28 junho 2007

O quarto Venerável Mestre

O Venerável Mestre no período entre Setembro de 1993 e Setembro de 1994 foi Ilídio P. C..

Foi o homem certo na altura certa. A Loja aprendera a trabalhar em condições mais difíceis do que aquelas em que se formara. A Loja aproveitara para perceber as vantagens de fazer rodar os Mestres - particularmente os mais recentes - nos vários ofícios rituais. É verdade que tal ocorrera por necessidade, devido à diminuição de assiduidade nas reuniões havidas às quartas-feiras. Mas ultrapassara a dificuldade e ainda obtivera um ganho com a forma como a ultrapassara. Mas a Loja necessitava de obter uma maior empatia com o seu líder. E Ilídio P. C. era o homem ideal para isso.

Ilídio P. C. teve a seu favor, desde logo, o factor emocional. A Loja aprendera a trabalhar sob uma liderança menos carismática, mas recordava com alguma saudade a ligação emocional e carismática que tivera com José M. M.. E, na verdade, com Ilídio P. C. teve o mais próximo disso que era possível, até num plano simbólico: Ilídio P. C. e José M.M. tinham sido cunhados (um deles, já não me recordo qual, tinha sido casado com a irmã do outro), a sua ligação pessoal mútua era grande (sobrevivera ao fim do casamento que os tornara cunhados) e Ilídio P. C. era também um emotivo, tal como José M. M.. Eram, obviamente diferentes - José M. M. motivava o grupo pela garra, pela combatividade, pelo carisma; Ilídio P. C. arregimentava afectos mansamente, ouvindo todos pacientemente e, num fio de voz, anunciando a decisão que todos instantaneamente sentiam que tinham contribuído para ser tomada e que reconheciam como a melhor, em face das circunstâncias analisadas. Era um carisma sossegado, mas não deixava de ser carisma.

Tinha uma actividade profissional intensa e competitiva e costumava dizer que a Loja era o seu porto de abrigo, o seu local de descontracção, onde podia estar à vontade e com as defesas em baixo, sem preocupações de ser traído (a palavra que utilizava era mais vernácula...), nem apunhalado pelas costas. Dizia-o, parte por ser verdade, mas também parte como meio de incutir na Loja a coesão entre os seus membros. A sua mensagem era: não importa a luta que travemos na vida profana, a forma como aí tenhamos de estar atentos; aqui é um espaço de camaradagem, de confiança, de amizade. Não é preciso gostar de todos, ser amigo de todos; mas não se trai nenhum e por nenhum se é traído. Aqui cada um pode e deve ser ele próprio, mostrar as suas fraquezas e colaborar com as suas forças; ninguém se aproveita das fraquezas de qualquer dos demais, ninguém abusa das forças dos seus irmãos.

E, dando-se a si como exemplo, agindo em consonância com o que dizia, calmamente fez com que todos o seguissem, e a Loja voltou a levantar voo, com as capacidades que tinha, enriquecida com a coesão que passou a fazer parte das suas características genéticas.

Ilídio P. C., que beneficiou também do paulatino regresso de muitos dos que, esgotados, tinham passado por um "ano sabático" de recuperação, no fim do seu mandato transmitiu ao seu sucessor uma Loja mais forte, mais coesa, mais madura, que entendera que a liderança também se exercia de uma forma calma e, com isso, crescera mais um pouco.

Ilídio P. C., aquando da cisão de 1996, sofreu como poucos o desgosto da separação e a forçada e inesperada quebra da coesão por que tanto se esforçara. Coerente, afastou-se. Mas, algum tempo depois, o apelo da Maçonaria foi mais forte. Uma vez maçon, sempre maçon. Acabou por se integrar numa Loja do GOL e aí certamente que o seu estilo brando e calmo exerce tanta influência como exerceu em nós.

Continuamos a revê-lo e a com ele conviver, sempre que possível, seja numa qualquer organização a que ele nos dá o gosto da sua presença, seja no jantar anual do Solstício de Inverno que a Loja organiza. E é sempre com grande alegria que o revemos e com ele convivemos e, sempre, algo de novo aprendemos. Porque o Ilídio P. C. não foi apenas um dos nossos. O Ilídio P. C. contribuiu, e muito, para a nossa identidade e características, mostrando-nos o imenso valor da coesão. Esteja onde estiver, esteja com quem estiver, é e será sempre um dos nossos!

