10 julho 2007

Organista, Mestre da Musica ou da Coluna da Harmonia


Tenho vindo nas últimas sessões da minha Loja a desempenhar um cargo que me tem dado um prazer muito grande. O de Organista ou Mestre da Coluna da Harmonia.

A Musica numa sessão de loja é de grande importância, pois completa o ritual dando-lhe um sustentáculo que permite elevar a espiritualidade e a disposição dos presentes e consequentemente da sessão em si.

Engana-se o leitor se pensar que por música numa sessão de Loja é chegar ali e debitar umas músicas, de preferência do Mozart e se forem muito conhecidas melhor.

A Loja Mestre Affonso Domingues sempre primou por ter Organistas de qualidade, e não falo de mim que ainda não me considero Organista nem terei a qualidade dos titulares, e consequentemente sempre teve música de grande nível nas suas sessões. Bastará para tal dizer que foram sempre músicos e melómanos os Organistas, foram e são porque o actual titular do Cargo (já o é desde 1996) é musico tendo na sua juventude gravado Discos e tocado em grandes salas por esse mundo fora.

O nosso Irmão Organista, tem ao longo destes anos vindo a criar para cada sessão um CD com a sequência de músicas com que nos enche a sala e nos delícia. Um Acervo fantástico o que tem vindo a ser produzido, por ele, com o fim único de embelezar e transmitir solenidade às sessões de Loja.

Ora por motivos pessoais e familiares, que queremos ver resolvidos tão brevemente quanto possível, a sua assiduidade tem sido prejudicada este ano, e por isso tenho assegurado a sua substituição.

A primeira vez foi um pouco de improviso, e como fui avisado 30 minutos antes e já ia a caminho usei os CDs que tinha no carro e com um pouco de Mozart aqui, Respighi ali, mais Mozart por acolá, lá me safei.

O bichinho ficou e dei comigo a preparar no meu computador portátil uma playlist com músicas para sessão de Loja. Este exercício, era essencialmente isso um exercício, não tinha na altura nenhum fim específico pois não sabia quando teria que fazer nova substituição. Era por assim dizer um trabalho para meu divertimento pessoal.

Continuei normalmente a aumentar o directório do meu portátil com música, não porque a quisesse por em Loja, mas porque gosto de trabalhar com música. Todavia cada vez que uma peça, um andamento, uma faixa me parecia adequada marcava-a inserindo na lista de música para sessão.

E um dia lá tive que ir fazer uma substituição. Saí de casa com o portátil, um par de colunas de computador, e uma extensão eléctrica. A coisa correu bem e a partir dai passei a assegurar a música sempre que necessário.

Decidi também que sempre que possível fugiria dos autores tradicionais (Mozart, Beethoven, Bach, etc.) e utilizaria outros tipos de musica. Nesta senda já usei músicas interpretadas em ritmo reggae, de grupos como os Queen, Norah Jones, Evanescence, ou ainda música de guitarra portuguesa composta e interpretada por esse Génio que foi Carlos Paredes.

Tenho também aproveitado para testar algumas músicas da minha cultura Judaica, sempre instrumentais e em interpretações para violino, ou de conjuntos de musica Klezmer (Musica Judaica da Europa Central).

Rapidamente percebi que cada sessão é muito diferente da anterior e que, as musicas que resultaram em cheio numa podem não servir para a seguinte. E Aqui surge a necessidade absoluta de improvisar, de escolher uma alternativa que não foi pensada e que tem que substituir o alinhamento pensado com base na ordem de trabalhos previamente distribuída.

Há que conseguir gerir os imprevistos, como sejam um visitante que chega e que se anuncia já com os trabalhos a decorrer. Ou uma decisão de modificação de sequencia dos trabalhos, ou uma alteração de ultima hora ou mesmo como há uns dias atrás a tentativa de reforçar uma alocução (não conhecida) de um Irmão com uma musica apropriada.

A música no meu ponto de vista deve preencher todos os vazios. Deve ser adaptada a cada momento, Grandiosa na abertura dos trabalhos, Alegre no fecho, motivante quando se procede à recolha de fundos para beneficência, espiritual na Cadeia de União, e por aí a fora.

