07 dezembro 2011

Um sonho meu



Eles não sabem, nem sonham,que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha

o mundo pula e avança
como bola colorida

entre as mãos de uma criança.


(estrofe final de
Pedra Filosofal, de António Gedeão)

Eu acho que sei e, por isso, sonho. A dormir e, muito, acordado. A Pedra Filosofal é um dos meus poemas preferidos, onde sempre renovo o meu, espero que incurável, otimismo. Estando acordado, ter sonhos de progresso, de esperança, de fraternidade, não é ingenuidade nem perda de tempo. É, sobretudo, confiança - confiança em nós, na nossa comunidade, na Humanidade. Transmitir os sonhos que acordados temos aos outros é dar-lhes a possibilidade de serem partilhados, adotados, fortalecidos, poderem porventura ganhar massa crítica que os materialize em realidades. Se de mil sonhos dos que sonhamos acordados apenas um deixar o mundo etéreo das aspirações e, pedra a pedra, se for construindo, já se tem ganho, já existe pulo, já há avanço. Por isso, eu, impenitente otimista, decidi hoje partilhar um sonho meu.

Sonho que se construa um espaço de culto que não seja igreja, não seja mesquita, não seja sinagoga, não seja salão, não seja terreiro - mas seja tudo isso e mais!

Sonho que esse espaço seja sóbrio, seja moderno, seja agradável, mas nele não se veja obrigatoriamente nenhum símbolo de nenhuma religião em particular - mas se possam ver, quando necessário, os símbolos de todas as religiões.

Sonho que o Templo - chamemos-lhe simplesmente assim - se destine a todos os cultos, seja utilizável por todas as religiões, seja utilizado pelos sacerdotes ou ministros de todos os cultos e pelos crentes de todas as religiões.

Sonho que ali existam, movíveis, facilmente colocáveis onde devem ser colocados, guardados quando devam estar guardados, expostos quando devam estar expostos, os símbolos e artefatos inerentes aos cultos de todas as religiões. Que quando ali se se celebre uma missa católica, esteja à vista, no local próprio, a cruz cristã, o sacrário, o altar. Quando ali tenha lugar a oração dos muçulmanos, não haja representações figurativas, nem do divino, nem do humano, facilmente os crentes saibam para que lado e direção está Meca e que tudo o que é necessário ou conveniente ao culto islâmico esteja onde deve estar. Que, quando ali tiver lugar culto judaico, no sítio próprio estejam os rolos da Lei e mais tudo o que a Tradição judaica mande que esteja. E que similarmente assim seja quando ali houver cultos de quaisquer outras religiões ou crenças.

Sonho que naquele edifício haja, não um, mas vários espaços, separáveis e independentes, que permitam que, com a necessária privacidade, possa ao mesmo tempo prestar-se culto ao Criador de várias formas e segundo diferentes tradições. Que tudo isso seja administrado de forma isenta, cooperante, organizada, de forma a que todos e cada um sintam aquele espaço comum como seu e podendo utilizá-lo segundo as suas necessidades e conveniências. Que haja o bom senso, a tolerância, a abertura e o espírito de cooperação para, por exemplo, se entender, sem conflitos, que o mais "nobre" ou espaçoso dos espaços de culto deve preferencialmente ser reservado à sexta-feira para os muçulmanos, ao sábado para os judeus, ao domingo para os cristãos.

Sonho que nos espaços de apoio aos locais de culto convivam harmoniosamente os ministros de todas as religiões, partilhando os espaços comuns que podem e, portanto, devem, ser por todos partilhados e dispondo dos espaços privados às necessidades de cada um e do seu ministério.

Sonho que o sistema informático desse espaço tenha um bom servidor para uso comum, dividido ou partilhado em diversas máquinas virtuais, cada uma utilizada por cada culto, de forma a que todos beneficiem da mesma infraestrutura, mas cada um só acedendo ao que a si diz respeito. Afinal, o hardware, o Universo, que a todos nós abriga, é único - e cada religião nele implanta o seu software próprio... E - não o duvido - o "Administrador do Sistema" é único e garante que as várias variantes existam e funcionem, cada uma com o "sistema operativo" que prefere...

Sonho que o Centro Social anexo seja também comum e comummente utilizado por todos, que tenha áreas partilháveis e partilhadas por todos e espaços próprios para cada um. Que harmoniosa e proficuamente aqui haja catequese, ali escola rabínica, acolá estudo do Alcorão, e, se assim for conveniente, tudo isso ao mesmo tempo. Que as crianças da zona vão ali aprender o que em cada tradição lhes seja conveniente aprender, podendo todos brincar e conviver em conjunto, pois, sendo metodistas, evangélicas, católicas, hindus, muçulmanas, judias, xintoístas, etc., são todas, acima de tudo e antes de tudo... crianças.

