Uma realidade próxima
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
(Fernando Pessoa - verso inicial da Segunda Parte / Mar Português, da Mensagem)
Na sequência do texto da semana passada, mão amiga proporcionou-me o acesso ao relatório e contas relativo ao ano de 2009 do Hospital de S. João, no Porto, que foi ultimado em 26 de março de 2010. Na página 106 desse relatório, inserida no capítulo Responsabilidade social e sob as epígrafes Outros - Religião, pude ler:
No Hospital de São João, já há muitos anos que padres e ministros de outras religiões acompanham espiritualmente os seus crentes, num apoio personalizado que pretende ajudar a suportar o sofrimento.
No dia seguinte ao internamento, os doentes são visitados por voluntários que lhes propõem assistência religiosa, seja qual for o credo: católico, islâmico, hindu, judaico, budista, baha'i ou de outras confissões cristãs.
O espaço de culto ainda é a capela católica, mas em breve haverá um lugar multirreligioso que poderá ser utilizado por todos, com a capacidade de se adaptar à simbologia de todos os credos.
O pólo inter-religioso será construído após a ampliação do 9.º e 10.º piso. Será um bloco espiritual.
Em 2010 o projecto deste novo espaço será apresentado ao Ministério da Saúde, pelo grupo inter-religioso para a assistência espiritual e religiosa no Serviço Nacional de Saúde.
O capelão do HSJ, padre José Nuno Silva, ingressa esse grupo como coordenador católico das capelanias hospitalares.
Quem me informou disse-me ainda que o grupo interreligioso para a assistência espiritual e religiosa no Serviço Nacional de Saúde aprovou o projeto, que havia dinheiro para o executar e que as obras do Hospital de S. João estão em execução, pelo que espera que, no próximo ano de 2012, esse espaço seja inaugurado e comece a funcionar. Segundo essa pessoa, a conceção e projetado funcionamento desse espaço será muito parecida com o que escrevi a semana passada. Não será totalmente assim, nem poderia - ou porventura deveria - sê-lo, até porque se tratará de um espaço específico para assistência espiritual e religiosa em ambiente hospitalar, em que não cabem algumas das valência que referi naquele texto. Mas, como se lê no relatório e como me foi reafirmado, o espírito será muito semelhante.
Fico contente - muito contente.
Só espero que os conhecidos constrangimentos orçamentais do presente não sirvam de pretexto ou motivo para a atual gestão do setor da Saúde em Portugal fazer alguma marcha-atrás neste projeto e que ele se concretize efetivamente. Se assim for, será um exemplo de boa decisão, de bom projeto. Perante a doença, a dor, a fragilidade assolando o ser humano (e todos, mais tarde ou mais cedo, mais ou menos vezes, passaremos por doenças e fragilidades físicas) que, ao menos, a tolerância, a concórdia, a cooperação na assistência religiosa e espiritual sejam garantidas.
Que o projeto se concretize e sirva de exemplo para outros lugares, outros espaços, outras comunidades, é o meu voto.
E, já agora, noto o agradável simbolismo, para um maçom, que este projeto tenha nascido no Hospital de S. João. Como todos os maçons sabem e os profanos que não sabiam ficam agora a saber, os maçons consideram S. João o seu patrono. Qual S. João? Ambos, S. João Batista e S. João Evangelista, cujos dias de festa rondam os solstícios, respetivamente, de verão e de inverno no hemisfério norte (e inversamente, no hemisfério sul), dualidade para nós também muito simbólica (sobre este tema, aconselho a leitura deste excelente texto, da autoria do Paulo M., por ele apresentado na Loja Mestre Affonso Domingues já lá vão mais de três anos).
Rui Bandeira