Pode parecer uma sobrevalorização, mas não é. O Mestre da Coluna da Harmonia tem uma importância enorme na qualidade dos trabalhos. Não pode imaginar o leitor (excepto Irmãos que me leiam) a diferença entre um bom acompanhamento musical (não na qualidade das peças musicais usadas mas na cobertura da sessão) e um mau acompanhamento, já para não falar que uma sessão sem música é uma “sessão coxa”.

Já desempenhei muitos cargos em Loja, já fui Venerável (e sobre isso falarei um dia), e sempre os desempenhei com zelo, correcção e gozo pessoal, mas nenhum me deu tanto prazer como o de organista, ainda que só o seja em substituição.

Espero que um dia possa vir a ser o Organista Titular da Loja Mestre Affonso Domingues, e mesmo esperando que esse dia seja só daqui a muitos anos porque o actual Organista é excepcional, sei que nessa altura vou avançar mais um degrau.

José Ruah
P.S. Louis Armstrong foi Maçon e Musico ( evidentemente)

Outra visita a RIGOR… (em fraternidade)

Como já foi elaborado antes neste A-Partir-Pedra o “sete” (o carácter numérico 7) é especial para a maçonaria e o Sábado passado permitiu uma conjugação especial de “setes”, na data (dia, mês e ano) e na cerimónia das sete maravilhas (as internas e as externas).

Não foi premeditado, mas a coincidência com a visita que alguns obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues fizeram à Loja Rigor (a Leste de Bragança) foi, de facto, uma “coincidência feliz”.

Outra coincidência, bem feliz, foi a visita do Grão-Mestre da GLLP/GLRP, que nos acompanhou nos trabalhos e nos tempos de “recreio”, incluindo o magnífico passeio de barco pelo Douro internacional que nos foi proporcionado pelos nossos irmãos “rigorosos”.
Segundo Eles, pudemos visitar o “parque natural mais belo do mundo”, o que seria um exagero enorme se… aquele não fosse o “parque natural mais belo do mundo”.
Como é, fica provado mais uma vez o “rigor” dos nossos Irmãos !

Em pleno Douro saltou à vista o timoneiro da nau, que não só comandou… como aproveitou para explicar detalhes dos trabalhos a executar pelos obreiros que O acompanhavam.





Neste encontro ficou agendado (ainda sem data, mas para breve) a visita dos nossos Irmãos a Lisboa (e à nossa Respeitável Loja), a fim de darmos continuidade ao processo de geminação que ali teve o seu ponto de partida.
Será trabalho para os próximos Veneráveis das 2 Lojas, atendendo a que o actual Veneralato está a terminar, compromisso assumido por todos, e como se diz “em língua oficial portuguesa”… Yá stou a oubir ls nuossos antigos a dezir, cun çprézio: 'me cago ne ls homes que nun ténen palabra.' Mais palabras para quei?
Realmente estamos obrigados, agora por mais esta razão, a trabalhar para que “ls nuossos antigos” não venham a ter razão para “cun çprézio”, fazerem que prometeram !!!


JPSetúbal

09 julho 2007

Uma visita a RIGOR

Uma delegação de sete obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues efectuou no fim de semana último uma visita à Respeitável Loja Rigor, n.º 57 da Grande Loja Legal de Portugal / GLRP, ao Oriente de Bragança.

Nesta visita, a delegação da Loja Mestre Affonso Domingues teve a honra de acompanhar o Muito Respeitável Grão- Mestre, Mário Martin Guia. O nosso companheiro neste blogue José Ruah deslocou-se na dupla condição de obreiro da Loja e de Grande Inspector para o Rito Escocês Antigo e Aceite.

Deslocámo-nos na companhia das respectivas famílias, pelo que, enquanto decorreu a reunião da Respeitável Loja Rigor, n.º 57, a esposa de um dos nossos anfitriões acompanhou as nossas mulheres e filhos numa visita ao castelo e a alguns museus de Bragança.

Na reunião, tivemos, designadamente, o grato prazer de testemunhar a iniciação do vigésimo quarto obreiro da Loja Rigor, a qual se destaca pela elevada assiduidade dos seus obreiros, além de ter ficado decidida a geminação entre as duas Lojas. Tal decisão foi assinalada pela assinatura num diploma a ela alusivo, efectuada pelos Veneráveis Mestres Domingos A., da Respeitável Loja Rigor, n.º 57, e Paulo FR, da Loja Mestre Affonso Domingues.

