teve - é o afastamento. E a Maçonaria Regular não só não é incompatível com a fé religiosa, como incentiva os seus membros a praticarem e aprofundarem a sua crença religiosa.

Creio que no espírito da minha interlocutora estará, porventura, o entendimento diverso, isto é, que é incompatível para um católico a integração na Maçonaria. Que considerará tal integração, mesmo, desonrosa. Que revelá-la atenta contra a memória do António.

Obviamente que respeito - só posso respeitar! - o entendimento da senhora. Mas o mesmo respeito obriga-me a consignar que, se for esse o seu entendimento, dele discordo. Muito mais do que alguma vez discordei do António...

Ser maçom não só não é desonroso, como muitos dos maiores vultos da História Universal - e da nossa História - foram maçons. O António bastas vezes me enumerou alguns.

O António esteve na Maçonaria como homem digno e honrado que era. Com o propósito de se aperfeiçoar e de ajudar outros a serem também melhores. O António deixou de estar na Maçonaria quando o entendeu, pelas razões que entendeu, com a mesma dignidade e honradez que sempre o caraterizaram.

Esconder que o António foi maçom é que seria trair a sua memória. Honrá-la é recusar esconder essa sua opção. O António nunca o teria feito: tinha a coluna vertebral bem direita para alguma vez o fazer!

Para quem entender que integrar a Maçonaria é um pecado, fica esclarecido que, se o António pecou, abandonou o pecado! E ser justo não é não pecar, é não persistir no pecado.

Por mim, que persisto e insisto em afirmar a minha admiração pela firmeza de caráter do António, aqui fica então o esclarecimento: o António desvinculou-se da Maçonaria antes de morrer e morreu como, na minha opinião, sempre viveu: como um bom católico!

À senhora que me contactou, não dando cumprimento à sua solicitação, aqui fica a minha explicação e o esclarecimento que julgo devido. Em nome daquilo que, cada um a seu modo, ambos prezamos: a memória do homem bom que foi o António.

Rui Bandeira