16 maio 2016

"A Maçonaria e as Novas Tecnologias de Informação e Comunicação..."


A Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues Nº5, Loja que acolhe os membros deste blogue, encontra-se inserida na denominada e reconhecida Maçonaria Regular, Maçonaria esta com um aspeto mais conservador e tradicional, uma vez que respeita e faz por respeitar os Landmarks maçónicos consagrados pela Grande Loja Unida de Inglaterra.
Mas apesar desta Maçonaria ser conservadora nos seus princípios, ela não se tornou arcaica nem deixou de evoluir com a passagem do tempo e teve de se adaptar às mudanças que foram ocorrendo com o progresso da sociedade, nomeadamente no que toca às "Novas Tecnologias".

No caso da Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues Nº5, para além do blogue que está neste momento a visitar, ela tem também uma página na Internet que pode consultar aqui, para além da Obediência Maçónica em que está filiada, a Grande Loja Legal de Portugal/Grande Loja Regular de Portugal ter a sua página própria na "rede" que também pode ser visitada aqui.

Não somos caso único e ainda bem, pois com a proliferação de Lojas que têm presença na "rede", seja através de blogues, páginas  ou revistas/magazines,  é possível tanto a maçons como profanos, conhecer o trabalho feito por essas Lojas bem como da Maçonaria na sua generalidade.

Esta abertura ao mundo, descredibiliza à partida a suposta secreticidade da Maçonaria, imposta por algumas teorias conspiratórias que costumam usar como bandeira, o "segredo" "ou "sigilo" que a Maçonaria poderá impor aos seus membros. E mostrando o que as Lojas fazem, seja através de trabalhos escritos ou com a sua presença na Sociedade, através de ações beneméritas e filantrópicas, a Maçonaria mostra o que faz e porque o faz...
O que também possibilita aos profanos que se identificam com os princípios maçónicos solicitar a sua adesão e conhecer uma "porta" onde bater, o que levou exponencialmente ao aumento do número de adesões nas Lojas Maçónicas.

A partilha de trabalhos na "rede" permite porém, a quem se encontra longe dos grandes centros urbanos, ter uma forma de obter esses mesmos trabalhos que de outra forma lhe seriam mais difíceis de obter.
Para além do comércio eletrónico de produtos maçónicos que também se tornou um negócio promissor e a ter em conta também, aproveitando o crescente interesse que a Maçonaria despertou nos últimos anos.

Mas o menos positivo desta abertura às novas TIs, é que acaba por ser difundido muito material maçónico que ou não deve ser exposto publicamente por ser material da vida interna de cada Loja, bem como na maioria das vezes se tratar de material que nem verídico ou fidedigno será, levando ao engano alguns incautos e menos informados sobre aquilo que a Maçonaria trata. Esse de facto é para mim um dos graves problemas que afetam a Ordem Maçónica.

Às vezes aprende-se mais procurando diretamente nas "fontes" do que aceitar facilmente aquilo que se apresenta e sem qualquer trabalho. Aliás um dos "motes" da Maçonaria é trabalhar incessantemente em busca da iluminação/perfeição, pois nada se adquire ou atinge sem trabalho. 

E depois do que aflorei anteriormente, porque não efetuar uma busca num dos vários motores de busca existentes (ex:Google) sobre as várias Lojas Maçónicas que proliferam pelo globo e consultar os trabalhos efetuados pelos maçons por este mundo fora, ficando aqui esta minha sugestão. 

09 maio 2016

A Queda da Grande Loja da Harmónica Utopia - um pequeno conto



Mão amiga fez-me chegar o texto do pequeno conto que seguidamente publico. Este texto terá sido encontrado num pequeno e velho cofre que ganhava pó num sótão, dentro de um sobrescrito em cujo exterior estava rabiscado: PARA LER E DAR A LER EM PERÍODOS DE ESCOLHAS.

Na GLLP/ GLRP, entramos em período de eleição do Grão-Mestre para o próximo biénio. É a altura de ler e dar a ler este pequeno conto!

A Queda da Grande Loja da Harmónica Utopia 
A Harmónica Utopia era um lugar - bem, não foi nunca um lugar porque na verdade não existiu... - onde tudo acontecia de forma ideal.

