05 setembro 2011

O Tempo, a Idade e a Maçonaria - II



Mais do que uma idade certa, há uma maturidade certa para se ser iniciado. Muitos nunca atingem essa maturidade: nascem, vivem e morrem sem nunca perder um segundo com as "grandes questões", tal a azáfama com que passam por esta existência. Outros atingem-na, encontram as sua próprias respostas, e deixa, a partir de certo ponto, de fazer sentido procurarem outro método de aperfeiçoamento, pois já encontraram o seu próprio método, chegaram às suas próprias conclusões, traçaram o seu próprio caminho.

Cada maçon tem a sua própria história, o seu próprio ritmo, o seu próprio percurso. Uns chegam mais cedo, outros mais tarde. Uns caminham mais depressa, outros mais devagar. Outros ainda levam mais tempo numa fase, e noutra disparam a correr. Ou ao contrário.

Temos entre nós quem tenha sido iniciado aos vinte e poucos anos, e quem o tenha sido já depois de ser avô. Temos quem tenha sido aprendiz ou companheiro durante bastantes anos, e quem ao fim de menos de dois anos já fosse mestre. Temos quem tenha ficado pouco tempo, quem tenha ficado alguns anos, e quem ainda cá esteja. Por tudo isto, encontra-se numa loja uma grande diversidade de idades, maturidades e sensibilidades. A todos une, porém, a vontade de se tornarem pessoas melhores, e de o fazerem juntos, e aprendendo uns com os outros.

Os aprendizes mais jovens podem aproximar-se mais facilmente de mestres mais próximos da sua idade, até estarem mais à vontade com os mais velhos. Os aprendizes mais velhos terão porventura maior afinidade, pelo menos inicialmente, com os maçons mais maduros. Com o passar do tempo, à medida que aquelas caras vão adquirindo nomes, aos nomes se vão juntando feitios, e os feitios, as caras e os nomes se tornam pessoas que vamos conhecendo e distinguindo das demais, os aprendizes vão-se apercebendo com quem podem aprender melhor o quê, e acabam por aprender com todos - com uns mais do que com outros, mas isso também faz parte...

Chegado a companheiro, o maçon conhecerá já razoavelmente a maioria dos irmãos da sua loja, e estes a ele. Terá, para além disso, passado pela experiência de ter "irmãos mais novos", iniciados depois dele. Esses irmãos mais novos podem ser até mais velhos em idade, o que torna tudo muito mais interessante. E quando se chega a mestre, percebe-se por fim que todos têm alguma coisa a aprender com cada um dos demais.

Os mestres mais novos encontram nos mais velhos a experiência de quem já passou por muitas situações difíceis, tomou muitas decisões - algumas mais certas que outras - e tem, enfim, a sabedoria que só a idade, a experiência e as dificuldades proporcionam. Por seu lado, os mestres mais velhos encontram nos mais novos a possibilidade de reviver e questionar o seu próprio percurso, de tornar de novo novas as suas velhas dúvidas e questões, e a possibilidade de passarem para outros aquilo que receberam dos que os antecederam. Uns e outros partilham da alegria de estarem juntos, de serem diferentes, e de terem algo a aprender uns com os outros.

Sem sangue novo, uma loja está condenada, mais ano menos ano, a abater colunas: não há quem ensinar e, à medida que os mestres forem passando ao Oriente Eterno, a loja vai ficando mais pequena, até deixar de se poder manter. Por outro lado, sem o "sangue velho" - e muitas começaram assim - a loja pode até existir, mas é uma loja sem raízes nem memória, que só adquirirá com o decorrer dos anos.

Diz-se que em maçonaria nada se ensina, e tudo se aprende. É, por isso, um privilégio poder-se aprender com quem cá está há mais tempo.

Paulo M.

31 agosto 2011

Maçonaria e Poder (VII)


Illinois Masonic Medical Center, Chicago

A implantação e evolução da Maçonaria americana seguiu linhas muito próprias, diferentes do que sucedeu no resto do mundo. O imenso continente foi sendo povoado de leste para oeste, em localidades distantes umas das outras e cada uma autossuficiente. Em cada localidade com alguma importância (e mesmo em algumas de reduzida importância...) estabeleceu-se pelo menos uma Loja maçónica, que geralmente tinha como membros os elementos mais destacados dessa sociedade: o juiz, o médico, o banqueiro, os principais comerciantes, etc.).

Em cada povoação, a Loja maçónica integrava a rede social ali existente, fazia parte da vida da comunidade. Cedo começou a perfilar-se o que viria a ser uma importante caraterística da Maçonaria americana: a sua vertente filantrópica. Em termos espirituais muito influenciados pelo puritanismo, para a mentalidade americana é muito importante o conceito de charity (que, no meu entendimento, mais corretamente se traduz por filantropia do que pelo aparentemente mais direto termo caridade). A Loja maçónica local foi naturalmente um espaço e uma estrutura adequados para o exercício do dever de filantropia.

A importância dada pela Maçonaria americana à filantropia, elevando-a a polo essencial da sua atividade, distingue-a da Maçonaria continental europeia, em que a filantropia é uma vertente presente, mas não atinge o nível de essencialidade da sua congénere americana.

A Maçonaria americana criou e sustenta grandes hospitais (gerais, pediátricos, ortopédicos, de assistência a grandes queimados, etc.), o que, como se calcula, implica a reunião e disponibilização de grandes quantidades de fundos financeiros.

Isto implicou a necessidade constante de fluxos financeiros apreciáveis, quer através de donativos, quer através de fundos obtidos pela própria atividade maçónica. Mais do que propriamente as quotas (destinadas ao suporte das despesas das próprias Lojas), importante eram e são os fundos obtidos através do que (algo impropriamente, mas mais facilmente compreensível por todos) poderemos designar por joias: joias de iniciação, de passagem de grau, de acesso e progressão nos Altos Graus.

A atividade filantrópica da Maçonaria americana em grande parte foi e é sustentada por um constante fluxo de novos elementos e de contribuições extraordinárias dos elementos existentes.

Necessário foi - e é - iniciar novos membros em quantidade e assegurar a sua progressão em novos graus como forma de financiar a atividade filantrópica.

Isso levou a uma outra caraterística distintiva da Maçonaria americana, em relação às suas congéneres europeias: a existência de muitas Lojas com várias centenas de membros, mas das quais apenas uns poucos são membros efetivamente ativos.

Nos Estados Unidos, em grande parte ser-se maçom é ser-se inscrito na Maçonaria, fazer uma espécie de "recruta" e a modos que umas "especialidades", atingindo-se o topo dos Altos Graus, ou perto disso, com uma rapidez impensável na Europa (mas pagando as respetivas joias de iniciação e progressão, claro...) e depois ... é assim, mal comparado, como que ser-se sócio da Associação dos Bombeiros da terra: paga-se as quotas anuais e raramente (ou nunca) se vai à Loja. Mas, no entanto, por regra existe o orgulho em ser maçom, expresso em autocolantes colados nos automóveis, no uso do anel de Mestre, ao menos em ocasiões festivas, e na comparência nos regulares eventos de angariação de fundos.

Claro que a Maçonaria americana não tem só esta vertente filantrópica, também compartilha dos princípios e objetivos de formação e aperfeiçoamento dos seus membros que é tónica da Maçonaria mundial - mas esta vertente filantrópica é ali de tal forma importante que influenciou a forma de a sociedade ver e participar na Maçonaria.

A Maçonaria americana, apesar de ter contado com membros ilustres nos Pais Fundadores dos Estados Unidos não tem qualquer intervenção no Poder ou na política federal, não tem influência relevante (que ultrapasse a decorrente de garantir a subsistência de importantes estruturas e instituições de interesse coletivo) a nível estadual e, a nível local, terá apenas a influência que os seus membros individualmente tenham.

A Maçonaria americana e o Poder naquele país são completamente independentes um do outro.

Rui Bandeira

24 agosto 2011

Maçonaria e Poder (VI)



Um dos primeiros destinos de exportação da Maçonaria foram as colónias britânicas no Novo Mundo. A colonização do imenso espaço que hoje são os Estados Unidos da América estava ainda na sua fase inicial, praticamente confinada à costa leste e a pouco mais, com colónias separadas por grandes distâncias e evidentes dificuldades de comunicação - mas cedo as Lojas maçónicas se começaram a implantar ali!

A Loja maçónica era mais um fator de congregação, um elemento importado da terra de origem que confortava quem desenvolvia e explorava um Novo Mundo. Nelas se juntavam os grandes e pequenos proprietários de terras, militares, professores e outros intelectuais. Enfim, a Loja maçónica era a reprodução, na colónia, de instituição existente na terra de origem de cada um. Nas Lojas maçónicas das colónias juntava-se a elite dos colonizadores.

O conflito entre as colónias do Novo Mundo e a Coroa Britânica que iria redundar na Independência dos Estados Unidos da América começou a desenvolverse em torno de razões económicas e comerciais, mas teve larga influência de maçons. A gota de água foi o imposto sobre o chá. Em 16 de dezembro de 1773, colonos americanos lançaram às águas do porto de Boston a carga de chá de três navios britânicos. Esta ação, que ficou conhecida por Boston Tea Party, foi planeada e organizada na Green Dragon Tavern, também conhecida por... Freemasons' Arms.