Sonho que as residências dos ministros das diversas religiões estejam, lado a lado, nas traseiras do edifício, para que todos estejam perto e disponíveis para os seus crentes, mas para que, sobretudo, sejam todos vizinhos uns dos outros e todos em conjunto cuidem do comum interesse de manter aquele pequeno bairro cuidado, ordenado e aprazível.

Sonho que tudo isto permita que cada um viva a sua religião como entender, segundo a sua tradição, mas respeitando as religiões de todos os demais e, sobretudo, aprendendo a cooperar em tudo o que em comum possam cooperar e a aproveitar e maximizar as semelhanças e a tolerar e relativizar as diferenças.

Sonho enfim que este espaço simbolize e materialize que a religião, a crença, não pode, não deve, ser motivo de discórdia, de luta, de emulação, antes seja por todos compreendida como assunto de cada um, que só a cada um diz respeito. Afinal, o Criador é Um e, com toda a probabilidade, deve ser-Lhe mais ou menos indiferente a forma como cada um a Ele se liga, pois o importante é a ligação, não a forma do laçarote...

Sonho isto porque sou maçom. Mas, sobretudo, sou maçom porque sonho isto!

Rui Bandeira

06 dezembro 2011

Instrução em Maçonaria - VI

As minhas desculpas pelo atraso no texto, mas algumas dificuldades técnicas impediram-me de o concluir em tempo util.


Continuando a serie sobre instrução em Maçonaria e tendo os artigos anteriores sido essencialmente dirigidos à instrução de mestres e à auto instrução, creio que é momento de abordar a instrução tal como ela é compreendida na sua vasta generalidade.

Tradicionalmente são os Vigilantes de cada Loja que estão encarregues de proceder à instrução dos aprendizes e dos companheiros.

Não existe uma regra para proceder a esta instrução. Existem Vigilantes mais proactivos e outros mais passivos, às vezes até em excesso que de proactividade quer de passividade.

Em minha opinião é melhor ser proactivo que passivo, mas como em tudo há que ter limites. O excesso de proactividade pode ser invasivo do espaço de cada um e pode gerar também reacções adversas ao excesso de trabalho exigido.

E como pode um maçon falar em excesso de trabalho !  Pode. Antes de tudo somos pessoas, como as outras. Temos profissões, família, compromissos sociais, religiosos, profissionais, e também o compromisso com a Loja. Como mesmo para um maçon o dia tem 24h ( talvez haja um segredo maçónico que permite transformar em 36 mas não posso elaborar mais sobre isso) os trabalhos maçónicos têm também que ser doseados.

O primeiro trabalho de um vigilante tem que ser o de conhecer quem tem pela frente, quem é quem, que aspirações individuais, que motivações, que empenho, que via privilegia, o background educacional e pessoal, enfim tem que conhecer cada um dos seus aprendizes ou companheiros.

O segundo trabalho de um vigilante é, na posse das informações anteriores, estabelecer metas e determinar os assuntos que gostaria de ver aprofundados.

O terceiro trabalho é o de definir não um plano de trabalho geral, mas sim um plano de trabalho individual para cada um dos aprendizes ou companheiros, indo assim ao encontro das motivações individuais tendo em conta o estádio de conhecimento de cada um.

Surge aqui também uma pequena nuance. O Primeiro e o Segundo Vigilantes devem articular entre si o que vão fazer porque assim podem estabelecer planos de continuidade, isto é quando o Segundo passar a Primeiro e herdar alguns dos companheiros, ou quando os aprendizes passam a companheiro, não deverá acontecer sobreposição de assuntos e temas, por forma a maximizar a aprendizagem.

Esta articulação é também importante porque há assuntos transversais como sejam coisas básicas de ritual e que podem ser objecto de prelecções conjuntas, convidando eventualmente um ou outro Mestre mais versado sobre o tema para as dar.

Estabelecidos os planos individuais e a articulação com a outra coluna, então é chegado o momento de definir as acções globais, que para além de palestras sobre os temas que forem achados convenientes, devem a meu ver incluir deslocações a outras Lojas do mesmo Rito e mesmo a uma ou duas de Rito diferente.

Com um plano de trabalho definido a prazo, é possível calendarizar a apresentação dos trabalhos de proficiência de cada um dos aprendizes ou companheiros. O tempo deve ser um bom conselheiro e não deve haver a pressa de apresentar os ditos trabalhos muito rapidamente.
É preciso dar a quem chega tempo de aclimatação, tempo de fraternização, tempo de individualização e finalmente tempo de apresentação.