Todos eram amigos, não havia infracções, os meninos e meninas eram todos excelentes alunos, não havia pobreza (nem mesmo a de espirito – bem, desta talvez houvesse...), nem fome, nem opressão, nem …

Tamanha perfeição era também timbre dos maçons da Grande Loja da Harmónica Utopia. Todos tinham já burilado as suas asperezas e imperfeições. Mais um pouco, muito pouco, e seriam todos “Grandes Arquitetos do Universo”!

Esse pouco era mesmo só o prescindir da disciplina (não fazia falta), da Justiça (porque não havia infrações que não se solucionassem com um abraço e uma conversa), da gestão (os anjos podiam fazê-lo em outsourcing), e, como tudo era ideal, não era preciso pagar quotas. 

Decidiu-se passar a assim proceder.

A partir de então, na Grande Loja da Harmónica Utopia, o Grão-Mestre não precisava de poder. Também para que precisaria disso, se os Irmãos eram todos tão cumpridores? Aliás, era sabido que o Grão-Mestre, quando deixasse o cargo, passaria a usar o titulo de Antigo Grande Arquiteto...

Um dia um homem malvado, talvez o único que ainda restasse, conseguiu disseminar a ideia que a Harmónica Utopia era isso mesmo, uma Utopia - e de repente o sonho acabou.

A Grande Loja da Harmónica Utopia também não resistiu e colapsou. O cobrador do fraque apareceu à porta, parece que queria receber. O Grão-Mestre ainda tentou uma conversa e um convencimento e uma solução harmoniosa, mas não foi suficiente! Então alguém com memória lembrou-se da “estória do grande alicate”.

Parece que no passado, quando ainda não se estava no máximo da Harmónica Utopia, o cobrador da electricidade veio cobrar umas contas atrasadas e que lhe contaram que era precisa a assinatura do Grande Tesoureiro e do Grande Secretário e do Grande ….. e que se ele fizesse o favor de passar na semana seguinte já haveria cheque. O homem lá fez isso e quando chegou, uma semana depois, lá lhe foi dito que já havia a assinatura do Grande e do outro Grande mas que o Grande estava no estrangeiro e que talvez na semana seguinte. O dito cobrador terá então retorquido: “não há qualquer problema, vou ali ao carro buscar o Grande Alicate e corto já a electricidade”.

E quando o Grão-Mestre quis saber como estavam a gestão e as contas e as listas de obreiros e os procedimentos, tudo estava entregue aos anjos do outsourcing e estes não tinham responsabilidade pois só trabalhavam com o que lhes era dado - e fazia dois anos que não lhes davam documentos (embora nunca o tivessem reportado e tivessem sempre recebido o seu cheque...).

E assim acabou a Harmónica Utopia e a sua Grande Loja.

 Felizmente que esta fábula não passa de um sonho. Ou será pesadelo?


Como não gosto de me enfeitar com penas de pavão, garanto que este texto não é de minha autoria. Aliás, nem sequer tenho qualquer jeito para a ficção. Mas subscrevo-o na íntegra. 

Prezo muito a Harmonia - mas não pode haver harmonia sem disciplina, sob pena de ocorrer rapidamente a degradação numa anárquica aparência de organização, em que os mais "fortes", ou os mais "espertos", ou os mais "próximos" mandam e põem e dispõem e os restantes... harmonizam!

Prezo muito a Tolerância. Mas Tolerância não implica não haver Justiça e não serem sancionadas as condutas que violem as obrigações assumidas e as normas vigentes. Até por uma questão de Igualdade entre todos: se uns quantos podem infringir diretamente as normas e - em nome de uma alegada "Harmonia" e de uma enviesada "Tolerância" - não verem punidas as suas condutas, por que razão os demais haveriam de cumprir as normas? Nesse caso, cada um faria o que entendesse, quando entendesse, pela forma que entendesse, segundo o seu livre alvedrio e ao arrepio das normas e das decisões de quem foi eleito para as tomar e alegremente se caminharia rumo à Grande Loja da Harmónica e Tolerante... Anarquia.

Invocar como argumentos eleitorais a prevalência da Harmonia sobre a Disciplina e da Tolerância sobre a Justiça não tem sentido. Afinal, uma Grande Loja é uma Obediência Maçónica - não uma Desobediência...

