17 julho 2009

Só sei que nada sei ?

Conta-se (ou cantava-se) nos meios académicos, pelo menos de Lisboa e Coimbra, uma historinha, mais ou menos "anedotificada", mas que retratava uma situação real passada numa aula de uma das várias "Matemáticas" pelo qual passaram os que andaram pelo Técnico ou pela Faculdade de Ciências de Lisboa nos idos de 60 do século XX (t'ou mesmo velho...!).

A coisa aconteceu com um professor de Matemática, conhecido e excelente cientista (está fora de dúvida), mas um tanto bronco no que tocava a sua vaidade pessoal, e rezava da seguinte forma:

- Meus senhores, no Congresso do último fim de semana só sábios eramos 14 !

Com toda esta modéstia é de prever que outras broncas sairiam de vez em quando, e saiam mesmo. Mas foi um excelente "prof" a quem muita gente da minha geração deve muito, do muito pouco que sabe.

Isto a propósito do vídeo/musiquinha de hoje, estilo "palavras cruzadas pensantes" para o fim de semana.

É que esta coisa de ponderar sobre o que se sabe ou não sabe, muitas vezes complica-se e damos connosco a pensar se de facto sabemos alguma coisa e que coisa é essa do saber.

Assim a modos como as "certezas" ácerca das quais eu sempre gosto de reproduzir um diálogo:

- Toda a gente que tem a certeza absoluta do que diz é estúpido...
- Tens a certeza ?
- Absoluta !

À hora a que habitualmente alinhavo estes pequenos introitos aos vídeos com que vou preenchendo as 6ªs feiras já não tenho paciência para dissertar sobre a relatividade do saber e do conhecimento, tanto mais que cada vez com maior frequência as “sardinhas assadas com pimentos” que ontem eram um veneno para tudo, hoje são um bálsamo para uma quantidade de maleitas perigosíssimas… !
O que significa que quanto mais certo estou de alguma coisa, mais perto estarei de um qualquer génio-novo vir provar que o quadrado é redondo e o círculo tem, nada menos do que quatro lados em bico concavo cruzados com semi-retas elíticas…
E quando um génio-novo diz… é porque é verdade, seja lá o que fôr !
Até aparecer o próximo génio-novo.

Portanto aqui Vos deixo um muito ligeiro alerta para as vossas convicções inabaláveis, tanto mais que a fixação das ideias está cada vez mais em risco.



E como diria o Rui, "G's" há muitos (!) e todos "G's".

Como sempre, desejo-vos a todos, a todos mesmo, um bom fim de semana cheio de boas e verdadeiras certezas.
Abraços.

JPSetúbal

15 julho 2009

G de... Maçonaria

Embora a Maçonaria Continental use o símbolo do esquadro e compasso apenas com estes dois elementos, a Maçonaria anglo-saxónica, de tradição e língua inglesa, usa como símbolo notoriamente reconhecido como o da Maçonaria uma imagem similar à que encima este texto, com o esquadro, o compasso e a letra "G".

É inevitável! O neófito, o recém-iniciado, uma das primeiras perguntas que coloca é qual o significado desta letra.

Também eu, naquele tempo em que era Aprendiz, fiz essa pergunta. Mas como eu sempre gostei de "beber do fino", não fui de modas e, quando se apresentou a oportunidade, fiz a pergunta ao Grão-Mestre! Era então Grão-Mestre, Fundador, o já falecido e, independentemente de infelizes sucessos posteriores, por mim muito admirado, Fernando Teixeira. Já noutro escrito o classifiquei como um vero príncipe da Renascença. Governava a Obediência com mão ferro envolta em luva de veludo. Experiente, sabedor - muito sabedor! -, inteligente e matreiro, bonacheirão na hora do descanso e ferreamente sério na altura do trabalho, era um líder carismático. Carisma que cultivava. E parte do cultivo desse carisma fazia-o com a disponibilidade que manifestava para ensinar, esclarecer, iluminar os Aprendizes com quem gostava de confraternizar.