Se nada sobrevier em contrário, está prevista para o próximo ano maçónico a retribuição da visita, ocasião em que, ultimada e acordada a redacção do respectivo Convénio de Geminação, se prevê a realização, em Lisboa, da formal cerimónia de geminação entre as duas Lojas, através do Ritual de Geminação que, a propósito da geminação ocorrida entre a Loja Mestre Affonso Domingues e a Respeitável Loja Fraternidade Atlântica, n.º 1267 da Province de Bineau da Grande Loge Nationale Française, no ano maçónico transacto, foi elaborado por obreiros da nossa Loja e mereceu a aprovação do Grão-Mestre então em funções.

A Loja Rigor, n.º 57, possui magníficas instalações próprias, graças ao esforço e ao trabalho dos seus obreiros, e, após a sessão, nelas teve lugar um agradável ágape, reunindo os obreiros de ambas as lojas e respectivas famílias.

A hospitalidade fraterna dos nossos Irmãos da Loja Rigor, n.º 57, foi insuperável e tornou-nos devedores do nosso reconhecimento e desejo de, não superá-la (porque o insuperável é insusceptível de superação, por definição), mas de dela nos aproximarmos tanto quanto possível.

Rui Bandeira

06 julho 2007

URGÊNCIAS 2007

Estreou ontem, dia 6 de Julho, no Teatro Maria Matos, em Lisboa, o espectáculo teatral URGÊNCIAS 2007, um conjunto de peças curtas, escritas por autores portugueses contemporâneos, a partir do mote "o que é que tens de urgente para me dizer?".

Esta terceira edição do conceito, sempre com textos novos, mostra uma assinalável evolução qualitativa, com uma inteligente encenação de Tiago Rodrigues e um oportuno aproveitamento dos meios técnicos que o Teatro Maria Matos disponibiliza. A utilização de imagens em vídeo como parte integrante do cenário, a apurada utilização da iluminação (concebida, bem como o cenário, por Thomas Walgrave) e do som (com dois DJ's em palco, ALX e Riot) na construção da atmosfera pretendida par cada texto, valorizam harmonicamente os textos, as interpretações e a encenação.

A primeira peça curta intitula-se Domingo e nela Tónan Quito e Cláudia Gaiolas eficazmente preparam o ambiente para a soberba interpretação de um quase-monólogo (apenas pontuados por esparsas e curtas falas da personagem interpretada por Tónan Quito) por Fernando Luís, em grande forma. O público é paulatinamente conduzido até ao entendimento da situação, de forma quase hipnótica, pelo lento movimento, sempre acompanhado pelo incansável discurso da personagem interpretada por Fernando Luís. Um texto de qualidade da autoria de José Maria Vieira Mendes, muito bem interpretado e correctamente encenado.

A peça seguinte, Duas Estrelas, da autoria de Rui Cardoso Martins, mostra-nos uma possível reacção de um vencedor de um chorudo prémio do Euromilhões. Uma competente encenação, servida por mais uma óptima interpretação de Fernando Luís, bem acompanhado por Margarida Cardeal, Cláudia Gaiolas (delirante a sua burlesca interpretação de uma irritante e interesseira administradora de condomínio, que faz muitos dos assistentes recordarem-se do respectivo condomínio...) e Tónan Quito.

O terceiro texto, Amar-te longe daqui onde pudesse chamar pelo teu nome sem ter de virar para trás, de Mickael de Oliveira, foi o que menos apreciei. Contudo, foi bem defendido por uma boa encenação e a competente interpretação de Margarida Cardeal, Joaquim Horta e da jovem Rita Brütt, esta uma agradável surpresa na valorização da sua personagem.

O quarto texto, Fora de serviço, de Inês Meneses, foi o que mais apreciei. Difícil de interpretar, por ser constituído essencialmente por um diálogo entre dois monólogos, foi objecto de sóbria encenação e valorizado pelas excelentes interpretações de Margarida Cardeal e Joaquim Horta.

