12 março 2008

Enrique Fugasot, masón caballero


Enrique Mario Fugasot Corbi. Uruguaio. Diplomata. Esteve dois anos e tal servindo o seu País na sua Embaixada em Lisboa. Maçon de muitos anos. Um senhor!

O Enrique juntou-se à Loja Mestre Affonso Domingues na infância desta, na primeira metade da década de noventa do século passado. Todos éramos então muito inexperientes, quase todos maçons de safras recentes, tacteando o caminho, aprendendo a aprender. O Enrique tinha já muitos anos de Maçonaria. E tinha a experiência da vida e o treino de diplomata. Obviamente que se apercebeu da inexperiência de quase todos. Certamente que viu serem cometidos erros que já não cometia há dezenas de anos. Evidentemente que reconheceu as dúvidas e as dificuldades de quem começa e ainda não está seguro do que faz e do que deve fazer.

O Enrique, porém, nunca deixou escapar um qualquer assomo de superioridade, um sinal de enfado, um resquício de impaciência. Integrou-se no grupo e deu-lhe a sua experiência de Irmão mais velho, sem nunca se impor. Quando se cometia um erro, brandamente, na primeira oportunidade, conduzia a conversa de modo a vir a dizer que, lá no Uruguai, se fazia assim e não como aqui fora feito. E, obtida a atenção de todos, explicava, sempre com um sorriso, o porquê de qualquer coisa se fazer assim e não assado e motivava o grupo para fazer bem, sem nunca o ter criticado por ter feito mal. Quando o grupo hesitava sobre o caminho a seguir, o rumo a tomar, a decisão mais adequada, calmamente recordava uma qualquer situação similar que se lhe deparara anos atrás e aconselhava, sem nunca procurar impor, o que lhe parecia o melhor a fazer. Se o sangue fervente da juventude parecia impelir para algum conflito ou desacordo mais áspero, pacientemente recordava a ética que imperava entre nós e que sempre deveria ser respeitada, por muito quente que estivesse a cabeça - e instantaneamente arrefecia todas as cabeças quentes, mostrava o valor da concórdia, a riqueza das diversidades de opiniões, a mais-valia do encontro dos planos de entendimento e das soluções de compromisso.

O Enrique foi um maçon antigo e experiente que, na hora certa, esteve junto de nós para nos transmitir a sua sabedoria, a sua experiência, os seus conhecimentos rituais e filosóficos e os seus estritos princípios éticos. Foi o Enrique que ensinou à Loja o que era e como se exercia o ofício de Orador. Em que consistia ritualmente, mas também substancialmente. Hoje, a Loja tem vários elementos capazes de bem exercerem este ofício. Todos, directa ou indirectamente, aprenderam com o Enrique ou com quem com ele aprendeu. Ainda hoje - e temos presentemente um excepcional Orador! -, se me pedissem para definir o arquétipo de Orador de Loja, seria o Enrique Fugasot que surgiria no meu espírito! Sei do que falo! Fui Orador da Loja Mestre Affonso Domingues. Foi dos ofícios que mais gosto me deu assegurar. Em relação a este ofício, quase tudo aprendi com o Enrique!

Ser maçon é dar e receber do grupo, da Loja. O Enrique deu à Loja Mestre Affonso Domingues a sua grande experiência, a sua confortante simpatia, o seu inexcedível saber fazer. Da Loja Mestre Affonso Domingues recebeu o que necessitava: o apoio de um grupo de amigos, que o acompanhou a si e à sua família enquanto estiveram em Portugal, o calor humano que ajuda a superar a ausência do país natal, o auxílio nas pequenas coisas em que nós portugueses, somos às vezes tão denodadamente complicados e complicativos e que tanto desesperam os estrangeiros, até que se acostumem com essas nossas recorrentes manias da complicação e aprendam a desfrutar o muito de bom que, apesar disso, sabemos apreciar da vida...

O Enrique esteve connosco, fez parte do quadro de obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues dois anos e tal, talvez um pouco mais. Depois, chegou a hora de ser recolocado - é a sina dos diplomatas, nunca podem fixar-se demasiado tempo num mesmo posto... - e foi para outro posto. Em 1998, era cônsul do Uruguai no Rio de Janeiro - a imagem que ilustra este texto é de uma carta que ele escreveu nessa qualidade em 16 de Novembro desse ano. Despedimo-nos dele e ele despediu-se de nós com o mútuo sentimento de um tempo bem passado, de uma amizade bem conseguida. Depois, como é comum nestas circunstâncias em que as distâncias e as vidas separam os amigos, primeiro houve contactos e notícias com alguma frequência, depois os contactos e as notícias foram rareando, ao fim de alguns anos, o Enrique era já apenas uma memória agradável para os mais antigos, um nome que os mais novos ouviam, de vez em quando, invocado por aqueles, enfim uma imagem que mansamente vai ganhando a cor sépia das fotografias antigas. Até que, há dois dias, o José Ruah - que está de pousio quanto à escrita aqui no blogue mas, como ele diz, não anda longe e anda sempre atento - me mandou uma mensagem de correio electrónico. Encontrara, nas suas navegações pela Internet, uma referência ao Enrique: a notícia da sua passagem ao Oriente Eterno, lá no seu Uruguai, em 22 de Setembro de 2005. A notícia que explica a ausência de notícias.

O Enrique Fugasot tinha já a sua idade. Nos tempos de hoje, em que a longevidade aumenta, não admiraria que nos acompanhasse mais alguns anos. Mas também não nos surpreende que a sua caminhada por aqui tenha chegado ao fim. É a lei da vida, a lei que a todos se impõe.

Tenho pena, claro, de não ter a possibilidade de voltar a encontrar-me com o Enrique, de conversarmos mansamente, de voltar a desfrutar da sua companhia. Mas sei que o Enrique teve uma vida cheia, produtiva e, sobretudo, vivida segundo os princípios éticos que sempre o nortearam e que a todos devem nortear. Foi uma vida que valeu a pena ser vivida. Foi um cavalheiro maçon que tive muita honra em conhecer, muito gosto em com ele privar e um enorme privilégio em com ele aprender. Foi mais um Irmão que deixou a sua marca na Loja Mestre Affonso Domingues, que contribuiu - e muito! - para ela ser o que hoje ela é. Foi um Mestre que a todos ensinou. Agora é uma recordação serena e agradável. Continuará a ser uma inspiração benfazeja!

ENRIQUE, MI HERMANO, HASTA SIEMPRE!

Rui Bandeira

11 março 2008

Serei crente?

aqui fiz referência ao excelente blogue Grémio Estrela d'Alva. É um blogue que continuo a visitar regularmente, sempre com com gosto e proveito. Deparei há dias com um notável texto intitulado Serei ateu?, que me inspira o texto de hoje. Não é uma resposta, nem uma manifestação de desacordo - pelo contrário! O meu propósito é tão somente complementar as ideias expressas naquele texto com o meu, de algum modo simétrico, entendimento. Daí, aliás, a escolha do titulo deste meu escrito...

Mas, para bem entender ao que aqui venho, faça o leitor, antes de mais, a fineza de aproveitar o atalho que acima coloquei e ler o dito texto Serei ateu?, da autoria de Carl Sagan. Vale a pena!

Já está? Prossigamos, então!

Ao ler o referenciado texto de Carl Sagan, a minha primeira reacção foi de admiração por ser possível uma tão grande comunhão de pensamento entre duas pessoas que, de alguma forma, estruturaram a sua forma de ver o mundo a partir de pressupostos opostos: noventa e muitos por cento daquilo que Carl Sagan naquele texto escreveu poderia ter sido escrito por mim - se, para tanto, tivesse tido engenho e arte... No entanto, enquanto Carl Sagan se define como ateu (embora colocando na devida perspectiva a sua posição), eu defino-me como crente. E, parafraseando o que Carl Sagan escreveu, também eu julgo adequado colocar um ponto de interrogação à frente da minha afirmação, porquanto também eu, na mesma linha, me considero crente até que alguém me prove racional e definitivamente que não existe um Criador.

Concordo plenamente com o entendimento de Carl Sagan sobre a racionalidade, o método científico, o cepticismo, a invenção de seres sobrenaturais pelo Homem, a inocuidade moral do ateísmo, as religiões, os fundamentalismos e os princípios que nos unem na Augusta Ordem Maçónica, independentemente das suas variantes!

No entanto, com essa tão grande, tão extensa, concordância, definimo-nos simetricamente: ele ateu, eu crente; ambos cum granum salis, o que vale por dizer, salvo melhor opinião e com reserva de mudança de opinião, se sobrevierem elementos que levem ao convencimento da necessidade dessa mudança.

Como é isso possível? Como é possível que tão similar forma de pensar conduza a conclusões diversas e, não diria opostas, mas simétricas? Será que a um se sobrepõe a Fé à Razão, ao contrário do outro? A tentação primária é afirmá-lo. Mas creio que seguir tal tentação seria um erro!

Pelo contrário, julgo ser asado concluir que ambos baseamos a nossa postura não só em postulados racionais, como até no mesmo postulado essencial: pese embora todo o Conhecimento Científico, toda a Especulação Racional, todos os Postulados de todas as Crenças, há duas afirmações opostas que, até agora, são racional e cientificamente indemonstráveis e racional e cientificamente irrefutáveis em absoluto: Deus existe; Deus não existe!

Para cada argumento que se possa aduzir em abono de que Deus existe, existe um argumento com igual força que o refuta; para cada argumento que se apresente demonstrando que Deus não existe, existe um outro, de igual fortaleza que defende essa existência.

Para não alongar muito este texto, apresento uma sumaríssima demonstração desta realidade, a um nível propositadamente primário: à pergunta quem criou o Mundo?, respondem os crentes que foi Deus; mas de imediato surge então a irrespondível pergunta de quem criou Deus?; similarmente, a tese da Ciência contemporânea de que o Universo teve origem num Big Bang é reduzida à sua dimensão de nada realmente explicar se se pergunta o que (ou quem...) criou, originou esse Big Bang, como e de onde surgiu essa tão fenomenal e extraordinária Força que do Nada fez surgir o Tudo. E, sendo postulado da Ciência que tudo o que existe pode ser reproduzido (e nisso se baseia a Ciência Experimental), como se explica que, desde há biliões e biliões de anos, só haja conhecimento de UM Big Bang, quando seria de esperar uma repetição do fenómeno?