Rui Bandeira

27 junho 2007

Uma História da Maçonaria Britânica (1856-1874)

O descontentamento com a administração da Maçonaria por Lord Zetland culminou em 1855 com a secessão de um grupo de maçons canadianos para formarem a sua própria Grande Loja. Isto foi seguido pouco depois pela formação da Grande Loja dos Maçons Mark Master.

Estes eventos fizeram parte de uma breve, mas profunda, crise política e social precipitada pele Guerra da Crimeia. Os ataques a Lord Zetland foram encabeçados por um jornal maçónico chamado Masonic Observer, escrito por um grupo de jovens e radicais maçons, entre os quais Canon George Portal e o Conde de Carnavon. Este defendia um maior papel para as províncias na organização maçónica. Estas reivindicações ligavam-se com as reformas da organização provincial, tais como a introdução dos Anuários Provinciais, reuniões provinciais mais frequentes e um papel mais activo para os Grão-Mestres Provinciais. Tudo isto pode ser visto como a exigência de um maior acesso à autoridade política e social por parte dos líderes sociais das novas cidades industriais. Isto foi impressivamente expresso em Birmingham, onde um certo número de ricos proprietários de fábricas e membros da elite social providenciaram pela criação de uma loja com o nome de Loja do Progresso, que iria reunir no Templo Maçónico, evitar o álcool e os ágapes e apoiar as virtudes da caridade, temperança e respeitabilidade. Idênticas iniciativas podem ser encontradas em muitas outras cidades industriais. Para referir de novo o exemplo de Bradford, a Loja da Esperança foi dominada por um grupo de ricos empresários, que entusiasticamente debatiam a melhor forma de atingir a Virtude Maçónica.

É nesta altura que a Maçonaria se torna uma avassaladora instituição da classe média. Convém notar que este parece ser um fenómeno intrinsecamente inglês. Na Escócia e na Irlanda, a presença significativa de elementos das classes trabalhadoras na maçonaria permanece até aos dias de hoje. Em Inglaterra, a importância da Maçonaria para a coesão das elites sociais nas cidades de província expressou-se na construção de Templos Maçónicos como parte integrante dos novos centros das cidades - em cidades como Manchester e Sheffield, localizados mesmo ao lado dos novos edifícios das Câmaras Municipais e outros edifícios públicos . Um dos muitos pontos de investigação futura acerca deste período fulcral da História da Maçonaria é verificar que efeito tiveram estas mudanças no papel da Maçonaria no Império Britânico.

Algumas das pressões junto da maçonaria Imperial eram diferentes e distintas - por exemplo, os Distritos indianos eram relutantes quanto à aceitação de não-cristãos nas lojas maçónicas e só vieram a admiti-los após determinações explícitas nesse sentido por parte de Londres. A relutância dos maçons coloniais da Índia em partilhar as suas lojas com os indianos propiciou um particular entusiasmo pelos trabalhosos de George Oliver e pelo desenvolvimento dos Altos Graus Crísticos - os indianos podiam integrar-se nas Lojas, mas só cristãos teriam acesso completo às glórias da Maçonaria, proclamava-se nos púlpitos das igrejas em Bombaim e por toda a Índia.


(Prossegue-se na divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield)

Rui Bandeira

26 junho 2007

Aniversário da Grande Loja

Decorreu este fim de semana a Sessão de Grande Loja do Solsticio de Verão. Esta sessão é coincidente com o Aniversário da Grande Loja, que este ano festejou o seu 16º.

Optou o M.R.Grao Mestre por dar maior enfase a questões de trabalho que a questões ludicas, indiciando assim o caminho que pretende ver percorrido.

Aproveitou a oportunidade para lançar a nova edição do ritual de aprendiz do R.E.A.A. que foi revisto, corrigido e melhorado. Ficou a informaçao que brevemente os demais ritos praticados terão também os seus rituais revistos e editados.

Seguiu-se jantar branco em ambiente muito agradavel.

Evidentemente que a organização de toda esta logistica teve o cunho das nossas queridas amigas Milu e Sandra, o que agradecemos.