A peça curta Pum, o tiro era a que mais curiosidade me despertava, por ser escrita por um valor já seguro da dramaturgia contemporânea, José Luís Peixoto. O texto, no entanto, não correspondeu às minhas expectativas. Porém, a simples historieta apresentada foi, surpreendentemente servida por uma fantástica encenação que, optando pelo registo da farsa, em minha opinião fez de um texto vulgar um muito bom espectáculo de teatro, com o registo escolhido a valorizar o texto de uma forma que se duvidaria possível. É claro que este registo de farsa (com uma surpreendente e de alto risco alteração de cenário) só teve um merecido êxito graças às fantásticas interpretações de (mais uma vez) Fernando Luís e de Cláudia Gaiolas (esta definitivamente com uma eficácia na farsa e no burlesco que impressiona), bem acompanhados por Margarida Cardeal, Rita Brütt, Joaquim Horta e Tónan Quito.

Tónan Quito que, na minha opinião, teve a sua grande interpretação da noite, mostrando-nos a sua grande qualidade, no último e ambivalente texto, A dispersão ou simulacro de urgência, de Joaquim Horta, mais uma vez servido por uma agradável encenação, que muito valorizou, não só a qualidade do trabalho do protagonista, mas as mais-valias trazidas pelos DJ's, pelo vídeo e uma competente iluminação. Rita Brütt, Fernando Luís e Cláudia Gaiolas acompanharam e serviram bem o merecido solo superlativamente interpretado por Tónan Quito.

Estas URGÊNCIAS 2007, produção Mundo Perfeito, Produções Fictícias e Teatro Maria Matos, está em cena até 29 de Julho, de quartas a sábados às 21,30 h e aos domingos às 17 horas e é um espectáculo que vivamente recomendo, pois auguro que nele assistimos às sementes do teatro português de qualidade das próximas décadas, quer a nível de actores, quer a nível de autores, quer de encenação.

Rui Bandeira

05 julho 2007

Uma História da maçonaria Britânica (1967- actualidade)

A década de 1960 inaugurou um período de declínio em relação aos anteriores altos níveis de admissão de membros. O completo colapso das associações de amizade e auxílio mútuo após a Segunda Guerra Mundial parece poder constituir um gelado aviso sobre o que pode ser o futuro da Maçonaria.

No entanto, existem algumas objecções a essa tese de que o declínio de admissões na Maçonaria desde a década de 1960 seja parte do mesmo processo que conduziu ao estiolamento das associações mutualistas, desde logo porque estas colapsaram porque constrangimentos legislativos as reduziram a pouco mais do que sociedades de seguros mútuos, minando os aspectos fraternais da sua organização. Quando a implantação do Estado-Providência supriu a sua função, essas associações tinham muito pouco mais a oferecer.

A razão do declínio de admissões na Maçonaria Britânica deve buscar-se antes na secularização da sociedade a partir dos anos 60, em contraponto à profunda religiosidade que caracterizou a época anterior. É essa emergência de uma sociedade secularizada que está na raiz das actuais incertezas que assolam a Maçonaria Britânica. A Maçonaria na Grã-Bretanha tornou-se, de 1870 em diante, tão firmemente ligada a uma expressão de uma cultura de religiosidade na Grã-Bretanha, que não podia de deixar de sofrer um abalo até às suas raízes com o súbito declínio dessa cultura. Neste contexto, as maiores ameaças no presente período da História da Maçonaria serão, não tanto os ataques de escritores anti-maçónicos, mas os estudos do relacionamento entre a Maçonaria e a Religião levados a cabo pelas Igrejas anglicana e metodista, os quais concluíram que a filiação na Maçonaria era incompatível com a qualidade de membro destas Igrejas.

No entanto, a Maçonaria permanece francamente saudável, ao contrário das associações de amizade e auxílio mútuo. Para além do mais, a História da Maçonaria Britânica demonstra a sua durabilidade, que não desaparecerá facilmente.

(Com a publicação deste texto, conclui-se a divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield)

Rui Bandeira

04 julho 2007

O quinto Venerável Mestre

O quinto Venerável Mestre, que exerceu funções de Setembro de 1994 a Setembro de 1995, foi Manuel A. G..

Manuel A. G., um homem corpulento e bonacheirão, era amigo pessoal do Grão-Mestre Fernando Teixeira, com quem partilhava o gosto, os conhecimentos e a paixão pela tauromaquia.