E por aí fora se poderia, horas e dias e meses e anos, argumentar, especular, refutar, insistir. Bem o pontua Carl Sagan: não é possível, à luz dos nossos conhecimentos e da nossa razão, nem provar, nem refutar a existência de Deus.

Carl Sagan, legitimamente, acolhe-se ao seu cepticismo científico para concluir (se bem ajuízo): porque não está provado que exista Deus, não creio que exista e portanto classifico-me como ateu; não posso, no entanto, excluir que se possa vir a provar que existe e, se assim vier a suceder, mudarei de posição.

Com igual legitimidade, a minha posição é a de que se não pode provar e se não provou que Deus não exista e a única explicação que encontro para o Universo e para o sentido da Vida é essa existência e portanto classifico-me como crente; não posso, no entanto, excluir que outras prova e explicação possam vir a surgir e, logo, mantenho a minha mente aberta e atenta...

Quando olho, numa noite sem nuvens, o Firmamento e vejo milhares e milhares de pontos de luz, maravilho-me com a grandeza, o rigor, a precisão, do Universo e concluo que só uma Vontade Superior e uma Capacidade inentendível ao nível humano pode ter criado toda aquela incomensurável maravilha e mais a Vida que alberga e mais o Homem e a sua capacidade de abstracção, de ética, de razão... Penso que, se tudo isto fosse tentado explicar como um mero fenómeno natural, então ficava por explicar como e porque foi único, e assim, e de onde veio a força, e a matéria, e...

É exactamente pelo mesmo uso da Razão que sou crente. É por ter o mesmo cepticismo que Carl Sagan que, como ele, acrescento um ponto de interrogação ao meu postulado.

Temos a mesma ética, os mesmos princípios. Olhamos ambos para a mesma cerca - só que cada um do seu lado. O que não é nenhuma tragédia... O que nos diferencia não é a Razão, que ambos partilhamos, nem a Fé, que, penso, ambos admitimos apenas como possível consequência, nunca fundamento. O que nos diferencia, creio, é algo intermédio: a Convicção. A Convicção que se funda na Razão e que, quando a Razão não sabe, não pode, dar resposta, parte dela para ir além dela. A Convicção que parte da Razão para, de braço dado com a Intuição, procurar descortinar para além do ponto de partida e do horizonte que nele é visível.

É por isso que dois homens habituados a ser racionais e cépticos podem, sem desdouro nem problema, ter diferentes convicções. Até ao horizonte, vêem o mesmo e de igual forma; para além do horizonte, cada um interpreta os elementos que tem e intui o que pensa que para lá estará.

Um triplo e fraterno abraço ao Carl Sagan, deste seu leitor que muito admira o que escreve,

Rui Bandeira

10 março 2008

Vamos dar sangue e homenagear Aristides de Sousa Mendes

Após um intervalo invulgarmente grande regressaremos no próximo dia 12 de Abril, um Sábado, à nossa actividade costumeira de moer o juízo ao pessoal para ir dar sangue.


Certamente estaremos de acordo quanto à oportunidade e necessidade desta acção.

Desta vez por maioria de razão, já que aproveitaremos para nos associarmos à Fundação Aristides Sousa Mendes numa homenagem, singela mas tão sentida quanto merecida, à memória desse diplomata de caracter extraordinário que foi Aristides de Sousa Mendes e Sua mulher Angelina.

Herois da Nação, Personalidades do Mundo, têm merecido o reconhecimento internacional.

Têm conhecido o esquecimento nacional.

A verdade e o valor destas vidas só agora começa a ser referido internamente, mas no mundo já há muito que Aristides e Angelina são considerados herois da história universal.


A dádiva de sangue do próximo dia 12 de Abril será em recordação das Suas memórias, e também como de costume contaremos com a valiosíssima e desinteressadíssima colaboração do grupo dos "Escoteiros da Pontinha ".

Também como já aconteceu antes, o centro das operações será nas instalações da Escola Melo Falcão, EB1-ciclo Nº2 da Pontinha (linha azul do Metro).

A todos os que habitualmente colaboram nestes eventos sugerimos que marquem na agenda o dia 12 de Abril, e a todos os outros sugerimos que marquem nas agendas o dia 12/Abril.

Marquem e apareçam. Este anúncio é suficientemente antecipado para permitir a reserva atempada da manhã (30 minutos para o acto em si são suficientes) e para que os "cagarolas" que nunca fizeram esta dádiva se mentalizem que há tanta necessidade como facilidade em doar sangue.


Não dói, não deixa marca, não incomoda, não ocupa muito tempo, não custa dinheiro...


É útil, é saudável, liberta-nos das taxas moderadoras do SNS, deixa-nos a consciência do cumprimento de um dever importante.


Aristides Sousa Mendes salvou mais de 30 mil vidas e não teve qualquer retorno pela sua heroicidade.

Quer mais ?

J.P.Setúbal

07 março 2008

Grão-Mestre da Gran Logia de la Republica de Venezuela assassinado

Dá-se conhecimento a todas as Lojas sob a jurisdição da Gran Logia de la Republica de Venezuela que passou ao Oriente Eterno o Muito Respeitável Grão-Mestre, Querido Irmão FRANCISCO PEREIRO LIZ, da Muito Respeitável Gran Logia de la Republica de Venezuela, que será velado sexta-feira 7 de Março no Grande Salão da funerária ABADIA IMPERIAL, Avenida Bolívar Norte, frente à Reitoria da Universidade de Carabobo. Honras fúnebres no sábado, 8 de Março, às 9 horas.

Este singelo texto, logo abaixo da imagem que também encima este artigo, é a sóbria referência que podemos ler no sítio da Gran Logia de la Republica de Venezuela ao falecimento do seu Grão-Mestre.

Chris Hodapp, no seu blogue Freemasons for Dummies, louvando-se em informações obtidas através do blogue Francmasoneria Universal e de informação à imprensa da Grande Loja de Washington DC, dá mais informações: o Muito Respeitável Irmão Francisco Pereiro Liz foi assassinado no decurso de um assalto e de uma tentativa de rapto. O Muito Respeitável Grão-Mestre da Gran Logia de la Republica de Venezuela era proprietário de uma plantação de café e o homicídio ocorreu na sua propriedade, perto de Barqisimeto.

Uma morte violenta é sempre de deplorar. Curvamo-nos perante a dor dos familiares do Muito Respeitável Irmão Francisco Pereiro Liz. Manifestamos a nossa solidariedade com os Irmãos da Gran Logia de la Republica de Venezuela. Para o nosso Irmão, a meia-noite chegou inesperadamente. Seus artefactos de construtor foram precipitadamente pousados. Mas os planos que traçou na sua prancha ajudarão a guiar os trabalhos de seus Irmãos. Quando o seu nome for chamado, entre nós haverá sempre uma resposta de "Presente!". A Cadeia de União violentamente quebrada será imediatamente reconstituída, com o firme propósito de levar à prática os princípios por que se guiou. E esta é a melhor homenagem que se lhe pode prestar!

Rui Bandeira

06 março 2008

Caldeirada (poluição)

Há tempos escrevi uma série de artigos sobre Maçonaria e Ambiente. Dois conceitos que aparentemente nada têm a ver um com o outro. Procurei mostrara alguns pontos de contacto possíveis. Hoje, numa escala bem mais ligeira, proponho-me demonstrar uma ligação ainda mais difícil de conceber: FADO E MEIO AMBIENTE!

A Antena 1 apresenta, um pouco antes das 13 horas, de segunda a sexta-feira, uma rubrica que genericamente se intitula Alma lusa. Nela, é transmitido, após um breve comentário do autor da rubrica, um fado - o género musical que o autor da rubrica entende (e eu concordo!) mais bem retratar a alma da lusa gente. Há dias, foi transmitido um fado, cantado pela grande Amália Rodrigues, que foi editado originalmente em 1977 e se encontra integrado em algumas colectâneas de fados por ela cantados.

Ora vejam lá como a preocupação pela conservação do Meio Ambiente e pela acção depredatória do mesmo pelo Homem também pode ser objecto de um Fado. Da autoria de Alberto Janes (autor também do muito mais conhecido fado "Foi Deus"), apreciem então a letra deste

CALDEIRADA (POLUIÇÃO)

Em vésperas de caldeirada, o outro dia,
Já que o peixe estava todo reunido,
Teve o guraz a ideia de falar à assembleia,
No que foi muito aplaudido

Camaradas: principia a ordem do dia!
É tudo aquilo que for poluição,
Porque o homem, que é um tipo cabeçudo,
Resolveu destruir tudo, pois então!

E com tal habilidade e intensidade
Nas fulguranças do génio,
Que transforma a água pura numa espécie de mistura,
Que nem tem oxigénio

E diz ele que é o rei da criação!
As coisas que a gente lhe ouve e tem que ser!
Mas a minha opinião, diz o pargo capatão,
Gostava de lha dizer!

Pois se a gente até se afoga!
Grita a moga, por o homem ter estragado o ambiente!
Dar cabo da criação, esse pimpão,
Isso não é decente!

Diz do seu lugar: tá mal!, o carapau,
Porque, por estes caminhos,
Certo vamos mais ou menos ficando todos pequenos,
Assim como “jaquinzinhos”

Diz então o camarão, a certa altura:
Mas o que é que nós ganhamos por falar?
Ó seu grande camarão, pergunta então o cação,
Você nem quer refilar?

Se quer morrer, diz a lula toda fula,
Com a mania da cerveja e dos cafézes,
Morra lá à sua vontade, que assim seja!,
Para agradar aos fregueses!

Diz nessa altura a sardinha prá taínha:
Sabe a última do dia? A pescadinha, já louca,
Meteu o rabo na boca,
O que é uma porcaria!

Peço a palavra! gritou o caranguejo,
Eu, que tenho por mania observar,
Tenho estudado a questão e vejo a poluição
Dia e noite a aumentar

Cai do céu a água pura
E a criatura pensa que aquilo que é dele é monopólio.
Vai a gente beber dela e a goela
Fica cheia de petróleo!

A terra e o mar são para o cidadão
Assim como o seu palácio.
Se um dia lhe deito o dente
Pago tudo de repente ou eu não seja crustáceo!

É um tipo irresponsável, grita o sável,
O homem que tal aquele!
Vai a proposta prá mesa: ou respeita a natureza,
Ou vamos todos a ele!

A preocupação com a conservação do meio ambiente não é de hoje. Há trinta anos já havia - imagine-se! - um fado que chamava a atenção para o tema. Quem disse que a alma lusa só acorda para os problemas tarde e a más horas?