Cada um pensa por si e decide por si. Mas eu, quando vejo certas posições, lembro-me sempre de um excerto de uma velha canção de Lena d´Água (letra e música de Luís Pedro Fonseca):

Demagogia feita à maneira
É como queijo numa ratoeira

P’ra levar a água ao seu moinho
Têm nas mãos uma lata descomunal
Prometem muito pão e vinho
Quando abre a caça eleitoral
Desde que se vêem no poleiro
São atacados de amnésia total

Disse!

Rui Bandeira

02 maio 2016

Esquadro e compasso (republicação)

Hoje faço a republicação de uma reflexão singela que o Rui Bandeira efetuou em Dezembro de 2013 e que pode ser consultado no seu original aqui.

"Esquadro e compasso

Talvez o mais conhecido dos símbolos da Maçonaria seja o que é constituído por um esquadro, com as pontas viradas para cima, e um compasso, com as pontas viradas para baixo.

Como normalmente sucede, várias são as interpretações possíveis para estes símbolos.

É corrente afirmar-se que o esquadro simboliza a retidão de caráter que deve ser apanágio do maçom. Retidão porque com os corpos do esquadro se podem traçar facilmente segmentos de reta e porque reto se denomina o ângulo de 90 º que facilmente se tira com tal ferramenta. Da retidão geométrica assim facilmente obtida se extrapola para a retidão moral, de caráter, a caraterística daqueles que não se "cosem por linhas tortas" e que, pelo contrário, pautam a sua vida e as suas ações pelas linhas direitas da Moral e da Ética. Esta caraterística deve ser apanágio do maçom, não especialmente por o ser, mas porque só deve ser admitido maçom quem seja homem livre e de bons costumes.

É também corrente referir-se que o compasso simboliza a vida correta, pautada pelos limites da Ética e da Moral. Ou ainda o equilíbrio. Ou a também a Justiça. Porque o compasso serve para traçar circunferência, delimitando um espaço interior de tudo o que fica do exterior dela, assim se transpõe para a noção de que a vida correta é a que se processa dentro do limite fixado pela Ética e pela Moral. Porque é imprescindível que o compasso seja manuseado com equilíbrio, a ponta de um braço bem fixada no ponto central da circunferência a traçar, mas permitindo o movimento giratório do outro braço do instrumento, o qual deve ser, porém, firmemente seguro para que não aumente ou diminua o seu ângulo em relação ao braço fixo, sob pena de transformar a pretendida circunferência numa curva de variada dimensão, torta ou oblonga, assim se transpõe para a noção de equilíbrio, equilíbrio entre apoio e movimento, entre fixação e flexibilidade, equilíbrio na adequada força a utilizar com o instrumento. Porque o círculo contido pela circunferência traçada pelo instrumento se separa de tudo o que é exterior a ela, assim se transpõe para a Justiça, que separa o certo do errado, o aceitável do censurável, enfim, o justo do injusto.

Também é muito comum a referência de que o esquadro simboliza a Matéria e o compasso o Espírito, aquele porque, traçando linhas direitas e mostrando ângulos retos, nos coloca perante o facilmente percetível e entendível, o plano, o que, sendo direito, traçando a linha reta, dita o percurso mais curto entre dois pontos, é mais claro, mais evidente, mais apreensível pelos nossos sentidos - portanto o que existe materialmente. Por outro lado, o compasso traça as curvas, desde a simples circunferência ao inacabado (será?) arco de círculo, mas também compondo formas curvas complexas, como a oval ou a elipse. É, portanto, o instrumento da subtileza, da complexidade construída, do mistério em desvendamento. Daí a sua associação ao Espírito, algo que permanece para muitos ainda misterioso, inefável, obscuro, complexo, mas simultaneamente essencial, belo, etéreo. A matéria vê-se e associa-se assim à linha direita e ao ângulo reto do esquadro. O espírito sente-se, intui-se, descobre-se e associa-se portanto ao instrumento mais complexo, ao que gera e marca as curvas, tantas vezes obscuras e escondendo o que está para além delas - o compasso.