Portanto, para mim não foi nada de mais fazer a pergunta que - imagino-o hoje - antes de mim dezenas ou centenas de outros lhe tinham feito: o que significa o "G"?.

O Fernando sorriu, recostou-se na cadeira e, mais uma vez, deu a resposta que já dezenas ou centenas de vezes dera: havia vários significados possíveis; uns defendiam que o "G" significava Gnose; outros que aludia a Geometria ou Geómetra, e por aí fora. Matreiro que era, nunca dizia o que se esperava que também dissesse e aguardava que a "brilhante sugestão" viesse do Aprendiz: e não significaria simplesmente "God" (Deus em inglês)? Mais um sorriso confirmava que a pergunta era aguardada e lá esclarecia que a Maçonaria era Universal, inerente a todas as línguas, que não parecia muito curial que um símbolo tão universal respeitasse a uma língua, e lá repisava as teses da Gnose (que lhe era cara, estudioso como era dos Mistérios Mitraicos) e da Geometria ou Geómetra.

Pese embora a minha admiração por ele, na altura pensei cá para os meus botões, aproveitando na íntegra o silêncio do Aprendiz, que "tá bem, abelha, a Maçonaria teve origem em Inglaterra, os ingleses são aqueles tipos que têm a mentalidade de pensar que, quando existe uma tempestade no Canal ds Mancha e a navegação tem de ser ali suspensa, é o Continente Europeu que fica isolado deles, queriam lá saber da língua dos outros; o "G" era de God e não se falava mais nisso!" A solução mais simples costuma ser a correta, para quê complicar?

Os anos passaram, a Mestre cheguei e Mestre sou e, cá para mim, embora, quando perguntado, exponha a tese da Geometria ou Geómetra (a da Gnose nunca foi do meu agrado, demasiado rebuscada que a acho), sempre que do meu interlocutor lá vinha a referência ao "God" eu lá admitia como possível, se calhar provável. Não podia eu desmerecer do que intimamente eu próprio pensava...

Pois bem! Aprender até morrer! Só os burros não mudam de opinião!

Estou finalmente convencido que o "G" significa Geometria.

No texto da semana passada referi como aprendi que, nos antigos manuscritos da Maçonaria Operativa, a palavra Maçonaria era comummmente usada como sinónimo de Geometria e da Geometria aplicada à construção, a Arquitetura. Pois bem, se "Maçonaria" era sinónimo de "Geometria", a inversa também era verdadeira. Na Maçonaria Operativa, falar-se de maçonaria era falar-se de geometria, falar-se de geometria era falar-se de maçonaria. Então, nada mais simples do que criar o símbolo da Ordem com os artefatos da profissão e a letra inicial da ciência em que se baseava: o esquadro, o compasso e o "G".

Portanto, afirmo e proclamo, abjurando das minhas antigas dúvidas e reservas: o "G" do símbolo da Fraternidade simboliza a Geometria. O que é o mesmo que dizer que... simboliza a Maçonaria!

Está assim explicado o título: "G" de... Maçonaria!

(E quanto a ti, meu caro Fernando Teixeira, meu sempre lembrado Grão-Mestre Fundador, que só por isso e pelo teu carisma obnubilas divergências posteriores, bem o sinto: se lá do assento etéreo em que subiste, memória deste mundo se consente... estou a ver o teu sorriso bonacheirão, contente e vitorioso! O "rapaz" foi teimoso, demorou vinte anos a lá chegar, mas finalmente acabou de te reconhecer a razão... - Não, meu caro, quanto à Gnose, não insistas... Já era um exagero... Concordemos em discordar... - Fica prometido: no próximo ágape ritual em que eu estiver, depois dos sete brindes rituais, chegada a hora dos brindes livres, eu proporei um brinde à tua memória. Porque de ti guardo e guardarei sempre enquanto por aqui andar a memória do teu carisma, da tua inteligência, da tua sabedoria, do muito de bom que fizeste e deixaste. Do resto, da divergência final, não cura a minha memória: já não eras tu, já era a doença final que te levou daqui. É assim que se constroem e se lustram as memórias daqueles que prezamos e admiramos!)