Rui Bandeira

05 março 2008

Reintegração do Companheiro (III)


O novo Companheiro não necessita de se integrar no grupo. Essa tarefa já deverá estar assegurada e concluída. Mas deve reintegrar-se nele, à luz do seu novo estatuto, do grau a que ascendeu. Três atitudes deve ter como prioritárias: diligência, disponibilidade e independência.

Diligência para efectuar os novos trabalhos que lhe são pedidos, sem deixar de efectuar os trabalhos que aprendeu necessários enquanto Aprendiz. Diligência para conjugar o estudo do que está em cima com o do que está em baixo. Diligência para progressivamente se libertar da orientação que lhe é proporcionada e começar caminhando por seus próprios passos, seguindo seu próprio rumo, perscrutando seu próprio horizonte. Afinal de contas, um Companheiro vem de Aprendiz... e vai para Mestre!

Disponibilidade para efectuar tarefas em Loja e fora de Loja, quer rituais, quer na organização e execução de tarefas integradas nos objectivos e eventos a que o grupo se dedica. Na Loja Mestre Affonso Domingues, é comum aproveitar as oportunidades que surgem para atribuir a um ou dois Companheiros, funções rituais de menor exigência, em sessões mais calmas. Pode designar-se um Companheiro para assegurar o ofício de Guarda Interno numa sessão, ou atribuir-lhe o exercício da função de Experto em sessão em que não ocorra nenhuma Iniciação, ou ainda confiar-se-lhe um dia a tarefa de fazer circular o Saco das Propostas e o Tronco da Viúva. Tudo tarefas que os Mestres sabem serem de fácil execução... depois de se terem executado. O Companheiro de agora vai ser Mestre daqui a uns tempos. Como Mestre, vai ser designado para exercer ofícios. Deve, portanto, ser-lhe dada a possibilidade de sentir o peso dos objectos cujo uso faz parte das funções de Guarda Interno ou de Experto, de executar movimentação em Loja, de assumir, ainda que por breves momentos, responsabilidades em Loja. Não é nada do outro mundo, mas serve para desinibir, para treinar, também para incentivar. Também fora de sessão o Companheiro pode e deve mostrar a sua disponibilidade perante o grupo, colaborando nas organizações da Loja. Na Loja mestre Affonso Domingues, por rotina, quando se designa um grupo de Irmãos para organizar um qualquer evento, assegurar uma qualquer tarefa, inclui-se sempre nesse grupo, pelo menos, um Companheiro. Finalmente, disponibilidade para partilhar o que sabe e o que aprende com seus Irmãos Aprendizes, com os demais Companheiros e com os Mestres que, sendo-o, não são - nem por sombras... - omniscientes. O Companheiro trabalha no concreto, nas artes, nas ciências, em tudo o que respeita ao Homem. Muitas vezes, é um profundo conhecedor da sua área de actividade ou de estudo. O Companheiro já não é só Aprendiz, nem é ainda Mestre. Mas, estando a meio caminho, deve ter a noção de que já não se dedica apenas a receber e a estudar; também, naquilo que sabe, pode já transmitir, ajudar, dar. Enquanto Aprendiz, recebe do grupo; sendo Companheiro, continua a receber, mas também já algo pode dar.

Finalmente, pede-se ao Companheiro independência. Independência de pensamento, que deve ser crítico. Independência enquanto postura. Independência na execução das orientações recebidas. O Companheiro está numa fase de transição. Já não se limita a aprender a fazer. Já faz. Embora ainda deva executar os planos traçados pelos Mestres, a forma como procede a essa execução já deve ser dele, ao seu jeito, segundo as suas próprias capacidades e escolhas.

O grau de Companheiro é também um grau de transição. De assunção de novas responsabilidades, de utilização das capacidades adquiridas. Embora ainda sob a direcção dos Mestres, o Companheiro vai ganhando progressiva autonomia, vai alargando o seu olhar de si para o grupo e as suas necessidades e capacidades e potencialidades. E vai começando a analisar. O Companheiro está aprendendo a ser Mestre. De si próprio e em conjunção com os demais. Está em busca do objectivo de se poder legitimamente considerar um homem pleno, conhecendo todos os seus atributos e capacidades físicos, mentais, morais e espirituais.

Está, no fundo, a prosseguir normalmente o seu caminho. Aquele que todos os maçons percorrem, cada um chegando ao destino a que chegar.

Rui Bandeira

04 março 2008

Reintegração do Companheiro (II)


Por muito que se precise que o trabalho de um maçon é essencialmente individual, não podemos esquecer que o que diferencia o método maçónico das demais formas de aquisição de conhecimentos, progressão e aperfeiçoamento é que esse trabalho individual se processa integrado num grupo heterogéneo, interagindo reciprocamente cada um dos indivíduos com o grupo. A reorientação do trabalho do maçon que ascende ao grau de Companheiro deve, pois, ser auxiliada pelo grupo, pela Loja e, especificamente, pelos Mestres da Loja. Três aspectos essenciais devem ser tidos em conta.

Em primeiro lugar, importa ter presente que, para que o Companheiro possa harmoniosamente dedicar-se ao específico trabalho do seu grau há que lhe proporcionar condições para tal. Ou seja, há que prever, calendarizar e levar a cabo sessões rituais especificamente destinadas ao trabalho do segundo grau, há que propiciar o efectivo funcionamento da Oficina de Companheiros. Nessas sessões, para além da abertura e encerramento dos trabalhos da Oficina segundo o ritual de Companheiro, devem ser apresentadas e debatidas pranchas respeitantes aos temas do grau, isto é, respeitantes ao Homem, às Artes e Ciências. As possibilidades e a variedade são obviamente imensas. Permite-se e propicia-se, assim, que o trabalho e o estudo dos assuntos respeitantes ao grau sejam colectivamente assegurados e não apenas individual e solitariamente cometidos ao Companheiro.

Neste aspecto, muito há a fazer e a aperfeiçoar no funcionamento, pelo menos, da Loja em que me integro, a Loja Mestre Affonso Domingues - mas suspeito que também na generalidade das Lojas. Criou-se o hábito de trabalhar preferencialmente, quase exclusivamente, no primeiro grau, só se constituindo a Loja nos graus superiores quando imprescindível e na medida do indispensável. Acaba-se por se cair na tentação de só se trabalhar nos graus superiores para conferir graus, baseando-se o trabalho da Loja no primeiro grau, considerando-se que assim se não excluem obreiros (Aprendizes, quanto a sessões de segundo grau; Aprendizes e Companheiros, quanto aos trabalhos do 3.º grau) dos trabalhos e se reforçam os laços de solidariedade entre todos. Embora compreenda a pureza da intenção, penso que é nocivo que assim se proceda. O trabalho maçónico pressupõe evolução. Não é por acaso que se concebeu que os trabalhos maçónicos decorrem em três graus. Em cada um destes, há objectivos a atingir, conhecimentos específicos a obter, trabalho próprio a realizar. Privilegiar - ainda que com a melhor das intenções - um grau em detrimento dos restantes equivale a empobrecer desnecessariamente a riqueza do trabalho comum de uma Loja. Abrir a Loja no grau de Companheiro apenas para passar Aprendizes a Companheiros e para a apresentação da prancha que é exigida ao Companheiro para que possa ascender a Mestre - por vezes, uma prancha que, em bom rigor, não respeita ao objecto do que devem ser os estudos do Companheiro, mas afinal uma simples prancha bis de Aprendiz, apenas com a diferença de respeitar a um dos poucos símbolos privativos do grau de Companheiro - não é a melhor forma de trabalhar o grau de Companheiro.

Em segundo lugar, devem os Mestres dar o exemplo, elaborando e apresentando pranchas efectivamente do grau de Companheiro, sobre o Homem, as Artes ou as Ciências. Não quer isto dizer que o simbolismo não tenha também lugar no grau de Companheiro. Claro que tem. Mas não tem aqui a essencialidade que reveste no primeiro grau. Aprendida e apreendida a forma de trabalhar com os símbolos, o maçon deve voltar-se para o Mundo e estudar-se a si próprio e às suas realizações nos campos do Saber e da Beleza, à luz da sua própria evolução, não concentrar-se num qualquer simbólico-metafísico plano exterior à realidade. Tese-antítese-síntese, síntese como nova tese- nova antítese-nova síntese. Assim evolui em todos os campos o Homem. Se persiste e insiste apenas num único aspecto, numa única linha, num preciso ponto, por muito meritório que seja, não evolui, involui. Devem, pois, os Mestres dar o exemplo, mostrar, o tipo de trabalho que se deve fazer no grau. Para que os Companheiros melhor o compreendam e possam tentar e, muitas vezes, conseguir, fazer melhor...

Em terceiro lugar, deve a Loja ter sempre presente que cada homem é um homem, cada caso um caso, cada situação uma situação. Não há cartilhas, não há manuais. O que se coloca aos Companheiros são linhas orientadoras, mapas que são postos à sua disposição. A forma como cada Companheiro vai percorrer (ou evitar; ou saltar; ou transgredir; ou esticar; ou aperfeiçoar; ou...) essas linhas é com ele. A maneira como vai olhar e utilizar (ou ignorar; ou refazer; ou...) os mapas é também com ele. A viagem é dele. O grupo só lhe propicia os meios para que a faça. E não há viagens certas, nem destinos errados. O que vale também por dizer que, apesar de eu defender que um Companheiro deve estudar o Homem, as Artes e as Ciências, se ele preferir continuar a concentrar-se exclusivamente no simbolismo, estudando apenas e só os símbolos do grau... tenho de respeitar e aceitar isso e reconhecer o mérito dessa opção. Não será a minha, não será a que eu penso a melhor... mas não existe nenhum decreto do Grande Arquitecto que estipule que eu estou certo e o outro errado; como nada garante que o que é certo para mim não convenha ao outro e que o que a mim me parece inconveniente não seja o adequado para o meu Irmão... Em suma, indicar, não dirigir, orientar, não abafar, propiciar, não obrigar. Ou seja, executar o que é a Maçonaria: um grupo ao serviço do indivíduo e beneficiando do que este lhe traz; não o indivíduo ao serviço, subjugado e dependente do grupo. Porque, acima de tudo, um maçon é um homem livre - e de bons costumes...

