03 janeiro 2008

MAÇONARIA E AMBIENTE: e=mc2

A civilização humana actual baseia-se no consumo de energia. Usa-se energia para produzir. Usa-se energia para transportar. Usa-se energia para consumir. A energia é tão vital para a civilização humana, tal como a entendemos nos tempos actuais, como o ar para uma pessoa.
O problema é que a energia que existe em abundância (por exemplo, a solar) não é fácil de utilizar. Não é fácil pegar num pouco de energia solar e colocá-la dentro do reservatório do nosso automóvel, para a utilizar como combustível... O problema é que a civilização humana tem tendência para se desenvolver sempre através da solução mais fácil. Durante séculos, a necessidade de aquecimento foi suprida com o recurso à queima de madeira, recurso abundante e de fácil obtenção e utilização. Com a descoberta das potencialidades da energia do vapor de água, a obtenção deste fez-se à custa da queima de carvão. Com a descoberta do motor de explosão, a obtenção da energia necessária para movimentar o veículo fez-se à custa da ignição de produtos petrolíferos.
Em suma, ao longo do tempo a obtenção de energia fez-se à custa do consumo de meios naturais relativamente abundantes. Mas este paradigma tem dois custos, que cada vez mais se revelam mais preocupantes e penosos: a extracção de energia de recursos naturais gera resíduos; os recursos, ainda que abundantes, são finitos.
A civilização baseada na obtenção de energia através da queima de carbono (madeira, carvão, petróleo, no fundo são apresentações diferentes da mesma substância: o carbono) deixa como resíduo, além do mais o dióxido de carbono. Este, na medida em que não seja consumido pelas plantas, acumula-se e, segundo parece, gera um efeito de estufa susceptível de conduzir a um aquecimento global potencialmente catastrófico para a civilização humana, tal como ela está organizada.
Por outro lado, o mais eficiente dos recursos fósseis é, consabidamente, finito. Um dia, mais cedo do que mais tarde, não existirá matéria-prima suficiente para a gulodice energética dos nossos tempos.
Parece estar-se perante um problema insolúvel.
Que podemos nós, maçons, fazer para ajudar? O que sabemos fazer: especular, pensar, racionalizar. Bem sabemos que não há soluções mágicas, que a resolução de problemas complexos se obtém por pequenos passos, pelo solucionar paulatino de cada um dos pequenos problemas em que conseguimos dividir o imenso problema de que vamos tendo consciência.
Por mim, proponho que não esqueçamos a ciência pura, a física básica. Proponho que recordemos a equação popularizada por Einstein: e = mc2.
e = energia; m = massa; c = velocidade da luz no vazio.
Portanto, a energia é igual ao produto da massa pelo quadrado da velocidade da luz do vazio. Energia, massa, velocidade, os três termos da equação.
Velocidade é a medida do movimento. A equação pode, assim, ser referenciada aos três termos energia, massa, movimento.
O meio mais comum de obtenção de energia é extraindo-a da massa, isto é, de diversas substâncias, designadamente do carbono. Talvez a solução do problema energético da nossa civilização passe pela obtenção de energia extraindo-a do outro factor ínsito na equação popularizada por Einstein: o movimento.
Afinal de contas, se pensarmos bem, isso é o que está na base de algumas das que nós chamamos energias renováveis. A energia eólica deriva do vento, isto é, do movimento do ar. A energia das marés deriva do movimento do oceano.
Talvez seja tempo de substituir o paradigma da massa pelo do movimento, no que à obtenção de energia respeita. A Ciência e a Técnica têm a palavra. É que, quer queiramos, quer não, não resolvemos o problema do Ambiente sem obter uma razoável resolução do problema da obtenção de energia.
Rui Bandeira

3 comentários:

Paulo M. disse...

O Rui, como nos tem habituado, começou bem e acabou melhor. De facto, estamos em plena fase de transição de uma forma de energia (o petróleo) para outra (sabe-se lá qual...) e temos que ser cautelosos com o rumo que tomarmos. Pelo meio, contudo, o Rui vacilou um bocadinho - não é a sua área, e não tem obrigação de a dominar com precisão. Vou tentar, já que o Rui abordou o assunto - que, reconheça-se, não é nada simples - aclarar um ou outro ponto.

Como descobriu Lavoisier, "nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". Contrariamente ao que parece empiricamente, na combustão não há transformação de matéria em energia; o que há é libertação de energia por se passar de matéria de um estado "mais energético" para um outro "menos energético". Mas o que é que isso quer dizer? Queimar algo é como que deixar cair um peso de uma certa altura; a queda do peso liberta energia (que pode ser usada para gerar movimento, por exemplo) mas o peso não se transforma em energia; continua a pesar e a ser feito precisamente do mesmo. Para voltar a colocar o peso na posição inicial temos que dispender energia - pelo menos tanta, mas normalmente mais, do que aquela que ganhámos ao deixá-lo cair.

Do mesmo modo, a lenha, o carvão ou o petróleo (mais energéticos) decompõem-se em cinza, em água e em CO2 (menos energéticos), e pelo caminho libertam a energia que consubstancia a diferença entre os dois estados. Se pegarmos numa semente, água, cinza e CO2 podemos reverter o processo, fazendo uma árvore outra vez - desde que forneçamos energia, concretamente energia solar. Essa energia permitirá elevar, de novo, o potencial energético. A matéria envolvida é, contudo, sempre a mesma; é sempre a mesma quantidade de oxigénio, carbono e hidrogénio; esses átomos não são criados nem destruídos, antes se recombinando sob a forma de substâncias diferentes. Podemos, por isso, dizer sem errar que a lenha, o carvão e o petróleo têm energia solar acumulada. Os combustíveis fósseis e a biomassa (lenha, carvão vegetal e afins) apenas "devolvem" a energia que as plantas que lhes deram origem receberam do Sol.