Rui Bandeira

13 julho 2009

Continuidade - Vem aí o 20º Veneravel.

Acontece todos os anos na primeira sessão do mês de Julho a eleição do Veneravel Mestre e do Tesoureiro.

A estabilidade da Loja permite que o processo eleitoral decorra sem quaisquer problemas ou dificuldades e consequentemente se eleve o espirito de união da loja.

Para os cargos de Veneravel e Tesoureiro foram eleitos respectivamente Rui C.L. e Alberto J.G. ambos mestres.

Se Alberto é um mestre recente e assume aqui o seu primeiro cargo de Loja, já Rui é um mestre com muitos, muitos anos de maçonaria. É do tempo da fundação da Grande Loja e não fosse ter tido que se ausentar durante uns anos já teria sido seguramente Veneravel há muito mais tempo.

Junta-se assim a experiencia de um com o desafio a outro no sentido de levar a Loja Mestre Affonso Domingues para mais um ano de trabalho que se espera gratificante.

A instalação decorrerá, previsivelmente, na primeira sessão de Setembro.


José Ruah

10 julho 2009

Modernices...

Desta vez não deixo passar a 6ªfeira sem Vos deixar uma prenda.

Vou fugir de novo das coisas sizudas, mas não menos sérias, para Vos trazer o resultado de uma daquelas modernices que andam para aí, que o pessoal agora inventa e impinge à malta, a "bué da malta", que fica "fixe à brava" com estas "manifs".

É assim, o mundo não pára e as sociedades vão assim de glória em glória até à... glória final.
Isto digo eu que sou otimista.
A imagem que junto hoje, dizem, disseram já vários entendidos na matéria, que não se repetirá.

- Olha que novidade... Se se repetisse é que eu ficava "estúpido", disse o "Lecas", "os cotas já malharam... áh, com'é que podem repetir ?"

Vejam e não fiquem invejosos por não serem capazes de fazer o mesmo.
Pensem que há mais assim. Não é Vosso exclusivo.



Sabem quem eram ? Quem eram, não, quem são, porque estes "não malharam, não...!"
O enorme par, com muito mau feitio, mas com uns pés de estarrecer.

Fred Astaire e Eleanor Powell aqui ficam para recordar... os que se recordarem, claro !

Ia esquecendo um pormenor. A "voz off" é... essa mesmo, "The voice" ! (Frank Sinatra).

Abração. Bom fim de semana.

JPSetúbal

08 julho 2009

Maçonaria = Geometria = Arquitetura

Albert G. Mackey

Estou agora a ler um livro que um dos meus Irmãos me ofereceu vai já para quatro anos e que os afazeres da vida, o imenso que há para ler e prioridades de leitura de outras obras relegaram para esta ocasião. É uma obra notável de um autor notável. O autor é Albert Gallatin Mackey. O nome dirá pouco a quem não for maçon- Trata-se do autor da conhecida Enciclopédia de Maçonaria (que está a ser publicada no sítio da Loja Mestre Affonso Domingues), um médico americano de Charleston, Carolina do Sul, também erudito historiador da Maçonaria. A obra é The History of Freemasonry - Its Legendary Origins (A História da Maçonaria - as suas Origens Lendárias).

A leitura desta obra permite-me relembrar algo aprendido em outras leituras, mas sobretudo permite-me aprender algumas coisas que não sabia. É assim, o Mestre maçon, se há algo que aprende, é que tem sempre mais a aprender...

A leitura desta obra oferece-me assunto para partilhar as minhas descobertas em vários textos. Começo hoje por algo que, sendo básico (depois de se saber...), permite compreender e interpretar melhor o significado real de algumas passagens dos textos primitivos da Maçonaria, anteriores à instauração da primeira Grande Loja de Londres e às Constituições de Anderson.