Rui Bandeira

03 março 2008

Reintegração do Companheiro (I)

A Passagem a Companheiro é um anti-clímax. Depois de uma cerimónia de Iniciação que o marcou, depois de um período de Aprendizagem em que foi confrontado com uma luxuriante quantidade de símbolos, em que focou a sua atenção nos aspectos da espiritualidade, o novo Companheiro ascende a esse grau através de uma cerimónia simples e singela e inicia um período de trabalho em que depara com muitos poucos símbolos novos e lhe é pedido que foque a sua atenção em algo que, provavelmente, foi objecto dela na maior parte da sua vida: o Homem, as Ciências e as Artes.

De repente, a novidade desaparece, o que se vislumbra nesta parte do caminho do maçon é o mesmo que qualquer profano medianamente culto vê no seu dia a dia. Naturalmente que o panorama se mostra menos interessante, que é admissível e até natural o pensamento de que não se vislumbra grande diferença entre a Maçonaria e o Mundo Profano. Naturalmente que o novo Companheiro descobre em si um misto de sentimentos que lhe desagradam: desilusão, estranheza, indiferença. Para quê voltar a estudar o que já se estudou? Ou que real vantagem se tira de iniciar um estudo, autodidacta e limitado, de uma qualquer outra disciplina científica ou artística diferente daquela a que profissionalmente nos consagrámos? Não será o grau de Companheiro o mais gritante dos anacronismos da Maçonaria? Talvez porventura no século XVIII se justificasse. Então imperava o analfabetismo, muitas das ciências davam os primeiros passos, o Iluminismo era ainda recente... Mas, nos dias de hoje, que interesse e justificação tem pedir-se a homens cultos, muitos licenciados e doutorados que... estudem o Homem e as ciências e as artes? Tudo isto são interrogações legítimas, preocupações compreensíveis, hesitações evidentes. Mas por tudo isto é necessário passar, para se concluir a formação maçónica!

Em primeiro lugar, este quadro cinzento permite que se tire uma lição: a Maçonaria não é um glorioso caminho de excelsas novidades, que o maçon percorre pisando a passadeira vermelha da exaltação espiritual. Ou, pelo menos, não é só isso. A Maçonaria, como tudo na vida, tem coisas agradáveis e coisa menos agradáveis. Tem o que nos dá prazer e conforto e motivação. Mas também tem o que nos é mais penoso, menos atractivo, mais aborrecido. A Maçonaria é, no fundo, um método de aprendizagem da Vida. E a Vida é assim mesmo: tem o agradável e o menos agradável, o exaltante e o aborrecido, o saboroso e o insosso. Isto para além de que o que é saboroso para uns é insosso para outros, o que agrada a una quantos, é indiferente a tantos outros, o que exalta estes aborrece aqueles. A diversidade de opções, de vias, a integração e valorização da individualidade através do grupo implicam que todos, de quando em vez e mesmo frequentes vezes, suportem algo que lhes é menos agradável em prol dos demais. A diversidade é uma riqueza, mas também um fardo!

Em segundo lugar, há que aprender ou relembrar que o Homem é tão mais interiormente rico quanto mais diversificados forem os seus interesses. Vivemos em tempos de especialização. Em contraponto, a Maçonaria lembra-nos as vantagens (mas também os inconvenientes...), a riqueza (e o esforço...), a essencialidade (e a penosidade...) de se ser um Homem integral, harmoniosamente desenvolvido científica, cultural e espiritualmente.

Mas a aquisição destas noções, o relembrar destes princípios constitui, inicialmente, um choque. O novo Companheiro tem a sensação de que, em vez de progredir, está a regredir. E, mesmo que o não verbalize, não se pode impedir de sentir um certo desapontamento. É por isso que é essencial um trabalho de reintegração do Companheiro. Não uma simples integração no grupo, que já está feita, mas de reintegração no espírito de crescimento, de aperfeiçoamento, através das diferentes ferramentas que agora se lhe pede que utilize.

Os Mestres, e em particular o Primeiro Vigilante da Loja (o oficial que tem a seu cargo o acompanhamento da coluna dos Companheiros), devem, nesta fase, colocar-se á inteira disposição do Companheiro. Procurar esclarecer-lhe as dúvidas. Apontar-lhe o caminho. Traçar-lhe objectivos. Permitir-lhe que venha a perceber, à luz dos conhecimentos simbólicos que, enquanto Aprendiz, adquiriu, a necessidade deste período especificamente destinado ao estudo do que é terreno, do que é material, do que é humano.

É a hora de relembrar ao Companheiro todos os símbolos de dualidade com que se confrontou e esperar que ele tire as suas conclusões. É o momento de lhe relembrara a frase, que lhe soou talvez tão enigmática, de que o que está em cima é como o que está em baixo. É afinal a ocasião para que o Companheiro ganhe a noção de que, mesmo quando lida com coisas muito práticas, ainda então e assim isso tem um significado simbólico. E aí o Companheiro regressa a águas conhecidas...

É altura de realçar que novos conhecimentos, ricos cambiantes, diferentes tonalidades se surpreendem ao revisitar, à luz dos conhecimentos que adquirimos em Maçonaria e da melhoria espiritual que progressivamente buscamos alcançar, as ciências e as artes que tão bem julgamos conhecer.

E então estará aberta a via para que a desilusão desapareça, o aborrecimento esmoreça, a estranheza se dissipe. O Companheiro, devidamente apoiado, por ele mesmo compreenderá a razão de ser deste regresso às coisas terrenas e do Homem, a necessidade de o empreender, o trampolim que constitui para o avanço seguinte.

No fim, o Companheiro compreenderá algo que aprendeu na sua Passagem: que, por vezes, é necessário um desvio e um regresso ao rumo, para poder prosseguir caminho...

Rui Bandeira

29 fevereiro 2008

Quanto ganhas por hora?

Mais uma pequena história que recebi por correio electrónico. Mais uma vez, quando procurava uma imagem para ilustrar o texto, verifiquei que já foi publicada em vários blogues. Não é razão para não a publicar aqui. Não precisa de comentários. É tão certeira que até dói...!

Um dia, quando um homem chegou tarde a casa, cansado e irritado após um dia de trabalho, encontrou, esperando por si à porta, o seu filho de 5 anos.

- Papá, posso fazer-te uma pergunta?

- Claro que sim. O que é?

- Quanto ganhas numa hora?

- Isso não é da tua conta. Porque me perguntas isso?! - respondeu o homem, zangado.

- Só para saber. Por favor... diz lá... quanto ganhas numa hora? - perguntou novamente o miúdo.

- Bom... já que queres tanto saber, ganho 10 euros por hora.

- Oh! - suspirou o rapazinho, baixando a cabeça.

Passado um pouco, olhando para cima, perguntou:

- Papá, emprestas-me 5 euros?

O pai, furioso, respondeu:

- Se a razão de tu me teres perguntado isso, foi para me pedires dinheiro para brinquedos caros ou outro disparate qualquer, a resposta é não! E, de castigo, vais já para a cama. Vai pensando no menino egoísta que estás a ser. A minha vida de trabalho é dura demais para eu perder tempo com os teus caprichos!

O rapazinho, cabisbaixo, dirigiu-se silenciosamente para o seu quarto e fechou a porta. Sentado na sala, o homem ficou a meditar sobre o comportamento do filho e ainda se irritou mais. Como se atrevia ele a fazer-lhe perguntas daquelas? Como é que, ainda tão novo, já se preocupava em arranjar dinheiro?

Passada mais ou menos uma hora, já mais calmo, o homem começou a ficar com remorsos da sua reacção. Talvez o filho precisasse mesmo de comprar qualquer coisa com os 5 euros. Afinal, nem era costume o miúdo pedir-lhe dinheiro. Dirigiu-se ao quarto do filho e abriu devagarinho a porta.

- Já estas a dormir? - perguntou.

- Não, papá, ainda estou acordado. - respondeu o miúdo.

- Estive a pensar... Talvez tenha sido severo demais contigo. - disse o pai. - Tive um longo e exaustivo dia e acabei por desabafar contigo. Toma lá os 5 euros que me pediste.

O rapazinho endireitou-se imediatamente na cama, sorrindo:

- Oh, papá! Obrigado!

E levantando a almofada, pegou num frasco cheio de moedas. O pai, vendo que o rapaz afinal tinha dinheiro, começou novamente a ficar zangado.O filho começou lentamente a contar o dinheiro, até que olhou para o pai.

- Para que queres mais dinheiro se já tens aí esse? - resmungou o pai.

- Porque não tinha o suficiente. Agora já tenho! - respondeu o miúdo. - Papá, agora já tenho 10 euros! Já posso comprar uma hora do teu tempo, não posso? Por favor, vem uma hora mais cedo amanhã. Gostava tanto de jantar contigo...

Gosto muito que leia este blogue. Mas NUNCA - nunca mesmo! - gaste com ele um minuto que seja do tempo que deve dedicar aos seus filhos!

Um bom fim de semana!

Rui Bandeira

28 fevereiro 2008

Ars Macionica


A Loja de Investigação da Grande Loja Regular da Bélgica tem o nome de Ars Macionica. Reclama-se de estar sob a égide do número três: Trabalha nos três graus simbólicos, tem três reuniões por ano e comunica em três línguas, inglês, francês e neerlandês. Foi criada em 1992. A ela podem pertencer todos os Mestres Maçons da Maçonaria Regular que tenham publicado, pelo menos, um trabalho original.São admitidos a participar nos trabalhos da Loja Aprendizes e Companheiros, em função do tema em análise. Reúne no seu seio maçons de diversas nacionalidades: belgas, franceses, suíços, holandeses, ingleses, italianos, gregos.

O símbolo e medalha da Loja representa a coruja de Atena, a ave que vê à noite. Símbolo da sabedoria, evoca o espírito crítico dos filósofos gregos.

Como outras Lojas de Investigação, a Ars Macionica agrega um Círculo de Correspondentes. Mediante o pagamento anual de 25,00 euros, cada correspondente tem direito a receber um volume anual das Acta Macionica, de receber convites para todos eventos organizados pela Loja ou pelo Circulo de Correspondentes, de estar presente em todas as sessões da Loja (em função do seu grau), de ver publicados no volume correspondente das Acta Macionica, sob o seu nome, os textos das perguntas ou intervenções que formule a propósito das conferências e a ver publicadas, no número seguinte, as respostas às perguntas que tenha formulado ou a reacção do conferencista aos comentários que tenha apresentado.

As Acta Macionica são a publicação anual da Loja. Até 2007, foram publicados dezassete números. Dezassete, porque o primeiro volume foi publicado ainda em 1991, antes da criação formal da Loja.