Jose Ruah

Uma História da Maçonaria Britânica (1834-1856)

A crescente clivagem social entre a maçonaria e outras formas de organização fraternal foi impressivamente expressa em 1834, quando elementos de uma organização fraternal foram presos e julgados ao abrigo da Lei das Sociedades Proibidas, um evento que foi aproveitado por oficiais da Grande Loja para lembrar às lojas maçónicas que a excepção que isentava a Maçonaria dessa Lei continuava em vigor. No entanto, as mudanças sociais começavam a colocar grandes desafios à Grande Loja.

Para o Duque de Sussex, a capacidade da Maçonaria de reformar a sociedade expressava-se melhor na sua capacidade de transcendência dos conceitos cristãos. Para outros, como Robert Crucefix, a Maçonaria precisava de aumentar a sua acção social. Crucefix elaborou um projecto de criação de um lar para os maçons idosos e pobres, a que Sussex se opôs.

A publicação da Nova Lei dos Pobres em 1834 deu um novo impulso ao projecto de Crucefix: havia agora a possibilidade de os maçons poderem obter instalações para o Lar. Crucefix lançou a Freemasons Quarterly Review para ajudar a promover o seu projecto do asilo maçónico. A Freemasosn Quarterly Review rapidamente se tornou um veículo de divulgação de um novo tipo de Maçonaria, que se pode considerar ligado a um maior movimento de busca de reformas ocorrido naquela época. Crucefix defendia uma Maçonaria mais Evangélica e mais comprometida com as reformas sociais. Acima de tudo, defendia que a Maçonaria devia ser mais explicitamente cristã. Quanto a este aspecto, o maior aliado de Crucefix foi o George Oliver, um clérigo, que desenvolveu uma teologia cristã da Maçonaria, que exerceu enorme influência até ao final do século XIX. Crucefix concebia a Beneficência Maçónica em ligação a uma mais ampla promoção da auto-ajuda e segurança. Para Crucefix, a maçonaria destinava-se à respeitável classe média. A Freemasons Quarterly Review publicava angustiantes relatos acerca de maçons pobres, geralmente membros de lojas na Irlanda ou na Escócia, que se pensava usarem as lojas maçónicas como meio para tentarem obter trabalho - o tipo de prática censurável a que Crucefix pretendia por cobro.

O êxito de Crucefix na implantação da sua reforma da Maçonaria de classe média foi relativo - enquanto que a sua influência no ressurgimento de lojas dirigidas pelos seus seguidores era entusiasticamente exaltado nas páginas da Freemasons Quarterly Review, em cidades industriais como Bradford ou Sheffield o seu impacto foi mais limitado. Não vale a pena detalhar a titânica disputa entre Crucefix e o Duque de Sussex. Mas interessa mencionar que as alegações de que os debates em Grande Loja eram truncadamente publicados na Freemasons Quarterly Review levaram ao pormenorizado registo dos debates nas actas da Grande Loja...

O ponto importante a frisar é que a evidente clivagem que ocorreu em vida de Crucefix continuou após a sua morte em 1850, tendo o Grão-Mestre Lord Zetland sido sujeito a ferozes ataques à sua displicente administração da Obediência nas páginas do Freemasosn Magazine, publicação sucessora da Freemasons Quarterly Review. Crucefix traçou linhas divisórias no interior da Maçonaria cuja influência ainda hoje se faz sentir.

(Prossegue-se na divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield)

Rui Bandeira

25 junho 2007

Mestre de Cerimónias

No texto sobre o mandato do terceiro Venerável Mestre, fiz, a dado passo, referência ao ofício de Mestre de Cerimónias. Tendo sempre presente que este blogue se destina a ser lido por maçons e por não maçons, este é um bom pretexto para descrever mais um dos ofícios da Loja, após já ter feito referência aos de Venerável Mestre e de Vigilantes.

O ofício de Mestre de Cerimónias existe no Rito Escocês Antigo e Aceite (aquele que é praticado na Loja Mestre Affonso Domingues) e bem pode ser exercido por um mudo. Com efeito, não me recordo de existir uma única fala especificamente do Mestre de Cerimónias em qualquer das cerimónias rituais deste rito. Toda a actividade deste Oficial se faz pelo movimento e pelos gestos. No entanto, este ofício é um dos mais importantes do mencionado rito!