Dos 56 signatários da Declaração de Independência, 9 eram confirmadamente maçons. É possível que até mais dez dos outros também o tenham sido. Trinta e três dos setenta e quatro generais do exército continental (independentista) eram maçons. George Washington, o Comandante em Chefe das tropas colomiais e o primeiro Presidente da novel nação era maçom, como o eram Benjamin Franklin, Paul Revere e o General Lafayette, o oficial de ligação francês nas colónias, sem cuja ajuda possivelmente os independentistas teriam perdido a guerra. Dos cinco redatores do projeto da Declaração de Independência, dois (Franklin e Robert Livingston) eram maçons e um terceiro (Robert Sherman) pode tê-lo sido, mas não há de tal confirmação inequívoca. George Washington prestou juramento como primeiro Presidente dos Estados Unidos da América perante Robert Livingston, Chanceler de Nova Iorque, o mais alto cargo de magistratura então existente e... Grão-Mestre da Loja Maçónica de Nova Iorque. A Bíblia sobre a qual Washington prestou juramento era a utilizada na sua própria Loja como Volume da Lei Sagrada.

Os princípios enformadores da organização política e social norte-americana têm fortíssima inspiração maçónica. Liberdade - Igualdade - Fraternidade, governo do Povo, pelo Povo, para o Povo, o respeito pelas liberdades fundamentais, incluindo obviamente a liberdade de religião, o princípio da separação de poderes, tudo isso são temas caros à Maçonaria.

Os maçons americanos deram a sua colaboração, juntamente com outros ilustres cidadãos que prezavam a liberdade e a democracia, para o estabelecimento das regras definidoras da atuação do Poder político da novel nação. É o caso que conheço de maior influência maçónica no Poder político.

Convenhamos que - independentemente de ideologias e de preferências por sistemas de governo - não fizeram, de todo, um mau trabalho!

Fontes:



Rui Bandeira

22 agosto 2011

O tempo, esse maravilhoso conselheiro.

Há algum (muito) tempo atrás, tinha adquirido de forma instintiva um exercício diário, visitar o A Partir Pedra.

Era por aqui que passava o meu tempo livre, por aqui vagueava horas a fio, onde lia e relia todos os textos, desde os novos aos mais antigos, desde os que me chamavam de forma natural a atenção até àqueles que pouco ou nada me diziam.

O tempo, esse maravilhoso conselheiro, que tudo cura e tudo constrói, foi passando e quando me apercebo o exercício era já rotineiro, em que a necessidade era superior à curiosidade. Quando se perde a necessidade e, a curiosidade é algo sempre presente, algo está por acrescentar no nosso dia a dia…

Era inevitável o querer ser maçom, disse-o uma e outra vez, durante alguns dias.

Se mais depressa o decidi, mais devagar o concretizei.

O tempo, esse maravilhoso conselheiro, surpreendeu-me pelo seu lado original e à altura negativo, pois avançou silenciosamente e sobretudo sem pressa alguma e como eu tinha pressa, queria ser maçom, queria aprender e crescer, quando na realidade, já com o processo em andamento estava já a fazer tudo isso e de uma forma instintiva, sem ter essa perceção.

Tanto tempo faz-nos, por vezes, desiludir e pensar em desistir, mas na realidade é apenas o ponto de partida para o que vem a seguir.

Já iniciado, o tempo, sempre ele, começou uma interior e dura batalha comigo, onde impera o silêncio e a incerteza do passo a dar em seguida.

A (minha) verdade é afinal tão simples.

O tempo passa e a integração vai surgindo de uma forma racional, de novo rosto desconhecido de todos, a forma como se é recebido entre os demais irmãos é acolhedora, afável, alegre e natural.

A batalha interior continua diariamente, onde a regra do silêncio imposta começa a revelar toda a sua essência, ou seja, quero falar e não posso e logo eu que tenho tanto a dizer.

Não sou dos que nada têm para dizer, nunca fui, quando tinha oportunidade falava sem qualquer problema de consciência e sempre com a certeza do que estava a dizer…como estava eu enganado, isto de falar só para não estar calado é realmente uma grande asneira e revela-se quando percebemos a diferença entre ouvir e falar.

Não falar é inicialmente algo penoso, no entanto, ao fim de algum tempo começamos a perceber que o fato de não falar nos permite um exercício mental bastante útil, pensar.

O local preveligiado do aprendiz e do companheiro, é isso mesmo, o local ideal para ouvir todas as opiniões e sobre elas pensar, fazendo algo que raramente se faz de forma natural, que no fundo é tão só isto, “caso eu pudesse falar, que diria eu sobre isto?”.

O tempo fez o que tinha a fazer, até que um dia, inesperadamente e de forma informal, ou seja, extra sessão, um irmão que por acaso era o VM desse ano maçónico, me questiona de forma direta:

- Então meu irmão, que tens tu a dizer sobre tudo isto, qual a tua opinião?

E em três segundos lá se foi o tapete debaixo dos pés, eu, logo eu, que tanto tinha para dizer e queria dizer, não articulei uma só frase, limitei-me a responder, “não tenho ainda opinião formada, afinal estou cá para aprender”.

Na realidade desenrasquei uma atribulada e apressada resposta e o que escrevi acima pareceu-me ser a melhor forma de lidar com aquele momento, é sempre assim, quando não estamos à espera as coisas acontecem.

E este era, afinal, o caminho certo, pois finalmente percebi que de tanto querer falar e não poder, se me pedem opinião e não a consigo articular de forma conveniente é porque me falta todo um percurso para fazer.

É um percurso sem fim, é um caminho a percorrer e sempre sem pressa alguma de o caminhar, seguramente é mais firme um passo exato a avançar na direção certa que um passo amedrontado numa direção qualquer.

Escrever hoje aqui é para mim, algo especial, era e é aqui que passo algum do meu tempo livre, foi e é aqui que me vou “perdendo” em leituras e nas minhas interpretações, logo, a possibilidade de aqui escrever é mais que natural, é um dever para comigo mesmo e para quem me acolheu.

Se esta foi a minha porta de entrada na M:., que esta seja agora, depois de elevado a M:.M:., uma das variadas formas de poder contribuir com tudo aquilo que me falta aprender.

Daniel Martins

21 agosto 2011

Parabéns!


Uma vez mais, e pontualmente - como, de resto, tem sucedido há mais de meio século - o nosso Rui Bandeira ficou um ano mais velho sábio. Que os contes pontualmente por mais outros tantos quantos contaste até aqui - se esse for o teu desejo! Um grande abraço de parabéns!

17 agosto 2011

Maçonaria e Poder (V)



Desde o seu início, a Maçonaria especulativa foi, em Inglaterra, interclassista, reunindo no seu seio nobres, burgueses, artesãos e intelectuais.

No século XVIII, muito por influência dos espíritos progressistas do Iluminismo inglês, as Lojas eram polos de divulgação do espírito científico, do Conhecimento. A reunião dos melhores espíritos da época, a sua influência nos círculos populares e urbanos, não escaparam à atenção da nobreza, da classe que detinha e continuava a deter o essencial das rédeas do Poder. E a nobreza inglesa teve a lucidez suficiente para embarcar no mesmo barco e, mesmo, rapidamente, capitanear o navio.

A Maçonaria inglesa, como instituição nascida nesse país, compartilhava da idiossincracia muito particular do povo inglês. Assim, as Lojas assumiam também as características conviviais dos clubs ingleses - e a tradição da sua exclusiva masculinidade, que permanece ainda hoje na Maçonaria Regular... -, particularmente na importância atribuída aos ágapes (refeições) partilhados entre obreiros. Mas, ao contrário, dos distintos e exclusivos clubs, a integração numa Loja não implicava exagerado dispêndio financeiro, sendo os custos inerentes comportáveis para o comum cidadão com uma situação económica que estivesse acima do nível da luta pela sobrevivência. Daí o seu caráter interclassista, sentando-se lado a lado o rico e o meramente remediado, o nobre e o burguês, o intelectual e o artesão.

Mas, como é natural - talvez inevitável - em grupos heterogéneos, os mais cultos, mais bem preparados, os mais bem colocados socialmente, gradualmente acabaram por sobressair. Não admira, assim, que a breve trecho, a direção formal da Grande Loja passasse a ser assegurada por membros da nobreza, depois da alta nobreza e finalmente da Família Real, embora a gestão diária fosse assegurada por elementos socialmente mais discretos, mas porventura mais entrosados na organização e seguramente com maior disponibilidade pessoal para as tarefas do dia-a-dia. Daí a particular importância que, na Maçonaria anglo-saxónica - mas não só - tem o ofício de Grande Secretário, verdadeiro Diretor Administrativo da instituição.

Seja como seja, desde o início da sua implantação que a Maçonaria inglesa foi protegida pelo Poder, integrada como instituição social de relevo. Para além da sua função básica, de polo de melhoria, de crescimento e aperfeiçoamento pessoal dos seus membros, passou a exercer lateralmente tarefas na área social e beneficente, integrande a rede de instituições de suporte social num país em que - não o esqueçamos - a mentalidade socialmente dominante é individualista. E este aspeto beneficente, de suporte social, como é óbvio, na medida em que contribuía para a diminuição e controlo das tensões sociais, sempre agradou ao e favoreceu o Poder.