A sua última reunião teve lugar no passado sábado, dia 23 de Fevereiro. Nesta reunião, foi proferida por Paul Rousseau a conferência intitulada A Maçonaria no Luxemburgo.

Rui Bandeira

27 fevereiro 2008

"Fiz das tripas coração"

É doente?
Ou convalescente?
Vai ser operado?
E está assustado?
Então porque espera?
Quem espera desespera!
Aprenda a sorrir!
Meia cura é o rir!
Aprenda com o autor
Que é médico e doutor!
E que ensina com humor
A ultrapassar a dor!

Este texto bem-disposto chama a atenção no convite que recebi para o lançamento do novo livro de MIGUEL ROZA, com o sugestivo título Fiz das tripas coração, publicado pelas edições São Rozas.

O lançamento do livro ocorrerá na próxima sexta-feira, dia 29 de Fevereiro (um dia especial: o autor garante, com certeza absoluta, que não ocorrerá outro lançamento de qualquer outro livro, por ele ou por qualquer outro autor, no dia 29 de Fevereiro, nos próximos três anos...), pelas 18 h 30m, no Grémio Literário, sito na Rua Ivens, n.º 37, ao Chiado, em Lisboa.

O Grémio Literário não dispõe de estacionamento privativo, mas o convite assegura que existem vários parques de estacionamento próximos. Ironia em todos os pormenores...

O livro será apresentado pelo Dr. Luís Lourenço, presidente da SOPEAM (Sociedade Portuguesa de Escritores e Artistas Médicos).

Este livro, a exemplo do anterior volume de narrativas do autor, De médico e de louco tomos temos um pouco, constitui mais uma pérola demonstrativa da arte de bem escrever e do bom humor, ironia e bonomia de MIGUEL ROZA.

Reservar o fim de tarde de sexta-feira para dar um saltinho até ao Grémio Literário e obter um exemplar do livro é uma óptima maneira de garantir um fim de semana bem disposto, com uma leitura agradável!

Rui Bandeira

26 fevereiro 2008

O trabalho do Companheiro


O trabalho do Companheiro é, simultaneamente, a continuação do trabalho do Aprendiz e a realização de uma tarefa diferente.

O Aprendiz trabalha no seu aperfeiçoamento e simultaneamente procura conhecer e reconhecer uma significativa quantidade de símbolos e descortinar o seu significado. O Aprendiz trabalha e aperfeiçoa o espírito. Ao Aprendiz pede-se que abstraia das lhanezas do mundo e da vida e que procure subir aos altos planos do Espiritual, do Ético. O Aprendiz recorda que o Homem não é só carne, não é simples animal sobrevivendo no terceiro planeta à roda de uma obscura estrela na ponta de uma das milhares de galáxias existentes no imenso Universo. O Aprendiz relembra, interioriza, que o Homem é também espírito e que esse é o lado nobre da sua natureza. E cultiva esse lado.

O Companheiro, sem esquecer tudo isso, continuando a trabalhar nesse sentido, deve voltar de novo a sua atenção para a sua Humanidade, para a sua natureza de Homem.

Depois de ter trabalhado exclusivamente concentrado na elevação e aperfeiçoamento espiritual, enquanto Aprendiz, ao Companheiro pede-se que, sem abandonar esse trabalho que aprendeu a fazer, regresse a este mundo, que reassente os pés na Terra, que volte a dirigir o seu interesse, a sua curiosidade, a sua vontade de aprender e de evoluir também para os aspectos do Homem e das Ciências e das Artes.

Um Homem completo não desenvolve apenas as suas aptidões espirituais. Porventura isso fará de quem opte por esse caminho um místico de excelência. Mas o objectivo do caminho e do método maçónicos não é o misticismo, não é a obtenção de epifanias. O objectivo do caminho e do método maçónicos é o desenvolvimento integral e harmonioso do Homem. O seu aperfeiçoamento não deve, pois, ser exclusivamente espiritual, antes este deve ser integrado no conjunto das capacidades humanas. Espírito e Razão, duas faces da moeda que é o Homem. Ambas devem ser integral e harmoniosamente desenvolvidas.

Nos dias de hoje, em que o Materialismo impera, o desenvolvimento do lado espiritual do Homem impõe-se. Mas também se impõe que se não abandone o lado material, científico, terra a terra, que constitui, continua a constituir e sempre constituirá parte da natureza humana.

O trabalho do Companheiro é, pois, depois do trabalho focado no espiritual, e sem o abandonar, regressar e focar-se de novo também nos aspectos "comezinhos" do Homem e do Conhecimento.

O Aprendiz trabalha na descoberta do Grande Arquitecto, do seu lugar na Vida e no Mundo, no vislumbrar do Plano da Criação e em tudo o que o faça subir acima das comezinhas coisas terrenas. O trabalho do Companheiro é regressar a essas coisas terrenas. Porque só assim o maçon será um Homem completo.

O trabalho do Companheiro vem assim reequilibrar o maçon.

Num texto da Cristandade, conta-se como Cristo certa vez acentuou, a propósito da moeda romana e do que se lhe perguntava sobre ela, que se devia dar a Deus o que é de Deus e a César o que é de César. Acentuou e chamou a atenção para a dicotomia entre o material e o espiritual.

Pois bem, o Maçon deve ter presente que é simultaneamente de Deus e de César. Não lhe cabe desenvolver e aperfeiçoar apenas o seu lado espiritual. Também a sua natureza racional, material, o seu espírito científico e ou artístico devem, por igual, merecer a sua atenção.

A Maçonaria não visa tornar homens bons em místicos. Visa tornar homens bons em homens melhores. Deve, portanto, atender à integralidade do Homem, dos seus conhecimentos e realizações.

O trabalho do Companheiro é essencialmente um regresso. Um regresso ao Homem, às Ciências e às Artes. Mas um regresso que não prescinde, que não abandona, que traz na bagagem, tudo o que obteve e aprendeu e viu e intuiu no seu percurso de Aprendiz. Não substitui aquele por um novo. Acrescenta àquele percurso mais uma nova exigência.

Em termos simples, o Aprendiz estuda o Grande Arquitecto, o Companheiro prossegue os estudos, voltando a sua atenção para o Homem. Aquele concentrou-se no Criador. Este recentra-se na Criatura, suas características e realizações.

Espiritual e material. Criador e criatura. Deus e o Homem. O Desconhecido e o comezinho. As etéreas alturas e o terra a terra. Dualidade que é essencial para o maçon. Porque só assim é verdadeiramente completo! Porque mesmo a mais livre ave não pode sempre voar. Também tem que regressar à Terra e nela pousar. E, para isso, tem de conhecê-la, saber onde pode estar segura, onde estão os perigos, como faz , onde se abriga, onde cria os seus filhotes. Céu e Terra.

O trabalho do Companheiro é regressar ao estudo do Homem, das suas Ciências e das suas Artes. Sem deixar de continuar a aperfeiçoar o seu lado espiritual. Assim se completa! Assim se faz!

Rui Bandeira

25 fevereiro 2008

A Passagem


Chama-se Passagem à Cerimónia pela qual o Aprendiz adquire o estatuto de Companheiro, conferindo-se-lhe o segundo grau da Arte Real.

Tal como a Iniciação, a Passagem é um rito... disso mesmo: de passagem. Tal como aquela, tem os três tempos de um rito de passagem: de onde vens, o que és, para onde vais.

Mas, ao contrário da Iniciação, a cerimónia de Passagem deixa quase sempre no nóvel Companheiro um travo de desapontamento, uma sensação de que o que ocorreu foi menos do que o que o esperava.

Efectivamente, a Cerimónia de Passagem é muito mais simples e sóbria do que a Iniciação. Se pensarmos bem, deve sê-lo! A Iniciação marca a entrada num novo mundo, marca a transição da vida profana para a vivência maçónica. A Passagem assinala apenas o dobrar de uma etapa. Uma marca que, tendo o valor de assinalar um progresso, uma melhoria, um crescimento, no entanto o maçon que dela beneficia já deverá começar a perceber que é só uma pequena parte do muito caminho que ainda tem para percorrer, se quiser efectivamente atingir a plenitude das suas capacidades.

E, para que o maçon que passa de Aprendiz a Companheiro não tenha dúvidas nem ilusões sobre o pouco que andou e o muito que lhe falta percorrer... vai começar por se desiludir com a espartana Cerimónia de Passagem!

Não é só por esta razão que a Cerimónia de passagem é tão simples. Porque ela é propositadamente simples, curta e sem enfeites!

A Cerimónia de Passagem não marca apenas uma mudança de estatuto, de grau, de Aprendiz para Companheiro.

A Passagem assinala sobretudo um novo estilo e objectivo de trabalho. Não uma mudança, porque o maçon não deve deixar de efectuar o trabalho que aprendeu a fazer enquanto Aprendiz para passar a fazer o tipo de trabalho do Companheiro. Não isso. Um maçon deve ser Aprendiz toda a sua vida maçónica. A Passagem assinala que, para além do trabalho que o maçon faz enquanto Aprendiz, deve, a partir de então, passar a executar também um novo tipo de trabalho.

A Passagem não é uma promoção. É um entregar de novas responsabilidades, a acrescer às que já se cumprem.

A Passagem não se destina, portanto, a impressionar, a marcar. A Passagem, pelo contrário, destina-se a enfatizar que o trabalho do maçon é sóbrio e persistente e cada vez mais profundo e variado. A Passagem não é uma festa. É apenas a entrega de um certificado de aptidão. A Passagem não é uma entrada na Mansão do Conhecimento Maçónico, é apenas a abertura de mais uma porta e o acesso de mais uma sala, para que o maçon, que anteriormente trabalhava apenas na sala dos Aprendizes... passe agora a trabalhar também na oficina dos Companheiros.

A Passagem deixará no maçon um travo levemente amargo da desilusão. Mas é para isso que serve. Para que o maçon perca as últimas ilusões que, sobre a Maçonaria, ainda guarde do seu passado de profano e confirme que o seu caminho é de trabalho. Mais trabalho.

