07 novembro 2007

MAÇONARIA E AMBIENTE - Demografia: Infecção ou nem por isso?


Existe um sítio na Rede, em inglês, que mostra, de maneira particularmente impressiva, o ritmo de crescimento da população humana no Mundo e todo um conjunto de dados, quer inerentes à população (número de infectados por HIV, número de doentes com cancro, quantidade de pessoas que passam fome), quer inerentes ao estado do planeta, poluição e exploração dos seus recursos (temperatura média global, emissão de CO2, espécies extintas, área de floresta perdida e área de floresta replantada, área desertificada, petróleo extraído, petróleo derramado nos oceanos, reservas de petróleo, sua duração, resíduos nucleares). É o Relógio da Terra.


A consulta dos dados deste sítio é elucidativa. No que a este texto respeita, fiquemo-nos pelos dados demográficos: existem presentemente mais de seis mil, seiscentos e trinta milhões de seres humanos à face da Terra, dos quais mais de quarenta e cinco milhões infectados com o vírus HIV e mais de sete milhões sofrendo de cancro. Só desde o princípio do corrente ano de 2007, a população mundial foi aumentada em mais de sessenta e cinco milhões de indivíduos.

A questão demográfica pode ser vista por dois modos, o catastrofista e o optimista.

Quem segue a via de análise catastrofista, antevê para depois de amanhã o caos, o apocalipse. Para esses, a espécie humana está para o planeta como a bactéria para o corpo humano: prolifera tão desregradamente que acabará por o destruir e, com ele, destruir-se-á a si própria.

Para os optimistas não há crise: naturalmente tudo se comporá, o planeta tem capacidade para albergar mais gente do que se julga e a Natureza é mais perfeita do que a julgamos e saberá desencadear o mecanismo de contenção do crescimento da espécie quando a capacidade do planeta estiver a ser atingida.

Para os catastrofistas, a Humanidade é uma infecção que só não destruirá o planeta se este não a destruir primeiro, com um qualquer equivalente cósmico do antibiótico.

Para os optimistas, a Natureza é mãe que acomodará seus filhos até ao limite do possível e, entretanto, providenciará a estes os meios de se auto-regularem e não ultrapassarem o limite da capacidade do planeta.

Para os catastrofistas, a infecção está já actuando e o aquecimento global é o planeta em febre, primeiro sintoma de doença que, se não for rapidamente debelada, levará à morte da doença (a Humanidade) ou do doente (o planeta), com a consequente destruição também daquela.

Para os optimistas, a responsabilidade humana no aquecimento global é uma treta (conferir a posição, aliás com fundamentação que impressiona, que Rui G. Moura apresenta no seu interessante blogue Mitos Climáticos).

Que o crescimento demográfico é um problema, parece que ninguém põe isso em causa. Que não pode ou não deve ser atalhado com medidas de força ou restritivas dos direitos e da dignidade humanas é um princípio que a Maçonaria não pode deixar de proclamar. Como não deve ceder à tentação de se deixar instrumentalizar por uma das teses.

É evidente que o acelerado crescimento da Humanidade coloca problemas cada vez mais urgentes e ingentes. Mas não se deve cair nas tentações dos presságios de catástrofe mais ou menos iminente, caucionando pretensas medidas correctivas que não respeitem a dignidade da pessoa humana.

Por outro lado, não devem também os maçons enfiar a cabeça na areia e pensar e agir como se nenhum problema houvesse, infantilmente confiantes que a Mamã-Natureza resolverá por nós o problema. Porque assim proceder pode levar a que a Mãe-Natureza efectivamente resolva o problema, quiçá por modo menos agradável...

A sobrepopulação deve ser por nós entendida como um problema sério, com que se deve lidar com seriedade, mas também ponderação.

Duas pistas penso que, para já, podemos apontar.

Verifica-se que, nos países economicamente mais desenvolvidos, a taxa de natalidade decresce. Dir-se-ia que o desenvolvimento económico é um bom meio de controlo populacional. Onde não há já grande taxa de mortalidade infantil, as pessoas não sentem a necessidade de ter mais filhos, para garantir que não fiquem sem nenhum. Onde as necessidades básicas são consideradas como asseguradas, as pessoas não sentem a necessidade de ter filhos para auxiliar na obtenção do sustento da família. Devemos, creio, defender o desenvolvimento económico EQUILIBRADO E AMBIENTALMENTE SUSTENTÁVEL também como meio de controlo do excesso de população.