Cada um pode - deve! - especular livremente sobre o significado que ele próprio vê nestes símbolos. O esquadro, que traça linhas direitas, paralelas ou secantes, ângulos retos e perpendiculares, pode por este ser associado à franqueza de tudo o que é direito e previsível e por aquele à determinação, ao caminho de linhas direitas, claro, visível, sem desvios. O compasso, instrumento das curvas, pode por este ser associado à subtileza, ao tato, à diplomacia, que tantas vezes ligam, compõem e harmonizam pontos de vista à primeira vista inconciliáveis, nas suas linhas direitas que se afastam ou correm paralelas, oportunamente ligadas por inesperadas curvas, oportunos círculos de ligação, improváveis ovais de conciliação; enquanto aquele, mais sensível à separação entre o círculo interior da circunferência traçada e tudo o que lhe está exterior, prefere atentar na noção de discernimento (entre um e outro dos espaços).

E não há, por definição, entendimentos corretos! Cada um adota o entendimento que ele considera, naquele momento, o mais ajustado e, por definição, é esse o correto, naquele momento, para aquela pessoa. Tanto basta!

O conjunto do esquadro e do compasso simboliza a Maçonaria, ou seja, o equilíbrio e a harmonia entre a Matéria e o Espírito, entre o estudo da ciência e a atenção às vias espirituais, entre o evidente, o científico, o que está à vista, o que é reto e claro e o que está ainda oculto ou obscuro. O esquadro é sempre figurado com os braços apontando para cima e o compasso com as pontas para baixo. Ambas as figuras se opõem, se confrontam: mas ambas as figuras oferecem à outra a maior abertura dos seus componentes e o interior do seu espaço. A oposição e o confronto não são assim um campo de batalha, mas um espaço de cooperação, de harmonização, cada um disponibilizando o seu interior à influência do outro instrumento. Assim também cada maçom se abre à influência de seus Irmãos, enquanto que ele próprio, em simultâneo, potencia, com as suas capacidades, os seus saberes, as suas descobertas, os seus ceticismos, as suas respostas, mas também as suas perguntas (quiçá mais importantes estas do que aquelas...) a modificação, a melhoria, de todos os demais.

Tantos e tantos significados simbólicos podemos descobrir e entrever nos símbolos mais conhecidos da Maçonaria... Aqui deixei, em apressado enunciado, alguns. Cada um é livre, se quiser, de colocar na caixa de comentários, o seu entendimento do significado destes símbolos, em conjunto ou separadamente, ou apenas de um só deles. Todos os significados simbólicos são bem-vindos! Cada um é também livre de, se quiser, nada partilhar, guardando para si as conclusões que nesse momento tire. Tão respeitável é uma como outra das posições. Este espaço é livre e de culto da Liberdade. Afinal de contas, tanto o esquadro como o compasso estão abertos... abertos às livres opções, entendimentos e escolhas de cada um!

Rui Bandeira"

25 abril 2016

Desde há 42 anos - para sempre!


Recordo que, quando eu era rapazote, havia algo que me impressionou ao ponto de não o ter esquecido. O dia 5 de outubro era, como voltou a ser depois de breve hiato, feriado nacional. Comemorava-se a Implantação da República. E, no telejornal, religiosamente seguido por todos lá em casa, nesse dia lá víamos sempre a reportagem das comemorações do aniversário da dita Implantação, em que os principais intervenientes eram uns caquéticos velhinhos, cada ano mais caquéticos e mais velhinhos, mas também cada ano menos em quantidade.

A minha mente infantil abismava-se então que se comemorasse a República, uma coisa tão natural como o ar que respiramos. Que tinha isso de especial? "Toda a gente" sabia que o normal era haver República, que isso da Monarquia era uma ultrapassada cena do passado, que desaparecera há mais de cinquenta anos (então...)! 

E então aquela coisa dos velhinhos a desfilarem e a colocar coroas de flores não sabia bem aonde, também me parecia algo bizarro. Que raio de ideia dos senhores, manifestamente frágeis, virem para a rua (ainda apanhavam alguma pneumonia e depois era o cabo dos trabalhos...) naquelas poses solenes, em vez de estarem comodamente em casa junto dos seus netos!