Mas não só a este nível a maçonaria foi utilizada pelo Poder britânico. A expansão imperial britânica teve como uma das suas pontas-de-lança a Maçonaria, rapidamente "exportada" para todos os confins do globo onde existia um espaço integrante do Império Britânico. A Maçonaria era parte do "british way of life", era uma instituição característica da sociedade inglesa e, como tal, estava presente, tal como a "Union Jack" e os regimentos britânicos, onde quer que existisse o Império Britânico.

Este caráter institucional que rapidamente a Maçonaria inglesa logrou atingir possibilitou e favoreceu o seu crescimento e implantação por todo o Mundo.

Em Inglaterra, indubitavelmente que a Maçonaria beneficiou do beneplácito do Poder. Mas não nos enganemos: mais do que ser a Maçonaria a influenciar o Poder, foi o Poder quem dirigiu e utilizou a Maçonaria, como um dos instrumentos da sua política.

Ainda hoje gentleman que é gentleman é maçom...

Esta caraterística de integração social da Maçonaria inglesa foi partilhada, de uma forma muito similar, em muitos países do Norte da Europa - Escandinávia, reinos alemães, Países Baixos, entre outros - em que, na sua fase de implantação, a Maçonaria foi protegida e integrada pela nobreza, nalguns locais mesmo dirigida pelo monarca ou por um membro da Família Real.

Por sua vez, esta integração social da Maçonaria inglesa influenciou - sobretudo ao nível dos princípios, da organização e da prática quotidiana - a Maçonaria Regular em todo o Mundo.

Em todo o Mundo, a Maçonaria Regular contém-se nos limites da Lei vigente, como instituição integrada na sociedade, existindo e funcionado em plena legalidade, à luz do dia, sem secretismos, tal como qualquer outra instituição social. E, tal como qualquer outra instituição social, influenciando e sendo influenciada pelo Poder. É assim a realidade da vida em sociedade...

Rui Bandeira

10 agosto 2011

Maçonaria e Poder (IV)


Príncipe Edward, Duque de Kent




A transição entre a Maçonaria Operativa e a Maçonaria Especulativa decorreu num período de instabilidade e conflito em Inglaterra: Stuarts contra Hanovers, Protestantes contra Católicos, Parlamento contra Rei. Foi um período de conflitos, de guerras civis, de tumultos e vinganças.

As Lojas maçónicas eram pontos de encontro de todos, independentemente dos lados dos conflitos em que se situassem, fossem católicos ou anglicanos, leais aos Stuarts ou aos Hanovers, adeptos do Parlamento ou fieis ao Rei. Por isso se instituiu na Maçonaria inglesa a regra de que em Loja não se discute política nem religião.

Esta regra, a admissão, permanência e convívio mútuo de pessoas que defendiam ideias diferentes, que, mesmo, batalhavam por conceções diversas, teve uma consequência benéfica para a Maçonaria inglesa: os detentores do Poder, em cada momento, estavam nela inseridos - tal como os derrotados desse momento... Mas, se os ventos sopravam diferentemente e os derrotados de ontem eram os vencedores de hoje, e vice-versa, a situação, em relação à Maçonaria, mantinha-se.

Quando, em 1717, foi criada a Premier Grand Lodge, em Londres, por quatro Lojas desta cidade, o primeiro Grão-Mestre designado foi um burguês, Anthony Sayer, gentleman não particularmente abonado de meios materiais (existem registos de que solicitou e obteve auxílio financeiro da Grande Loja em 1724, 1730 e 1741, ano do seu falecimento). Anthony Sayer era membro da Loja da Apple Tree Tavern, que não era aristocrática. Na época, os aristocratas reuniam-se na Loja Rummer & Grapes.

Em 1718, o Grão-Mestre foi George Payne, também burguês, que mais tarde veio a ser Secretário da Repartição de Impostos. Em 1719, o Grão-Mestre foi o filósofo huguenote francês John Theophilus Desaguliers, também membro da Royal Society, a sociedade inglesa onde se juntaram os melhores cérebros e cientistas da época, verdadeiro alfobre do Iluminismo em Inglaterra. Sucedeu-lhe de novo George Payne, em 1720.

Em 1721, foi eleito Grão-Mestre o primeiro membro da alta nobreza britânica a assumir o cargo: John Montagu, 2.º Duque de Montagu, anteriormente Visconde e depois Marquês Monthermer, que, em 1745, veio a ser nomeado Par do Reino. Foi o primeiro de uma longa lista de nobres, incluindo o Príncipe de Gales entre 1792 e 1812, que dirigiram a Premier Grand Lodge até à sua fusão com a Grande Loja dos Antigos e criação da Grande Loja Unida de Inglaterra, em 1813, realizada sob a égide do seu último Grão-Mestre, o Príncipe Augustus Frederick, Duque de Sussex, que viria a ser o primeiro Grão-Mestre da Grande Loja Unida de Inglaterra (UGLE).

A Grande Loja Unida de Inglaterra só teve como Grão-Mestres membros da alta nobreza - e mesmo da família real - desde a sua fundação até à atualidade. Repare-se na lista dos seus Grão-Mestres:
Como se vê, a Maçonaria inglesa muito cedo foi, não só integrada por membros da nobreza britânica, como por ela diretamente dirigida.

A Maçonaria inglesa insere-se, desde o seu início, na esfera do Poder, é uma organização claramente integrante da estrutura social britânica - ao contrário do que sucedeu, como iremos ver, noutras paragens, mas também a exemplo do que sucederia noutros tantos lugares.

Qual o seu papel na sociedade, a sua autonomia em relação ao Poder político e económico - já que, quanto ao Poder social britânico é inequívoca a sua pertença - é matéria que será objeto do próximo texto.

Fontes:

http://en.wikipedia.org/wiki/Premier_Grand_Lodge_of_England
http://en.wikipedia.org/wiki/Anthony_Sayer
http://en.wikipedia.org/wiki/George_Payne_%28Freemason%29
http://en.wikipedia.org/wiki/John_Montagu,_2nd_Duke_of_Montagu
http://en.wikipedia.org/wiki/United_Grand_Lodge_of_England
http://en.wikipedia.org/wiki/Prince_Edward,_Duke_of_Kent

Rui Bandeira

06 agosto 2011

Niny Sequeira - Maçon de corpo inteiro

Niny Sequeira – assim de repente o nome não diz nada a ninguém, ou a apenas poucas pessoas, a mim diz-me. Diz-me que já passaram muitos anos desde o dia em que o conheci, uns 20 talvez, ou quase.

Diz-me que nos idos tempos da “expansão pela província” da Maçonaria, privei muito de perto com ele.

Pela aurora se marcava a hora de encontro, ali para um posto de abastecimento de combustível na Encarnação.

Niny era inconfundível, magro, enérgico e sempre com um cigarro, mas não era por isso que era inconfundível, era pelo smoking. Homem prático não queria saber de levar muita coisa com ele e por isso o fatito de cerimónia ia logo vestido pela manhã, aliás de uma das vezes quis ser tão prático, e ao mesmo tempo tão irreal, que o smoking acabou por ser o seu pijama.
As idas eram para Bragança, e evidentemente não voltávamos no mesmo dia !!

Sim porque isto de ir realizar sessões maçónicas a sério, para ele só podia ser de smoking.

Foram algumas as viagens, foram muitas as peripécias.

Foram muitos os episódios que se passaram. O Maçon e o Amigo. De vez em quando telefonava-me e lá falávamos um pouco. Acompanhei por terceiros os seus últimos anos de combate a maleitas que o afligiram.

Ontem Niny Sequeira avançou passando ao Oriente Eterno, dele ficam muitas coisas nas nossas memórias.

Nós, que ainda estamos no nosso caminho de aperfeiçoamento, aqui ficamos no nosso percurso até o podermos encontrar novamente, daqui a muitos anos ( porque ele não se aborrece se nós o fizermos esperar um pouco!!!!)

Que o Grande Arquitecto do Universo o tenha  !

José Ruah

03 agosto 2011

Maçonaria e Poder (III)



No tempo das Lojas Operativas, a relação entre os construtores em pedra e o Poder era de simbiótica subordinação. Os construtores em pedra detinham o exclusivo conhecimento - ou quase - de técnicas de construção baseadas em princípios geométricos há muito descobertos, mas perdidos, na sua aplicação, no obscurantismo da Idade Média. A sua associação em núcleos profissionais, Lojas, que asseguravam a formação e treino de novos elementos e a transmissão dos conhecimentos e técnicas herdados de gerações e gerações de profissionais, buscava também garantir a manutenção do conhecimento dessas técnicas e conhecimentos no restrito círculo de profissionais.

Esse desiderato, porém, só era possível de atingir e manter, com o beneplácito dos senhores detentores do Poder - a nobreza -, que assegurava as condições e práticas legais que garantissem o quase monopólio das Lojas operativas nas grandes construções. Em troca, os construtores tinham de bem servir os senhores que lhes encomendavam os trabalhos, executando-os segundo a sua vontade, utilizando as suas técnicas e conhecimento em benefício de quem os contratava.