Uma Loja estruturada não deve ter pressa. Um aprendiz ou companheiro não precisa de ter pressa. Os Vigilantes não são avaliados pelos “ quilogramas” de aumentos de salário, mas sim pela qualidade do trabalho produzido.

É preferível ter menos Irmãos mais preparados, bem enquadrados, tendo absorvido a cultura da Loja correctamente, que mais Irmãos com deficiente instrução.

A instrução só tem sentido quando podemos projectar no futuro o seu resultado, e uma Loja Maçónica é intemporal logo tem que pensar sempre no futuro.


José Ruah

02 dezembro 2011

Afinal, o que é o segredo maçónico?



O "segredo maçónico" é daquelas coisas a que a curiosidade da sociedade, certa comunicação social, e alguns setores mais "aguerridos" não resistem. A maçonaria é coisa de que só recentemente se fala às claras e na praça pública: antes só merecia comentários em surdina, meias palavras e olhares de desagrado, invariavelmente acompanhados de desinformação, descontextualizados e eivados de preconceito.

Uma boa parte da responsabilidade é dos próprios maçons. Perseguidos anos a fio, mantiveram-se a partir de certo ponto de tal modo "subterrâneos" e discretos que não se preocupavam, sequer, com o que deles diziam - quanto mais preocuparem-se com a refutação pública das inverdades, e com a divulgação de informação correta sobre a maçonaria. Os tempos têm mudado, os extremismos do passado têm-se refreado, e a maçonaria começa a poder sair debaixo da pedra onde se escondeu - e os maçons começam a querer desfazer os equívocos resultantes de décadas de silêncio.

No entanto, ao fazê-lo, deparam-se com uma primeira linha de ideias feitas, de argumentos falaciosos, de cegueiras voluntárias, em referências constantes às mesmas fontes já mil vezes desmascaradas, na insistência em questões já inúmeras vezes respondidas, e na recusa em mover-se um milímetro para além dos pontos de vista anteriormente adquiridos.

O que, de início, parece ser um desafio interessante, começa a tornar-se numa desmoralizante e surda guerra de teimosias e de cansaços. É que, depois de se responder à mesma pergunta trinta vezes seguidas, de cada vez tentando encontrar uma resposta mais certeira, mais facilmente inteligível, mais passível de irradiar a dúvida, e perante a incessante repetição da mesma pergunta, vezes sem conta, acabam-se as ideias, exaure-se a imaginação, e esgota-se a paciência.

No que me concerne, tenho-me esforçado por encarar cada pergunta como uma vontade honesta de chegar à verdade. Mesmo aquelas que, colocadas de má fé, não pretendam senão passar a proverbial rasteira, merecem-me uma resposta tão cândida quanto o consigo: afinal, as respostas ficam aqui, para usufruto e benefício de quantos as quiserem ler, e pode ser que aproveitem a alguém...

Quem está de fora não pode falar de maçonaria sem falar de segredo. De facto, arrisco a dizer que o segredo é aquilo de que mais se fala "de fora" quando se fala de maçonaria. E também arrisco dizer que não se fala mais de segredo "de dentro" porque é algo já tão interiorizado que (já) não merece constante reparo. Deixem que repita uma vez mais: os "segredos" da maçonaria não passam do conteúdo dos rituais, dos meios de reconhecimento dos vários graus, da identidade dos maçons e do que se passa nas sessões.

Os dois primeiros segredos são simbólicos e rituais. O conteúdo dos rituais não tem nada de especial, e estou certo de que quem os ler esperando encontrar alguma verdade miraculosa ficará muito desapontado: simplesmente determinam quem diz o quê, quando, e em que circunstâncias, um pouco com uma peça de teatro. Também os sinais de reconhecimento são meramente rituais, e usados quase exclusivamente em loja ou à entrada de um templo maçónico. Os maçons não andam aí pela rua a fazer "sinalefas" uns aos outros...

Os outros dois segredos têm que ver com a reserva da privacidade das pessoas. A identidade dos maçons só pode ser revelada pelos próprios, uma vez que muita gente ainda vê a maçonaria com maus olhos, e a revelação da condição de maçon de alguém pode, por essa mesma razão, causar-lhe dissabores profissionais, sociais ou religiosos. Por outro lado, ao guardar-se segredo do que cada um diz em loja confere-se aos participantes a liberdade de se exprimirem sem reservas, com a certeza de que as posições que revelarem, as ideias que defenderem, as atitudes que tomarem, ficarão ali.