Precisei de crescer para entender que o regime republicano não era coisa tão natural assim, que havia vários países que optavam por manter o regime monárquico, que a Implantação da República não fora coisa fácil e implicara três dias de batalhas, com mortos a sério e suicídio de um dos comandantes da revolta quando pensava que esta tinha falhado e posterior reviravolta que assegurara o triunfo dos republicanos. Só mais crescido entendi que aqueles velhinhos frágeis e caquéticos eram o que restava dos combatentes da Rotunda e de outros locais por onde passou a revolta republicana, então vigorosos jovens na flor da idade que viram a morte desfilar diante dos seus olhos, que estiveram debaixo de fogo e fizeram fogo. Só então entendi que aqueles dias tinham sido tão importantes, tão determinantes, tão identitários para aqueles homens, que eles não se dispensavam, ano após ano, embora cada ano menos e cada ano mais frágeis, de evocar aquele evento.

Hoje, estando já eu a caminho da caquexia, senão velhinho pelo menos já meio velhote (decididamente usado e já muito fora do prazo de garantia...) entendo perfeitamente aqueles velhos republicanos e sou eu que não dispenso de evocar uma data para mim importante, determinante e identitária: o 25 de abril! Não que eu tivesse tido nele alguma participação, para além de a tudo ter assistido, empolgado e esperançoso. Tinha então menos de 19 anos e nem sequer estava de armas na mão porque tinha adiado o cumprimento do então obrigatório serviço militar, em virtude de ser estudante universitário.

Passaram 42 anos!

Pela minha vivência infantil em relação aos velhos republicanos, percebo perfeitamente que as crianças e jovens de hoje vejam com alguma indiferença o que eles consideram a bizarria de comemorar um golpe militar ocorrido muito antes de terem nascido e que os cotas mais velhos afirmam ter permitido a instauração da Democracia! Entendo perfeitamente que as crianças e jovens de hoje achem estranha esta comemoração. Então a Democracia não é tão natural como o ar que respiramos? 

É, pois, importante que os mais velhos não deixem de transmitir que, sendo a Democracia natural e desejável, não é necessariamente existente. Que a Democracia necessita constantemente de ser defendida, vivida, praticada e renovada.

Eu vivi mais de 18 anos da minha vida sob um regime político não democrático e sei a asfixia que, quando ganhei consciência da cidadania, tal me provocou. O meu pai viveu quase toda a sua vida em regime não democrático. Lembro-me perfeitamente de, em 1969, ter havido uma novidade: ia haver umas eleições em que era permitido que concorressem listas não afetas ao regime. Lembro-me de, nesse dia, o meu pai, agitadíssimo, receosíssimo, prudentíssimo, ter saído de casa para ir votar, com o boletim de vota na lista da situação num bolso do casaco e o boletim de voto na lista da oposição no outro bolso (então era assim, boletins separados, não havia cá quadradinhos nem cruzinhas...), após ter proibido terminantemente a minha mãe e os filhos de saírem de casa ou sequer assomarem à janela, não fosse haver algum problema, e de, ao regressar, ter-se dirigido imediatamente à cozinha, retirado do bolso o não utilizado boletim de voto na situação e pressurosamente tê-lo queimado, para que não houvesse provas que ele tinha votado na oposição, recomendando a todos que mantivéssemos a boca calada em relação à sua decisão de voto, que as paredes tinham ouvidos e a policia política do regime não era para brincadeiras!

Dou graças por as crianças e jovens do meu País sempre terem vivido em Democracia e não saberem, nem sequer imaginarem o que é viver sem ela! Recomendo vivamente que não tenham a Democracia como algo de garantido, como favas contadas, e a defendam, vivam e pratiquem. Que não a deixem estiolar nem fenecer, para não virem a sofrer a falta dela.

42 anos passaram. Hoje a Democracia parece-nos tão natural como o ar que respiramos. Felizmente muitos de nós não têm noção da sua falta. 

Comemoram-se hoje 42 anos do 25 de abril. Comemora-se hoje o evento que permitiu se restabelecesse a Democracia em Portugal. Que ela permaneça na nossa terra - para sempre!

Rui Bandeira

18 abril 2016

Sobre o Método Maçónico (III)...



Já em dois textos anteriores que podem ser consultados aqui abordei como assunto o “Método Maçónico” e hoje volto ao mesmo tema para complementar o que foi anteriormente publicado.

O designado "Método Maçónico" é um processo refletivo, seja ele autónomo (pessoal) ou coletivo (na forma de debate).