Sob a sua liderança, a Loja manteve-se sempre muito próxima do Grão-Mestre, o qual, por sua vez, nomeou vários dos obreiros da Loja para o exercício de funções de Grande Oficial, isto é, funções na Grande Loja. Por um lado, isso era agradável, porque correspondia à manutenção da confiança do Grão-Mestre fundador na Loja e nos seus obreiros. Por outro lado, isso era penalizador para a Loja, que não raras vezes se via privada da presença e do contributo de vários e influentes obreiros, ocupados no exercício dos deveres dos seus ofícios na Grande Loja. Por outro lado, tinha começado a implantação dos Altos Graus na Maçonaria Regular portuguesa, com os Altos Graus dos Rito Escocês Rectificado e do Rito Escocês Antigo e Aceite à cabeça, e muitos dos obreiros da Loja acumulavam com a frequência de sessões de Altos Graus e o exercício de ofícios nos Altos Graus, por vezes com simultaneidade de reuniões entre estes e a Loja Azul (a Loja trabalhando nos três graus basilares da Maçonaria, Aprendiz, Companheiro e Mestre).

Por força destas circunstâncias, a Loja continuou a trabalhar com Quadros de Oficiais muito variáveis. Existia o Quadro de Oficiais efectivo, digamos assim. Mas raramente a Loja trabalhou com a presença de todos os oficiais efectivos. Para cada ofício existia o titular efectivo da função e, informal e naturalmente, perfilavam-se um ou mais suplentes que asseguravam o exercício da função na falta do titular. Assim a Loja se habituou a colmatar as faltas de seus membros, impedidos em outras actividades maçónicas. Assim se reforçou a característica da Loja de todos os seus membros estarem aptos a exercer bem mais do que um ofício em Loja e de conseguir trabalhar com segurança e qualidade independentemente da composição efectiva do quadro de oficiais em cada momento. O que, em termos de prática ritual, trouxe a mais-valia da garantia de uma qualidade média do trabalho, independentemente de quem esteja presente e de como estejam distribuídos os obreiros pelos ofícios, mais-valia que, felizmente, se foi mantendo ao longo do tempo.

Manuel A. G. apreciava que os trabalhos decorressem de forma imponente e serena. Com ele, cada sessão de Loja era um exercício de execução tão perfeita quanto possível do ritual, entendendo-se como parte desse esforço a execução, em toda a pompa e circunstância, de cada gesto, de cada passo, de cada fala. Com Manuel A. G., a Loja habituou-se de novo a executar o ritual, não apenas bem, mas com brilho. Cada pormenor era corrigido, cada detalhe era aperfeiçoado.

Assim, em termos de execução do ritual, a Loja retomou a qualidade que se habituou a considerar sua, com as vantagens do aumento do número de obreiros capazes de a manter e da capacidade de execução de múltiplos ofícios por cada obreiro. A preocupação e o gosto de Manuel A. G. pela boa execução do ritual criou em todos o hábito e a necessidade da qualidade. Isso continua a Loja a dever a Manuel A.G..

No seu sereno e calmo mandato, apenas uma pequena nuvem se apresentava no horizonte: retomada e aperfeiçoada a qualidade de execução do ritual, os mais dinâmicos interrogavam-se sobre o que fazer com a Loja. Tínhamos um grupo que aprendera a ser coeso, que nutria o gosto pela qualidade do trabalho ritual, que paulatinamente aprendia Maçonaria. O que fazer com ele? Apenas executar com qualidade o ritual já sabia a pouco. Mas fazer o quê? Utilizar o potencial da Loja em quê?

Uma coisa se tinha como certa. Fosse o que fosse, não seria por voluntarismo que se encontraria. Utilizar de forma útil o potencial da Loja e dos seus obreiros só fazia sentido e só seria efectiva e persistentemente possível se fosse consensual. Esta busca de conteúdo, de valia, de contribuição prática da Loja em algo que consensualmente se tivesse como possível e que se entendesse valer a pena foi tema recorrente nas conversas entre os seus obreiros, naquela época. Muitos projectos foram falados, muitos foram reconhecidos de megalómanos ou não reuniram o consenso. A pouco e pouco, foi-se entendendo que a solução não era a busca de grandes coisas, de projectos de encher o olho e a alma. Como sempre, foi nos princípios da Maçonaria Regular que fomos buscar as bases para a resposta aos nossos anseios. No caso, que a Maçonaria Regular não se destina a intervir, ela própria, enquanto tal, na Sociedade, mas cada obreiro, por virtude do seu aperfeiçoamento pessoal deve ele próprio contribuir, na medida do que possa, para a melhoria da Sociedade. A resposta não estava, pois, em ambiciosos projectos, em grandes organizações, em eventos de estalo. A resposta estava em nós mesmos e no que nós pudéssemos dar e fazer.