Existem diversos manuscritos que vêm do tempo da Maçonaria Operativa. O mais antigo de todos é o manuscrito Halliwell, que contém o chamado Poema Regius, que se crê datar de cerca de 1390. O manuscrito Cooke calcula-se que seja de um século depois. Do século XVI, segundo se crê, encontraram-se os manuscritos Downland e Landsdowne. Do século XVII, foram descobertos e estudados os manuscritos York, n.ºs 1, 2, 5 e 6, Harleian, n.ºs 1942 e 2054, Grand Lodge, Sloane, n.ºs 3323 e 3848, Aitcheson-Haven, Edinburgh-Kilwinning e Lodge of Antiquity. Já do século XVIII, mas anteriores à criação da primeira Grande Loja de Londres, descobriram-se os manuscritos, Alnwick, York, n.º 4 e Papworth.

Estes manuscritos contêm diversas informações sobre o que era a Maçonaria Operativa, entre elas a chamada Lenda do Ofício, a Lenda da criação e evolução da Maçonaria.

Uma das coisas interessantes desses manuscritos, vinda dos mais antigos e mantida nos mais recentes (que, em grande parte, eram cópias dos anteriores) é que a palavra Maçonaria era, nesses tempos, usada como sinónimo de Geometria. Assim, quando neles se escreve que Euclides é fundador da Maçonaria, o que se está realmente a dizer é que Euclides foi o criador da ciência da Geometria.

Por sua vez, a Geometria aplicada à construção, ou seja, a Arquitetura, também era designada por Maçonaria nesses manuscritos.

Ou seja, nos tempos da Maçonaria Operativa, dos construtores em pedra, a palavra maçonaria tinha três significados: a associação de construtores em pedra, que preservava e transmitia os segredos da profissão e regulava esta; a ciência da Geometria; a arte da Arquitetura.

Estes três significados, naturalmente, interligavam-se, porquanto os segredos da construção eram noções geométricas (tirar ângulos retos, a 47.ª Proposição de Euclides, mais conhecida entre nós por Teorema de Pitágoras, etc.), aplicadas à arte da Arquitetura e sua execução prática.

Não tinha ainda deparado com esta noção de que a palavra Maçonaria, nos documentos antigos, tinha também os significados de Geometria e de Geometria aplicada à construção, isto é, Arquitetura.

E esta noção permite compreender melhor os relatos desses documentos primitivos. Lidos com esta noção, talvez alguns pontos da Lenda do Ofício não sejam tão lendários como isso e correspondam a relatos, necessariamente imprecisos, da pré-história da Maçonaria, da ciência da Geometria e da arte da Arquitetura.

Pelo menos é uma interessante tese exposta pelo insigne historiador da maçonaria que foi Albert Mackey.

Fonte: The History of Freemasonry - Its Legendary Origins, Albert Gallatin Mackey, Gramercy Books, New York.

Rui Bandeira

04 julho 2009

Porque hoje é Sábado !

Pois é, porque eu me "distraí", porque eu me "atrasei", porque eu ando metido em 24 coisas ao mesmo tempo (é..., eu reconheço, sou burro...!) deixei passar a 6ª feira.
Sei que os habituais deste espaço ficaram a esfregar as mãos de contentes. Desta vez é que o "chato" cedeu ! Ficamos com um fim de semana limpinho.
Desenganem-se.
Mas porque hoje é Sábado ponho no blogue uma lufada de ar fresquíssimo, bem disposto, capaz de Vos deixar a pensar se me vão perdoar ou não...
Já não é mau ! Fica criada a dúvida, o que já é ganho.

Meus Caros, oiçam, reoiçam, trioiçam... e depois concluam como eu:
- BRILHANTE !
Vamos aplaudir de pé, mesmo.

Além de não acreditar que não ficaram, pelo menos, com um leve sorriso, seus mal encarados.