Na sua forma pessoal, é um modo de auto-questionamento que em última instância levará ou deveria levar, a um aprimoramento moral e social do seu interlocutor.

As questões pessoais que afligem e que com as quais se debate um maçom enquanto ser humano, logo "ser pensante", os “talvez?!”, os"quês?!", os "porquês?!", os "serás?!", os "conseguirei?!" e outras questões análogas que possam surgir na mente e na vida de um maçom, serão a base do seu pensamento, da sua motivação e que levarão à sua suplantação pessoal. 
Isto é a busca pelo auto-aperfeiçoamento, conceito este commumente tão propalado no meio maçónico.

Já a prática da reflexão coletiva na forma de debate ou discussão de ideias, leva a que se possa partilhar o que se conhece, a informar e ser-se informado, trocar pontos de vista e opiniões diversas e/ou contrárias, com o intuito da obtenção de consensos  e/ou informação que seja verdadeira ou a mais próxima da realidade.

Este método em si não é muito díspar de outros que também usam o debate e partilha de ideias, logo não será nem melhor nem pior que os restantes, mas é aquele que os maçons utilizam como sustentáculo da sua filosofia.

O "Século das Luzes", época na qual a atual Maçonaria (Maçonaria Especulativa) teve origem, foi um tempo de debates intensos e amplos na sociedade vigente e muito das ideias e ideais que se partilhavam nessa altura da história eram originários e debatidos no seio das lojas maçónicas de então. E sendo as Lojas Maçónicas um espaço (local) onde a liberdade de expressão e de ideias sempre existiu, ainda para mais nesse tempo em que a Liberdade era um conceito mais teórico que prático no mundo, estas Lojas albergavam a vanguarda do pensamento da época; o que possibilitou a transferência desse espírito liberal para a sociedade civil, levando a um consequente avanço tanto da sociedade em si como também da forma de pensar das pessoas que viveram nesses tempos. 
- E a Maçonaria ainda o continua a fazer contemporaneamente...-
Pois o facto da atual Maçonaria ser designada por "especulativa" é devido à própria Ordem fomentar a "especulação", o debate, a "conversa" livre de dogmas, em si, "o questionamento".
- Apenas questionando se pode evoluir!-

Esta maçonaria dita de "especulativa" é muito diferente da maçonaria primitiva, a Maçonaria Operativa, que era a maçonaria dos "construtores das catedrais", que tinha outro tipo de intervenção e preocupações.
E com a entrada de pessoas nestas guildas (associações ligadas à "Arte de Construir")  que tinham outro tipo de profissões e origens, procedeu-se a uma "transformação" na forma e essência que caracterizava essa maçonaria. Deixando esta de ser uma associação ou fraternidade de trabalhadores unidos pelo elo da "construção" para se tornar em algo mais que um mero "clube de discussão". E friso "algo mais" porque estes grémios acabaram por mudar/mutar o sistema pensante vigente, porque ao sentar lado a lado, de igual para igual, gente com origens e forma de pensar (muitas vezes) distinta, criou algo que seria quase impensável para a época e para os locais onde a Maçonaria Especulativa se ia então estabelecendo e consolidando.

 - E é também por estas razões que este "método" que é desenvolvido de uma forma racional e algumas vezes pragmática, tem uma maior eficácia e interesse na sua executabilidade. -

Assim e pelo que referi anteriormente, pode-se concluir que o "pensamento"  foi sempre, na Maçonaria,  um ponto de partida para algo mais. Quer fosse a nível pessoal ou de forma coletiva, propiciando a evolução pessoal (dos seus obreiros) e o progresso civilizacional dos povos onde (a Ordem) se encontre instituída. 
Estas são as  principais metas a que Maçonaria se propõe a atingir/efetuar, seja como Instituição ou através dos seus obreiros.

11 abril 2016

Afinal é só isto ?


Um homem livre e de bons costumes, a certa altura, manifesta interesse em se integrar na maçonaria. Espera um bocado (ás vezes, um booom bocado...), alguns desconhecidos têm com ele conversas que lhe parecem cerrados interrogatórios, um belo dia é informado que foi aceite para ser iniciado, um não menos belo dia é mesmo iniciado. Vive uma cerimónia que, provavelmente, não vai esquecer até ao fim da sua vida e dizem-lhe que, a partir daí, é um Aprendiz. Passa um bom bocado (às vezes um booom bocado...) nessa condição e, outro belo dia, é elevado a Companheiro, noutra cerimónia que, esta, o dececiona um pouco. Passa outro bom (ou booom...) bocado e, em mais outro belo dia, é exaltado Mestre Maçom, numa nova cerimónia que, esta, vai rivalizar, na sua memória com aquela em que foi iniciado. A partir daí, é um elemento com pleno direito a intervir em tudo o que diz respeito à sua Loja e à Obediência em que se integra.