Por outro lado, não devemos deixar passar em claro os receios contrários: a quebra da natalidade, dizem alguns, deve ser atalhada, porque causa envelhecimento da população, sobrecarrega os sistemas de protecção social, faz definhar as sociedades. Devemos ajudar a manter os nossos concidadãos e os nossos decisores com a cabeça fria. Primeiro, apontando que o envelhecimento da população nos países mais desenvolvidos não resulta só da quebra de natalidade, resulta também do facto de os frutos da explosão de nascimentos que ocorreu após o fim da II Guerra Mundial estarem agora no declinar da vida, conjugado com o sucesso das técnicas da medicina moderna no prolongar do tempo médio de vida. Mais vivem mais tempo e portanto daí resulta a alteração da relação entre o número de idosos e o de jovens. Aqui, estamos a ser aparentemente vítimas do nosso sucesso... Mas este é, creio, um problema que naturalmente se resolverá com o tempo: o tempo de vida, mesmo aumentado, dos frutos da explosão de nascimentos chegará ao fim e, tão naturalmente como a relação idosos-jovens se alterou, paulatinamente retomará o sentido da normalidade.

Acresce que o problema conjuntural da alteração do envelhecimento da população nos países economicamente mais desenvolvidos se resolve facilmente com uma medida que, simultaneamente, ajudará a debelar alguns dos problemas resultantes do excesso de natalidade dos países mais pobres: regular os fluxos migratórios, não "fechando portas", mas permitindo um adequado fluxo migratório, que permita manter a quantidade de força de trabalho adequada para o normal funcionamento de cada sociedade, melhorar a relação idosos-jovens e aliviar a pressão sobre os sistemas de segurança social.

É também devido ao facto de ser, ao longo do tempo, um país de imigração que os Estados Unidos são uma potência económica...

Simplesmente, tolerar o Outro, o Diferente, o Imigrante, é, por vezes, difícil. Conviver com culturas diferentes, costumes diversos, não é fácil.

É aqui que a Maçonaria deve intervir: Tolerância é algo de que sabemos muito bem o significado!

Rui Bandeira

4 comentários:

Nuno Raimundo disse...

BoAS...
Já conhecia este relógio.
É de facto assustador ver "aqueles" números todos e para mais sempre a aumentarem...

Se ninguém meter a mão à consciência e pensar no que quer para o seu futuro, a Terra como a conhecemos hoje se transformará num local inóspito e de impossivel de ser habitado; pelo menos por aqueles que tanto mal lhe fazem, e que somos Nós...


abr...prof...

Paulo M. disse...

"É também devido ao facto de ser, ao longo do tempo, um país de imigração que os Estados Unidos são uma potência económica..."

Parece-me que os EUA o fazem por interesse próprio, e não por magnanimidade. A verdade é que têm atraído os melhores cérebros do mundo, mas fechado firmemente as portas ao resto. Entendo a estratégia - pois abrir as portas de par em par seria catastrófico para todos - mas não a tomemos pelo que não é.

Em vez de fomentar a imigração dos melhores, parece-me mais equilibrado - e mais justo - ajudar os países menos desenvolvidos a atingir o tal patamar de conforto que lhes permita ser auto-suficientes. Ora, retirar-lhes os cidadãos mais promissores dificilmente pode ser considerado uma ajuda.

A imigração é tema igualmente meritório - que seria interessante até debater-se aqui - mas para já foquemo-nos no ambiente e na sustentabilidade.

Quanto aos défices da Segurança Social, parece consensual que o modelo de aumento constante da população como meio de financiamento é insustentável.
Apertemos antes o cinto, e procuremos sobreviver pesando tão pouco quanto possível nos ombros das gerações que nos seguem. Elas agradecer-nos-ão.

Um abraço,
Simple Aureole

Rui Bandeira disse...