Só errando se aprende, e a maçonaria é uma escola de aprendizagem. Cada um é convidado a dar o melhor de si, sem o medo de errar e sem temer a acusação dos demais. Longe disso, aprende-se que o mais implacável juiz de um homem deve ser ele mesmo, mas que para isso é preciso que os demais se refreiem e lhe deem espaço e tempo para que isso suceda, sempre num ambiente de confiança e de entreajuda.

Não esqueçamos que a maçonaria especulativa nasceu há mais de três séculos em Inglaterra, e que era uma escola de gentlemanship, vindo por isso bem embebida da cultura e valores desse país e dessa época. Um gentleman era, na altura (e ainda hoje...) alguém de quem se espera uma certa contenção, uma certa reserva no trato, uma dose de circunspeção que evite a precipitação nas conclusões, incessantes mudanças de opinião ou, até, a exteriorização de mais asneiras do que as circunstâncias o permitam, podendo fazê-lo cair em descrédito...

Diz-se, às vezes a brincar, que o grande segredo é que não há segredo nenhum; é quase isso. Para além do enunciado, não há mais "segredos" que possam servir seja para o que seja. Não há ingredientes mágicos,  fórmulas secretas ou passagens ocultas; apenas o salientar de uma caraterística importante num cidadão maduro. É que aprender a calar-se é algo que demora tempo, especialmente numa sociedade em que tudo é cada vez mais transparente. 

É, precisamente, para a aprendizagem do refrear-se, do não dizer tudo o que nos passa pela cabeça, do guardar o que se pretende dizer para o momento que seja mais apropriado, que serve o "segredo".  Este não é mais do que mera ferramenta de trabalho, um exercício de vontade, no sentido de levar os maçons a aprender a guardar para si as - eventualmente injustas, possivelmente erradas, certamente precipitadas - primeiras impressões acerca do que quer que seja.

Só isto.

Paulo M.

30 novembro 2011

A Maçonaria NÃO É uma sociedade secreta (V)



Já vimos que foi a alta hierarquia da Igreja Católica quem lançou e divulgou e repetiu que a Maçonaria era uma sociedade secreta. Hoje, o epíteto é glosado em vários tons pela comunidade dos teóricos da conspiração, pelos fundamentalistas religiosos de vários quadrantes e pelos ditadores de serviço em várias latitudes.

Os mais primários decretam que a Maçonaria é uma sociedade secreta... porque é, porque "toda a gente" o diz. A esses não importa que se lhes mostre que, em cada país, cada Obediência maçónica se estrutura e organiza no respeito da Lei do Estado, em regra organizando-se como associação sem fim lucrativo, constituída nos termos e pela forma legal e cumprindo as determinações legais quanto ao seu funcionamento, escolha e publicidade dos seus corpos gerentes, facultando, nos termos que a Lei determina as informações que a Lei determina, executando os comandos das leis fiscais, etc.. A esses nada importa.

A Grande Loja Legal de Portugal / GLRP - Associação constituiu-se por escritura publicada no Diário da República - III série, n.º 18, página 1378 (6), em 22/1/1997, com declaração de retificação publicada no Diário da República - III série, n.º 67, página 4989, em 20/3/1997? E depois? É sociedade secreta!

Tem o número de identificação fiscal 503 770 434? É número de sociedade secreta!

Tem sede e instalações sociais na rua João Saraiva, n.º 34, em Lisboa? Secretíssima!

Pode-se telefonar para lá através do número 218470903? É número confidencial, de certeza!

E pode-se comunicar por fax pelo número 218470905? Deve ser para esconder as comunicações...

E tem o endereço de correio eletrónico gs@gllp.pt? De certeza que só recebe mensagens cifradas...

E tem um sítio na Internet, acessível em www.gllp.pt? É só para enganar o pessoal: aquilo é mais secreto que os serviços secretos!

O seu Grão-Mestre é o advogado e gestor José Francisco Moreno e a sua fotografia e currículo até estão publicadas no tal sítio da Internet? Tudo falso! Tudo inventado! Aquilo é secreto!!

Aquilo é secreto porque eles não divulgam quem são os maçons! E não venham falar de que também não se sabe quem são os sócios das sociedades anónimas! Isso não são sociedades secretas. São só anónimas. Não precisamos de saber quem são os donos. Sabemos para que servem: para ganhar dinheiro a vender-nos caro o que não precisamos e caríssimo aquilo de que não podemos prescindir. As sociedades anónimas e as off-shores e essas coisas não têm nada de secreto. Mas esses maçons, esses sim, são perigosamente secretos!