Eu senti essa desilusão na minha Passagem a Companheiro. Eu, que já assisti e participei em dezenas de Cerimónias de Passagem, já vi dezenas de trejeitos de desilusão nas faces e nos olhos dos meus Irmãos. A alguns a desilusão é tanta e tão pesada que, mansamente, discretamente, se vão ausentando e decidem abandonar o caminho que os demais continuam a percorrer. Não é grave! Nem todos os Aprendizes chegam a Companheiros. Nem todos os Companheiros ascendem a Mestres. E seguramente que nem todos os Mestres virão a exercer o ofício de Venerável Mestre. É assim a realidade! Para alguns, o peso do trabalho é superior ao que se sentem com capacidade de suportar e arreiam. Também na Maçonaria a selecção é natural... Cada um percorre o seu caminho ate onde pode. Mesmo os que decidem parar a meio, já percorreram, pelo menos, uma parte do caminho. Esse ganho já é deles e ninguém lhes tira.

Não é por sadismo ou por inconsciência que se sujeita o maçon à desilusão, que se arrisca a sua desistência. É porque é necessário que essa etapa seja vivida. O novo trabalho que se acrescenta parecerá, para muitos, inútil e desnecessário. Mas não é nem uma coisa, nem outra. Porque com ele o maçon vai aprender que, para ser Mestre de si próprio, tem de ser um Homem completo. E que tem de se completar. De crescer e desenvolver-se harmoniosa e equilibradamente em todos os campos. Não apenas num ou em alguns. Sobretudo, não apenas onde e como gosta...

Para começar, tem uma desilusão... Mas, se efectivamente aprendeu bem o que tinha de aprender na coluna dos Aprendizes, cedo, logo, superará essa desilusão; cedo, logo, se lembrará que, em Maçonaria o que parece normalmente é diferente do que é e o que é normalmente é mais do que parece; cedo, logo, esquecerá a desilusão e olhará, atentará, meditará no que, espartana, simplesmente, lhe foi mostrado. E agirá em conformidade. E com isso completar-se-á.

Demorei muitos anos a perceber isto. Andei muito tempo a dizer e a escrever que o grau de Companheiro estava mal acabado, que era desinteressante, que era uma perda de tempo, enfim, uma quantidade de disparates que os mais antigos fizeram o favor de estoicamente suportar, sem me tirarem a possibilidade de descobrir por mim próprio como eram tão desajustados!

O ciclo reproduz-se com cada maçon que persiste! Desilude-se, interroga-se, observa, trabalha, evolui e... um dia percebe que era assim mesmo que tinha de ser e de fazer. Quando, finalmente, estiver pronto para perceber.

A cada novo Companheiro eu dedico três desejos: que cumpra o ciclo que eu e muitos outros antes de mim cumpriram e ainda muitos mais cumprirão depois dele; que, um dia, perceba, como eu percebi; que não necessite de tanto tempo como eu necessitei!

Rui Bandeira

22 fevereiro 2008

O doce aroma do café

Mais um texto, da autoria original de R. P. Arturo Vargas, que recebi por correio electrónico e que adaptei para aqui publicar, pois parece-me ser mais uma boa alegoria, demonstrativa de princípios e posturas de vida que devemos ter.

Uma filha queixou-se ao seu pai da sua vida e de como tudo estava difícil para ela. Já não sabia o que fazer. Estava cansada de lutar, sem obter resultados. Apetecia-lhe desistir. Parecia que, mal resolvia um problema, logo outro lhe aparecia, numa sucessão sem fim e sem descanso.

O pai, cozinheiro de alta cozinha em restaurante de luxo, levou-a até à cozinha do restaurante onde trabalhava. Ali, encheu três panelas com água e colocou cada uma delas sobre lume alto. Na primeira, colocou ainda cenouras. Na segunda, deitou ovos. E, na terceira, despejou café em pó. Sem dizer uma palavra, deixou que tudo fervesse.

Cerca de vinte minutos depois, apagou o lume. Retirou as cenouras da primeira panela e colocou-as num prato. Retirou os ovos da segunda panela e colocou-os num recipiente. Finalmente, com uma concha, retirou o café e colocou-o numa tigela.

Virando-se para a filha, perguntou-lhe o que via.

- Cenouras, ovos e café - respondeu ela.

O pai pediu-lhe para se aproximar e experimentar as cenouras. Ela assim fez e reparou que as cenouras, cozidas, estavam macias. O pai disse-lhe então para pegar num ovo e descascá-lo. Ela assim fez e verificou que o ovo endurecera com a fervura. Finalmente, o pai disse-lhe que bebesse um pouco de café. Ela assim fez, sorrindo ao notar o seu aroma delicioso.

Mas a filha estava confusa e perguntou ao pai onde queria ele chegar.

Então o pai explicou-lhe que os três diferentes géneros tinham sido submetidos à mesma adversidade: água a ferver. Mas tinham reagido de maneira diferente.

A cenoura entrara na água, forte, firme e dura. Mas depois de submetida aos efeitos da água fervente, amolecera e tornara-se frágil.

Já os ovos eram frágeis quando entraram na água, com o seu interior líquido apenas protegido por uma fina casca. Mas, depois de terem sido fervidos na água, o seu interior endurecera.

Porém, o pó de café era incomparável: uma vez colocado na água a ferver...
mudara a água!!!

As pessoas, em face da adversidade, podem comportar-se como estes três elementos. Uns, como a cenoura, podem parecer fortes mas, submetidos à adversidade e à dor, murcham, tornam-se frágeis e perdem a sua força. Outros, como o ovo, começam com o coração maleável e o espírito fluido mas, submetidos às adversidades da vida, tornam-se duros e inflexíveis. A sua casca exterior parece a mesma, mas estão mais amargos e obstinados, com o coração e o espírito inflexíveis.

Finalmente, há aqueles que são como o pó de café. Este muda a água fervente, o elemento que lhe causa dor. Quando a água chega ao ponto máximo da sua fervura, o café atinge o máximo do seu aroma e sabor.

Procura, minha filha, ser como o café, que, quando as coisas se tornam difíceis, consigas reagir de forma positiva, tornando-te cada vez melhor, sem te deixares vencer pelas circunstâncias, e fazendo com que tudo à tua volta se torne cada vez melhor!

Uma boa lição de vida, para nós seguirmos e para ensinarmos aos nossos filhos!

Rui Bandeira

21 fevereiro 2008

Museu virtual Aristides de Sousa Mendes

Meus Caros, este é apenas um adicional ao post do Rui de dia 15 p.p.

A Figura exemplar de Aristides de Sousa Mendes começa a aparecer, para conhecimento dos portugueses e orgulho de Portugal.
Infelizmente continuam a acontecer eventos da maior relevância nacional que passam..., pura e simplesmente passam !
Talvez se perceba porque de facto A.S.Mendes apenas salvou milhares de vidas, e se estudarmos bem a Sua existência constataremos que não foi jogador de futebol, nem bancário vigarista, nem nada dessas coisas importantes.

A casa de A.S.Mendes, em Cabanas de Viriato, está na ruína.

Ali, ele e Sua Mulher Angelina receberam e alimentaram grande parte dos exilados cujas vidas haviam sido salvas pelos vistos consulares passados por ASM à revelia das ordens de Salazar.
Desta vez o Presidente Cavaco Silva tem razão, há outras prioridades à frente do campeonato do mundo de futebol.
A exposição (virtual) está dividida em três corredores: da Guerra, da Fuga e da Liberdade.
Nestes corredores são apresentados documentos/filmes pertencentes a arquivos tais como a Shoah Fundation, o Museu do Holocausto e Cinemateca Portuguesa.
O primeiro corredor dá conta dos factos históricos que antecedem a II Guerra Mundial bem como o seu início.
O segundo corredor narra a fuga de milhares de refugiados, alguns dos quais vêem o seu caminho cruzar-se com Aristides Sousa Mendes.
No último são apresentadas imagens da chegada de refugiados a Portugal, da sua estada e da sua partida rumo a novos destinos.
Em cada corredor há a hipótese de percorrer o filme em capítulos (link ao fundo, do lado esquerdo).
Noutra parte do museu, a base conhecimento, é possível consultar centenas de documentos, fotografias e alguns testemunhos orais de refugiados, na maioria salvos por Sousa Mendes.
O site, para além de muito informativo, está construído duma forma brilhante e parece-me que é fruto duma iniciativa pessoal (Margarida Dantas) depois apoiada pelo Ministério da Cultura.
Não custa nada percorrer este excelente museu, pois é só carregar em http://mvasm.sapo.pt/


J.P.Setúbal

20 fevereiro 2008

Colóquio Mozart e a Matemática



Sábado, dia 23 de Fevereiro, 15h30

Será que já na sua primeira composição, aos 5 anos, Mozart se socorreu da Matemática para escrever música? Qual a relação entre uma peça de Mozart e um vitral? E será que o número 3 tem um significado especial na Flauta Mágica? No próximo Sábado, dia 23 de Fevereiro, às 15h30, assista no Pavilhão do Conhecimento - Ciência Viva a mais um colóquio sobre A Matemática das Coisas e descubra a relação entre Mozart e a Matemática. A entrada é gratuita. Carlota Simões, docente do Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, irá mostrar a presença da Matemática na obra do criador das Bodas de Fígaro e um grupo de alunos da Escola de Música do Conservatório Nacional tocará alguns trechos da Flauta Mágica. E para provar que na obra de Mozart tudo é possível, duas alunas de violino do Conservatório de Música de Coimbra vão tocar a mesma peça de forma bem diferente: uma lendo a partitura de cima para baixo, outra lendo a mesma pauta de pernas para o ar. Até Maio, venha descobrir, através de palestras conjuntas de matemáticos e profissionais de outras áreas, de que forma a Matemática se revela em coisas tão distintas como os jogos de azar, as histórias para crianças, ou o bem e o mal. O ciclo de colóquios A Matemática das Coisas é uma iniciativa conjunta do Pavilhão do Conhecimento - Ciência Viva e da Sociedade Portuguesa de Matemática. Programa completo em http://www.pavconhecimento.pt/ e http://www.spm.pt/

Transcrevo esta notícia recebida do Pavilhão do Conhecimento porque a considero verdadeiramente interessante.

Por mim, lá estarei, salvo "acidente de percurso" inesperado.

JPSetúbal

19 fevereiro 2008

O salário do maçon

A Maçonaria Operativa, como estrutura de regulação do acesso e prática da actividade profissional de construtor em pedra, regulava igualmente as formas de pagamento e os montantes dos salários dos seus associados.

Também na Maçonaria Especulativa os maçons recebem o seu salário. Simplesmente, como tudo na Maçonaria Especulativa, o salário que o obreiro recebe é simbólico.