Foi assim que nasceu o primeiro projecto colectivo da Loja Mestre Affonso Domingues. Um projecto modesto, mas à medida das possibilidades dos seus obreiros. Um projecto discreto, mas que ajudava a suprir uma necessidade social. Um projecto através do qual cada um, na medida em que podia fazê-lo, dava o que de mais precioso uma pessoa pode dar: um pouco de si próprio.

Assim começou o que pomposamente gostamos de chamar Grupo de Dadores de Sangue Mestre Affonso Domingues, um grupo sem sede, sem direcção, sem contas nem património, sem organização, um pouco como a a casa da canção infantil ("era uma casa muito engraçada, não tinha tecto, nem tinha nada..."). Mas se nada disso teve, nem tem, teve, tem e desejamos que continue a ter o que verdadeiramente importa: a disponibilidade para ajudar, para obter e efectuar doações de sangue, para contribuir para que ninguém fique sem o necessário tratamento ou recuperação da sua saúde por falta desta essencial seiva da vida. Quem pode dar sangue, dá; quem não pode, ajuda de outra forma qualquer, na organização da acção, na sua divulgação, na simples companhia aos que dão. Sendo a Loja constituída por algumas dezenas de obreiros e com uma não negligenciável quota de elementos cuja idade ou condições de saúde não lhes permitem que dêem sangue, não esperamos que, de cada vez, se recolha uma grande quantidade de sangue. Mas, ao longo dos anos, a quantidade de sangue recolhida já é significativa. e, a pouco e pouco, vamos conseguindo o auxílio de terceiros, que amigos, conhecidos e mesmo desconhecidos também ajudem e também dêem sangue. E lá vamos ajudando...

Manuel A.G. contribuiu também para este projecto. Como os demais Veneráveis Mestres da Loja deixou também nela a sua marca. E nós não o esquecemos.

Como amigo pessoal de Fernando Teixeira que era, naturalmente que, na altura da cisão, o acompanhou. Mas continua a ser um amigo e, pelo menos no nosso convívio anual de Dezembro, procuramos, com todo o gosto, tê-lo connosco e ficamos especialmente satisfeitos quando os seus afazeres lhe permitem estar connosco. Também a ele se aplica a nossa máxima de que uma vez um dos nossos, sempre um de nós.

Rui Bandeira

03 julho 2007

Uma História da Maçonaria Britânica (1874-1967)

Depois de um período conturbado, emergiu um consenso a partir da década de setenta do século XIX, aliás tal como em toda a sociedade britânica. Este consenso no final da época vitoriana reflectiu-se no facto de, quando o Príncipe de Gales se tornou Grão-Mestre, em 1874, o anteriormente inflamado Conde de Carnarvon transformou-se no seu pacato e diligente Pro Grão-Mestre, enquanto que o antigo rebelde dos anos 50 Canon George Portal se afadigava a trazer a Ordem e a Harmonia às muitas institutições maçónicas que tinham proliferado desde 1856.

A Maçonaria do final da época vitoriana estava instalada na sua posição na Sociedade. As incidências dos debates em várias sessões de Grande Loja eram abertamente relatadas no The Times. Em vilas e cidades de todo o País, as Lojas Maçónicas locais eram partes indispensáveis dos desfiles cívicos, tal como os orgnizados por ocasião dos Jubileus de Ouro e de Diamante da Rainha Vitória. A Maçonaria era suportada por uma fornmidável infraestrutura comercial, visivelmente expressa na firma de George Kenning, que fabricava as caras jóias e paramentos, que permitiam à classe média do final da época vitoriana uma ostentação através da Maçonaria. Kenning também publicou um dos semanários disponíveis nos escaparates das estações ferroviárias, no qual se debatiam temas da actualidade maçónica e se publicavam notícias acerca de personalidades e eventos maçónicos. Este período também constituiu a emergência da Maçonaria como uma das mais abastadas e mais bem organizadas organizações filantrópicas do país.