O Mestre de Cerimónias é o oficial de Loja que executa, dirige e conduz todas as movimentações em Loja. Sempre que um qualquer dos elementos da Loja deve circular nela, fá-lo acompanhado pelo Mestre de Cerimónias (melhor dizendo: seguindo-o). Sempre que a posição ou o estado de um dos objectos com significado ritual deve ser corrigida, quem efectua essa acção é o Mestre de Cerimónias. Cumprindo instrução nesse sentido do Venerável Mestre ou por decisão própria.

O Mestre de Cerimónias é o responsável por toda a circulação no espaço da Loja e, consequentemente, pela sua fluidez e correcção. É ele quem indica por onde se deve ir, para se fazer o quê.

O ofício de Mestre de Cerimónias é fundamental na execução do ritual do Rito Escocês Antigo e Aceite, porque é ele quem marca os ritmos e, assim, quem agiliza ou soleniza cada cerimónia.

Ao contrário do que sucede, por exemplo, no Rito de York, o ritual do Rito Escocês Antigo e Aceite não é executado de cor: os oficiais que o executam têm o apoio do texto relativo à cerimónia respectiva. Porém, o Mestre de Cerimónias, porque não tem falas, exerce o seu ofício sem o apoio do ritual escrito, o que o obriga ao profundo conhecimento do ritual de todas as cerimónias. Só bem conhecendo o ritual, pode ele estar preparado para executar uma determinada acção no exacto momento em que é adequado fazê-lo, por saber que, quando determinada frase é dita por alguém, se seguirá determinada acção que ele deve executar.

A experiência e o conhecimento do ritual do Mestre de Cerimónias pode fazer de uma qualquer cerimónia ritual um acto corriqueiro ou uma exaltante execução. O Mestre de Cerimónias tem que saber, que intuir, quando deve ser solene e pausado e quando deve acelerar o seu movimento - por vezes, em função da existência ou não de atraso na execução dos trabalhos...

O Mestre de Cerimónias só aprende o seu ofício de uma maneira: executando-o e corrigindo os erros e hesitações que lhe detectarem ou que ele próprio detectar. O Mestre de Cerimónias faz a função, mas também se faz na função.

O símbolo da função do Mestre de Cerimónias - símbolo que ele transporta sempre consigo! - é o bastão (ver figura), espécie de bordão ou vara de caminheiro com que ele marca o início dos seus passos e as suas mudanças de direcção e que é também utilizado, em conjunto com a espada de outro oficial, para executar uma abóbada cerimonial, designadamente sobre os mais importantes símbolos em Loja em momentos-chave da abertura e do encerramento dos trabalhos. Pode ser substituído por uma versão em tamanho reduzido, de cerca de cerca de meio metro, que, nesse caso, transportará sobre o antebraço, o que sucede normalmente em cerimónias a que se pretende conferir maior "pompa e circunstância".

Rui Bandeira

22 junho 2007

Uma História da maçonaria Britânica (1797-1834)

A política de realce do prestígio social da maçonaria sofreu um severo golpe em 1797/98, com a publicação de escritos alegando que a Maçonaria tinha sido usada como uma organização de cobertura por elementos jacobinos promovendo a Revolução Francesa. William Preston prontamente escreveu ao Gentleman's Magazine protestando a lealdade dos maçons ingleses às instituições estabelecidas. Mas as tensões assolavam a Maçonaria Britânica. Em Sheffield, lojas maçónicas cindiram, na sequência de desacordos sobre o uso das instalações maçónicas pela Sheffield Society para Informação Constitucional. Espiões apresentaram relatórios ao Ministério do Interior sobre actividades em lojas maçónicas. Uma loja maçónica em Brentford foi acusada de conspirar para assassinar o rei. A reacção das Lojas consistiu em energicamente protestarem a sua lealdade à Coroa. A Loja das Luzes, em Warrington, tornou-se ela própria num ramo da milícia local. Muitas lojas mudaram de nome, para enfatizar a sua lealdade e apego à Coroa.

Mas a Maçonaria recebeu um novo golpe com a descoberta de que rebeldes irlandeses tinham usado formas maçónicas de organização na preparação da rebelião irlandesa de 1797. O Governo propôs ao parlamento a proibição de reuniões à porta fechada. Finalmente, na sequência de um dramático debate parlamentar, acabou por ser aprovada uma excepção, em favor das lojas maçónicas, à Lei das Sociedades Proibidas de 1799. Esta legislação criou uma separação entre a Maçonaria e outras formas de organizações fraternais. Designadamente, os Oddfellows sofreram severas restrições na sua actividade.