O obreiro trabalha em Loja. Em quê? No seu aperfeiçoamento, na busca dos conhecimentos, das lições, dos exemplos, das práticas que dele farão uma pessoa melhor. Nesse trabalho tem de identificar e interpretar símbolos, atribuindo-lhes o seu significado pessoal, similar ou não ao que os seus Irmãos, ou alguns dos seus Irmãos, ou um particular Irmão, lhes atribuem. O trabalho do obreiro em Loja insere-se e une-se ao trabalho que os demais obreiros efectuam, constituindo o conjunto um acervo de estudos, actividades, interpretações, princípios desenvolvidos, que tem mais virtualidades como um todo do que a mera soma dos contributos individuais.

Virtualidades para quem? Para os próprios obreiros. O trabalho maçónico é eminentemente individual, mas colectivamente efectuado. O seu resultado, inserido no conjunto dos esforços e nele amalgamado, está à disposição para apropriação de todos e de cada um. A forma como cada um beneficia é com cada qual. O mesmo obreiro, em cada momento, pode retirar do trabalho que ele e seus Irmãos efectuam lições ou consequências diferentes. Hoje poderá ser uma lição moral, amanhã uma simples lição de vida ou regra de conduta, depois uma ferramenta para uso no seu dia a dia profissional ou de relação social, por vezes apenas (e tanto é...) uma simples sensação de Paz, de Segurança, de Conforto, a mera (mas por tantos tão dificilmente obtida) noção do seu lugar na vida e do significado da sua existência.

Perante a sua Loja, o maçon apresenta para o trabalho a Pedra Bruta que é ele próprio, o seu Carácter, a sua Personalidade, as suas Características, as suas Virtudes, os seus Defeitos, as suas Capacidades, as suas Insuficiências, as suas Potencialidades e o que falta para as transformar em Realidades. Junto de seus Irmãos, trabalha essa Pedra Bruta. Retira-lhe as asperezas. Melhora a sua forma. Determina o local onde deve ser colocada. Dá-lhe cor e atavio. A pouco e pouco, essa Pedra Bruta será cada vez menos Bruta, ganhará forma mais delineada e adequada, tornar-se-á mais útil para a função que está destinada a exercer. A pouco e pouco, tornar-se-á uma Pedra Aparelhada, já com alguma utilidade e capacidade para se inserir no grande Templo da Criação, Parede da Humanidade. Mas ainda será, não já áspera, mas rugosa, não já suja, mas baça.

Será ainda necessário alisá-la e poli-la, de forma a que, a seu tempo, a Pedra Bruta que é o maçon possa vir a ser a muito mais útil e bela Pedra Polida. Mas, ainda então, de pouca utilidade e valia será se não for inserida no local adequado, pela forma asada, para exercer a função destinada. Há que conhecer ou definir os Planos, efectuar e ler o Desenho que nos guie para colocarmos a nossa Pedra, que foi Bruta e que procurámos tão Polida quanto o lográmos que fosse, no lugar correcto, em que será útil e contribuirá para a sustentação, imponência e beleza do Templo em cuja construção se insere.

Cada maçon, à medida que vai trabalhando, vai aprendendo a trabalhar, à medida que melhora, vai aprendendo a melhorar, a medida que aprende, vai aprendendo a aprender. E cada vez mais vê melhor trabalho, mais melhoria, mais larga aprendizagem. À medida que evolui vai aumentando o benefício que retira do trabalho que efectua. Não patrimonial, mas pessoal, intrínseco.

Esse benefício é o salário do maçon, a justa remuneração do seu esforço. Não tem valor de mercado, nem cotação de troca, porque vale muito mais do que uma mercadoria ou um serviço. Tem o valor supremo da Pessoa Humana, que cresce, que se educa, que evolui, que se aprofunda, que se realiza, que se enobrece, que se dignifica. Esse valor vale mais que todo o ouro do Mundo, que todas as riquezas e mordomias de que usufruem os afortunados do planeta. Porque nada vale mais do que um Homem digno, de espinha direita, cabeça lúcida, espírito forte. Aos outros, por mais ricos que sejam, conquistou-os o mundo. Este conquista o mundo, ainda que seja pobre e sem poder. O seu mundo. O que interessa.

O salário do maçon é o que ele retira do bolo comum que resulta do seu trabalho, do seu esforço e dos seus Irmãos. Em conjunto e com o fermento da Fraternidade, esse bolo cresce muito mais do que se lhe pôs, ao ponto de todos poderem retirar mais um pouco do que cada um lá pôs e ainda sobra bolo.

Esse salário não se conta, não se mede, não se pesa, não se avalia. Só o próprio o sente e dele beneficia. Não tem valor facial algum. Tem todo o valor moral e espiritual.

E, porque à medida que o maçon trabalha, aprende, cresce, melhora, de cada vez vai conseguindo retirar um pouco mais, de cada vez vai conseguindo aumentar um pouco seu salário. Imperceptivelmente. Até que um dia os seus Irmãos dão por ela e... oficializam-lhe o aumento de salário! Chamam os maçons aumento de salário à passagem de grau. Mais não é do que o reconhecimento dos progressos feitos.

Rui Bandeira

18 fevereiro 2008

Decidir em Loja


O processo de tomada de decisão em Loja não tem necessariamente os mesmos trâmites e parâmetros da vida de relação em sociedade.

Claro que, quando a decisão a tomar se prende com uma eleição, as regras são as mesmas de uma sociedade democrática: um homem, um voto, voto secreto e é eleito quem tem mais votos. Mas, por exemplo, a admissão de um novo membro, também objecto de uma votação por voto secreto, não está sujeita à regra da maioria, antes de uma tendencial unanimidade. E digo tendencial, porque, em algumas Lojas, a existência de um ou dois votos contrários deve ser justificada, para se atribuir validade impeditiva da admissão do elemento sob escrutínio.

Mas a grande maioria das decisões não se toma por voto secreto, antes na sequência de debates abertos, em que cada um manifesta livremente a sua opinião. Procura-se, se possível, atingir um consenso. Mas, se não for possível, não é propriamente uma decisão por maioria que indica o caminho a tomar. Isto causará porventura perplexidade, nos dias de hoje, habituados como estamos a que a maioria decida e ponto final.

No entanto, o facto de uma maioria se inclinar para uma determinada opção não quer dizer necessariamente que essa posição é a correcta. Nada nos assegura que não ocorre simplesmente uma situação em que se formou uma maioria de errados! Uma coisa é a maioria, a legitimidade conferida pela maioria, outra é o acerto. Na sociedade, confiamos, em regra, que a maioria erre menos vezes que a minoria. Mas, ao menos, quando o erro acontece, aceitamos as consequências desse erro, procurando consolar-nos com o pensamento de que, se se errou, ao menos foi a maioria que errou. Esquecemo-nos, ou fazemos por esquecer, que a tomada de decisão por maioria é vulnerável à demagogia, à ignorância, ao facilitismo.

Não querem estas palavras dizer que a Maçonaria recusa ou não defende os princípios democráticos. O passado da Maçonaria é bem demonstrativo de que esta preserva e luta por eles. Simplesmente, como um dia disse Winston Churchill, "a Democracia é o pior de todos os sistemas... excepto todos os outros!!!". A Democracia não é perfeita mas, para uma sociedade ou grandes grupos, não há melhor sistema de decisão.

A Maçonaria, porém, funciona normalmente em grupos de dimensão reduzida ou média, em que todos os elementos se conhecem uns aos outros. Consegue assim manter uma dimensão personalizada de contactos entre os seus membros, que permite combinar as regras democráticas com regras tradicionais, que eu me atrevo a classificar de regras de bom-senso. É através desta amálgama que se procura chegar às melhores decisões possíveis, sem deixar de ter consciência de que é completamente impossível excluir de todo a possibilidade de erro.

Para melhor se compreender como funciona o processo decisório em Maçonaria, deve ter-se presente que a Maçonaria Especulativa tem as suas raízes na Maçonaria Operativa dos construtores em pedra e respectivas Lojas de regulação do exercício da profissão e que a Maçonaria procura preservar, tanto quanto possível, a tradição que cada um recebeu dos seus antecessores.

Na Maçonaria Operativa, a Loja não era um espaço democrático. A Loja era dirigida pelo Mestre, que dirigia o trabalho, admitia e dirigia a aprendizagem dos Aprendizes e supervisionava o trabalho dos oficiais construtores (Companheiros). Em Loja, executava-se o que o Mestre dizia. Ponto final.

Este elemento de autoridade benigna, obviamente temperado pelas regras da democracia, permanece importante no processo de decisão em Loja.

Como se articulam então estes dois elementos aparentemente contraditórios? Conferindo-se legitimidade democrática a quem dirige a Loja!

Temos então que o processo de decisão em Loja resulta de se conferir poder autocrático a quem se elege democraticamente para tal, por um período determinado.

Traduzindo: o Venerável Mestre é democraticamente eleito, por voto secreto, para cumprir um mandato de duração determinada; durante esse período, a Loja e todos os seus elementos delegam o direito de decidir sobre quaisquer assuntos que respeitem à Loja no Venerável Mestre em funções.

Daqui resulta que o objectivo de um debate em Loja não é vencer a discussão ou arregimentar maioria. O objectivo que cada um prossegue num debate em Loja é contribuir com a sua informação, com a sua análise, com a sua opinião, para fornecer o máximo de elementos relevantes possível para permitir ao Venerável Mestre tomar a melhor decisão possível, decisão esta que é assumida como a decisão da Loja.

Assim, cada debate consiste em uma intervenção, no máximo duas, por cada Mestre que deseje intervir sobre o assunto. Cada um deve procurar dar a sua opinião tão fundamentadamente quanto possível. No final, um oficial da Loja, o Orador, extrai as conclusões do debate, isto é, resume as posições expostas, os argumentos apresentados, podendo ou não opinar sobre se existiu consenso ou sobre a decisão que aconselha seja tomada. Finalmente, o Venerável Mestre decide e a sua decisão vincula a Loja.

Nenhum maçon é obrigado a executar a decisão, mas nenhum maçon a pode violar. Isto é, pode omitir o seu cumprimento (primado da liberdade individual), mas não pode ir CONTRA o decidido.

Com este método de decisão, procura-se limitar o erro com apelo ao bom-senso, sem esquecer a democracia.

Esta está presente na escolha democrática daquele a quem é delegado o poder de decidir. Aquele decorre de o Venerável Mestre ouvir antes de decidir, ser aconselhado sobre a decisão a tomar antes de o fazer e, finalmente, saber que, se pode exigir que ninguém a desrespeite, só a valia e o acerto desta lhe garantem a execução dela (porque voluntária).