Queridos Irmãos, Amigos, Leitores, Bisbilhoteiros e demais ocasionais, para todos bom fim de semana.
E como disse o grande Vinicius "porque hoje é Sábado", aqui fica a nossa imagenzinha semanal:


JPSetúbal

02 julho 2009

O Silêncio dos Aprendizes

O Silêncio dos Aprendizes

Ao escolher este tema presto homenagem ao silêncio dos aprendizes em loja e em particular ao seu significado e objectivos, dado considerar que ele contribuiu decisivamente para a minha aprendizagem e para a minha evolução como pessoa e, espero que, como Maçon.

Silencio

Nas conversas prévias que tive com os Irmãos Mestres J:. R:. e R:. B:., integradas no meu processo de admissão à Maçonaria, houve desde logo algo que me causou alguma apreensão – como iria eu conviver com o silêncio que se impunha aos aprendizes em Loja. Ter uma opinião para transmitir e não o poder fazer, só poderia ser uma forma sofisticada de praxe ou de tortura, para ver se eu me aguentava....

Sendo normalmente uma pessoa interventiva, o ficar calado significava para mim quase que uma prova de fraqueza ou ignorância, e isso era algo que não estava habituado. No mundo profano, nomeadamente nas esferas empresariais, é normalmente preferível dizer alguma coisa, mesmo que inútil, do que não dizer nada, já que isso parece ser apreciado.

As minhas primeiras sessões em loja foram muito conflitivas – se não podia falar e só podia ouvir, o que é que eu estava ali a fazer? Durante este período, passei por várias fases evolutivas: equacionei ir-me embora, já que não queriam ouvir o que eu tinha para dizer e eu tinha muito para dizer; ponderei os inconvenientes de desrespeitar a regra, rompendo o silêncio; efectuei comparações entre os argumentos que eram utilizados e os que eu utilizaria na mesma situação, etc.. Creio que posso afirmar que a minha permanência na Maçonaria se deve a um acto de teimosia, já que decidi não desistir e ir até ao fim.

Gradualmente, fui começando a alterar a minha atitude perante o silêncio, principalmente a partir do momento em que conclui ser inútil preocupar-me em construir uma argumentação que depois não teria continuidade. Já que não podia falar, talvez existissem outras formas de rentabilizar o tempo que ali passava e a forma mais lógica e imediata parecia ser, ouvir e assimilar o que estava a ser dito. Tal “descoberta” fez-me começar a escutar de forma consciente, o que efectivamente se dizia, o que me conduziu a uma nova descoberta acerca de mim próprio: tinha tendência para só escutar os outros em função da resposta que teria de lhes dar e não por aquilo que tinham para me dizer.

Esta constatação levou-me a começar a tentar escutar os outros de forma desinteressada e sem reservas ou intenções. Foi um processo intencional, lento, com avanços e retrocessos mas extremamente agradável - sentir que começava a descobrir os outros e ver que a atitude destes se alterava gradualmente. De forma tímida no inicio, primeiro nos círculos familiares e depois entre amigos e em ambientes profissionais, foi encorajante ouvir frases como “não sei porquê, mas agora é mais agradável conversar contigo”...

No campo estritamente profissional e nomeadamente nos processos negociais, em que cada argumento antecipado pode constituir uma vantagem para os outros, descobri também que o escutar me permitia analisar melhor a situação e sobretudo preparar melhor a argumentação necessária à consecução de estratégias ganhadoras.

E no entanto toda esta simplicidade parece ser fruto de uma sabedoria milenar que já Hiram utilizava quando formava os seus aprendizes e companheiros, para os preparar para a construção do Templo de Salomão.

Quando o recém iniciado é advertido de que não poderá falar em loja, desde a sua iniciação até à sua passagem a mestre, devendo apenas ouvir e observar, está-se simplesmente a dar continuidade a um dos mais antigos costumes das ordens iniciáticas: o silêncio.

Voltado para si mesmo, calado, numa postura de reflexão e recepção, o Aprendiz Maçon deverá evitar resvalar para uma atitude passiva ou desinteressada. Pelo contrário, todos os seus sentidos devem estar atentos para o que se passa em loja. Ver, ouvir, receber, reflectir e guardar, são as palavras chave deste processo de aprendizagem e evolução interior. Juntar e interligar todas as informações que lhe chegam ao cérebro, estranhas e diferentes das que já conhece, formulando hipóteses e conclusões que lhe permitam uma visão cada vez mais elevada das observações que faz. Esta deve ser a maior preocupação do iniciado.