O homem livre e de bons costumes (desejavelmente melhores...), agora Mestre Maçom, às vezes - frequentemente - é atraído para efetuar o percurso de um (ou mais) sistema de Altos Graus. Algum tempo (e algumas despesas...) depois, interioriza que estes Altos Graus afinal mais não são do que desenvolvimentos, aprofundamentos, do que aprendera na Maçonaria azul, a dos três graus, Aprendiz, Companheiro e Mestre.

Entretanto, na sua Loja, o homem livre e de bons (desejavelmente melhores...) costumes vai evoluindo de jovem Mestre a Mestre experiente. Vai assegurando o exercício de vários ofícios em Loja, normalmente primeiro em substituição dos titulares, depois como elemento oficialmente integrando o Quadro de Oficiais da Loja. A certa altura, assegura o ofício de 2.º Vigilante, tem a responsabilidade de coordenar os Aprendizes, relembra o tempo em que ele próprio foi Aprendiz e trata de fazer o que se recorda que então apreciou que o "seu" 2.º Vigilante fez, mais aquilo que gostaria que ele tivesse feito. Depois, assegura o ofício de 1.º Vigilante, passa a coordenar os Companheiros e relembra o trabalho do "seu" 1.º Vigilante e acrescenta-lhe o que, quando Companheiro, sentiu que então faltara.

Um belo dia, sente a responsabilidade de ser-lhe confiada a gestão da sua Loja, de lhe ser entregue o malhete de Venerável Mestre. Tem natural alegria por ter recebido a confiança dos seus Irmãos e sente a responsabilidade de corresponder a essa confiança. Não sabe ainda que essa é apenas a primeira de duas alegrias: a segunda saboreá-la-á juntamente com o sentimento de dever cumprido e o alívio de terminar a responsabilidade de conduzir a Loja, na ocasião em que passar o malhete ao seu sucessor.

Depois... depois aconselha o seu sucessor, exerce o ofício mais humilde - mas não menos importante... - da Loja, e... passa ao estatuto de Mestre Instalado, ex-Venerável, senador da Loja, enfim, com mais ou menos colaboração com a Loja, com mais ou menos intervenção em ofícios em substituição, com mais ou menos exercício de ofícios em primeira linha destinados aos Mestres mais experientes, essencialmente passa à "reserva ativa" e a observar o percurso que efetuam os que, depois dele, fazem o caminho que ele já fez.

É certo que há os tais Altos graus, é certo que pode haver a oportunidade de assegurar ofícios em Grande Loja, mas certo, certinho, é que passará os dez, vinte, trinta ou mais anos seguintes a fazer mais do mesmo.

Provavelmente, talvez quase certamente, em mais um belo dia sentirá assomar-lhe ao pensamento a pergunta: mas afinal a Maçonaria é só isto?

E é então, precisamente então, que, chegado o momento da verdade, o homem livre e de bons (desejavelmente melhores...) costumes, se fez bem o seu trabalho desde o já longínquo dia em que foi iniciado, imediatamente tem a sua resposta: Sim, é só isto, não deve ser mais do que isto e é preciso que seja exatamente isto!

Se der esta resposta a esta pergunta, pode sentir-se feliz, porque já aprendeu (ou melhor, pois convém não ser convencido nem petulante: já começou a aprender...) a primeira e essencial lição que a Maçonaria lhe ensina: a Maçonaria serve, tem como objetivo, destina-se ao aperfeiçoamento dos seus elementos. Dia a dia, hora a hora, momento a momento, sempre, desde o meio-dia até à meia-noite, isto é, desde o dia da sua iniciação até ao momento da sua passagem ao Oriente Eterno.