Também os detentores do Poder religioso, particularmente os bispos - católicos ou Reformistas - influenciavam claramente os maçons operativos. A construção de uma catedral durava e, mesmo, ultrapassava o tempo de vida útil de um oficial construtor. Mas só bons cristãos eram admitidos a trabalhar na construção desses templos. E não só. Também os construtores tinham de se conformar e adotar as normas morais e estilos de vida impostos pelos detentores do Poder religioso. Ou não trabalhavam ali...

Durante séculos, subsistiu esta relação simbiótica, mas subordinada, entre as Lojas operativas e os detentores do Poder - político, económico e religioso.

Mas os tempos iam, primeiro lentamente, depois cada vez mais aceleradamente, mudando. O obscurantismo da Idade Média começou a ser rompido pelo Renascimento, regressando o interesse pelos conhecimentos que a Humanidade obtivera já na Antiguidade. A cultura da Antiguidade Clássica voltou a ser estudada. E muito se descobriu que, mesmo já se sabendo, afinal não se sabia durante séculos e séculos. Os postulados e teoremas da Geometria foram uns dos aspetos redescobertos. E, da redescoberta, em termos públicos e não apenas reservado a uns quantos, poucos, cultores de conhecimentos oralmente transmitidos, necessariamente que resultou a divulgação geral das técnicas de construção que anteriormente só os maçons operativos detinham e guardavam para si.

A Imprensa foi descoberta. Os morosos e caros livros copiados à mão foram, a pouco e pouco, dando lugar a livros impressos, mais baratos, abundantes e dedicados às mais variadas matérias. Conhecimentos e técnicas incluídos...

O que dantes era reservado e monopólio, ou quase, das Lojas passou, num espaço de tempo relativamente curto, a ser habilidade acessível a muitos mais. Era já possível aprender-se as técnicas da construção sem ser no seio de uma Loja operativa. Era já possível trabalhar-se na construção fora da tutela de uma Loja operativa. Surgiam e espalhavam-se os que, nas Ilhas Britânicas, eram depreciativamente denominados pelos maçons operativos de "cowans".

As Lojas operativas lentamente declinavam. A concorrência de profissionais a elas alheios diminuía-lhes o trabalho e os rendimentos. Os construtores em pedra integrados em Lojas operativas deixavam de ser os únicos operadores no mercado. Para procurar manter a sua supremacia, ou simplesmente a sua presença no mercado, dependiam cada vez mais dos senhores terratenentes e das suas encomendas. A relação entre os construtores agrupados em Lojas operativas e os detentores do Poder deixou de ser simbiótica, passou, claramente, a ser subordinada e, com o prosseguir do declínio - os ventos da História não se mudam pela mera vontade de grupos ou indivíduos... - , chegou mesmo a ultrapassar o umbral da subserviência.

As Lojas operativas declinaram economicamente, feridas pela perda da sua exclusividade no mercado. Mas, centenárias, mantendo tradições próprias e um espírito de união resultante de gerações de transmissão de conhecimentos e de vivência em comum, não deixavam de ser atrativamente misteriosas para quem estava de fora (há coisas que, pelos vistos, não mudam...). Os senhores podiam escolher dar os seus trabalhos de construção a Mestres de Lojas operativas ou a "cowans". Mas continuavam a interrogar-se que conhecimentos exclusivos seriam esses que os operativos reservavam para si mesmos. Se outros sabiam também construir, que fazia os operativos manterem-se em Lojas? Que algo mais, ou algo de diferente, havia?

Durante séculos,o que havia no interior das Lojas operativas era só para quem nelas estava. Mas os tempos foram mudando e eram cada vez mais difíceis. Primeiro um senhor, depois outro, logo mais uns quantos, começaram a pôr condições para dar trabalho aos maçons das Lojas e para os continuar a proteger: queriam ter acesso aos conhecimentos próprios deles. Ou então, acabar-se-ia a proteção e havia agora mais quem quisesse trabalhar na construção...

Pouco mais havia a salvar do que a dignidade. Se os senhores exigiam saber o que eles sabiam, não havia já meios de o impedir. Mas podiam e deviam manter os seus compromissos de gerações e não revelar fora de Loja o que à Loja era reservado. A solução foi evidente: admitiram-se os senhores nas Lojas!

Entrou-se assim na transição - mais rápida do que seria de supor - entre a estrita Maçonaria Operativa e o que viria a ser a Maçonaria Especulativa.

Os senhores estavam já nas Lojas. Mais cultos, mais sofisticados, rapidamente se terão apercebido de que os segredos das técnicas de construção não eram já nada de especial nem de domínio exclusivo. Mas toda uma Tradição, toda uma Ética, todo um particular espírito de convivência estratificara ao longo de gerações e de séculos nas Lojas operativas. Esse era o verdadeiro acervo, próprio e único, que, insuspeitadamente, guardavam as Lojas operativas. Afinal, não eram já os segredos das técnicas de construção que interessavam - era tudo o resto!

Os senhores atraíram outros senhores, intelectuais, burgueses, para esse até aí oculto mundo, de antigas tradições, embalsamadas ideias prontas para serem desenvolvidas, notáveis formas de relacionamento a serem prosseguidos. Porventura em menos de um século, os operativos, engolidos pelo progresso, viram as suas Lojas tomadas por dentro e a Maçonaria operativa transformar-se na Maçonaria Especulativa.

O primeiro embate entre a Maçonaria e o Poder começou por ser simbiótico, passou a dependente e subordinado, raiou mesmo a subserviência, transpôs os limites da capitulação... para levar a um inesperado rumo: o Poder conquistou, pacificamente, a Maçonaria por dentro, mas, a partir desse momento, como tantas vezes na História sucedeu com fortes conquistadores, conquistado o Poder interno, podendo-se pôr e dispor... foi seduzido (afinal conquistado) pelas ideias que encontrou.

No primeiro embate entre a Maçonaria e o Poder, os homens do Poder ganharam... mas foram as ideias da Maçonaria que convenceram os vencedores!

Assim mudou a Maçonaria e mais um elemento de mudança se juntou à evolução dos poderosos e do Poder.

Era tempo do Iluminismo alumiar o caminho!

Rui Bandeira

27 julho 2011

Maçonaria e Poder (II)



Antes de se avançar, importa estabelecer bem o significado das palavras, para que não se estabeleçam confusões.

Maçonaria e Poder - que significado neste conjunto de textos se atribui a Maçonaria? E qual o alcance do termo Poder?

Neste conjunto de textos, sempre que utilizar simplesmente a palavra Maçonaria, estarei a utilizá-la no sentido mais amplo possível, tanto quanto possível procurando abarcar o conceito tal como o entende o comum cidadão, de fora, sem grandes precisões ou distinções.

Precisamente porque o objetivo deste conjunto de textos é proporcionar ao cidadão comum, sem grandes conhecimentos ou noções precisas sobre a Maçonaria informação que lhe possibilite assentar as suas ideias sobre o tema com algum fundamento, não faria sentido utilizar a palavra senão no sentido amplo que o cidadão comum lhe atribui.

Assim, neste conjunto de textos, a palavra Maçonaria respeita tanto à Maçonaria Regular como à Liberal, masculina como feminina ou mista, de corrente mais esotérica ou de índole mais social. Quando houver necessidade de precisar, precisar-se-á o conceito. Basicamente, utiliza-se a palavra segundo o significado que ela tem para quem está de fora.

Também será útil deixar uma advertência: procurar-se-á elaborar uma exposição e fazer uma análise tão objetiva quanto a subjetividade de quem escreve for capaz - e sobretudo limitando os juízos de valor ao mínimo possível. Quem frequenta este blogue sabe que os que aqui escrevem se integram na Maçonaria Regular, que é distinta da Maçonaria Liberal. Mas o propósito não é - nem neste espaço nunca foi, pois aqui procura-se respeitar sempre as opções individuais de cada um! - argumentar com uma qualquer superioridade de uma orientação em relação à outra. Tenho a minha opinião sobre o diferente efeito potencial que as diferenças entre a Maçonaria Regular e a Maçonaria Liberal pode ter no relacionamento de uma e de outra com o Poder. Mas restam-me muito poucas dúvidas de que as diferenças efetivas nesses relacionamento decorrem muito mais de razões e percursos históricos e de pontuais tendências subjetivas do que de eventuais inevitabilidades sistémicas.

Não se procura, assim, direta ou indiretamente, afirmar que uma corrente é melhor do que a outra, mais "pura", com ideias "que lavam mais branco". Sempre aqui afirmei - e mantenho e insisto - que considero que, na comparação entre Maçonaria Regular e Liberal, o juízo correto não é declarar ou pretender que uma seja melhor ou pior do que a outra, antes reconhecer que são diferentes - nem muito, nem pouco, diferentes em dois ou três pontos que bastam para que as vejamos como instituições diferentes, sem perder de vista o muito em que são semelhantes. Tão só. E o facto de me integrar na Maçonaria Regular e não na Liberal não tem nada a ver com um eventual juízo meu de pretensa superioridade daquela em relação a esta, apenas e tão só do facto de eu ter procurado integrar-me na tendência que considerei mais afim ao meu pensamento e à minha crença, sem juízos de valor em relação ao pensamento e crença, ou falta dela, alheios.