Vejam lá que eles não divulgam o que fazem nas suas reuniões!!! Ainda se aquilo fossem Conselhos de Administração de Bancos ou de empresas, ainda se percebia, o segredo é a alma do negócio, mas que negócio é esse de aperfeiçoamento pessoal de que os maçons falam? Isso só pode ser fumo para nos enganar! O negócio deles é secreto, senão diziam a toda a gente (e nós, pobres teóricos da conspiração, não ardíamos em curiosidade insatisfeita...).

Aquilo é super-hiper-secreto! Fecham-se numa sala, não deixam entrar ninguém de fora e não dizem nada do que se passa lá dentro! E juram guardar segredo sobre o que lá se passa!

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Não, meus caros, o parágrafo anterior não é do teórico da conspiração . Fui eu que deixei voar o meu pensamento e os meus dedos o teclaram. Estava a pensar nos Conclaves de Cardeais que designam o novo Papa, sempre que a Cadeira de S. Pedro fica vaga...

Os cardeais fecham-se, muito cerimoniosamente, na Capela Sistina. Ninguém de fora lá pode entrar. É-lhes absolutamente interdito comentar ou divulgar, a quem quer que seja, o que debatem, como debatem, quem disse o quê, quem propôs quem, por juramento solene.

Mas isso não tem nada de secreto! Secreto, secreto, secreto mesmo só as reuniões dos maçons! Afinal dos conclaves ainda vai saindo fumo, ora negro, ora branco, pela chaminé. Os malandros dos maçons pelos vistos nem no Inverno usam lareira!!!

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Sabem que mais? Às vezes, rendo-me à razão do José Ruah! Tanto preconceito, tanta cegueira voluntária, por mais paciência que se tenha, acabam por cansar!

Não vale a pena argumentar mais com quem não quer ou não pode argumentar lógica e racionalmente.

Já neste blogue escrevi centenas de textos sobre o que fazemos, como o fazemos, a razão do que fazemos. Muito pouco guardamos para nós e, mesmo isso, dizemos o que é e porque o guardamos (quem estiver interessado, que leia o texto O segredo maçónico em http://www.rlmad.net/rlmad-main/mmenu-pranchas/715-segredo-maconico.html . Mais esclarecimento, só se nos despirmos e expusermos publicamente a nossa nudez! Parece que todos têm direito a alguma privacidade - exceto os maçons; à privacidade desses chama-se, incansavelmente, secretismo!

Por isso, por tudo o que está à vista, proclamo, alto e bom som: A Maçonaria NÃO É uma sociedade secreta!

Todos aqueles que desejarem continuar a insistir na tecla do secretismo, que se recusarem a pensar pela própria cabeça e se resignarem a seguir os teóricos da conspiração, os fundamentalistas religiosos e os ditadores de serviço, que apreciem muito a companhia!

Rui Bandeira

28 novembro 2011

Instrução em Maçonaria - V


E ao fim de uns anos larguei a música.

Não que tenha deixado de a ouvir (porque tocar … isso não é para mim) mas porque este ano deixei o cargo de Organista.

O Venerável pediu e o meu dever era aceitar o seu pedido e fui consequentemente fazer outras coisas.

Foram uns anos, mais de 3. Foi mais que isso, foi um percurso, um estudo e uma evolução. Tive a necessidade de entender sob um outro prisma o que se passava em Loja.

A leitura dos rituais não foi suficiente, as ordens de trabalhos insuficientes e muitas vezes incompletas ou tardias, as alterações de ultima hora comunicadas, e as não comunicadas.

O esquecimento que esta ou aquela cerimónia tinha também mais esta deslocação ou este momento de silencio.

Os momentos de silêncio e sua análise. Podiam ou não ser preenchidos por música? e sendo como ?

A aprendizagem de cada momento de cada sessão, a respectiva interiorização e visualização em pensamento e em memória “RAM equivalente” considerando ou pelo menos tentando considerar todos os movimentos e estimando quanto tempo duraria.

O ambiente particular de cada sessão e as diferenças de uma para outra, os diferentes ritmos dos Veneráveis, tudo isto era de primordial importância para a escolha da musica.

E ao chegar à escolha da música conclui que estava formatado. Tinha passado anos a ouvir esquemas musicais parecidos quer na RL Mestre Affonso Domingues, quer nas múltiplas Lojas que visitava. Havia um standard criado. Esta uniformização era tão mais forte que havia peças musicais que estavam elas próprias enraizadas e já faziam parte da mobília.

Na minha memória uma ou outra sessão na qual o anterior organista o Irmão Alexis tinha dado umas sacudidelas ao sistema.