O ainda candidato é exposto pela primeira vez perante a regra de silêncio quando é introduzido na Câmara de Reflexão, permanecendo sozinho e ladeado por símbolos, palavras e frases, estimulado a pensar e a penetrar no fundo do seu interior. No silêncio da meditação, vai ao encontro de si mesmo, examinando minuciosamente o que lhe vai na alma. É então confrontado com a sigla Vitriol (Visita Interiora Terrae, Retificandoque, Invenies Occultum Lapidem), que na sua tradução para português significa: "desce ao interior da terra, e perseverando na rectidão, poderás encontrar a pedra oculta".

Após toda a cerimónia de iniciação, o candidato profano transforma-se em recipiendário silencioso, o recém iniciado assume o papel do hermetista, ou do alquimista na sua busca incessante da Pedra Filosofal, que uma vez descoberta, o transformará no homem perfeito. Este é o sentido que o maçom busca quando luta para transformar a sua Pedra Bruta na Pedra Cúbica, que poderá utilizar e encaixar perfeitamente na construção do seu novo Templo interior.

O conselho "lege, lege, relege, ora, labora et invenies", que significa lê, lê, relê, ora, trabalha e encontrarás, era dado ao eleito para conhecer e assimilar os mistérios da Alquimia. Hoje, continua sendo este o conselho dado ao iniciado. O maçon afasta lentamente todas as suas paixões, os seus vícios, os seus desejos incontroláveis, para vê-los transformarem-se em virtudes, domínio de si mesmo, tolerância e prudência, alcançadas no silêncio e na introspecção. O iniciado reconhece como fundamentais, as palavras "Vigilância e Perseverança" nas metodologias do seu estágio de observação. Quem fala muito pensa pouco, ligeira e superficialmente, e a Maçonaria quer que seus membros sejam melhores pensadores do que faladores.

Todo este processo pretende, na sua essência, preparar e induzir ao Aprendiz a necessidade da reflexão como método de transformação interna. Embora indirectamente, é possível estabelecer vários paralelismos e interacções com o Catecismo do 1º grau, nomeadamente:

  • Quando o Aprendiz afirma vir “vencer as suas paixões, submeter a sua vontade e realizar novos progressos na Maçonaria”, logo seguido de “Porque um Maçon deve desafiar-se a si próprio e evitar juízos de valor antes de consultar a sabedoria dos irmãos”. O silencio proporciona-lhe um método de progressão e impõe-lhe uma prática de reflexão que o levará a ponderar os seus juízos de valor em função de conhecimentos que deve reconhecer como mais profundos.
  • Na resposta “Antes queria ter a garganta cortada do que revelar os segredos que me foram confiados”, que pressupõe não só dedicação e respeito pela Ordem, mas também a capacidade de responder ou reagir após um processo de interiorização e valoração, que a pratica do silencio poderá ajudar a tornar inconsciente e natural.
  • Na resposta “Porque todas as forças destinadas a desenvolverem-se utilmente no exterior devem primeiro concentrar-se em si mesmas”, em que claramente transparece a necessidade de um trabalho interior prévio em que o silencio pode e deve ser uma peça fundamental.

Se mais não houvesse para aprender na Maçonaria, o ter conhecido o valor do silencio e tudo aquilo que este me proporcionou, já teria valido a pena.

Partindo de um silencio imposto, cujas motivações se fundamentam na sabedoria milenar do grupo e que constitui como que um tirocínio para o recém iniciado, passa-se para uma fase de utilização em termos interiores do silencio, evoluindo finalmente para um estadio de admiração pelo silencio em que a imposição se transforma em voluntariado que assim se transforma em sabedoria, fechando o círculo e preparando o iniciado para novas fases da sua evolução e do seu crescimento interior.

A. Jorge em 27.04.6000