Também em relação ao segundo termo da equação em análise - o Poder - se justifica uma breve advertência. Neste conjunto de textos, o termo será utilizado igualmente na sua aceção mais ampla, abrangendo não só o Poder Político - que é a noção natural e correntemente utilizada -, mas também o Poder Económico, a Influência Social, o Poder Religioso, a Influência do Saber , enfim tudo o que, sempre na perspetiva do homem comum permite equacionar que alguém se superiorize a outrem, que lhe imponha regras ou comportamentos, que obtenha ou possibilite vantagens. Mais uma vez, sempre que por necessário ou conveniente precisar, precisar-se-á.

Uma última nota: gosto muito de enquadrar o meu pensamento com a perspetiva histórica. entendo que as coisas são o que são, não por acaso, não por voluntarismos, mas porque foram de determinada maneira e tiveram uma específica evolução, que necessariamente condicionam o que são hoje. Não me faz, consequentemente, sentido, procurar dissertar sobre as relações, ou falta delas, entre a Maçonaria e Poder aqui e agora, sem previamente procurar entender como foram, ao longo do tempo e em diversos lugares e circunstâncias, essas relações, buscando entrever sequências, influências, causas e efeitos, que, tanto quanto possível, ajudem a compreender não só as coisas como elas são, mas o como e o porquê de serem como são..

Esclarecido isto, posso então começar a análise do tema no próximo texto.

Rui Bandeira

26 julho 2011

Marreteando



É curioso como, quando sentimos que temos de lidar com algo de maior peso do que a normal rotina, acabamos por retomar hábitos antigos e com que nos demos bem.

Brevemente, vai ser tempo para tomar uma decisão importante. E, cientes de que assim iria ser, os dois Marretas, sem que cada um previamente tivesse consultado o outro, naturalmente retomaram o antigo hábito e ultimamente têm dado uso ao telefone e ao teclado do correio eletrónico.

Desta vez, nem sequer existe, à exceção porventura de um ou outro pormenor, mais adjetivo do que substantivo, desacordo entre ambos. Ambos estão de acordo quanto ao sentido da decisão, ambos se mostram favoráveis à decisão a tomar. Mas, como a decisão é mesmo importante e não basta estar de acordo com ela, há que prevenir perigos, preparar coisas, estar preparado para alguns possíveis imprevistos, prever, gerir e efetuar algumas adaptações, para que, chegada a hora de a decisão ser tomada e, sobretudo, tendo em vista o tempo depois de a mesma ser tomada, se esteja pronto e tudo corra bem. Assim, ambos analisam, preveem e constroem cenários, estudam alterantivas, situações, posturas, ações e reações.

E aqui de novo os velhos hábitos confortavelmente surgem: quase que instintivamente, eles, que estão de acordo no essencial, arranjam maneira de se porem em desacordo nos pormenores e estudam e argumentam e rebatem e, detalhe a detalhe, lá se vão pondo de acordo quanto à melhor forma de atuar e - o que não é de somenos - quanto à melhor forma de cada um deles agir, pois normalmente são mais eficazes cada um sendo ele, diverso do outro, cada um dando atenção a questões diferentes, cada um guarnecendo diferentes aspetos, enfim, cada um fazendo diferente do outro, ambos em prol do mesmo objetivo.

Portanto, minha gente, informo que os dois Marretas estão marreteando a bom ritmo e que esperam - mais: sabem! - que, também com a ajuda do seu marreteanço, na altura própria a Loja estará em perfeitas condições de bem contribuir para a decisão importante que brevemente será tomada e - sobretudo - completa e absolutamente preparada para o que implica essa decisão. Assim, esperam - não só: têm a certeza! - que a decisão importante que brevemente será tomada não perturbará a Loja, não a prejudicará. Pelo contrário, vai torná-la mais sólida, mais forte, mais eficaz, mais... Mestre Affonso Domingues, permanecendo como sempre foi e, como sempre também, reinventando-se e adaptando-se.

A liderança da Loja é boa. Boa será também a próxima liderança. Nesse particular estamos tranquilos. O resto da Loja vai rapidamente preparar-se para o que aí vem. Nós estamos marreteando. Outros vão conversando e preparando-se também. E, quando chegar a altura da decisão importante, não se duvide: a Loja Mestre Affonso Domingues e a sua liderança, a atual e a próxima, estarão preparadas.

Que não sejam as únicas, antes apenas mais uma de todas na mesma situação, é o que eu espero. Mas, para isso, mister é que, em todas as Lojas da GLLP/GLRP, líderes e liderados conversem e se preparem. Com férias ou sem férias, com substituição de lideranças ou sem elas, todas as Lojas, daqui a não muito tempo, têm de tomar uma decisão importante. E não vale a pena, chegada a hora, seja quem for ter a pretensão de se refugiar na dificuldade das férias, no constrangimento da mudança de liderança. Nem invocar desconhecimentos ou incertezas. Quem desconhecer e tiver a obrigação de conhecer, sabe muito bem como e junto de quem se informar! A circulação da informação e o esclarecimento são vias de dois sentidos, não apenas de um...

Qual é a decisão importante que brevemente será tomada? Por agora, não a digo aqui e espero que mais ninguém o faça. Quem sabe, sabe; quem não sabe, em devido tempo virá a saber. Por agora, é para ser discutida nos locais próprios, isto é, em privado, com sossego, calma e concentração. Porque - ninguém o duvide - o problema não estará certamente na tomada de decisão, que, espero, mais detalhe, menos pormenor burocrático, não será difícil de tomar e não suscitará divergências de monta. O problema para que todos e todas as Lojas se devem preparar é o que há que fazer depois de tomada a decisão. Porque se pretende que tudo corra bem e que todos fiquem melhor!

Agora, para os dois Marretas é tempo de marretearem. E por aqui hoje me fico, que estou com pressa: vou almoçar com o José Ruah...

Rui Bandeira

23 julho 2011

Mais um Ano ou será mesmo um dos Anos?

A Loja Mestre Affonso Domingues fecha mais um ano de actividade, o 21º e consequentemente pelos cânones antigos atinge a maioridade.

O inicio do 22º ano é assim simbolicamente o inicio da Idade adulta da Loja. Os caminhos seguidos ao longo destes anos todos, a cultura e a forma de estar serão os pilares para os anos vindouros. As bases e fundamentos estão criadas e a moldagem - entenda-se ensino - dos irmãos está estruturada.

Estou certo, convencido e seguro, que este ano que ora se inicia será um ano MARCO na história da Loja, que o Venerável agora eleito será preponderante (talvez muito mais que o ele pensa) para que daqui a uns anos alguém (eventualmente eu próprio) venha aqui contar do meio século da Loja.

A Maçonaria passa por muitas fases e por muitas transformações, com algumas pequenas derivas à esquerda ou à direita (ou à direita e à esquerda – que não quero que ninguém associe conotações onde elas não existem), mas segue sempre o seu caminho rumo ao futuro na fidelidade aos princípios que a regem.

Todavia para seguir esse caminho é preciso que exista a vontade dos maçons, porque estes são a maçonaria. Se não o fossem então a maçonaria seria apenas um conceito teórico vazio de efeito e conteúdo.

A fase adulta é um bom tempo para com maturidade ir adaptando modificações, suportar alterações mais importantes, digerir novas realidades.

Uma das facetas de uma Loja Maçónica é a capacidade de poder escolher entre várias opções, mas mais que isso propor outras diferentes daquelas que lhe foram apresentadas. Deve poder fazê-lo de forma sustentada, informada e segura.

O seu Venerável, é aqui peça charneira porque é ele o representante de direito da Loja nas várias instâncias. É-lhe exigido que apresente as propostas e posições da Loja, que as defenda, que as “venda”, mas também lhe é exigido que entenda rapidamente outras propostas e posições que lhe sejam presentes.

Não lhe pode ser exigido por quem quer que seja, que decida sozinho sobre matérias de relevância – excepto em situações de grande emergência ou cataclismo – sem pelo menos lhe ser concedida a prerrogativa de ao receber a informação decidir se decide sozinho ou se tem que consultar a sua Loja.

Mas mesmo que essa prerrogativa não aconteça, deve a Loja antecipar cenários, e com isso pensar em soluções que põe à disposição do seu Venerável para que este possa em caso de “aperto” decidir sozinho confortado no debate, ainda que teórico, que teve antes com os seus.

Ora com a entrada na idade adulta, como acima disse, fico muito mais descansado porque sei que tudo o que acabo de escrever está assegurado e que a RL Mestre Affonso Domingues está preparada, faltarão uns ajustes mas poucos, para o futuro e para tudo o que este na sua vertente próxima ou longínqua reserva.

O novo Venerável Mestre, o Irmão Nuno, está suficientemente instruído sobre o funcionamento de uma Loja, e em especial desta, sabe bem como gerir o que lhe aparecer, e sabe sobretudo que conta com a lealdade de todos os membros da sua Loja.