E quando comecei embora não formatado, não saí muito fora do que era a regra. Todavia pouco a pouco comecei a trilhar um percurso, assente numa máxima:
“Tudo ou quase tudo pode ser tocado numa sessão de Loja”

E pensando assim fui estudando cada vez mais os rituais, conhecendo cada vez mais profundamente as cerimónias. Desse conhecimento resultaram várias coisas, mas para o caso aqui em apreço importa o tipo de percurso que se abriu à minha frente e que me levou do Barroco à música contemporânea fosse ela clássica ou rock, bandas sonoras de filmes. Abandonei assim os clássicos, o tradicional Mozart e os convencionais Beethoven, J.S. Bach e outros.

De repente Dire Straits, Scorpions, Eagles, Enya, Carlos Paredes e outros passaram a aparecer nos alinhamentos de cada sessão.

Ao fim de um tempo o paradigma de música numa sessão maçónica mudou, e mudou não porque simplesmente se abandonassem as peças musicais mais tradicionais, mas porque estava demonstrado que era possível ir em múltiplas direcções e não só numa apenas.

Também me dediquei um pouco à instrução, mas não tanto ensinando como fazer mas mostrando como se podia fazer diferente sem retirar qualquer brilho ou solenidade a uma sessão.

Um Mestre Maçon ao trabalhar no seu aperfeiçoamento, ao continuar a sua auto instrução e mostrando aos seus Irmãos independentemente do respectivo grau ou qualidade, que há sólidas formas de fazer coisas diferentes sem quebrar o prescrito no regulamento ou nas leis maçónicas, está a instruir.

E por aqui ficamos esta semana.

José Ruah

PS: deixo-vos aqui com 2 versões na mesma musica. Qualquer das versões foi usada por mim em ocasiões e momentos diferentes de sessões:


23 novembro 2011

A Maçonaria NÃO É uma sociedade secreta (IV)


Leão XIII retomou a sua cruzada contra a Maçonaria na sua encíclica de 8 de dezembro de 1892 Custodi de quella fede (texto integral em inglês aqui).

A unificação da Itália completara-se em 1870, com a anexação de Roma ao Estado italiano, apesar da forte oposição do Papa (só em 1929, com o Tratado de Latrão, a situação ficou resolvida, com a mútua aceitação da presente configuração política de uma República italiana e de um Estado papal, o Vaticano, no interior da cidade de Roma). Leão XIII, italiano, de seu nome civil Gioacchino Vincenzo Pecci, escreve esta encíclica do ponto de vista do clérigo italiano que vê a sua terra politicamente organizada de uma forma diferente da que ele gostaria. Efetivamente, a Maçonaria teve um grande e ativo papel na unificação italiana. Garibaldi e Cavour, os dois grandes artífices da mesma, foram maçons. Este enquadramento histórico permite entender melhor a grande animosidade de Leão XIII em relação á Maçonaria.

Nesta sua encíclica, Leão XIII começa por invocar a Humanum Genum, anunciando que neste novo texto se dedicará à explanação dos "deploráveis efeitos" da ação maçónica em Itália: a substituição do pensamento cristão pelo "naturalismo", da Fé pela Razão, da moral católica pela "moral independente", do progresso espiritual pelo progresso material, das leis dos Evangelhos pelas leis civis, que apelida de "código revolucionário", da escola, ciência e arte cristãs pelo "ateísmo e vil realismo". Poderão justificar-se, do seu ponto de vista, os restantes aspetos, mas, quanto à alegada substituição pelos maçons do progresso espiritual pelo progresso material, dificilmente poderia estar mais errado...

Para Leão XIII, a unificação italiana levada a cabo pelos maçons fez-se contra a Igreja Católica e as suas instituições. No fundo, afinal, Leão XIII protestava contra o fim do Poder Temporal do Papa, que obviamente lamentava. Para ele, a substituição do Poder Temporal da Igreja pelo poder civil em Itália só causava degradação, miséria, conflitos. Mais uma vez, vê-se como esta posição é datada e afetada pelos sucessos políticos e sociais da época.

Foi este o último grande pronunciamento da alta hierarquia da Igreja Católica durante muito tempo. O século XX trouxe à Humanidade evoluções e conflitos que colocaram a disputa da alta hierarquia da Igreja católica contra os maçons em segundo plano: a Grande Guerra de 1914-1918, os loucos anos 20, a Grande Depressão, a ascensão do nazismo e do fascismo, a Segunda Guerra Mundial, o Holocausto, a ascensão do Poder comunista e o levantamento da Cortina de Ferro, tudo isso reduzia o antigo conflito à sua real insignificância.