Já Einstein foi um pouco além de Lavoisier: descobriu que a matéria pode, de facto, ser destruída, e que essa destruição liberta uma enorme quantidade de energia (e daí vem a famosa equaçãozinha referida pelo Rui). É esse o princípio de funcionamento dos reactores nucleares: pega-se numa pequena quantidade de matéria instável e, nas condições propícias, parte desta transforma-se em energia; no processo, a matéria desaparece. É, de resto, esse o processo que se dá no interior do Sol, que é um enorme reactor nuclear. Curiosamente, até aqui Lavoisier tinha alguma razão: podemos, desde que disponhamos de uma colossal quantidade de energia, criar matéria a partir do nada - bom, do nada, não: a partir da energia que fornecemos.

Os combustíveis fósseis, o vento (fruto das diferenças causadas pelas diferenças de calor na Terra aquecida pelo Sol), as centrais hidro-eléctricas (baseadas no ciclo da água, de que faz parte a evaporação causada pelo calor do Sol), são formas indirectas de energia solar. O Sol é, incontornavelmente, a fonte de energia a que, de uma forma ou de outra, mais vezes recorremos. Já uma que nada parece ter que ver com o Sol é a proveniente de centrais nucleares. Na verdade não temos grande alternativa: ou usamos, directamente, a energia de uma central nuclear pequena e feita por nós - com o problema da escassez de recursos naturais e da poluição dos resíduos resultantes do processo - ou usamos, de forma mais ou menos indirecta, a energia que emana dessa enorme central nuclear que é o Sol. Há ainda a energia geo-térmica, mas é ainda pouco explorada. Quem sabe...

Seria desejável que a "nova fonte de energia" que substitua o petróleo fosse o menos poluente possível. Contudo, procurar o mais barato, através da "lei do menor esforço", sempre foi um grande motor de desenvolvimento, e poderá imedir que isso aconteça. O que irá, no fim, determinar a escolha será, estritamente, o factor económico. É possível que a próxima fonte seja, por exemplo, a energia nuclear. O petróleo é o mais usado porque, até agora, tem sido barato. Ao aumentar a escassez não diminuindo a procura, ensina a Economia que o preço sobe - o que tem acontecido. A partir de certo ponto, será mais barato produzir energia a partir de qualquer outra coisa; nesse ponto, a procura de petróleo declinará - como declinou a procura de locomotivas a carvão - mas não antes. Pretender que o mais barato seja o melhor e o menos poluente... bom... isso é já wishful thinking... pode ser que sim, mas pode ser que não.

Subscrevo o voto que faz o Rui: saibamos escolher bem. É que o tal "aquecimento global", longe de ser o fim da Terra, seria não obstante, e como bem o diz o Rui, o fim do mundo tal como o conhecemos. Ao mesmo tempo que levaria ao florescimento de uma infinidade de espécies que achariam o clima quente mais propício - como as nossas amigas melgas - levaria, eventualmente, à extinção (ou forte declínio) de muitas espécies - nomeadamente da nossa. E, com o devido respeito pelas melgas, prefiro que estas sucumbam e deixem a Terra para os nossos filhos.

Um abraço,

Simple Aureole

P.S.: Desculpem lá a extensão do comentário, mas não foi por falta de tentar encurtá-lo...

J.Paiva Setúbal disse...

Boa, Simple, e pertinente. Só vi o comentário depois do meu próprio post publicado, o que não altera nada, mas é um pormenor. Quanto à extensão... dificilmente poderia ser mais curto para conter o que contém. Pela minha parte já deixei aí algures no blog que nuclear... não obrigado, mas inteiramente de acordo com pesquiza, experiência, tentativa de mais e melhor energia, na convicção de que há muito para aproveitar do Sol, do Vento, das Marés, da Geotermia, das Hidricas,...
Há sempre uma maneira diferente e melhor de conseguir um resultado ! É essa a fórmula.

Paulo M. disse...

Um dos grandes problemas das energias renováveis é a possibilidade frequente de a sua baixa eficiência levar ao seu alto custo. Não nos esqueçamos de que, contrariamente à biomassa, os painéis são fabricados (não nascem nas árvores...). O seu fabrico consome matéria-prima e energia, e deixa resíduos no fim. Um simples painel de energia solar para aquecimento de água demora uns quantos anos a pagar-se a si mesmo - e, se não tivermos cuidado, a sua vida útil pode terminar antes que isso aconteça, traduzindo-se num prejuízo.

O nuclear vê a sua maior justificação no custo. Claro que, idealmente, todos comeríamos vegetais cultivados organicamente; contudo, os recursos disponíveis não chegam para alimentar todos dessa forma, sendo necessário que nos alimentemos com vegetais provenientes da agro-química. O bom é inimigo do óptimo... e por vezes tem que se fazer compromissos, sempre sem tirar os olhos do objectivo final.

Nos painéis foto-voltaicos (que geram energia eléctrica a partir de energia solar) conseguiu-se, fruto da investigação, um aumento para o triplo da eficiência nos últimos anos, o que quer dizer que se consegue gerar a mesma energia com um painel de 1/3 do tamanho - que, por sinal, tende a ser mais barato. A investigação é cara, e só o alto preço do petróleo pode justificar a procura de alternativas. Depois de justificada economicamente a opção, mais cedo ou mais tarde alguém surgirá com uma solução... Esperemos que mais cedo.

Um abraço,

Simple Aureole