Cabe aqui dizer que só chegámos aqui, porque o 21º Venerável, Irmão A Jorge, teve um papel de relevo na condução dos trabalhos, e terá agora que está prestes a passar à condição de Antigo Venerável uma função de aconselhamento de primordial importância.

Quanto a mim, pois como bem sabem, ando sempre por aí atento ao que se passa, e se me parecer apareço por aqui.


José Ruah

20 julho 2011

Maçonaria e Poder (I)


Corrente e repetidamente, a Maçonaria é acusada de secretismo e de influenciar, ou exercer, o Poder, de forma subreptícia, escondida, por detrás das cortinas, obtendo benefícios para os seus, e de comandar os destinos do país, quiçá do mundo.

Quanto ao secretismo, a melhor prova de que a acusação é infundada é este blogue, bem acompanhado pelo sítio da Loja Mestre Affonso Domingues e por centenas de outros blogues e sítios de Lojas e Grandes Lojas maçónicas, em todas as línguas e publicados por todo o globo, em toda a parte onde há Maçonaria. Poucas instituições, nesta era da Sociedade de Informação, disponibilizam mais e mais detalhada informação sobre o que são, o que fazem, quais os seus propósitos, do que a Maçonaria. No entanto, o anátema persiste, a mentira mil vezes repetida continua a ser tomada por verdade. O tempo e a paciência acabarão por, paulatinamente, ir mostrando a todos que a acusação é vã. E tempo e paciência é algo que os maçons aprendem que são bens preciosos...

O outro cavalo de batalha dos maníacos das conspirações e dos escrevinhadores de tabloides é a alegada influência da Maçonaria no Poder. Periodicamente se elencam listas de ministros, ex-ministros, deputados, autarcas e correlativos que os autores desses textos dizem ser maçons, insinuando-se ou afirmando-se claramente que atingiram as suas posições de maior ou menor exercício do Poder porque beneficiaram das manobras da Maçonaria e que, por sua vez, subrepticiamente beneficiariam os maçons no exercício das suas funções.

Ainda recentemente foi escrito e afirmado na rádio e na televisão, até por eminentes comentadores políticos, que determinada pessoa, que não teria o apoio da maioria dos deputados da Assembleia da República iria, não obstante, ser eleito Presidente da Assembleia da República, porque a todo-poderosa Maçonaria, manobrando nos bastidores, garantiria a sua eleição. Azar! O dito cujo não foi eleito... e todos os ""eminentes" e "conhecedores" comentadores e "fazedores" de opinião assobiaram para o lado, como se as alarvidades por si inventadas e proclamadas não tivessem existido! Este episódio ilustra bem que o alegado poder oculto da Maçonaria é muito menos poderoso, se é que existe, do que os maníacos das conspirações inventam. Embora eu não me admire nada se algum desses "iluminados" resolver proclamar que, afinal, o dito suposto apoiado pela Maçonaria não foi, afinal, eleito, porque, à última hora, a todo-poderosa Maçonaria resolveu que o não fosse, como forma de enganar o mundo, fazendo-lhe crer que afinal não tinha poder nenhum...

Seja como seja, se, em relação ao alegado secretismo da Maçonaria só persiste na espúria afirmação da sua existência quem não quiser ver os factos nem ler os milhares de documentos e textos publicamente disponibilizados pela Maçonaria, em relação às relações, ligações, influências, entre a Maçonaria e o Poder, forçoso é reconhecer que o tema está muito menos esclarecido por parte da Maçonaria, que assim tem deixado campo aberto a todas as especulações, invenções, disparates.

Entendo que é tempo de este pequeno cantinho da Sociedade de Informação contribuir para que a situação mude, no sentido de um melhor esclarecimento, na linha do que tem sido o constante e firme rumo deste blogue: esclarecer o que tiver de ser esclarecido, calmamente, fundamentando o melhor possível as suas afirmações e, sobretudo, com equilíbrio e verdade. Entendo eu e entendem os maçons da Loja Mestre Affonso Domingues que a melhor maneira de descredibilizar os maníacos das conspirações, os mal-intencionados detratores da Maçonaria, os espúrios alarmistas que se comprazem a gritar que vem aí o lobo sem que o bicho esteja na redondezas, é serenamente tratar dos temas alegadamente polémicos, com verdade e a maior clareza que nos seja possível.

Vou, consequentemente, dedicar alguns textos ao tema Maçonaria e Poder, nos quais procurarei esclarecer as relações entre ambos, sua natureza e profundidade. E, como sempre, devidamente informado, cada um formará a sua opinião como muito bem entender, que a liberdade de opinião é coisa que, acima de tudo, se preza neste espaço!

Por hoje, e para terminar, deixo-vos a minha opinião preliminar sobre o tema: em matéria de relações entre a Maçonaria e o Poder, são mais as vozes do que as nozes - mas que há algumas nozes, isso há...

Rui Bandeira

17 julho 2011

O símbolo da MAD e a vesica piscis

O texto do Rui Bandeira sobre o símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues veio a suscitar - de novo - a questão de fazer a vesica piscis  parte ou não do referido símbolo. Não faz, e vamos ver porquê - sem argumentos, que os factos falam por si mesmos.

Quando dois círculos se intersetam, forma-se uma figura nessa zona de interseção. Caso os círculos sejam diferentes, a figura resultante é assimétrica; caso sejam idênticos, é simétrica:

Nem sempre que dois círculos idênticos se intersetam se forma a mesma figura; esta depende do afastamento entre os centros dos círculos:

À esquerda, a distância entre os centros dos círculos é menor do que o seu raio. No centro, é igual ao raio. Á direita, é maior do que o raio. Quando a distância entre os centros é igual ao raio, cada circunferência passa pelo centro da outra. Isso só sucede na figura do centro, que traça aquilo a que se chama uma vesica piscis; as outras não têm esse nome.

Note-se esta curiosa propriedade da vesica piscis: cada um dos pontos de interseção das circunferências forma, com os dois centros das mesmas, um triângulo equilátero. Uma vez que o triângulo equilátero é um dos símbolos usados para designar o Divino, não é senão normal que em volta da vesica piscis se tenha urdido uma densa teia simbólica, tanto mais quanto os triângulos nem sequer estão nela representados, mas meramente implícitos:

Agora que já sabemos o que é uma vesica piscis, vamos tentar encontrá-la no símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues. Para facilitar essa procura, tratei de dar destaque aos círculos que constituem o referido símbolo. Descubra agora quem puder se há alguma vesica piscis na figura da direita:

Temos 2 grupos de círculos iguais: os 6 círculos "de fora" e o do centro por um lado, e os 3 círculos "de dentro" por outro, sendo os primeiros de maior raio do que os segundos. Os do primeiro grupo não se intersetam, apenas se tocando (são tangentes). Os 3 círculos de dentro intersetam-se uns aos outros, mas estão, claramente, mais afastados uns dos outros do que a distância de um raio. A interseção entre qualquer círculo do primeiro grupo e qualquer do segundo também não é uma vesica piscis, uma vez que esta apenas resulta da interseção de dois círculos iguais.

Daqui se conclui que, desde que devidamente definido aquilo de que se fala, muitas vezes os factos falam por si mesmos; não é sequer preciso argumentar.

Paulo M.

P.S.: Corrigi o penúltimo parágrafo, pois o círculo do centro é igual aos de fora.

Referências:
http://ucjcuriosidadesmatematicas.blogspot.com/2010/05/circunferencia-circulo-circunferencia-e.html
http://mathworld.wolfram.com/Lens.html
http://mathworld.wolfram.com/Circle-CircleIntersection.html
http://mathworld.wolfram.com/VesicaPiscis.html

14 julho 2011

Vem aí o 22º Veneravel

À semelhança de anos anteriores na primeira sessão do mês de Julho a Loja Mestre Affonso Domingues elege os seus Veneravel Mestre e Tesoureiro.

Para os cargos de Veneravel e Tesoureiro foram eleitos respectivamente Nuno L. e Vitor M. ambos mestres.

Vitor é uma das apostas da Loja. Não tendo sido iniciado na Mestre Affonso Domingues, nela ingressou vindo de outra Loja quando ainda era Companheiro, concluindo o seu tempo e passando a Mestre. A sua forma de estar não passou despercebida e a sua integração decorreu sem sobressaltos, tanto que hoje foi eleito tesoureiro.

Nuno pelo seu lado é já membro da Loja ha uns anos e progrediu paulatinamente passando por quase todos os oficios de Loja. Nuno apesar da sua antiguidade ainda está na "casa dos trintas" sendo por isso um jovem.

Porque esperamos trabalho de qualidade fomos absolutamente unanimes na escolha.

A instalação decorrerá, previsivelmente, na primeira sessão de Setembro.


José Ruah

13 julho 2011

O símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues


Em comentário ao texto, Maçonaria e Filosofia Pitagórica - o QUATRO, Jocelino Neto perguntou:

Perdoe-me pela análise superficial, mas a vesica piscis faz parte do partido construtivo da imagem que identifica visualmente a R.´.L.´. (Respeitável Loja) Mestre Affonso Domingues? O significado deste símbolo é desvelado apenas aos seus O.`. (Obreiros)?