Algumas notas devem, porém, ser enfatizadas neste quadro de prosperidade, estabilidade e crescimento. Desde logo, a Maçonaria não estava sozinha neste ambiente social. Fazia parte do que foi descrito como o "fraternalismo competitivo". Por outro lado, o crescimento de várias formas mais racionais de lazer e recreação a partir da década de 1860 fora, em parte, a reacção a uma crise de identidade por parte dos habitantes das grandes cidades industriais. Como poderiam eles mantero seu antigo sentido de comunidade e, no caso da classe média, afirmar a sua liderança cívica? Uma resposta foi escolher entre a esplendorosa variedade de novas actividades sociais. Um cavalheiro de sociedade podia viver uma vida cheia de uma variedade de organizações filantrópicas, empresas comerciais e publicações. Um maçon empenhado podia, similarmente, preencher a sua vida com várias reuniões maçónicas, levar o The Freemason para a sua leitura semanal, utilizar a Biblioteca Maçónica e envher a sua casa de uma variedade de objectos maçónicos. A Maçonaria era apenas uma das formas pelas quais a classe média do final da época vitoriana podia afirmar a sua respeitabilidade e prestígio social e manter um paroquial sentido de comunidade.

Um exemplo deste uso da Maçonaria como forma de expressão de identidade no final da época vitoriana foi a emergência de Lojas destinadas a profissões específicas. A criação de lojas maçónicas deu a classes profissionais emergentes, relutantes em frequentar bares e tabernas, um meio através do qual podiam conviver depois do trabalho, numa atmosfera neutral. Assim, membros do Serviço de Educação de Londres peticionaram a criação de uma loja maçónica própria, onde poderiam confraternizar após as reuniões profissionais. Lojas similares foram criadas por vários outros grupos profissionais. São particularmente dignas de nota as lojas criadas por membros das profissões do sector público, tais como polícias e professores. A posição social destes grupos profissionais era, frequentemente, ambígua: a Maçonaria proporcionava a cada um deles a possibilidade de se reclamar pertencer à classe média.

Como parte deste desejo de respeitabilidade, a religiosidade tornou-se cada vez mais importante. Com a adopção de cânticos religiosos populares, a importância do ofício de Capelão (um dos ofícios de Loja do Rito de Emulação, cuja função é a de pronunciar orações em momentos determinados do ritual) e a aparência pseudo-eclesial de muitos dos novos Templos Maçónicos, a frequência das reuniões de loja parecia quase como comparecer a um serviço religioso.

A atmosfera eclesiástica da Maçonaria Britânica afastou-a crescentemente da Maçonaria em todo o resto do Mundo, muito especialmente do Grande Oriente de França, o qual se tornou, a partir da década de 1870, crescentemente ateu e secularista e se ia transformando no guardião da chama da Terceira República. Estas tensões agudizaram-se com a decisão do Grande Oriente de França de dispensar como requisito de admissão dos seus membros a crença num Ser Supremo, o que resultou na cessação de relações com os membros desse Grande Oriente pelas Grandes Lojas Britânicas.

As duas principais orientações do Mundo Maçónico, que divergiram entre si na década de 1870, ainda hoje se vêem uma à outra através do equivalente maçónico do Muro de Berlim. A culpa por esta cisão não pode ser inteiramente atribuída aos franceses. É justo fazer notar que, enquanto a Maçonaria Francesa se moveu numa direcção, a Maçonaria Britânica adoptou um tom cada vez mais religioso.

É por esta razão que Andrew Prescott tende a olhar o consenso do final da época vitoriana em torno da Maçonaria como persistindo até à dácada de 1960, talvez com as celebrações do 275.º aniversário da Grande Loja Inglesa, em 1967, marcando o seu último fôlego. Tal como em recente trabalho de Callum Brown se defendeu que, no período final da época vitoriana, se verificou um aprofundamento do sentimento religioso popular, que é considerado como tendo persistido até às mudanças culturais da década de 1960, parece que se pode detectar a mesmoa evolução na Maçonaria. Apesar da sua proclamação de que não exige a crença numa particular religião, desde, pelo menos, a década de 1870 que a Maçonaria Britânica se tormou uma muito efectiva expressão do mais alargado consenso moral, cultural e político em que se alicerçou o Império Britânico. Apesar daqueles que eram não conformistas, fossem anglicanos, judeus ou hindus, havia um forte entendimento do que constituia o comportamento apropriado para um leal súbdito britânico, o qual se alicerçava numa espécie de religiosidade instintiva e discurso moral, que caracterizaram a sociedade britânica até à década de 1960.

(Prossegue-se na divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield)

Rui Bandeira