De tudo isto resulta, obviamente, por um lado que a margem de decisão do Venerável Mestre é mais reduzida do que aparenta. Não vale a pena o Venerável Mestre decidir branco se a generalidade dos obreiros opinou preto: ninguém executará o que não concorda. Havendo divisão de opiniões, ou é possível retirar das posições expostas o denominador comum exequível e então deverá ser esse o caminho por que se opta (pois é aquele que mais elementos executarão, senão total, ao menos parcialmente), ou não é, e então o Venerável Mestre optará segundo o seu prudente arbítrio. E considera-se que é a melhor forma, porque não há vencedores nem vencidos. Há a decisão tomada, o melhor possível, por alguém a quem se confiou a missão de tomar decisões, sempre que necessário. E, por essa legitimidade, será executada, porventura até por aqueles que dela discordem...

Não será um método de decisão perfeito. Mas seguramente procura evitar o erro e promover a harmonia e não nos temos dado mal com ele...

Rui Bandeira

15 fevereiro 2008

Homenagem a Aristides Sousa Mendes

A Respeitável Loja Aristides Sousa Mendes, n.º 32 da GLLP/GLRP, levou a cabo ontem, dia 14 de Fevereiro, uma sessão comemorativa do seu 11.º aniversário e de homenagem ao seu patrono, o Cônsul que, desobedecendo a Salazar, emitiu vistos válidos para entrada em Portugal a cerca de 30.000 refugiados, muitos deles judeus, que fugiam do avanço das tropas de Hitler e do colaboracionismo do regime de Vichy.

A sessão realizou-se numa sala de um hotel de Lisboa, para o efeito preparada e decorada segundo os trâmites do Rito de York, o rito praticado pela Respeitável Loja Aristides Sousa Mendes. Os trabalhos foram ritualmente abertos e posteriormente suspensos, sendo então franqueada a entrada na sala aos convidados, familiares e amigos de Aristides Sousa Mendes, familiares dos obreiros da Loja e maçons visitantes, representante da Fundação Aristides Sousa Mendes, da Comunidade Israelita de Lisboa e da Embaixada de Israel em Lisboa e senhoras da Ordem da Rosa (organização de senhoras esposas e companheiras de maçons, associada aos Altos Graus do Rito de York).

A homenagem a Aristides Sousa Mendes consistiu na apresentação pública de dois trabalhos sobre a vida e obra do homenageado, na entrega à Fundação Aristides Sousa Mendes, na pessoa do seu representante, do diploma de persona grata concedido pelo Muito Respeitável Grão-Mestre da Grande Loja Legal de Portugal/Grande Loja Regular de Portugal e na imposição, na pessoa do neto do homenageado, Major Álvaro Sousa Mendes, do Grande Colar da Ordem General Gomes Freire de Andrade, condecoração maçónica concedida, a título póstumo, a Aristides Sousa Mendes, em reconhecimento da sua conduta de alto significado moral e humanitário, pelo Grão-Mestre da GLLP/GLRP.

Discursaram, relembrando Aristides Sousa Mendes e sua mulher, Angelina, a sua histórica decisão e o alto preço que por ela pagou - o afastamento e o ostracismo imposto por Salazar - e manifestando a sua alegria e reconhecimento pela homenagem prestada, o representante da Fundação Aristides Sousa Mendes, que igualmente divulgou os princípios e objectivos da Fundação, e um neto do homenageado.

Ainda no âmbito das comemorações do aniversário da Respeitável Loja anfitriã, procedeu-se à realização da Cerimónia da Lembrança, sentida forma de recordar e homenagear os maçons da GLLP/GLRP que já passaram ao Oriente Eterno.

Depois de concluídas as cerimónias e homenagens, todos os ilustres convidados abandonaram a sala, após o que os trabalhos da Loja retomaram força e vigor e se procedeu ao seu ritual encerramento.

Os obreiros e ilustres convidados presentes juntaram-se seguidamente num agradável e animado ágape, no decorrer do qual houve lugar à recitação de poemas por dois profissionais do espectáculo, que, graciosa e simpaticamente, se disponibilizaram para o efeito, e a dois momentos musicais, um a cargo de um grupo de que faz parte um filho de um obreiro da Respeitável Loja Aristides Sousa Mendes, que executou, com agrado geral, duas composições musicais, a última das quais de homenagem a Aristides Sousa Mendes, e o outro a cargo de dois obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues, Acácio R. (executante de guitarra clássica) e Alexis B. (balalaica e violino), que executaram diversas obras musicais, com as conhecidas mestria e alta qualidade, já familiares aos obreiros da nossa Loja, mas que muito impressionaram os convidados.

Estiveram presentes na sessão e no ágape, além dos obreiros da Respeitável Loja anfitriã, o Muito Respeitável Grão-Mestre, acompanhado de luzida e numerosa comitiva de Grandes Oficiais, e obreiros visitantes de diversas Lojas da Obediência. A Loja Mestre Affonso Domingues fez-se representar por uma delegação composta pelo seu Venerável Mestre, JPSetúbal, três Mestres, todos Ex-Veneráveis, Rui Bandeira, Miguel R. e Paulo FR, um Companheiro, João M., e um Aprendiz, Alberto G.. Estiveram ainda presentes mais dois obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues, mas na sua qualidade de Grandes Oficiais da GLLP/GLRP, integrando a comitiva do Muito Respeitável Grão-Mestre, no caso o Vice-Grão-Mestre José M. e o Grande Organista Alexis B.. Apenas ao ágape juntou-se o Acácio R..

Tendo-se verificado que um dos objectivos prosseguidos pela Fundação Aristides Sousa Mendes é a dinamização de doações de sangue, ficou logo projectada a futura colaboração da Loja Mestre Affonso Domingues, através do seu Grupo de Dadores de Sangue, e da Fundação em futuras acções de dinamização de doações de sangue. Para o efeito, ficou aprazada para muito breve uma reunião entre o Venerável Mestre da Loja Mestre Affonso Domingues e responsáveis da Fundação.

Que maneira melhor tínhamos nós de homenagear Aristides Sousa Mendes?

Rui Bandeira

14 fevereiro 2008

Discutir e conversar


A frase final do comentário de JPM/David que ontem reproduzi produziu-me alguma perplexidade. Relembro-a:

Que tal uma secção do tipo "Discutindo com o profano" (discutindo, não conversando).

A perplexidade adveio-me da dicotomia discutir-conversar e da preferência pela discussão sobre a conversa.

Normalmente (e sem grandes preocupações de precisão linguística) atribui-se ao verbo discutir um de dois significados: manifestar acaloradamente divergências de opinião; ou analisar em conjunto um assunto ou tema.

Por outro lado, o significado usual de conversar remete para uma troca descontraída de opiniões, num registo mais intimista e prazenteiro; mas também se pode utilizar o conversar como uma forma de confronto ("temos de conversar sobre o que fizeste ontem"; "recebi um telefonema sobre a tropelia que fizeste na escola e logo vamos ter uma conversa sobre isso...").

Mas, genericamente, tenho a noção de que preferencialmente se utiliza o verbo discutir para o confronto acalorado e o verbo conversar para o diálogo descontraído. Daí que tivesse estranhado a preferência por discutir relativamente a conversar...

Depois lembrei-me que, quando li o comentário de JPM/David, fiquei com a impressão que o seu autor usava o português do Brasil. É certo que, consultando o perfil de JPM/David, verifiquei que o mesmo está em Portugal. Mas isso não impede que seja oriundo do Brasil ou que esteja mais familiarizado com o português do Brasil...

Admiti portanto a hipótese de o significado preciso de discutir e de conversar ter diferentes conotações em ambos os lados do Atlântico. Não conheço suficientemente as subtilezas do português tal como é utilizado no Brasil, mas porventura ali discutir seja preferencialmente utilizado no dignificado de análise conjunta de um assunto ou um tema e conversar tenha mais ali a conotação agressiva, que só secundariamente é utilizada neste lado do Atlântico.

Ou talvez, pura e simplesmente, JPM/David quisesse enfatizar que pretende analisar com profundidade os assuntos (discutir) em vez de os abordar pela rama (conversar)...

Pela minha parte, em relação a todos os assuntos, gosto de os abordar tão seriamente quanto possível, tão aprofundadamente quanto consiga e sempre de forma pacífica, coloquial e descontraída. Ou seja, gosto de discutir os assuntos conversando, em ambos os casos utilizando as palavras nos seus significados mais benignos...

E porque trago eu aqui esta questão? Para frisar os cuidados que devemos sempre ter, quer nos mais descontraídos diálogos, quer nos mais tensos confrontos, em procurar determinar se o nosso interlocutor utiliza as palavras com o mesmo significado que nós o fazemos, sob pena de se criarem mal-entendidos que, de forma mais ou menos grave, inquinarão a troca de opiniões. Quantas e quantas vezes tenho eu assistido a acesas disputas verbais em que ambos os contendores estão afinal a dizer a mesma coisa, apenas de forma diferente...

Em qualquer troca de opiniões, devemos ter sempre um especial cuidado em determinar se o que o outro disse é efectivamente aquilo que, à primeira vista, nos pareceu que disse, ou se uma melhor e mais lúcida análise não nos fará perceber que afinal o que o outro queria dizer é bem mais cordato e bem mais concordante com a nossa própria opinião do que a aparência nos fazia crer.

Tenho para mim que o esforço persistente de, em qualquer diálogo, procurar realçar os pontos de entendimento e tentar descortinar a real existência e os reais fundamentos das discordâncias permite uma muito mais acurada consciência do que o nosso interlocutor realmente pensa e limita muitos focos de tensão. Muitas e muitas vezes é o deficiente entendimento do que é dito que nos arrasta para estéreis conflitos, em que se deixa de discutir assuntos para se passar a discutir com alguém, em que se deixa de conversar e se passa a disputar uma acalorada conversa com outrem...

No caso concreto, certamente que JPM/David não pretende discutir comigo, mas discutir assuntos ou temas comigo. E seguramente que não é seu objectivo,nem ter uma conversa agressiva comigo, nem simplesmente conversar futilmente. Mas obviamente que não desdenhará ter uma conversa descontraída e agradável, através da qual possamos confrontar opiniões e aprofundar temas, cada um se enriquecendo com os contributos do outro...

A falar nos entendemos. Mas, se não tivermos cuidado, também é a falar que nos desentendemos...

Rui Bandeira