Estas pressões sociais e políticas acabaram por influenciar a união entre as duas Grandes Lojas (a dos Modernos, ou primeira Grande Loja e a dos Antigos), ocorrida em 1813. Maçons de várias outras zonas da Europa ansiavam por que as Grandes Lojas em Inglaterra realmente conseguissem deter sobre os seus membros o controlo que reclamavam ter. Por exemplo, a Grande Loja da Suécia reclamava que as Lojas inglesas eram demasiado permissivas na admissão de marinheiros provenientes das classes baixas, que posteriormente criavam problemas quando se deslocavam ou regressavam à Suécia e tentavam juntar-se a lojas suecas. O Ministério do Interior Britânico exerceu pressões sobre a Grande Loja dos Antigos, para que esta banisse os ágapes após as reuniões maçónicas, pois muita conspiração podia aí decorrer.

Na negociação da união das duas Grandes Lojas, o Duque de Sussex (Príncipe Augustus Frederick, sexto filho de Jorge III, Grão-Mestre da Grande Loja dos Modernos em 1813 e subsequentemente primeiro Grão-Mestre da Grande Loja Unida de Inglaterra - na foto que acompanha este texto) atendia a várias preocupações. Por um lado, pretendia garantir que não existisse o perigo de a Maçonaria ser usada por elementos sediciosos. Por outro lado, procurava criar uma Maçonaria apta para o Império , criando uma uniformidade na sua prática em todo o Império Britânico. Esperava ainda que a união das duas Grandes Lojas inglesas viesse a ser seguida pela união da Grande Loja Unida de Inglaterra com as Grandes Lojas da Escócia e da Irlanda, o que explica alguns detalhes da reforma do ritual maçónico ocorrida em função da união entre os Modernos e os Antigos.

O Duque tinha mais largas ambições com a sua reforma. Esperava que, consumada a união, iria também levar a cabo um maior serviço à Humanidade. Estava fascinado pela ideia de que a Maçonaria recobria os restos de um antigo culto solar, anterior ao Cristianismo e encarregou Godfrey Higgins, que fora o pioneiro dessa teoria nas suas publicações, de investigar mais as origens da Maçonaria. Higgins afirmou ter encontrado provas suportando a sua teoria. Com a ajuda de Higgins, Sussex sonhava em usar a Maçonaria para dar uma nova religião ao Mundo, o que ele pensava ser um avanço para a civilização.

Não obstante o seu radicalismo religioso, Sussex mostrou ser muito mais conservador em termos sociais e económicos. Insistiu em que os escravos libertos não podiam ser admitidos maçons, causando o caos na Maçonaria caribenha, que só foi ultrapassado em meados do século XIX. Não foi sensível às necessidades e características das novas cidades industriais, o que talvez tenha potenciado a secessão de um grupo de lojas no Noroeste de Inglaterra, após a união das duas Grandes Lojas. Em termos gerais, parece não ter havido interesse na divulgação da Maçonaria nas cidades industriais. Um exemplo característico parece ter sido o de Bradford, onde a loja maçónica local continuou a ser constituída em exclusivo por artesãos, que aparentemente buscavam manter nela o sentido de comunidade que o desenvolvimento industrial da cidade fizera desaparecer.

(Prossegue-se na divulgação do trabalho do Professor Andrew Prescott, que constituiu a sua lição de despedida do Center for Research in Masonry da Universidade de Sheffield)

Rui Bandeira

21 junho 2007

O mandato do terceiro Venerável Mestre

No texto em que relembrei as circunstâncias da sua eleição, descrevi como a Loja foi convencida a eleger José C. C. para exercer o ofício de Venerável Mestre para o período entre Setembro de 1992 e Setembro de 1993, apesar do desacordo inicial de muitos dos obreiros, e como, tomada essa decisão, todos manifestaram o seu apoio ao candidato.

A forma como foi construído o consenso removeu um grande escolho no caminho do novo Venerável Mestre. Mas as circunstâncias adversas acumulavam-se e o mandato de José C. C. não podia deixar de se ressentir. A Loja estava exausta: quase dois anos de actividade ritual extremamente intensa, dedicados a iniciar, passar e elevar quase todos os obreiros da nóvel grande Loja deixaram marcas que inevitavelmente cobrariam o seu preço. A equipa que dirigira a Loja durante o mandato de José M. M. e que, com notável coesão, assegurara todo o trabalho ritual esrava cansada e dispersava-se. José C. C. teve de efectuar uma renovação do quadro de oficiais da Loja, recorrendo inevitavelmente a elementos menos experientes.