Quanto à primeira questão, a resposta é negativa. Repare-se que, enquanto a vesica piscis é o espaço comum resultante da interseção de dois círculos iguais com centros na mesma linha horizontal, a uma distância entre si inferior ao diâmetro de cada círculo (cfr. figura abaixo), a estrutura do símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues é constituída por três círculos interligados, para além dos outros elementos.

Também a resposta á segunda pergunta é igualmente negativa. Parece haver tendência para envolver tudo o que respeita à maçonaria num véu de mistério, de segredo... Como o propósito deste blogue é precisamente mostrar que essa tendência não é consistente, aproveito o pretexto para explicar as circunstâncias da criação do símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues e indicar o que pretende representar cada um dos seus elementos constitutivos. Quer as circunstâncias, quer os significados são o mais prosaicos possível, adianto já...!

Nos primórdios da Loja Mestre Affonso Domingues e da então denominada Grande Loja Regular de Portugal, hoje Grande Loja Legal de Portugal/GLRP, a preocupação era a de aprender, criar e consolidar estruturas, enfim, trilhar o caminho da Regularidade Maçónica e da obtenção do Reconhecimento internacional. Os contactos que havia era com maçons da Grande Loge Nationale Française, que, por vezes, se apresentavam em sessão com a medalha da respetiva Loja. Também maçons portugueses iniciados no estrangeiro em Obediências Regulares podiam finalmente aceder a sessões maçónicas regulares no seu país e, comparecendo em sessões de Loja da novel Obediência Regular, frequentemente usavam as medalhas das suas Lojas de origem. Eu próprio, que tinha sido iniciado na Loja Miguel Cervantes y Saavedra, ao Oriente de Bona, no período em que frequentei a Loja Mestre Affonso Domingues com o estatuto de visitante (até ser admitido como obreiro do seu quadro), usava a medalha da minha Loja-mãe.

A Loja Mestre Affonso Domingues, sendo então a mais apurada na prática ritual, era a Loja mais visitada por obreiros estrangeiros e cedo verificou o costume de cada Loja ter uma medalha que era usada pelos seus obreiros. Foi assim simplesmente natural que a Loja, a certa altura, decidisse criar e mandar fabricar a sua medalha distintiva.

Um obreiro da Loja, artista plástico, elaborou o projeto que, com algumas modificações, sobretudo ao nível das cores (modificações essas que, assinale-se, por ser justo fazê-lo, o autor do projeto nunca viu com bons olhos), veio a servir de modelo para a confecção da medalha.

A imagem dessa medalha veio a ser utilizada como logotipo da Loja nos seus documentos e, a breve prazo, transformou-se no símbolo identificativo da Loja Mestre Affonso Domingues.

O significado dos seus elementos é simples e intuitivo e tem, naturalmente, muito a ver com o nome adotado pela Loja, Mestre Affonso Domingues, o arquiteto do Mosteiro da Batalha, imortalizado num belo texto das Lendas e Narrativas de Alexandre Herculano.

As porções visíveis dos três círculos entrelaçados cruzados por seis semicírculos virados para o exterior, evocam a principal característica da arquitetura gótica, a que pertence o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, mais conhecido por Mosteiro da Batalha, a abóbada em cruzaria. Na figura abaixo, pode-se ver a representação esquemática de uma abóbada de cruzaria sexpartida.
Repare-se: seis arcos quebrados ou ogivais góticos (a que correspondem as seis "pontas" da medalha) unidos e sustentados por três nervuras diagonais estruturais, que suportam e distribuem o peso, a abóbada de nervuras (a que correspondem os três círculos entrecruzados, só parcialmente visíveis)

Cada uma das pontas da medalha termina em forma de flor-de-lis, tal como as existentes no brasão de armas do Mestre de Avis, depois rei D. João I, que ordenou a construção do Mosteiro da Batalha (ver figura abaixo).

Justaposto a este conjunto, estão dois círculos concêntricos, formando uma faixa de fundo branco onde está inscrito o nome da Loja, Mestre Affonso Domingues, e o local da sua fundação e o seu número de ordem na Grande Loja, Cascais - n.º 5, inscrições separadas por duas folhas de acácia, símbolo maçónico conhecido. Inscrito no círculo interior está um triângulo (símbolo maçónico comum), em fundo vermelho (cor do Rito Escocês Antigo e Aceite, rito praticado pela Loja Mestre Affonso Domingues), que contám no seu interior o também comum e conhecido símbolo maçónico do compasso e esquadro, este sobre aquele.

Como se vê, é prosaicamente simples a explicação do símbolo da Loja Mestre Affonso Domingues!

Rui Bandeira

12 julho 2011

O Tempo, a Idade e a Maçonaria - I




São condições mais ou menos universais (mas cada Obediência segue regras ligeiramente distintas) de admissão na maçonaria a maioridade e a independência económica; um menor não pode ser maçon, bem como o não pode ser alguém que não tenha meios de sustento. Na GLLP a idade mínima de admissão é de 21 anos, podendo admitir-se candidatos mais novos desde que maiores de 18 anos e apenas em casos excecionais que carecem sempre de autorização especial. Não há, todavia, uma idade superior limite; basta que, como se disse, se seja economicamente independente - pois pertencer à maçonaria acarreta alguns custos fixos - e que se esteja em posse das faculdades mentais.

O limite inferior de idade é compreensível. Mesmo os 21 anos são uma idade muito tenra para se ingressar... Mais do que a idade, é imprescindível a capacidade de ouvir (pois só ouvindo se aprende), a abertura para se admitir estar errado (pois só se aprende se se admitir ou o erro ou a ignorância...) e a capacidade de aceitar que o outro possa ter ideias contrárias às nossas (pois a maçonaria cultiva a tolerância face à diversidade). Quando se é muito novo é difícil ouvir-se os outros, pois um jovem sabe sempre tudo. Admitir-se o erro, então, é coisa ainda mais difícil. Já a infinita curiosidade dos mais novos torna mais fácil o diálogo entre fações opostas, ideias contraditórias, crenças antagónicas.

É à medida que se amadurece que vai surgindo a capacidade de se ver o silêncio não como um açaimo doloroso que se removeria se se pudesse, mas antes como um refúgio, um reduto, um pequeno Éden dentro de nós que podemos defender com um simples sorriso. As amarguras da vida vão-nos mostrando que somos, afinal, pequenos, imperfeitos e efémeros; o ímpeto da invencibilidade da juventude dá lugar a um estado de espírito mais sereno e de maior aceitação das próprias limitações. Todavia, a experiência acumulada acaba por estabelecer o preconceito, dificultando o diálogo.

Como em tantas outras coisas, in medio virtus. Se se for muito novo quando se ingresse a maçonaria, corre-se o risco de não ter ainda atingido a maturidade necessária a que esta possa ser proveitosa e, quando esse momento acabe por chegar, perdeu-se já a novidade, e a oportunidade de fazer a diferença. Sem por outro lado, se pretender ingressar a maçonaria já numa idade avançada, há que acautelar se, de facto, há ainda capacidade - e, acima de tudo, vontade - de aprender coisas novas, de mudar comportamentos, de apurar ideias. É que, quando se entra na maçonaria, entra-se para aprender, e não para ensinar.

A este respeito aprendi na Loja Mestre Affonso Domingues três lições complementares. A primeira passou-se comigo mesmo. Quando entrei, notei uma certa frieza - a roçar a hostilidade - da parte de alguns irmãos da loja. Eu queria aprender, avançar, saber mais, engolir inteiro - e obrigavam-me a estar quieto, a esperar, a mastigar aos bocadinhos e de novo o que já tinha comido antes. Explicaram-me depois que tinha havido algumas más experiências com algumas admissões - os chamados "erros de casting" - de que, mais tarde, a loja se veio a arrepender, e que eu fazia lembrar um ou dois desses. Daí o facto de alguns membros me estarem a dar um "tratamento de choque" para separar logo o trigo do joio desde o princípio. Se tivesse unhas, tocaria guitarra, mesmo com os dedos pisados; se não as tivesse, que seguisse o meu caminho, mas quanto mais cedo isso ficasse claro para todos, melhor.

A segunda deu-se quando assisti à leitura de pranchas de aprendiz. Apesar de ir avisado, foi confrangedor ouvir, dos mestres presentes, as críticas implacáveis, demolidoras e quase a roçar o cruel. É certo que as pranchas não estariam um primor - afinal de contas, eram o primeiro trabalho apresentado à Loja de cada um dos que as elaborara - mas tamanha crítica pareceu-me exagerada. Porém, como disse, tinham-me avisado de que "era da praxe", e assim o tomei. Quando vim a apresentar a minha primeira prancha estava já à espera do que sucederia, e não o estranhei. Não deixou, contudo, de ser algo doloroso ouvir as farpas certeiras que expunham perante todos os mais ínfimos erros do trabalho que tantas noites me levara a elaborar. Aprendi, nessa altura, a confiar; a confiar no juízo dos que me criticavam, pois que o faziam com seriedade e precisão; a confiar que não tomariam as minhas falhas por vulnerabilidades por onde me atacassem; mas, acima de tudo, a confiar na intenção puramente fraterna de quem aponta um erro a um irmão e fica com o coração a transbordar de alegria quando o vê corrigir-se. 