Após trepidantes sessenta anos, o Mundo mudou, a relação das pessoas com as suas fés também e João XXIII reconheceu-o. Teve a imensa lucidez e a arrojada força de convocar o Concílio Vaticano II, que veio a consagrar importantes ajustamentos e atualizações na relação da Igreja e seus oficiantes com a imensa massa de crentes, trazendo efetivamente a Igreja para a Modernidade. A evolução foi prosseguindo e, já no pontificado de João Paulo II, em 1983, foi publicado o novo Código Canónico que, em relação à Maçonaria, deixou de diretamente a fulminar com o labéu da excomunhão automática e o ferrete da impiedade. Com efeito, o cânone 1374, aquele que sobre o assunto diretamente se debruçava, passou a ter como texto:

“Aquele que se afilia a uma Associação que conspira contra a Igreja, deve ser punido com justa penalidade; e aqueles que promovem e dirigem estes tipos de Associações, entretanto, devem ser punidos com interdição”.

Deixou de estar em causa a maçonaria, as "sociedades secretas", etc., mas apenas quem porventura se una a ou dirija "associação que conspira contra a Igreja". Como a Maçonaria Regular não conspira contra a Igreja Católica, antes a reconhece e aceita e com ela coopera, nos mesmos termos em que o faz com as outras Igrejas e religiões, considera-se excluída da previsão do cânone.

Porém, a dialética entre conservadorismo e modernidade no interior da alta hierarquia da Igreja Católica impôs que uma satisfação fosse dada aos mais conservadores. No mesmo dia em que foi publicado o novo Código do Direito Canónico, foi publicada uma Declaração Sobre a Maçonaria pela Congregação para a Doutrina da Fé (designação atual da estrutura eclesiástica que, em tempos passados, se designou por Santa Inquisição...), do seguinte teor:

Foi perguntado se mudou o parecer da Igreja a respeito da maçonaria pelo facto que no novo Código de Direito Canónico ela não vem expressamente mencionada como no Código anterior.
Esta Sagrada Congregação quer responder que tal circunstância é devida a um critério redaccional seguido também quanto às outras associações igualmente não mencionadas, uma vez que estão compreendidas em categorias mais amplas.
Permanece portanto imutável o parecer negativo da Igreja a respeito das associações maçónicas, pois os seus princípios foram sempre considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e por isso permanece proibida a inscrição nelas. Os fiéis que pertencem às associações maçónicas estão em estado de pecado grave e não podem aproximar-se da Sagrada Comunhão.
Não compete às autoridades eclesiásticas locais pronunciarem-se sobre a natureza das associações maçónicas com um juízo que implique derrogação de quanto foi acima estabelecido, e isto segundo a mente da Declaração desta Sagrada Congregação, de 17 de Fevereiro de 1981 (cf. AAS 73, 1981, p. 240-241).
O Sumo Pontífice João Paulo II, durante a Audiência concedida ao subscrito Cardeal Prefeito, aprovou a presente Declaração, decidida na reunião ordinária desta Sagrada Congregação, e ordenou a sua publicação.
Roma, da Sede da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, 26 de Novembro de 1983.
Joseph Card. RATZINGER
Prefeito
+ Fr. Jérôme Hamer, O.P.
Secretário

Aparentemente tudo afinal continua como dantes.

Mas uma análise mais fina permite detetar subtil diferença. Não há já encíclica papal a condenar a Maçonaria. A legislação canónica mudou para um texto que não condena a Maçonaria, advindo agora essa condenação, não do texto da lei, não de texto do Papa, mas apenas de um texto de um oficial da Cúria Romana, embora se declarando que com a aprovação do Papa. Mas não é a mesma coisa: é diferente se o Papa pessoalmente condena ou se se limita a aprovar que um subalterno o faça...

Em termos comparativos, esta situação é como se uma determinada conduta deixasse de ser diretamente prevista como crime pelo Código Penal, mas fosse publicada uma declaração do Chefe da Polícia, invocando a aprovação do governante, de que afinal continua essa conduta a constituir crime... Por mais voltas que se dê, o Chefe da Polícia é só isso, aplica as leis, não as faz. Tem direito a ter a sua interpretação delas, pode até invocar que o governante o autorizou a publicar a sua opinião e que a aprova mas... a lei é o que é, não o que ele deseja e entende. E se o Chefe da Polícia prende alguém que teve a conduta em causa, o Tribunal que irá decidir se ela afinal é crime ou não aplica a Lei em vigor, não a Declaração do Chefe da Polícia...