Com a condução das cerimónias rituais por elementos com menor experiência e, sobretudo, sem a coesão que a anterior equipa forjara, não podia deixar de se notar uma quebra de qualidade no trabalho ritual na Loja, particularmente um aumento de hesitações e de comissão de pequenos erros. Isto levou a duas consequências, uma penosa a curto prazo, outra rapidamente gratificante.

A penosa foi que muitos dos que tinham manifestado discordância perante a perspectiva de José C. C. ser Venerável Mestre da Loja, pensaram que se confirmavam os seus receios. Essa sensação e o cansaço acumulado fez com que muitos dos elementos até então preponderantes na Loja fossem paulatinamente reduzindo a sua comparência. Por outro lado, no final do mandato de José M. M. a Loja tinha decidido mudar os dias de reunião. Em vez de reunir dois sábados por mês, passou a reunir um sábado e uma quarta-feira em cada mês. A reunião à quarta-feira à noite demorou a entrar nos hábitos dos obreiros da Loja e foi no período do mandato de José C. C. que tal mais se sentiu. Durante esse ano, algumas quartas-feiras houve em que as sessões decorreram com o mínimo indispensável de presenças, algo a que a nossa pujante loja não estava, de todo, habituada...

A gratificante foi que a nova equipa resolveu adequadamente o problema da sua inexperiência: corrigiu erros, ultrapassou hesitações, ganhou coesão e, em poucos meses. a qualidade do trabalho ritual foi retomada. Particularmente importante, porque difícil, foi o papel do novo Mestre de Cerimónias.

Numa loja maçónica do Rito Escocês Antigo e Aceite, o rito praticado pela Loja Mestre Affonso Domingues, toda a circulação no espaço do Templo é assegurada e dirigida pelo Mestre de Cerimónias, oficial que, assim, assume particular importância no ritmo e na correcção de todas as cerimónias rituais. A Loja estava habituada a trabalhar com um fentástico e experiente Mestre de Cerimónias, Miguel C. M.. A sua substituição não se antevia fácil e não o foi. Mas o caminho faz-se caminhando - e o cemitério está cheio de insubstituíveis... A seu tempo emergiu um novo e notável Mestre de Cerimónias que, à sua indesmentível qualidade no exercício do ofício, veio a aliar a sua permanente disponibilidade para partilhar os seus conhecimentos do ritual e ajudar os outros a bem exercitar a sua função. Hoje é, seguramente, dos maçons portugueses que mais sabe do Rito Escocês Antigo e Aceite e ainda continua a, sempre que é preciso, proficientemente exercer o ofício de Mestre de Cerimónias (ou qualquer outro em Loja, diga-se de passagem...). Quem habitualmente lê este blogue está familiarizado com o seu nome: José Ruah!

Mas aquele ano 1992/1993, com todas as dificuldades, com todos os obstáculos, foi passando, sem problemas de maior. Foi um ano de anti-clímax, de "serviços mínimos", em que, paulatinamente, a Loja recuperou fôlego, renovou o seu Quadro de Oficiais e viu uma nova geração de Mestres ganhar experiência. E aprendeu que as dificuldades se superam com trabalho e coesão. E isso foi um importantíssimo ganho para a Loja: a coesão que naquele ano aprendeu e obteve, nunca mais, até hoje, a perdeu. E tempos difíceis vieram em que essa coesão se revelou essencial. Ainda hoje a característica mais forte, mais distintiva, da Loja Mestre Affonso Domingues é, na minha opinião, a sua coesão, que se fortalece e floresce quando as adversidades surgem. José C. C. teve um papel importante no construir dessa coesão. Só por isso, merece uma grata referência na memória da Loja.

José C. C, um tímido afável, exerceu esforçada e interessadamente o seu ofício de Venerável Mestre. E, com a ajuda do seu Quadro de Oficiais, cumpriu a sua obrigação: entregou ao seu sucessor a Loja objectivamente melhor do que a recebeu, recomposta, mais experiente, pronta para, esgotado o ciclo do contributo ritual para a implantação da Obediência, definir o seu projecto.

Rui Bandeira