@ NuNo_R:

É por isso que convém ir pensando enquanto é tempo... Mas sem radicalismos, de um ou outro sentido, que só servem para fazer ruído e dificultar a análise séria do problema e a busca de remédios eficazes e possíveis.

@ simple:

Não duvido que os EUA têm uma política de atracção de cérebros. Outros países também a têm, talvez com menos sucesso porque as condições estruturais que são oferecidas são diferentes.
Mas seria injusto esquecer que os EUA, ao longo da sua breve história (são só 200 e poucos anitos...), têm sido um país de acolhimento de imigrantes qualquer que seja a capacidade e a preparação destes. Só três exemplos: a migração de irlandeses na época da Grande Fome na Irlanda, a vaga migratória italiana (que resultou na introdução da Cosa Nostra nos EUA, isto para não especular sobre as origens da pizza à americana...) e a migração portuguesa, constituída maioritariamente por açorianos. São movimentos que duraram décadas, talvez hoje com menor expresão (mas hoje há vagas migratórias de outras paragens...), que originaram a integração desses imigrantes e seus descendentes no Povo americano e que obviamente não têm nada a ver com a caça aos cérebros.

Por outro lado, quanto à sugestão de o melhor caminho ser a ajuda aos países menos desenvolvidos, é indiscutível a sua sensatez. Mas, a meu ver, não deve ser utilizada como forma de impedir a migração, ao jeito de "a gente ajuda-os a desenvolverem-se; fiquem lá quietinhos nas vossas terras e não venham para cá misturar-se connosco; afinal de contas, os vossos bisnetos já vão poder ter uma boa vidinha e, perante isso, o que são os sacrifícios, a fome e a miséria de três gerações?".
É que de boas intenções está o Inferno cheio e de boas palavras está a hipocrisia política plena...
Portanto, meu caro, insisto na minha: é útil que a Maçonaria insista na Tolerância, no caso na Tolerância perante a Diferença e o Diferente. Até porque, queiramos ou não, goste ou deteste quem gostar ou detestar, os movimentos migratórios são como a maré: quando sobe, nada a pára. E nem os diques da Holanda devem iludir-nos. Vão sendo a excepção que vai confirmando a regra e, se se confirmar a subida do nível do mar, daqui a umas dezenas de anos se calhar mem isso...

Paulo M. disse...

@ Rui

De facto, não se pode falar de ambiente sem se cair na demografia e na economia; é como tentar falar de gastronomia sem falar de agricultura.

O problema de fundo é simples: afinal, chega ou não para todos, e em que termos? É inegável que, descontadas as incontornáveis assimetrias locais a cada país, chega para todos (e até sobra) nos países desenvolvidos, e falta o mais essencial nos países menos desenvolvidos.

Mas será que o excedente dos países "mais ricos" pode, deve ou basta para ajudar os países "mais pobres"?

Não tenho a pretensão de responder a questões deste calibre. Contudo, foquemo-nos no que se fazia, anos atrás, quando uma colheita de cereais era má: passava-se fome, mas guardava-se semente para o ano seguinte. No limite, sacrificava-se o curto prazo para não comprometer o ano seguinte. A Economia ensina isso: que o investimento é alternativo à fruição dos bens, mas que o crescimento económico só se consegue à custa do investimento.

Por outro lado, os excedentes europeus vendidos a baixo custo em África têm destruído a economia local, por serem vendidos a preços abaixo do custo de produção local. Linda ajuda; antes os deitassem ao mar. Vi um programa na TV que mostrava um tipo que construiu 12 aviários com subsídios ao desenvolvimento - uma coisa bem feita - mas, quando apareceu frango congelado europeu a 2/3 do preço de custo dele, ficou com tudo ao abandono, excepto um bocadinho de um aviário apenas para subsistência... Se deixasse de haver subsídios à produção, quer na Europa quer nos EUA, o problema ficava resolvido por si, pois os produtos são baratos por serem subsidiados...

As minhas objecções são desta natureza, não doutra. Em resumo: parem de lhes mandar peixe, e ensinem-nos antes a pescar!!! Afinal, eles até têm, em muitos casos, melhores recursos naturais do que nós... Desde que não lhes façam o que tem feito o Mugabe...

Um abraço,
Simple Aureole