Dir-se-á, por outro lado, que o Cardeal Ratzinger, que emitiu a Declaração em 1983, é atualmente o Papa Bento XVI. Assim é. Mas o Papa Bento XVI, pelo menos até ao momento que que escrevo, não emitiu qualquer encíclica condenatória da Maçonaria, nem revogou nem alterou o Código do Direito Canónico....

Seja como seja, o relacionamento entre a alta hierarquia da Igreja Católica ainda tem muito por onde evoluir e certamente muito evoluirá. Ambas as instituições são duradouras e têm vocação de permanecer importantes para a Humanidade por muito tempo no futuro. Atrás de tempo muito tempo ainda há para vir.

Mas algo é certo: foi a alta hierarquia da Igreja Católica quem lançou a ideia de que a Maçonaria seria uma sociedade secreta; há muito, há mais de um século, que abandonou esse conceito e a sua contradição com a maçonaria existe ou não, permanece ou não, nos termos em que exista ou permaneça, não em face do primitivamente alegado secretismo, mas tendo em conta diferenças de ideias e contrastes de posturas (diferenças e contrastes que são legítimos e, porventura, naturais em instituições que são e é natural que sejam diferentes).

Feita esta resenha histórica e mostrado que mesmo quem lançou o labéu do secretismo já não o continua a afirmar, estamos então em condições de elencar e comentar os argumentos usados em prol do tal pretenso secretismo. Mas já não neste texto, que vai longo...

Rui Bandeira

21 novembro 2011

Instrução em Maçonaria - IV



Fico curioso! Eu aqui a falar de uma coisa, essencialmente de métodos que podem até ser transversais a outras áreas do conhecimento e os comentadores (por acaso sempre os mesmos) a comentarem ao lado.

Imaginemos por um instante que eu escrevia aqui sobre temas de culinária, aliás exemplo usado por um dos comentadores para explicar a outro qualquer comentador coisa que este ultimo teimava em não perceber, e os comentadores sempre questionando sobre carburadores e cilindros e outros assuntos de mecânica automóvel.

E que lendo e relendo o que escrevia, via com clareza que lá estavam métodos de cocção, formas de arranjar alimentos, maneiras de fazer molhos, apreciações objectivas sobre as quantidades dos ingredientes, da farinha, do sal, do azeite e do vinho.

Pequenos truques para as especiarias aromatizarem e para os óleos não se queimarem, enfim lendo e relendo e voltando a verificar que o escrito era mesmo sobre o tema anunciado e depois quando chegam os comentários só mencionam o entupimento dos injectores, as cambotas, e os cilindros deficientemente encamisados.

Dá que pensar! E sobretudo obriga a reflectir e a questionar. Será que escrevi mesmo sobre o tema anunciado, e se não escrevi? A bem dos simpáticos comentadores peço a terceiros, isentos, que me digam sobre o que escrevi e eles confirmam que de facto  escrevi sobre o tema que me tinha proposto.

Fico então a saber que sei escrever, ler, que também consigo ir soletrando e que não estou enganado.

Sou então assomado por uma pena, pena de pena que não pena de pena porque esta ultima por grande pena que fosse mesmo que me assomasse não me assomaria, sendo que a primeira por pequena que seja quando me assoma, assoma-me em profundidade.

Mas dizia eu que me assoma uma pena por ver que ainda há algumas pessoas que embora pensem que sabem ler, apenas conseguem juntar letras e dizer palavras. E dizem essas palavras convencidos que estão contribuindo com qualquer ideia.

Uma coisa seria se o que relato acontecesse fugazmente ou mesmo por ignorância, mas outra coisa é quando o meu convencimento é contrário, e na verdade uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa, e não devemos confundir as coisas sob pena de as coisas se nos sobreporem, passando elas a serem as coisas das nossas circunstâncias, quando na verdade quando as coisas são bem separadinhas e arrumadinhas tudo fica clarinho e transparente.

Ora a recorrência da insistência em “bugalhar” quando o expectável seria “alhar”, é em si reveladora de perversidade
Acontece que se fosse a ignorância acima mencionada seria possível combate-la e por isso o trabalho neste espaço. Já a perversidade…

E porque a ignorância é possível combater se publicam neste espaço, artigos com conteúdos de qualidade e com profundidade, e felizmente por análise de retorno de informação é seguro saber que a grande maioria dos leitores vai aprendendo e logo o propósito de transmissão de conhecimento é cumprido.

Já quanto aos que não pretendem aprender, e que estão no seu direito, também não lhes assiste o direito de sequer tentar fazer com que se perca tempo com outros assuntos laterais.

Desengane-se quem pensar que este texto que aqui acaba não se enquadra na Instrução em Maçonaria.

E por esta semana ficamos por aqui.


José Ruah