O aperfeiçoamento individual é uma atividade, um esforço, uma tarefa, que se assemelha a andar de bicicleta: se se parar por muito tempo, cai-se... O aperfeiçoamento individual, tal como a forma física, é um compromisso  permanente. Sabem os atletas e desportistas, da alta, média ou baixa competição, que para se atingir e melhorar a forma física, tem de se ter muito trabalho. E que, quando se vai de férias, ou se fica doente ou lesionado, ou simplesmente se para porque assim apetece, ao fim de pouco tempo deixa-se de se ficar em forma. E, para a atingir de novo, é preciso recomeçar e ressofrer o que se sofreu para atingir a forma da primeira vez.

O treino está para a forma física como o trabalho de aperfeiçoamento está para o aprumo moral e espiritual. Se se para, regride-se. Quem quer efetivamente ser melhor, tem de continuamente esforçar-se por ser melhor - sem descanso, sem interrupções, sem desfalecimentos - até ao momento em que o nosso tempo neste plano de existência termina. 

Portanto, meus Irmãos maçons, caros candidatos a integrarem a Maçonaria, simples curiosos, indiferentes que só por acaso vieram dar a este texto e (miraculosamente?) ainda o estão lendo, e até mesmo você, que não gosta mesmo nada dos maçons: Sim, afinal a Maçonaria é só isto, faz todo o sentido que seja só isto, não deve ser mais do que isto ou diferente disto, um percurso de aprendizagem, de repetição, muita repetição, de esforço, muito esforço, de persistência, muita persistência, apenas com um simples e aparentemente (mas só aparentemente...) fácil objetivo, ser melhor hoje do que se foi ontem, ser amanhã um pouco melhor do que se foi hoje, e assim prosseguir até à hora em que ao maçom é permitido pousar as suas ferramentas e passar ao Oriente Eterno.

Quanto mais depressa se interiorizar isto, mais fácil e mais profícuo é o trabalho!

Rui Bandeira

06 abril 2016

Caminhos ...

Os passos são dados em silêncio, sem alarmismos, sem falsos moralismos e sempre sem afrontamentos.

A solidão impera entre 4 paredes, ou porque não dizer, entre o sul e o norte, entre o oriente e o ocidente.

Os caminhos, individuais, são graduados por desvios, curva e contra curva, retas, curva em cotovelo, cruzamentos e entroncamentos e, sempre assim é, e sempre assim será, cada um faz o seu caminho, percorre a distância que lhe apraz percorrer, trilha os lugares por onde passa e, sobretudo, os lugares por onde quer passar e marcar presença. Seja ela de que índole for, ou seja, para ser conciso, seja ela propositada ou não.

As leis existem…sim, as leis, porque no fundo são leis, os regulamentos, as provas, as provações, as provocações, as ilusões, e muitas outras coisas acabadas em “ões” …
Consequentemente, tudo isto seria fácil de explicar à luz de uma dinâmica de grupo, em que a ação gera reação e por fim, em ambos os sentidos, reflexão. Que é como quem diz, “amor com amor se paga”, ou até mesmo numa entoação mais popularucha, “cá se fazem, cá se pagam” …

E a Maçonaria? Que tem a Maçonaria a ver com tudo isto?
Nada.

Tudo.

Aqui não há falsos moralismos, aqui não há falsas promessas, caminhos inversos e passos dados sem concretizações imaginárias. Uma atitude tomada em certa direção é sempre uma atitude tomada nessa direção, e essa atitude fica escrita, fica gravada na pedra de cada um de nós. 

O que hoje é verdade, em Maçonaria, daqui a muitos anos também o será, há sempre alguém que ouviu, que viu, que registou, que sentiu. Sempre.

O humilde silêncio inicial prepara e apruma essas capacidades, que outrora esquecidas, sempre que necessárias, são postas ao serviço da nossa ordem e, meu irmão, um de nós irá sempre recordar-te delas, bem como dos teus juramentos e de muitas outras coisas mais se necessário for.

Cada um faz o seu caminho, desbasta a sua pedra bruta, vira na direção que pretende, segue o grupo, ou caminha sozinho, mas a todos essa decisão diz respeito. Até porque um caminho individual leva ao engrandecimento do caminho de todos os meus irmãos. 

E um templo individual não é mais do que uma pequena partícula do grande templo coletivo que é a Maçonaria Regular em Portugal.


Daniel Martins”