A terceira lição foi mais triste. Pouco tempo depois de iniciado, um aprendiz - por sinal, apadrinhado por um dos mais históricos membros da loja - viria a revelar-se de difícil integração. A sua idade - mais de sessenta anos - não o facilitou, como não o facilitou o facto de ter já bastante conhecimento prévio da maçonaria por via de familiares próximos. Talvez por ser um homem assertivo, de convicções fortes, ideias arrumadas e palavras duras e incisivas, a loja não conseguiu "abalar-lhe os alicerces" da forma pretendida: dando-lhe a oportunidade de se ver a si mesmo e ao mundo de outra forma, mas sem o fazer sentir-se ameaçado nem pessoalmente atacado. Fiquei triste por vê-lo deixar de aparecer, mas acima de tudo doeu-me vê-lo afastar-se magoado. E tudo porque haviam sido criadas expetativas de parte a parte que se viam, no fim, goradas.

De cada aprendiz espera-se que dê o máximo de si mesmo; a loja lá estará para lhe atravessar tantos obstáculos quantos os que ache que ele consegue - e quer - ultrapassar. Uns terão mais capacidade do que outros; uns poderão não ter ainda a pujança que lhes permita correr com os maiores, sem o desconto de serem um "junior"; outros poderão não ter já a força para correr o suficiente que lhes permita atingir os "mínimos olímpicos". A vida é cheia de surpresas, e as portas não se fecham por excesso de décadas de vida; há sempre quem ludibrie as estatísticas. No entanto, sabemos que há uma idade ideal para tudo. É que, como o atletismo, assim é a maçonaria; do mesmo modo que há corridas para seniores, também temos maçons com mais de 80 anos; contudo, esses raramente terão começado a correr tarde; são, antes, atletas que começaram a correr na idade certa, e que ainda não pararam...

Paulo M.

06 julho 2011

Oração de um Mestre a outros Mestres


Novos Mestres:

Foi longo o tempo que mediou entre a vossa iniciação e este dia. É assim que deve ser, porque o Tempo também é construtor e as mudanças perenes não se fazem de um dia para o outro. No dia da vossa Iniciação, simbolicamente terminaram a vossa vida profana e iniciaram a vossa vida maçónica. Hoje, renascem Mestres, em perpétua continuidade do trabalho dos que vos antecederam e em esperançosa construção do futuro que porão à disposição dos que vos sucederem.

Tiveram um longo tempo de aprendizagem, estudo e preparação. A partir de hoje, têm a vossa “carta de condução” de Mestres maçons, que vos possibilita ensinar os que trilham o caminho por vós já percorrido, mas sobretudo testemunha a vossa capacidade para estudar, meditar, trabalhar, melhorar, por vós próprios, segundo as vossas escolhas, os vossos critérios, os vossos métodos. A Sabedoria da Maçonaria, a sua Força, igualmente a sua Beleza, consistem também nesta absoluta, pujante e entusiasmante Igualdade: a todos os que se juntam nesta Instituição é-lhes mostrado um método, apontado um objetivo, proporcionado um meio; quando se dá por terminada a formação de cada um, é-lhe reconhecido, sem reservas, o direito de trilhar o seu caminho em busca do seu objetivo, pelos seus meios e com os métodos que entenda mais adequados. Porque não há respostas unívocas, caminhos certos, percursos exclusivos. Vós sois agora Mestres maçons, é-vos por todos nós reconhecida a vossa plena capacidade de prosseguirem a vossa via sem tutelas, sem reservas, sem limites. Apenas vos dizemos, nós, os Mestres mais antigos: estamos aqui para que, se assim o quiseres, continues a aprender connosco e também para aprendermos contigo, naquilo em que o teu contributo nos seja útil. Simples, afinal!

Mas, se um último conselho me admitis, Mestres, aqui deixo à vossa consideração o seguinte: o tempo decorrido até aqui é muito menor do que o tempo que decorrerá daqui até à vossa meia-noite. Em cada momento deveis fixar novos objetivos, escolher novas tarefas, fixar novas metas. Tendes à vossa frente umas dezenas de anos em que, pese embora percursos que porventura façam complementarmente, não obstante ofícios que vireis a desempenhar, serão fundamentalmente aquilo que hoje sois: Mestres maçons. Nem mais, nem menos, nem diferente.

Porventura dias vivereis em que vos interrogareis sobre a continuidade do vosso interesse na Arte Real. É normal, natural e talvez até inevitável. Todos temos momentos de dúvida, de fraqueza, de necessidade de nos repensarmos. É para esses momentos, para esses dias, que deveis estar prevenidos com esta essencial mensagem: o que importa acima de tudo é o que buscais. E o que buscais não está na Loja, está no local mais importante do Mundo: dentro de vós próprios. O que buscais é aquela inefável partícula do Arquétipo Primordial da Perfeição, cuja busca é quiçá o verdadeiro sentido da Vida. A Maçonaria, a Loja, a Mestria, tudo o que aqui fizerdes ou construirdes, são simples meios dessa vossa busca.

Lembrai-vos: por mais importante, indispensável, precioso, que seja o trabalho que desempenhardes em Loja, é sempre menos importante do que o trabalho que deveis desempenhar fora da Loja – e não estou, obviamente, a falar das vossas profissões. Falo-vos do trabalho de construção do Templo, do vosso Templo de que hoje fostes reconhecidos como Arquitetos. Sois vós que dirigis esses trabalhos. Sois vós que o executais. Todos os dias. Aqui e fora daqui. Sobretudo fora daqui. Especialmente dentro de vós.

E quando tiverem momentos de dúvida, de desalento, quando vos perguntardes porque vir à Loja, lembrai-vos: os espaços de tempo em que estamos em Loja não são os momentos em que trabalhamos. São os nossos momentos de lazer, o prémio que nos atribuímos pelo nosso esforço diário, o momento em que convivemos, em que mostramos aos demais o resultado, naquele preciso momento, do nosso trabalho, da nossa evolução, em que detetamos e apreciamos a evolução dos demais, em que, em conjunto, executamos sempre e sempre os mesmos gestos, dizemos as mesmas palavras, temos as mesmas posturas, no que é afinal uma pausa, um recarregar de baterias em união de espíritos e de vontades, para seguidamente voltarmos a executar o interminável e solitário trabalho da construção do nosso Templo.

Mestres, assumi com o orgulho que, na justa medida, também é qualidade: sois agora Mestres maçons, mas, mais do que aqui, sois Mestres maçons lá fora e, sobretudo, dentro de vós. Aqui sois apenas – e basta, e é muito! – reconhecidos como tal!

Rui Bandeira

04 julho 2011

Bem comum e liberdades individuais



Li hoje uma notícia sobre um "motoqueiro" de 55 anos que, de cima da sua Harley, protestava contra a lei que passava a obrigar ao uso do capacete. Enquanto o fazia teve que fazer uma travagem brusca, foi lançado sobre o guiador, caiu de cabeça e, como não usava capacete... morreu.

Uma vez mais se me colocou esta questão: até onde pode, ou deve, a sociedade regular as liberdades individuais? Dever-se-á deixar ao juízo (ou falta dele...) de cada um o uso de capacete? E se o motoqueiro for um pai de família, que depende dele para o seu sustento? E se for uma pessoa com um cancro em fase terminal? E se do acidente decorrerem custos de tratamento enormes, pagos por todos os contribuintes - muitos dos quais até teriam votado a obrigatoriedade do uso do capacete?

O consumo de drogas deve ser liberalizado? E a condução sob a influência de drogas? E conduzir zangado? Se uma Testemunha de Jeová (religião que proíbe as transfusões de sangue) se apresentar inconsciente num hospital em consequência de um acidente, deverá o médico de serviço deixá-la morrer por falta de uma transfusão, ou salvar-lhe a vida recorrendo a algo que a sua religião proíbe, quando não haja tratamento alternativo? E se a pessoa estiver consciente e recusar a transfusão? E se for o filho pequenino dessa pessoa que esteja doente, e ela peça aos médicos que antes deixem o filho morrer do que lhe dêem uma transfusão?

Até que ponto podemos ou devemos sacrificar o indivíduo ao bem comum? Ou o bem comum ao indivíduo? Há séculos que estas questões se discutem. E há séculos que ficam sem resposta - ou pelo menos sem uma resposta categórica, uma vez que recebem respostas diferentes, cada uma fundamentada sobre distintas premissas. Não é, porém, por se saber a priori que não há uma resposta universal que deve deixar de se discutir estas questões. É importante que cada um tenha as suas próprias respostas, mesmo que estas sejam diferentes das daqueles que o rodeiam. E se não é essencial que todos afinem pelo mesmo diapasão, é desejável que todos tenham consciência da diversidade de respostas, e de que há pelo menos alguma legitimidade nessa diversidade.

Assim sucede - ou deve suceder - numa loja maçónica. Não é importante que todos pensem igual; pelo contrário, é bom que pensem diferente, para que todos tenham a oportunidade de aprender, desde cedo, o  respeito pelas ideias com que não se identificam.

Paulo M.